Domador Avistaram-no sobre a cerca de madeira. Havia dois - TopicsExpress



          

Domador Avistaram-no sobre a cerca de madeira. Havia dois domadores em cena naquele instante. Muitos tombos se somavam naquele sábado pela manhã. Nenhum resultado com aquela tropa de xucros que tentavam, à força e pancadas, domar. Magro e com barba longa e muito branca ele surgiu do nada. Carregava um alforje e um saco de lona que deixara no chão antes de subir à cerca. Quando o avistaram, pensaram tratar-se de um parente de alguém dali. Perguntando, certificaram-se de que não era. Ele nada dizia, mas seus olhos lacrimejavam ao ver o que acontecia na mangueira gigante. “Eles não estão querendo domar os cavalos. Estão torturando os animais e se torturando”, pensou ao ver um dos ginetes literalmente voar do lobo de um alazão negro, alto e delgado. O rapaz que caiu levantou-se cheio de ódio e vergonha. Muitos dos que assistiam começaram a rir dele. “Agora este matungo me paga! Vou cortá-lo na espora! Vou bater só entre as orelhas e ele vai se ajoelhar aos meus pés”, gabou-se o ginete destronado de seu posto por um pulo agonizante do alazão. Ele que estivera o tempo todo calado e sentado sobre a cerca, gritou de lá e todos se espantaram com sua voz forte, vibrante, destoando de sua magreza e idade. “Filho, você está machucando o animal! Ninguém gosta de ser machucado! Se me permite, eu posso te ajudar. Eu aprendi a domar de um jeito diferente. Posso te passar umas dicas. É preciso conquistar a confiança de um cavalo”, gritou de lá enquanto o outro ginete era atirado de costas sobre o chão arenoso e também saía de lá bufando e jurando o cavalo de morte. O primeiro ginete que caíra caminhou com desenvoltura, altivez e muita arrogância até a cerca onde o velho estava e, com a mesma cara de raiva que tinha para com o cavalo, perguntou: “Quem é você, afinal? É parente de alguém aqui? Ninguém te viu chegar. Para que saiba, meu caro: somos os melhores domadores destas bandas e nunca deixamos de cumprir nosso papel. Contra selvagem, só selvageria. Conosco aqui, é espora nas costelas e mango no lombo. Estes xucros viram fêmeas em nossas mãos, é questão de tempo, de bem pouco tempo”, gabou-se o ginete ajeitando sua bota amarelada já gasta e suja de poeira. “Ao invés de querer dominar o animal, domine-se a sim mesmo. Você deve conquistar um cavalo. Torne-o um aliado seu e terá não só um amigo, como um súdito, uma extensão de si mesmo. Um cavalo não é uma máquina. Ele é frágil ao extremo. Se me permitir, eu te ajudo. Será um prazer”, redarguiu o velho descendo da cerca e tocando o chão da mangueira com seus pés descalços. “Vovô, o senhor vai partir os pés. O sistema aqui é bagual. Cadê as botas de domador? Cadê as esporas? E o mango?”, indagou o segundo ginete que caíra igualmente arrogante. Ignorando o que os outros diziam ou pensavam, o velho avançou rumo à tropa que, arisca, estava em outro canto da mangueira só não fugindo porque não havia espaço devido à cerca de pranchas, alta e resistente. “Não me responsabilizo pelo senhor, vovô. Se for pisoteado e escoiceado, o máximo que vamos fazer é retiras seus pedaços daí”, gritou um rapaz que estava no chão, ao lado da porteira. Longe dali, na colina, o dono dos cavalos, um homem maduro e calado, observava o que acontecia. Ele gostara do velho desde o momento em que ele surgira sobre a cerca. Era como se aquele homem tivesse uma espécie de dom inexplicável, era como se carregasse em si algo muito especial, além do humano. Vestindo sua bombacha preta já bastante gasta, o velho enveredou pelo meio da tropa. Os dois cavalos que tinham sido montados e que estavam com os freios e as selas sobre os lombos estavam ainda mais isolados. Ambos sangravam nas costelas pelos cortes das esporas. Ele se achegou. Tocou nas rédeas dos dois animais e retirou os freios de suas bocas. Sem olhar para trás, afrouxou as barrigueiras e deixou que as selas caíssem. Os dois cavalos se mantiveram quietos, para espanto dos que a tudo assistiam. “Preciso de sebo, água e de um pano. As feridas estão muito abertas. Os cavalos precisam de curativos. Podem esvair. Como eu disse, são frágeis demais”, gritou o velho. Ninguém se moveu de onde estava. O dono da fazenda precipitou-se de lá da colina onde a tudo observava e, com voz firme, ordenou: “Deem o que ele pede. Sebo, um pano e água”, falou com autoridade. Um dos meninos que olhava a tudo correu até o galpão e voltou de lá com os apetrechos pedido pelo velho e autorizado pelo fazendeiro. Lentamente, ele foi limpando as feridas dos cavalos com o pano molhado no balde de água. Fazia isso simultaneamente nos dois animais. Depois que os sangramentos estancaram, ele aplicou sebo sobre as feridas e espalhou com delicadeza por toda a extensão da pele rasgada. O sangramento parou instantaneamente. Os outros cavalos da tropa se aproximaram. Muitos cheiravam o velho e ele começou a acariciar a todos nos focinhos, pescoço, ancas, barriga e virilhas. Nenhum sinal de agressão por parte dos animais. Ele tocou nos dois animais feridos a espora e eles se separaram da tropa. Olhando nos olhos de um dos cavalos, o velho fazia gestos com uma das mãos, mantendo a outra sempre no animal. Acariciou o corpo todo do cavalo que se mantinha parado. Não havia sequer sinal do cavalo violento de momentos atrás. Primeiro ele pôs um dos pés descalço sobre o lombo do animal, mantendo o outro no chão. Tinha total flexibilidade nas pernas. O outro animal se mantinha do lado, parado, observando a ação do velho. Com calma e falando baixinho ao cavalo, ele informou que montaria em seu lombo. Fez isso lentamente. Em cima, fez um gesto com a mão e o cavalo caminhou com ele ao redor da mangueira para espanto de todos ali. Retornou ao lugar onde estava antes e repetiu tudo com o outro cavalo. Ninguém acreditava. O dono da fazenda voltou para seu posto de observação e sorria. O velho chamou o menino que buscara o sebo, o pano e a água e pediu que lhe trouxesse dois cabrestos. O menino correu ao galpão e voltou rápido. Ele pôs os cabrestos nos cavalos e os retirou da mangueira. Dirigiu-se aos dois ginetes e entregou os cavalos a eles: “Estes estão domados. Serão os melhores cavalos, desde que respeitados. Cuidem deles e terão amigos fiéis. Maltratem-nos e terão os piores inimigos que jamais imaginaram”, falou o velho com propriedade. O menino começou a aplaudir seguido pelos outros que se aglomeraram na cerca. Com uma reverência, o velho agradeceu, sorriu e disse: “Sou Gumercindo, domador de cavalos. Estou procurando trabalho. Se tiver trabalho para mim, eu estou disposto a executar”, informou olhando para o dono da fazenda que descia da pequena colina e se juntava ao grupo. “De hoje em diante, será meu domador aqui. Vou te arrumar uma colocação. Você merece. Provou que sabe fazer e que faz tudo com amor. Trabalho não vai lhe faltar, nunca”, disse o dono da fazenda saltando para dentro da cerca e dando um abraço em Gumercindo sob olhares atentos dos homens e dos cavalos que se aglomeravam perto do velho. Jossan Karsten
Posted on: Sun, 30 Jun 2013 16:49:37 +0000

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