DECEPÇÕES Pode existir coisa mais triste do que nos decepcionarmos com alguém em quem confiávamos cegamente? Estamos acostumados às limitações e defeitos humanos. Desde cedo aprendemos que, de um ser humano, podemos esperar tudo. Sabemos, por experiência própria, que as pessoas estão sempre sujeitas a toda espécie de fraqueza, e podem, a qualquer momento, mostrar-se menos sinceras, leais e verdadeiras do que parecem ou gostaríamos que fossem. Mas sempre chega um momento em que ficamos tentados a acreditar que, para toda regra, existe mesmo exceção. Quem de nós, algum dia, não conheceu alguém que parecia completamente diferente do resto da humanidade? E é então que, mesmo ressabiados pelas muitas desilusões, vamos, pouco a pouco, baixando a guarda, nos desarmando, até que esse alguém reabilita nossa já há tanto tempo perdida confiança na espécie humana. Com a alma leve, pensamos, ainda um pouco surpresos com a novidade: está vendo só? Nem tudo está perdido. O mundo pode estar cheio de gente ruim, mas pessoas boas ainda existem também. Como é bom constatar que pelo menos alguém neste mundo é digno de confiança. Que pelo menos alguém neste mundo está acima das fraquezas humanas. Que pelo menos alguém neste mundo é incapaz de mentir, ferir, trair, enganar. Até que esse alguém — que julgávamos acima de qualquer suspeita, que colocamos numa espécie de pedestal — falha, decepciona, mostra-se tão miseravelmente humano como o mais desprezível dos mortais. Nessa hora nosso mundo desmorona, se espatifa no chão. Muitas lágrimas são derramadas, até nos resignarmos a aceitar a dolorosa realidade. E então nos perguntamos: meu Deus! Se esta criatura em cujo caráter eu apostava a minha vida, por cuja sinceridade eu colocava a mão no fogo — se até esta criatura me decepciona, em quem vou poder confiar nesse mundo? A verdade é que às vezes colocamos nos ombros de uma pessoa uma carga que ela acaba não conseguindo carregar. Alimentamos acerca de um simples mortal uma expectativa de perfeição de que só mesmo Deus é capaz. Por paixão, entusiasmo, ou mesmo necessidade, parecemos esquecer que, por mais maravilhosa que uma pessoa se mostre, por mais forte e digna que nos pareça, continua sendo, ainda assim, apenas um ser humano — e, como tal, sujeita a erros, fraquezas e imperfeições. Enquanto não entendemos isso, devemos estar sempre preparados para sofrer. Aceitar a realidade é nossa única chance não de evitar as decepções — que isso é impossível — mas de, pelo menos, impedir que nos peguem de surpresa e acabem nos tornando irremediavelmente amargos e desencantados com a vida.
Posted on: Fri, 21 Jun 2013 21:54:59 +0000
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