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Envio de filhos pelos pais ao exterior para entregá-lo a terceiro sem observância do processo de adoção Publicado 28/11/2013 r Adoção Deixar um Comentário Tags:adoção, Criança, Estatuto da Criança e do Adolescente (ilustração: maíra paz) Retirado da Internet ENVIO DE FILHO PELOS PAIS AO EXTERIOR PARA ENTREGA-LO A TERCEIRO SEM OBSERVÂNCIA DO PROCESSO DE ADOÇÃO – INCIDÊNCIA DO ART. 239 DA LEI Nº 8.069/90, ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE: Antônio Carlos Welter - Procurador da República em Porto AlegreO Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 – prevê em seus artigos 238 e 239 tipos que embora guardem alguma semelhança, objetivam de forma e conteúdo diverso a proteção da criança e do adolescente de condutas que visem afastá-los do convívio de seus responsáveis. Questão controversa diz da tipicidade da conduta atribuída a pai ou responsável que entregar filho a estrangeiro sem a observância das formalidades legais relativas à adoção e sem que haja notícia da existência de paga.Dizem os arts. 238 e 239 do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90): “Art. 238. Prometer ou efetivar a entrega de filho ou pupilo a terceiro, mediante paga ou recompensa. Pena: reclusão de um a quatro anos, e multa. Parágrafo único: Incide nas mesmas penas quem oferece ou efetiva a paga ou recompensa.” “Art. 239. Promover ou auxiliar a efetivação de ato destinado ao envio de criança ou adolescente para o Exterior com inobservância das formalidades legais ou com o fito de obter lucro: Pena: reclusão de quatro a seis anos, e multa.” Da análise dos dois dispositivos retira-se, desde logo, que o primeiro (art. 238) protege a família e tutela o exercício do poder familiar, buscando impedir que os pais ou responsáveis entreguem a terceiro criança ou adolescente que esteja sob sua responsabilidade. Por conseqüência, são sujeitos ativos da conduta os pais ou tutores, qual seja, aqueles que por sua condição estiverem no exercício do poder familiar, sendo que a norma também incrimina a conduta daqueles que oferecem ou efetivam o pagamento ou recompensa.Já a conduta prevista no art. 239, ao punir a promoção ou o auxílio da efetivação de ato destinado ao envio de criança ou adolescente ao exterior – com inobservância das formalidades legais ou com o fito de obter lucro –, deixa claro que muito mais do que a entrega de criança ou adolescente a terceiro, visa impedir ato que determine sua saída do território nacional, quando ficará fora do alcance das autoridades brasileiras.Isto porque não é a mera vontade da mãe, pai ou tutor suficiente para autorizar a saída da criança do território nacional e lá permanecer em lar substituto. Os pais ou responsáveis não dispõe de tal poder, sendo imperiosa a regularidade do processo de adoção, que é cogente. O objeto tutelado pelo art. 239 do ECA, portanto, não é o mesmo do art. 238, na medida em que visa impedir a saída de crianças ou adolescentes do território nacional com desrespeito, com a não observância das formalidades legais, ou com o escopo de lucro. O tipo, nesta medida, não preserva somente o correto exercício do pátrio poder, mas o interesse estatal de que a criança ou adolescente não saia do seu alcance, fique fora dos limites de sua Jurisdição. Esta segunda hipótese delitiva, considerada sua objetividade jurídica, pode ser praticada por qualquer pessoa. Roberto João Elias1, em seus Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente, ao tratar da figura previsto no art. 238 do ECA, assim se manifesta sobre o tema: “O delito em questão, para se configurar, exige o dolo específico, que é a vantagem pecuniária. Não é necessário que a entrega do filho ou pupilo se efetive, bastando que haja a promessa. Os sujeitos ativos, no caso, só podem ser os pais ou tutores e, conforme os termos do parágrafo único, quem oferece ou efetiva a paga ou recompensa. No caso deste último, para se configurar crime, é suficiente o oferecimento. Aquele que tem somente a relação de guarda sobre a criança ou o adolescente não pode, a rigor, cometer o delito. É que a guarda, sendo uma forma precária de colocação em lar substituto, que pode ser revogada a qualquer tempo (art. 35), não permite ao seu detentor que disponha sobre o menor. Na lição de Cury, Garrido e Maçura, ´ausente o dolo específico (fim de obter vantagem pecuniária) a conduta poderá configurar o crime capitulado no art. 245 caput do Código Penal, se a entrega der-se a pessoa em cuja companhia o agente saiba ou deva saber que o filho ou menor ficará moral ou materialmente em perigo´ (Estatuto da Criança e do Adolescente anotado, cit. P; 124). O pátrio poder, como por diversas vezes já foi anotado, representa, hodiernamente, mais um conjunto de deveres. Assim, o art. 22 do Estatuto preceitua que incumbe aos pais o dever de sustento, guarda e educação da prole. Isto não pode ser relegado simplesmente, mas, se o for, mediante interesses mesquinho, justifica-se a reprimenda. Com relação ao tutor, aplica-se o mesmo raciocínio, uma vez que tutela é um sucedâneo do pátrio poder.” E, ao tratar da figura prevista no art. 239 do mesmo diploma, prossegue o comentarista afirmando que 2 “A única forma prevista na legislação que permite o envio de um menor ao exterior é a adoção, mas esta deverá obedecer ao que dispõe o art. 45. § 2°, do Estatuto. O art. 31 preceitua que ‘A colocação em família substituta estrangeira constitui medida excepcional, somente admissível na modalidade de adoção’. A preocupação do legislador, ao apenar com severidade o delito, justifica-se, porque, nos últimos anos, houve muitos casos ilegais de envio de crianças a outros países, algumas arrebatadas de seus lares de forma violenta. O presente artigo pune são só aquele que promove, mas também o que auxilia na efetivação do ato. Qualquer pessoa pode cometê-lo, sendo necessário o dolo específico, que se consubstancia na vontade de obter lucro e na inobservância das formalidades legais. Se houve a intenção de obter lucro, mas a adoção foi realizada de acordo com a lei, não se configura o delito. Entretanto, se alguém colaborar ou promover o envio de forma ilegal, ainda que não tenha obtido lucro, responderá penalmente por seu ato, porque agiu contrariamente à lei.” Como se verifica, são duas modalidades de conduta visando a proteção da criança, porém com traços que as distinguem. A primeira (art. 238) buscando penalizar o inadequado exercício do pátrio poder, portanto somente passível de cometimento pelos pais ou tutores; a segunda (art. 239) impedir a saída clandestina do território nacional de criança ou adolescente, ato este passível de prática por qualquer pessoa, inclusive pais ou tutores.Assim, se os pais de criança ou adolescente, em violação de seus deveres próprios do pátrio poder, promoverem a saída de seu filho do território nacional estarão praticando conduta prevista no art. 239 do ECA, apenada de forma mais grave, e não aquela prevista no art. 238 do mesmo diploma legal, com sanção mais leve e que exige o recebimento de vantagem pecuniária para sua consumação.Admitir posição contrária teríamos que conceber que o crime cometido pelos pais contra filho seria menos grave que aquele cometido por outro qualquer, sendo que a conduta do detentor do poder familiar somente seria punida na hipótese de estar presente paga ou recompensa. Qual seja, haveria verdadeira inversão de valores, em que aquele que tem o dever jurídico de assistir o filho seria tratado de forma mais benéfica do que aquele que não possui o mesmo dever, o que se mostra inadmissível à luz dos valores protegidos. Renato Cramer Peixoto, em sua obra Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente3, assim analisa a figura do art. 239 da Lei nº 8.069/90: “Pune-se aqui a venda de criança ou adolescente para o exterior, o tão combatido tráfico internacional. E se o pune por qualquer forma de participação, tanto na promoção direta, como no auxílio a quem efetivamente promove o envio da criança ou do adolescente mediante pagamento em dinheiro. Sujeitos ativos poderão ser, portanto, quaisquer pessoas que promovam a efetivação de ato destinado ao envio do menor, ou que apenas auxiliem nessa efetivação. Sujeitos passivos serão a criança ou o adolescente enviado.” Como se retira, o tipo em questão pode ser praticado por qualquer pessoa, seja o pai, a mãe, o tutor ou ainda outra pessoa qualquer, ainda que nenhuma relação jurídica mantenha com a criança ou adolescente, bastando que promova ou auxilie seu envio para o exterior com inobservância das formalidades legais ou com o intuito de lucro.Quanto à referida obra, cabe salientar que em sua primeira edição, seu autor, Renato Cramer Peixoto, afirma de forma equivocada ser necessário para a consumação do delito a obtenção de lucro, de paga, ou que ao menos este propósito esteja sendo buscado.Todavia, como se extrai da análise da norma, para que o delito se consume é necessário que o envio da criança ao exterior ocorra com inobservância das formalidades legais ou com o fito de obter lucro. Há pois, duas hipóteses, alternativas, não excludentes, sendo que a conduta motivada por vantagem econômica é apenas uma delas, e a inobservância do processo de adoção a outra, não menos importante, e também suficiente para a consumação do delito, ao contrário do que afirma o referido autor. Portanto, a figura penal do art. 239 do ECA protege justamente o interesse do Estado brasileiro de que as crianças e adolescentes somente saiam do território nacional com atenção das regras legais, com obediência ao processo de adoção, ou então com o propósito de vantagem econômica. A propósito do tema, cumpre traçar algumas diferenças entre adoção internacional e tráfico de crianças, cabendo salientar que a primeira figura se materializará sempre que deixarem de ser atendidas as formalidades legais para a saída do território nacional de criança 4: “É importante estabelecer uma distinção entre adoção e tráfico de crianças. A adoção reveste-se de todas as exigências e formalidades previstas pela lei e exige a intervenção da autoridade judiciária, à qual incumbe apreciar, decidir e controlar todos os atos para a realização da adoção. Já o tráfico de crianças realiza-se através da inobservância e da fraude às leis, o que inviabiliza a intervenção e o controle pela autoridade judiciária. Não é possível controlar se a adoção corresponde ao interesse da criança e, sobretudo, não se pode garantir a proteção e o acompanhamento da criança no país estrangeiro. Segundo Dimas Borelli Thomaz Jr. e João Luiz Galvão Minnicelli, ‘adoção internacional e tráfico internacional de crianças são, portanto, formas de agir inteiramente distintas e situadas em pólos opostos, embora destinados ambos à colocação de crianças em lares substitutos no exterior.’ Investigações estão sendo realizadas acerca da ação de grupos de tráfico de crianças, especialmente de uma quadrilha que age na Paraíba, com ramificações em Brasília, Paraná e Fortaleza. O relatório da Polícia Federal apresenta estimativas de que perto de três mil crianças deixam clandestinamente o País por ano, contra outras mil e quinhentas que partem com documentação em ordem.” Desta forma, quando a saída da criança ou adolescente se der em desrespeito da Lei, sem a observância do cogente processo de adoção, mesmo que não exista prova de paga ou de sua promessa, e ainda que presente o consentimento dos pais, estaremos diante da figura do tráfico de crianças, punida na forma do art. 239 do ECA. Qual seja, embora o tipo previsto no art. 238 do ECA seja próprio, somente podendo ser praticado pelos pais ou ainda por aquele que esteja na condição de responsável pela criança; este pai, mãe ou responsável incidirá nas penas da figura prevista no art. 239 do mesmo diploma quando praticar ato destinado ao envio de filho ao exterior sem a observância das formalidades legais.Não há pois, que se confundir os objetos jurídicos dos dois tipos para restringir os agentes, ou sujeitos ativos, que podem praticar a segunda conduta. Embora o art. 238 do ECA descreva conduta semelhante à prevista no art. 239 do mesmo diploma, e exija do agente circunstância de caráter pessoal (ser titular do poder familiar), o pai ou a mãe podem praticar a conduta mais gravemente apenada (art. 239 do ECA) na medida em que os objetos jurídicos protegidos são diversos. Não se pode esquecer que o art. 239 do ECA tutela também regularidade da saída de criança do território nacional, visto que presente interesse do Estado brasileiro na regularidade da adoção internacional. Assim, não há como afastar a incidência do tipo previsto no art. 239 da Lei nº 8.069/90 às condutas praticadas por aquele que, sendo pai, mãe ou tutor, praticar ato destinado ao envio do menor ao exterior, havendo ou não existência de pagamento ou mesmo sua promessa. _________________________________________________________________________ 1 ELIAS, João Roberto. Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente, Saraiva, 1994, p. 210. 2 Op. Cit, pp. 210 e 211, g.n. 3 PEIXOTO, Renato Cramer et alii. Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente, Forense, 1991, pp. 266 e 267, g.n. 4 BRAUNER, Maria Cláudia Crespo. Problemas e perspectivas da adoção internacional em face do Estatuto da Criança e do Adolescente. Revista de Informação Legislativa, a. 31, nº 122, Brasília, 1994, g.n. Fonte: Autor: Antônio Carlos Welter. Envio de filhos pelos pais ao exterior para entregá-lo a terceiro sem observância do processo de adoção. Site MPRS. Disponível em: . Acesso: 28.11.2013.
Posted on: Fri, 29 Nov 2013 15:34:02 +0000

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