A REVOLTA DOS “SEM PARTIDO” E OS FRAGMENTOS DA - TopicsExpress



          

A REVOLTA DOS “SEM PARTIDO” E OS FRAGMENTOS DA HISTÓRIA Compreender/explicar o presente envolve sempre um enorme risco e desafio. Mas, atordoado pela natureza insólita, imprevisível, promissora e, agora, também brutal dos últimos acontecimentos, não há como parar de pensar. O mundo, sem a menor dúvida, é outro, e nele podemos acordar no meio da noite sonhando uma nova realidade que já está do nosso lado. Cazuza, nos anos 80, dera o grito de alerta: “ideologia, quero uma pra viver”. Os motes “sem partido” e “sem violência” da multidão desde a última segunda-feira ecoam o tempo todo nos meus ouvidos, especialmente agora em que vejo tanta proliferação de sonhos e a violência, antes invisibilizada no cotidiano da periferia, eclodir bem ao nosso lado. Existe uma “ideologia”, sim, se por isso entendermos um ideário que é o contraponto gerado pelo vazio da política em que mergulhamos. É a revolta dos “sem partido” e daqueles que têm pouca história pra rememorar e/ou pouco espaço pra (re)viver. Muitos, ou pelo menos os que tomam a dianteira, são jovens, ou foram jovens há poucos dias atrás (logo já serão “velhos”, pois finalmente, mesmo a contragosto e na velocidade desses novos tempos, estão fazendo sua(s) própria(s) história(s). Viviam em casulos, meio calados, uma indignação que crescia por todos os lados, escondida entre sites de internet e pequenos grupos de sociabilidade. Acompanhavam, mesmo de longe, a massa expropriada, sem terra, sem teto, as lutas das “minorias maiores” que haviam sido cooptadas pelo Estado ou, simplesmente, em vias de retrocesso pelo discurso moralista e/ou criminalizador de uma direita reacionária. Algum dinheiro no bolso, “dádiva” de uma classe média agora ressentida com a ascensão dos debaixo, não lhes basta. Querem a liberdade de poderem definir, cada um, o seu próprio partido, levantar sua própria (todas...) bandeiras. Um risco: o ódio contido, acumulado nos seus dias de reclusão compulsória (ou de exposição invisível) em que os espaços de reconhecimento (de suas diferenças) se estreitou tanto – ou o vazio de sentido tanto se expandiu – que acabou por transformá-los em “novos revolucionários”. Como dizia Deleuze, a desterritorialização, a ruptura de fronteiras de um território, tão necessária para a criação do novo, pode tanto fortalecer a autonomia em um novo território de maior liberdade quanto criar microfascismos. Por isso, meus amigos, “jovens da nova revolução”, sonhem, levem-nos para as ruas, mas “não se apaixonem por vocês mesmos” (como disse Zizek no Occupy de Wall Street). Com a história fragmentada que levamos, recortando apenas alguns pedaços das resistências do passado, podemos estar invertendo o futuro que almejamos. Não nos iludamos. A brutalidade desses tempos corporativos e policialescos em que a política se esvaziou e a história foi arquivada não pode ter como resposta outro vácuo político, outro abandono da história e outra brutalidade, pois a conquista que daí advém pode ser justamente o oposto daquilo com que sonhamos: a contração ainda maior de nossos espaços, cuja abertura é condição primeira, como dizia Doreen Massey, para a convivência da multiplicidade e, consequentemente, para a ampliação democrática e a criação do efetivamente novo. (Rogério Haesbaert, em Santa Maria, RS, 22.06.2013, dia histórico em que 30 mil santa-marienses foram às ruas protestar)
Posted on: Mon, 24 Jun 2013 01:21:16 +0000

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