Dório Gomes A HIPOCRISIA DO PRESIDENTE DE UMA IGREJA O presidente de uma igreja muito egocêntrico que adorava roupas bonitas. Esse Presidente enviava emissários por todo o país com a missão de comprar roupas diferentes. Os seus guarda-roupas estavam entulhados com ternos, sapatos, gravatas de todas as cores e estilos. Eram tantas as suas roupas que ele estava muito triste porque seus emissários já não encontravam novidades. Dois espertalhões ouviram falar do gosto do Presidente da igreja pelas roupas e viram nisso uma oportunidade de enriquecerem às custas da vaidade da autoridade religiosa. A vaidade torna bobas as pessoas e elas passam a acreditar nos elogios dos bajuladores. Pois os dois espertalhões foram até ao presbitério da igreja e anunciaram-se na portaria, apresentando o seu cartão de visitas: “Doutor Joselino e Doutor Valerino, especialistas em tecidos maravilhosos.” O Presidente da igreja já havia ouvido falar de tecidos de todos os tipos, mas nunca ouvira falar de tecidos maravilhosos. Ficou curioso. Ordenou que os dois fossem trazidos à sua presença. “Falem-me sobre o tecido maravilhoso”, ordenou o Presidente da igreja. Um dos espertalhões, o mais loquaz, se pôs a falar. “Presidente, diferente de todos os tecidos comuns, o tecido que nós tecemos é maravilhoso porque somente as pessoas inteligentes podem vê-lo. Vestindo um terno feito com esse tecido o digníssimo presidente será cercado apenas por pessoas inteligentes, pois somente elas o verão...” O Presidente da igreja ficou encantado e imediatamente contratou os dois espertalhões, oferecendo-lhes um amplo aposento onde poderiam montar os seus teares e tecer o tecido que só os inteligentes poderiam ver. Alguns dias depois o Presidente da igreja mandou chamar o 1º Diretor e ordenou-lhe que fosse examinar o tecido. O 1º Diretor dirigiu-se ao aposento onde os tecelões estavam trabalhando. “Veja, Diretor, a beleza do tecido”, disseram eles com a mãos estendidas. O 1º Diretor não viu coisa alguma e entrou em pânico. “Meu Deus, eu não vejo o tecido, logo sou burro...” Resolveu, então, fazer de conta que era inteligente e começou a elogiar o tecido como sendo o mais belo que havia visto. “Chefe”, relatou o 1º Diretor ao presidente da igreja, “o tecido é incomparável, maravilhoso. De fato os tecelões são verdadeiras homens de Deus!” O presidente da igreja ficou muito feliz. Passados mais dois dias ele convocou o 2º Diretor e ordenou-lhe que examinasse o tecido. Aconteceu a mesma coisa. Ele não viu coisa alguma. “ Meu Deus”, ele disse, “ não sou inteligente. O 1º Diretor viu e eu não estou vendo...” Resolveu adotar a mesma tática do 1º Diretor e fez de conta que estava vendo. O Presidente da igreja ficou muito feliz com o seu relatório. E assim aconteceu com todos os outros Diretores. Até que o Presidente da igreja resolveu pessoalmente ver o tecido maravilhoso. Mas, como os Ministros, ele não viu coisa alguma porque nada havia para ser visto. Aí ele pensou: “Todos os meus Diretores viram. São inteligentes. Mas eu não vejo nada! Sou burro. Não posso deixar que eles saibam da minha burrice porque pode ser que tal conhecimento venha a desestabilizar o meu governo...” O Presidente da igreja, então, entregou-se a elogios entusiasmados ao tecido que não existia. O Presbitério da igreja determinou então que deveria haver uma grande festa para que todos vissem o presidente da igreja em suas novas roupas. E todos ficaram sabendo que somente os inteligentes as veriam, dessa forma convidaram todos os membros da igreja para a solenidade. No dia do evento, a comunidade religiosa engalanada, bandeiras por todos os lados, bandas de música, as ruas cheias, anunciaram na rádio da igreja e ouviu-se uma voz pelos alto-falantes: “Amados irmãos! Dentro de poucos instantes a sua inteligência será colocada à prova. O Presidente da igreja vai desfilar usando a roupa que só os inteligentes podem ver.” Canhões dispararam uma salva de 10 tiros. Rufaram os tambores. Abriram-se os portões do presbitério da igreja e o Presidente da igreja marchou vestido com a sua roupa nova. Foi aquele ooh! de espanto. Todos ficaram maravilhados. Como era linda a roupa do Presidente da igreja! Todos eram inteligentes. No alto de uma árvore estava um menino a quem não haviam explicado as propriedades milagrosas da roupa do Presidente da igreja. Ele olhou, não viu roupa nenhuma, viu o Presidente da igreja pelado, ficou indignado com tanta hipocrisia e não se conteve. Deu um grito que a multidão inteira ouviu: “O Presidente da igreja está nu!” Foi aquele espanto. Um silêncio profundo. E uma gargalhada mais ruidosa que a salva de artilharia. É QUE O MENINO FEZ O QUE TODOS ESTAVAM COM VONTADE DE FAZER, MAS TINHAM RECEIO PORQUE O PRESIDENTE DA IGREJA PODERIA NÃO GOSTAR E MANDAR PUNIR A QUEM SE ATREVESSE, mas nesse momento não teve mais como conter e todos os presentes gritaram também: “ O Presidente da igreja está nu, o Presidente da igreja está nu...” O Presidente da igreja tratou de tapar as partes com as mãos e voltou correndo para dentro do presbitério da igreja. Quanto aos espertalhões, já estavam longe e haviam transferido os milhões que haviam ganho para um paraíso fiscal...” Adaptação da estória “O Rei Nu”, de Hans Christian Andersen
Posted on: Fri, 21 Jun 2013 20:39:48 +0000
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