A MISCELÂNEA BRASILEIRA de Nanda Stefani . O - TopicsExpress



          

A MISCELÂNEA BRASILEIRA de Nanda Stefani . O folclore, dizia mestre Câmara Cascudo, valoriza técnicas e processos utilitários numa ampliação emocional, além do ângulo do funcionamento racional; inclui nos objetos e fórmulas populares uma quarta dimensão, sensível ao seu ambiente. Não apenas conserva e mantém os padrões do entendimento e ação, mas remodela, refaz ou abandona elementos que se esvaziaram de motivos e finalidades indispensáveis a determinadas sequências ou presença grupal. Em suma, diz o estudioso em seu famoso dicionário, o folclore “como a imóvel enseada dá a ilusão da permanência estática, embora renovada na dinâmica das águas vivas”. Colcha de retalhos bastante colorida, o folclore brasileiro reflete e guarda as marcas de um processo do qual – em termos de história populacional – participaram todos os estoques raciais do mundo: os ameríndios mais arcaicos, pois, eram mongoloides do Leste Asiático; os caucásicos, ou seja, os colonizadores, que procediam da Europa Ocidental; os negróides que, escravizados, foram sujeitos a uma migração forçada da África às terras americanas. Da dialética de encontros e enfrentamentos entre tais componentes resultou uma miscigenação de enorme riqueza, cuja expressão mais elevada – como é sabido - é o sincretismo religioso. A artista plástica paulista Nanda Stefani trabalha com figuras e mitos do folclore, numa atitude de deglutição antropofágica, típica da tradição cultural brasileira. A artista, cujas raízes italianas são reveladas pelo sobrenome Stéfani, discípula de figuras importantes como o seu mestre Loris Foggiatto, explora ao máximo grau a potência expressiva das cores, evidenciando influências de movimentos quais Fauvismo, Cubismo, Surrealismo etc. Em seus quadros encontramos numerosas citações de Gaugin, Van Gogh, Toulouse Lautrec, Picasso, Dali, entre outros. Toda essa bagagem, porém, aparece transfigurada através de um verdadeiro procedimento alquímico: si a alquimia visava a separar o falso do verdadeiro, o jogo das alegorias frequentes na produção de Stéfani corresponde à sua tentativa de atingir um “alhures” feito de universos paralelos, talvez inconciliáveis entre si. A Miscelânea Brasileira, portanto, apresenta ao espectador uma visão de mundo deformada, misteriosa; a única possibilidade de se aproximar de seu sentido, sugere a autora, seria o abandono à estase mística. Quem olha para as telas vai se confrontar com imagens polissêmicas, símbolos que remetem para uma concepção metafísica marcada por radicais oposições. Em sua pintura, a mitologia é amplamente citada e reinterpretada. Na Miscelânea Brasileira de Stéfani as figuras femininas ocupam espaço privilegiado. Suas mulatas, suas baianas, suas mulheres dançando frevo, não são apenas reflexos do folclore e da cultura popular: numa perspectiva heurística de tipo neoplatônico, são corpos buscando as almas e os espíritos que neles se escondem. Suas telas encenam, através da Commedia dell´Arte, um carnaval mestiço onde triunfa o lúdico, a “vertigem da sedução” que, com seu “poder de fascinação”, leva ao “vacilar da lógica”, segundo a famosa expressão de Jean Baudrillard. Assim se dá, na pintura de Stéfani, o fenômeno da renovação artística de tradicionais mitos, lendas, figuras do folclore na “dinâmica das águas vivas”, invocada por Câmara Cascudo. Aniello Angelo Avella
Posted on: Mon, 05 Aug 2013 15:01:40 +0000

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