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CONTINUACAO DO TEXTO A Ponta do Iceberg João Cabrita O caso de fraude eleitoral registado em vídeo pela Liga dos Direitos Humanos* e que está a ser disseminado em redes de comunicação social, passou-se numa assembleia de voto na cidade de Maputo, no âmbito das eleições autárquicas realizadas este ano num número restrito de municípios do país. Peguemos neste exemplo para observar a situação sob uma perspectiva diferente, mais ampla, a das eleições gerais, para o Parlamento e para a Presidência da República. O número de assembleias de voto aumenta exponencialmente, localizando-se em pontos recônditos deste vasto Moçambique, alguns deles de difícil acesso e sem condições de alojamento. A fiscalização de todo o processo – da votação, contagem, contabilização dos votos à segurança das urnas – torna-se, forçosamente, mais difícil. Isto é, para os partidos da oposição. Não para o partido no poder - o Partido Frelimo. Esta, não é uma formação política normal, idêntica ou semelhante às demais. Ela é uma verdadeira superstrutura político-estatal que, não obstante as periódicas revisões constitucionais, continua a confundir-se com o Estado. Na prática, o Partido Frelimo é, efectivamente, a força dirigente do Estado, tal como originalmente estabelecido. O processo de organização dessa superstrutura iniciou-se logo a partir de Setembro de 1974, com a criação de Grupos Dinamizadores, os quais, secundados por Grupos de Vigilância Popular foram paulatinamente permeando a sociedade no seu todo, entrando nas nossas casas, nos nossos bairros, nos locais de trabalho, de lazer e de recreativas - no campo e nas cidades. Por isso, também, a sua designação estatutária de força dirigente do Estado e da sociedade. Apesar dos abalos sofridos no decurso das guerras, essa superstrutura político-estatal continua, existe, mantém-se e funciona – a todos os níveis. O Estado moçambicano é, pois, um Estado partidarizado. Como força dirigente do Estado, é o Partido Frelimo que tem a capacidade de gerir, controlar – e de manipular – todos os processos eleitorais realizados desde o fim da outra democracia, a popular, do partido único, do dirigente máximo e do pensamento comum. Uma força dirigente que usa e abusa das instituições estatais e do erário público para atingir esse fim. Como ficou demonstrado – ao vivo – nas eleições autárquicas acabadas de realizar. Em Moçambique, todo o acto eleitoral começa por ser uma competição de desiguais em que os partidos da oposição não têm capacidade para concorrer com a superstrutura político-estatal que funciona sob a designação de Partido Frelimo. A fiscalização do processo eleitoral no terreno é o exemplo mais gritante. Viajar de Maputo a Lichinga, de Maputo a Pemba, Tete ou Nampula é tão caro como viajar entre Maputo e qualquer capital europeia. A superstrutura político-estatal não viaja – ela está «lá» : na célula, na localidade, no distrito, na província. Quando muito, desloca-se, em missão de serviço ou em Presidência Aberta. Movimenta-se no local em viaturas do Estado, impedido ao volante, números de matrícula à vista ou tapados, consoante a arrogância ou a esperteza de cada responsável. Defrauda-se e vigariza-se o eleitorado à custa do contribuinte. Sustentar um quadro de fiscais de mesa para operar em todas as assembleias de voto envolve recursos financeiros e humanos que a oposição não tem. O Partido Frelimo não precisa de um tal quadro – ele é esse quadro, do qual a Função Pública faz parte e está ao seu serviço em virtude da sua condição de força dirigente do Estado e das demais instituições: as Forças Armadas, a Polícia e as unidades militarizadas , as chamadas Forças de Defesa e Segurança que são convocadas para tudo, incluindo eleições, como se o exercício do direito de voto fosse um acto de guerra. Um Estado instrumentalizado, portanto. É esta a raiz da fraude eleitoral em Moçambique. Uma fraude que perdura desde 1994. Com a cumplicidade da comunidade internacional. Esta, podendo, nada fez, nada faz para consolidar e salvaguardar a jovem e frágil democracia moçambicana, desencaminhada à nascença. Em vez disso, foi avalizando a fraude, de escrutínio em escrutínio. A comunidade é, pois e quer ela queira, quer não, co-responsável moral pela actual crise política em que o país se encontra mergulhado. E o mais provável, não obstante a habitual distorção ter desta vez sido inesperada e involuntariamente posta a descoberto, é as chancelarias acreditadas em Maputo repetirem o que sempre fizerem, em cumprimento de instruções superiormente traçadas – endossar mais uma golpada, ou «cabeçada» , esgrimindo o coçado e esbatido argumento de que a oposição não é alternativa válida. E da cartola tirarão o cliché: as irregularidades verificadas pelos observadores no terreno não alteram significativamente os resultados finais. Esta fraude – fraude consentida, abençoada, avalizada, mas prevenida e ignorada – foi o rastilho da nova guerra civil que já começou a ceifar vidas, a manchar de sangue o alcatrão e a terra batida das estradas e picadas do país. Já morrem irmãos de ambos os lados da trincheira. Friamente, como no passado, o regime oculta de pais e familiares os que vão tombando em emboscadas e em combates. São números apenas, que se substituem, militar e obrigatoriamente. Como manda o SMO. Tal como a fraude, a ameaça da guerra foi ignorada, se bem que prevenida. A dinastia – e disso faz alarde a cada passo, os asseclas da comunicação social nacional e estrangeira a ecoar – sente-se confiante que poderá continuar a existir e a reproduzir-se, pois não vê minorias brancas em Pretória ou Harare e tem amigos e aliados por toda a parte, do Ocidentre ao Extremo Oriente, sendo inútil a parte lesada ir bater à porta da SADC ou da UA pois, como nos lembra Alice Mabota, iríamos falar com as pessoas que falam a mesma linguagem. Além do mais, a dinastia interpretou sempre os conflitos que ciclicamente procria no seu próprio seio e entre ela e os que pretende governar não em função dos erros que vai cometendo amiúde, mas de factores que diz serem-lhe absolutamente estranhos. Afinal, o bom povo moçambicano não esteve sempre com a ditadura, a discriminação, a deslocação, o chicote e a execução? Quem tem andado de olhos fechados ou ofuscados é tempo de olhar as coisas com frontalidade: Esta nova guerra poderá ser ainda mais sangrenta e de consequências mais graves, tornando intransponíveis os rios para se poder chegar a outras margens – margens da reconciliação; e inatingíveis as mãos da reconciliação. * https://facebook/photo.php?v=574814809241085
Posted on: Fri, 29 Nov 2013 17:24:48 +0000

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