A escola pública afundou em decadência. Ela foi destruída por - TopicsExpress



          

A escola pública afundou em decadência. Ela foi destruída por vários processos. Além da privatização, o principal foi a desvalorização da carreira docente, a degradação profissional dos professores. O que é a degradação social de uma categoria? Na história do capitalismo, varias categorias passaram em diferentes momentos por promoção profissional ou por deterioração profissional. Houve uma época no Brasil em que os reis da classe operária eram os ferramenteiros: nada tinha maior dignidade, porque eram aqueles que dominavam plenamente o trabalho no metal, conseguiam manipular as ferramentas mais complexas. Séculos antes, na Europa, foram os marceneiros, os tapeceiros, e em muitas sociedades os mineiros foram bem pagos, relativamente, por muito tempo. Houve períodos históricos na Inglaterra porque a aristocracia era pomposa - em que os alfaiates foram excepcionalmente bem remunerados. Na França, segundo alguns historiadores, os cozinheiros. Houve fases do capitalismo em que o estatuto do trabalho manual, associada a certas profissões, foi maior ou menor. A carreira docente mergulhou nos últimos vinte e cinco anos numa profunda ruína. Há, com razão, um ressentimento social mais do que justo entre os professores. A escola pública entrou em decadência e a profissão foi, economicamente, desmoralizada. Os professores foram ideologicamente desqualificados diante da sociedade. O sindicalismo dos professores, uma das categorias mais organizadas e combativas, foi construído como resistência a essa destruição das condições materiais de vida. Reduzidos às condições de penúria, os professores se sentem humilhados. Este processo foi uma das expressões da crise crônica do capitalismo. Depois do esgotamento da ditadura, simultaneamente à construção desse regime democrático liberal, o capitalismo brasileiro parou de crescer, mergulhou numa longa estagnação. O Estado passou a ser, em primeiríssimo lugar, um instrumento para a acumulação de capital rentista. O Estado retira da sociedade através de todos os mecanismos - o fisco e todos os mecanismos arrecadatórios - uma parte da mais-valia que é produzida e a redistribui para o Capital. Isso significa que os serviços públicos foram completamente desqualificados. Dentro dos serviços públicos, contudo, há diferenças de grau. As proporções têm importância: a segurança pública está ameaçada e a justiça continua muito lenta e inacessível, mas o Estado não deixou de construir mais e mais presídios, nem os salários do judiciário se desvalorizaram como os da educação; a saúde pública está em crise, mas isso não impediu que programas importantes, e relativamente caros, como variadas campanhas de vacinação, ou até a distribuição do coquetel para os soropositivos, fossem preservados. Entre todos os serviços, o mais vulnerável foi a educação, porque a sua privatização foi devastadora. Isso levou os professores a procurarem mecanismos de luta individual e coletiva para sobreviverem. Há formas mais organizadas de resistência, como as greves, e formas mais atomizadas, como a abstenção ao trabalho. Não é um exagero dizer que o movimento sindical dos professores, em todos os níveis, ensaiou quase todos os tipos de greves possíveis. Greves com e sem reposição de aulas. Greves de duas, dez, quatorze, até vinte semanas. Greves com ocupação de prédios públicos. Greves com marchas. E muitas e variadas formas de resistência individual: cursos para administração escolar, transferências para outras funções, cargos em delegacias de ensino e bibliotecas e, também, a ausência. Tivemos taxas de falta ao trabalho, em alguns anos, elevadíssimas. Além disso, temos uma parcela dos professores, inquantificável - é um tabu dentro das instituições e nos sindicatos - que são aqueles colegas que freqüentam a escola, mas não dão aulas. Entram na sala de aula, passam uma atividade na lousa e dispensam os alunos faz quem quer, quem não quer sai , já desistiram de dar aulas, é o último degrau. Cria-se uma situação de conflito latente entre os professores que dão aula e os professores que não dão aula. Por último, uma parcela dos professores desabou. Surtaram: as doenças profissionais são elevadíssimas, entre elas, a depressão é epidêmica. Um programa socialista para a educação pública As duas últimas questões são programáticas. O quarto tema são elementos para um programa que o marxismo revolucionário poderia apresentar para a educação. Um projeto para a reconstrução da escola pública e gratuita é, também, um plano para a educação dos educadores. Ensina a sabedoria popular que podemos conduzir um cavalo até à água, mas não podemos obrigá-lo a beber. Não haverá uma nova educação sem a mobilização livre dos sujeitos ativos no processo educacional. O programa socialista para a educação brasileira começa por um resgate do lugar da educação e dos educadores. Os principais agentes de transformação da educação serão os estudantes e os trabalhadores da educação, pois são eles que a defendem contra os ataques do Estado. Em cada momento, qual será entre os estudantes e os professores, o segmento que estará na vanguarda? Este é um falso problema. É um assunto sobre o qual não deveríamos ter um critério rígido; isto é indeterminado, é incerto. A experiência histórica sugere que, em alguns momentos, os professores serão vanguarda e, em outros, os estudantes. Essa não é a opinião dos reformistas. Ao lado dos liberais e dos conservadores, defendem uma campanha imunda que transforma os professores, de vítimas, em responsáveis pela crise da escola, criminalizando as greves de resistência. O Estado burguês defende que é o governo a vanguarda, o que é cômico se não fosse trágico. Como transferem a responsabilidade do fracasso escolar para os professores e os estudantes, insistem em mobilizar os pais para dentro das escolas, argumentando que a pressão externa da comunidade poderá melhorar a gestão. Os neoliberais descobriram que o problema da educação não é o corte verbas, mas a má administração. Uma campanha abjeta na televisão, apresenta o trabalho voluntário como a solução da escola pública, o que seria, evidentemente, risível, se não fosse desprezível. Um programa para a educação tem que primeiro identificar quem são os sujeitos sociais da luta pela mudança. Não é sequer razoável pensar na luta por uma melhor escola pública, se o projeto for construído demonizando os professores. Este ponto de partida programático, a reivindicação dos professores como sujeitos, é uma ruptura com a estratégia reformista, porque identifica o Estado burguês como o inimigo da educação, e os docentes como os protagonistas da mudança. Os reformistas defendem, exatamente, o contrário. A concepção dos reformistas é igual à dos partidos ao serviço do Capital: o partido burguês na campanha eleitoral diz o nosso programa para a educação é muito bom. Aí os reformistas, o PT e o PCdoB dizem o nosso programa para a educação é melhor. Depois esquecem as promessas, por suposto, mas a concepção comum é que, quando chegarem ao Estado, aplicarão um programa contra os professores, porque são grandes sábios e os professores nem merecem ser ouvidos. A tradição marxista revolucionária não é esta. A tradição marxista é que as organizações dos trabalhadores, sindicais e políticas, são instrumentos para os trabalhadores tomarem o poder, e eles, os trabalhadores, governarem a sociedade. Um partido revolucionário não toma o poder e não impõe um programa contra as massas; as massas é que mudam a sociedade e tomam o poder. O partido é um instrumento para a revolução e um organizador geral do projeto insurrecional. Recordando a epígrafe de Marx que abre este artigo, transformaremos a escola, nos transformando a nós mesmos. Lutamos por uma outra escola, porque nós mesmos lutamos para sermos diferentes daquilo que fomos e somos. Não haverá uma nova escola, se os professores não acreditarem nela. Não haverá uma nova escola, se a juventude brasileira não for chamada a construir essa nova escola, e não tiver paixão política pelo projeto. Um programa para a educação passa por investimentos maciços na educação, porque nós acreditamos que é justamente o socialismo ou, pelo menos, a primeira fase de construção do socialismo que vai, pela primeira vez na história do Brasil, transformar em experiência social o que hoje não são senão utopias. O projeto do socialismo é a implantação de uma verdadeira equidade, e a escola será um dos instrumentos da equidade. A equidade é a meritocracia que não existe na sociedade brasileira de hoje. Mas, a equidade não é mesma coisa que a igualdade. A igualdade é de cada um segundo suas capacidades, a cada um segundo suas necessidades, um critério de distribuição imortalizado por Marx e que foi tomada por todos os igualitaristas do final do século XIX. Na primeira fase de transição, no entanto, o critério de distribuição será de cada um segundo suas necessidades; a cada um segundo o trabalho realizado. Isso é a meritocracia, é a equidade: milhares de vezes mais igualitária que o capitalismo, mas ainda não é a igualdade social. O projeto socialista é transformar a escola num dos instrumentos da equidade social. Esse projeto só é possível, se os educadores compreenderem que eles têm que estar disponíveis para serem, permanentemente, reeducados. Se eles compreenderem que o processo de educação é permanente processo de reavaliação e que, portanto, essa vida que nós escolhemos é uma vida em que ensinar e aprender não se encerra nunca. A primeira aprendizagem que existe nesta profissão, é que para ser professor será preciso ser eternos estudantes. Aquele que está sempre disposto a se colocar no lugar do outro. Só a revolução socialista poderá garantir a educação pública universal A quinta e última idéia é uma contextualização de porque um programa tão elementar como a educação universal só é possível, em nossa opinião, com a revolução social. Só a revolução socialista pode oferecer uma educação de qualidade, gratuita, e acessível para todos. A revolução social é a expropriação do capital, um processo econômico, mas ela se inicia, como toda revolução, como uma ruptura política. Este Estado é incapaz de oferecer uma escola de qualidade para todos: nunca funcionou, mas agora não é mais possível o Estado garantir a remuneração do Capital e os serviços públicos. É uma realidade internacional inquestionável. Sob o capitalismo, contudo, a educação virou uma mercadoria que só é acessível a quem pode pagar. A educação é um direito essencial, uma necessidade que está entre as mais intensas. A educação abre a janela da vida na infância para aquilo que é o nosso destino: o domínio consciente da natureza e de nossa sociabilidade. Por essa via, descobrimos a vocação de uma profissão, que é o sentido do trabalho, a plena realização do potencial humano. Na sociedade que nós vivemos, porém, o trabalho é a maldição que nos oprime. O trabalho é o castigo que nos mortifica. É, às vezes, até a prisão, dentro da qual nós nos sentimos encarcerados. O projeto socialista é derrubar os muros da prisão, libertar o trabalho da forma alienada que ele tem no capitalismo e transformá-lo naquilo que é, na verdade, o sentido da nossa existência. O sentido da nossa existência é transformar as condições materiais e culturais da vida que nos entorna. O que nos transforma em humanos é o trabalho. Nós temos necessidades mais complexas que a vida vegetal e animal, nossas necessidades não são resolvidas só com o consumo de oxigênio e a transformação de carboidratos, proteínas, vitaminas e sínteses químicas que alimentam as sinapses do nosso cérebro. Nós precisamos do trabalho. Nós temos que agir. A união de conhecimento e ação, a práxis, é o nosso destino. A práxis humana é transformar o mundo e a nós mesmos através do trabalho. Os reformistas ignoram a necessidade de uma educação libertadora e desalienadora. Abandonaram o projeto da escola pública, porque aderiram ao programa do Estado mínimo. Já nos alertaram que, se não pagarmos as dívidas do Estado aos capitalistas, seremos vítimas de terríveis maldições bíblicas. Ai de nós, será a invasão dos gafanhotos, e os filhos dos corintianos nascerão todos palmeirenses. O fim dos tempos e a escuridão cósmica. Defendem, portanto, as políticas sociais focadas, como o Bolsa Família, argumentando que, sendo as verbas públicas disponíveis muito insuficientes para garantir escola de qualidade para todos, seria preciso atender aos mais necessitados. São, agora, os campeões da ideologia de que é preciso esquecer as reivindicações históricas dos trabalhadores, para atender aos mais humildes. O projeto de distribuir dinheiro aos miseráveis, no lugar de garantir o direito ao trabalho e a escola universal, é, no entanto, uma política reacionária. O direito ao trabalho e à educação são inegociáveis, e é preciso ter perdido, além de todos os reflexos socialistas mais elementares, até o bom senso, para renunciar a eles. Acontece que o capitalismo contemporâneo admite, todos os dias, que é impossível garantir trabalho e escola, e os reformistas se resignam, porque estão mais comprometidos com a defesa da propriedade privada de uns poucos, do que com o direito da maioria. Os reformistas argumentam, também, que projetos de renda mínima, como o Bolsa Família, seriam progressivos, porque iriam além da relação salarial - uma das metas históricas do socialismo. O projeto socialista é, de fato, desmercantilização do trabalho, mas destruindo o Capital, e preservando o trabalho. O Bolsa Família é, exatamente, o contrário: mantém o Capital recebendo os dividendos das dívidas estatais, e condena os desempregados a receber esmolas, desmoralizando-os. Tem como objetivo inconfessável, somente, a paz social e os calendários eleitorais nos países da América Latina que estão explodindo. Suas seqüelas são previsíveis: dividirão os trabalhadores entre ativos e ociosos, e promoverão a proliferação de uma massa lumpen dependente do Estado, e por ele manipulável. O projeto socialista, por sua vez, é incompatível com a propriedade privada e com o capital. Exige que a sociedade destrua este Estado, e destrua toda a organização política que tem como uma única função proteger a propriedade privada. Por que isto é pré-condição? Nós precisamos da revolução brasileira porque esta é a única possibilidade, num intervalo historicamente curto, de oferecer a toda a juventude um projeto para a vida. Se não suspendermos o pagamento das dívidas públicas, se não conseguirmos o controle do sistema financeiro, se não limitarmos, enfim, a ação dos monopólios, garantindo trabalho e educação para todos, não haverá futuro. O lugar da escola hoje é um encontro de sociabilidade, mas não é um encontro mais com o repertório cultural que a humanidade construiu. Nós sentimos essa angústia, que é reconhecer que a escola agoniza. Nós somos, contudo, os guardiões de uma promessa: que através da arte, da cultura, da ciência que as gerações anteriores nos legaram, podemos construir um mundo melhor. Os professores se sentem tristes, sendo a última linha de defesa. Mas, não estamos sozinhos. O projeto pelo qual lutamos, que é a promessa inscrita no programa socialista, a liberdade e a igualdade humana, permanece sendo a causa mais elevada da época que nos coube viver.
Posted on: Sat, 31 Aug 2013 23:37:52 +0000

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