Acho que a inconstância é uma constante desintegração da - TopicsExpress



          

Acho que a inconstância é uma constante desintegração da humanidade. Filtro os pensamentos quando quero mas eles saem, por vezes, com a moeda furada. Ando torta na linha direita e direita na linha torta. Só assim sei que viva estou, que não sonho apenas. Por vezes, quando acordo, tenho um sentimento de vazio que perdura até comer alguma coisa. Sinto que não existo, e se aceno a alguém do outro lado da rua, essa pessoa não me vê. Acho mesmo que sou um espírito de alguém que um dia já foi, mas que já não o é. Trinco a sandes no café da frente e sinto-lhe o sabor, a saliva misturasse com todo aquele bolo na boca e sinto-me viva. Sim, estou viva. Porem há mortos mais vivos que eu. Aqueles mortos que morreram e nunca tinham sentido a dor da perda. Aquela morte de criança que nunca pensara em outra coisa a não ser acordar para outro dia igual aos outros. Sinto-me fora de mim por vezes e vejo-me a passar, frame a frame, na tela do cinema. Apetece-me intervir no filme e avisar-me para virar à direita, mas ela (eu) vai sempre para a esquerda. Saio do meu filme quando sinto. E aqui sinto por mim e por quem não de mim é. Isto não é um conto! Eu não conto histórias, eu vomito sensações. Se esperam alegrar-vos ao lerem as próximas páginas, aconselho-vos a pousarem o livro no mesmo sitio que o pegaram. Mas se quiserem sentir humanidade, talvez seja para vocês que escrevo. E então não terá sido em vão a viagem que fiz e faço todos os dias ao olhar o buraco vazio do Mundo. Sei que há flores coloridas, campos verdejantes, paixões arrebatadoras, mas dessas já toda a gente fala, toda a gente vê. Em contra-partida muitos poucos são os que abrem os olhos para ver. Não passear os olhos como passeamos a roupa nas ruas, abrir os olhos para enxergar qualquer coisa que nos faça andar. O fingimento dura até nos cair o Mundo aos pedaços em cima das costas, e aí, se não tivermos olhos não nos podemos desviar dos bocados de Terra com que morreremos entalados no dia do Fim. Do nosso fim. Não o fim do Mundo, Apocalipse, mas o resto dos nossos dias que acabarão da mesma forma que começaram, sem avisar, sem pedidos nem clamurias. Os cegos nos dedos sentem a matéria feita, nós que vemos sem nada ver achamos que temos a verdade em frente aos olhos, e é nessa mentira que nos construímos, com uma trave de madeira encaixada no cérebro.
Posted on: Sat, 27 Jul 2013 14:10:55 +0000

Trending Topics



Recently Viewed Topics




© 2015