GIRO-JURÍDICO. Em uma decisão interessante, Juiz de Bauru/SP - TopicsExpress



          

GIRO-JURÍDICO. Em uma decisão interessante, Juiz de Bauru/SP nega pedido liminar do Padre Beto quanto a sua reincorporação na Igreja Católica, alegando que isto depende da fé e das regras canônicas e não do Direito Processual Civil. Leia a sentença abaixo: Processo CÍVEL Comarca/Fórum Fórum de Bauru Processo Nº 0027122-18.2013.8.26.0071 PARTE(S) DO PROCESSO [Topo] Requerido DIOCESE DE BAURU DO DIVINO ESPIRITO SANTO Requerente: ROBERTO FRANCISCO DANIEL Advogado: 6550/SP ANTONIO TITO COSTAAdvogado: 131677/SP ANTONIO CELSO GALDINO FRAGA Decisão Proferida. Vistos. O autor ajuíza ação cautelar preparatória inominada, apontando a nulidade de ato jurídico como fundamento da lide principal. Invoca a violação ao devido processo legal pela imposição da excomunhão latae sententia; ou seja, pela punição automática reservada aos casos mais graves de delitos previstos no Código de Direito Canônico. E para ser reabilitado imediatamente aos sacramentos, alega o periculum in mora. No entanto, o perigo da demora não está presente, daí a ausência dos requisitos da tutela cautelar liminar. Alguns pecados particularmente graves são passíveis de excomunhão, a pena eclesiástica mais severa, que impede a recepção dos sacramentos e o exercício de certo atos clericais. Neste caso, a absolvição não pode ser dada, segundo o direito da Igreja, a não ser pelo Papa, pelo Bispo local ou por presbíteros autorizados por eles. (Catecismo da Igreja Católica, Fidei Depositum, § 1463). Logo se vê que a excomunhão imposta autor não é pena definitiva, - mera pena medicinal - , até porque tal conceito conflita com a misericórdia divina: “Todo o pecado e blasfêmia serão perdoados aos homens; porém, a blasfêmia contra o Espírito Santo, não lhes será perdoada. E todo o que disser alguma palavra contra o Filho do Homem, ser-lhe-á perdoada; porém, o que disser contra o Espírito Santo, não terá perdão neste mundo nem no outro (Mateus, 12, 30-31) Assim, para fazer valer a revisão da excomunhão, o cânone 1.354 prevê a cessação das penas pela remissão ou perdão concedido pela autoridade competente. E o cânone 1.356 §1º, prevê a autoridade competente para a remissão dos delitos feredae ou latae setentia. De sorte que inexiste periculum in mora no caso dos autos. Se o autor teme a ineficácia do provimento jurisdicional se deferido apenas ao final da cognição exauriente do processo principal, ou seja, se teme ficar privado dos sacramentos até o final do processo, bastaria a providência extrajudicial consistente no pedido de absolvição ao ordinário local, a qualquer Bispo em ato de confissão sacramental (cân. 1355, §2º), ou ainda ao Romano Pontífice, de quem o autor já declarou acreditar na revisão da penaMark[1]. Escreve Humberto Theodoro Júnior que o perigo de dano refere-se, portanto, ao interesse processual em obter uma justa composição para o litígio, seja em favor de uma ou de outra parte, o que não poderá ser alcançado caso se concretizar o dano temido (Curso de Direito Processual Civil, vol. 2, pág. 340). Daí se inferir que o interesse para a obtenção da medida liminar não se faz presente no caso dos autos, dada a existência de meio extraprocessual para se obter a proteção aos direitos judicialmente discutidos. O perigo da demora nem sequer atinge o direito do autor ao último dos sacramentos, pois a unção dos enfermos só é vedada aos que perseverarem obstinadamente em pecado grave manifesto (cânone 1.007). Ainda sobre o requisito do perigo, inexiste informação nos autos de que o autor tenha se utilizado das vias impugnativas previstas no Código Canônico. O cânone 1628 prevê o recurso da apelação, com efeito suspensivo (cân. 1639), disponível a qualquer parte que se julgar prejudicada por alguma sentença, não figurando, a decisão de excomunhão dentre os atos insuscetíveis de apelação (cânone 1629). Além disso, até mesmo a sentença transitada em julgado admite a restitutio in integrum, caso ela tenha sido preferida com evidente negligência de alguma prescrição (cân. 1.645, §4º), como alega o promovente quanto ao devido processo legal. Ademais, a afronta ao direito de defesa, também invocado pelo acionante, justifica a querela de nulidade prevista no cânone 1.620, 7º, deduzida junto ao próprio juiz ordinário ou delegado que proferiu a sentença (Cruz e Tucci e Azevedo. Lições de Direito Processual Civil Canônico, pág.152, Ed RT). Por fim, no arsenal de meios de impugnação da sentença também está prevista a apelação per saltum diretamente ao Romano Pontífice (favorável às opiniões do autor, segundo manifestação deste à imprensa), caso o autor tenha dúvidas sobre a imparcialidade dos tribunais inferiores: A partir do momento em que se estruturou a hierarquia eclesiástica, permite-se que, per saltum qualquer causa seja levada à apreciação do Papa. (ob. cit, pág. 147). Em síntese, porque não esgotadas as vias impugnativas extrajudiciais, também por isso o autor não reúne os requisitos da medida liminar. E sobre o uso das vias impugnativas canônicas, é importante mencionar que a decisão pública a folhas 32 – disponível na web - é suficiente para a instrução dos recursos, não sendo verossímil, ao menos nesta fase de cognição sumária, a alegação de que a ré deliberadamente obstaculiza o acesso do autor à defesa nos meios canônicos. Ademais, força convir a incongruência da alegação de nulidade do processo penal canônico por vício formal, com a retomada da aptidão para receber os sacramentos, sem com que haja uma efetiva comunhão do fiel com a fé preconizada pela igreja, em cujo corpo o autor pretende ser reintegrado por decisão secular. Santo Agostinho define os sacramentos como o sinal visível externo de uma graça espiritual, interna (Keeley, Robin, org., Fundamentos da Teologia Cristã, pág. 343. Ed Vida). Logo, até poder-se-ia argumentar que uma decisão liminar conferiria ao autor a retomada dos sacramentos como mero sinal externo da graça espiritual, i. .e, um lugar na mesa eucarística. No entanto, a graça interna, consistente na participação na vida divina (Catecismo, pág. 460), na associação do fiel à obra da Igreja, não há decisão judicial que garanta. A graça compreende igualmente os dons que o Espírito nos concede para nos associar à sua obra, para nos tornar capazes de colaborar com a salvação dos outros e com o crescimento do corpo de Cristo, a Igreja (ob. Cit, pág; 460). Vale dizer, a declaração de ineficácia da excomunhão por vício formal do processo canônico até pode garantir a reintegração do autor ao corpo formal da igreja, mas não teria o condão de reintegrá-lo à comunhão com o corpo místico de CristoMark[1]: Igreja Triunfante, constituída pelas almas que já se encontram no Céu; Igreja Padecente, constituída pelas almas do purgatório; e Igreja Militante, constituída pelos os fiéis na terra que comungam a mesma fé, segundo os preceitos ditados pelas cabeças invisível – Jesus Cristo – e visível – o Papa - desse corpo (Carta Encíclica Mysticy Corporis) E o sinal de unidade da Igreja, assim entendida como o Mysticy CorporisMark[1], é dado pela eucaristia, ou seja, pelo sinal da comunhão, do qual o acionante encontra-se privado por iniciativa própria. Fosse o vício formal do processo canônico igual ao da exclusão de um associado de clube recreativo, por exemplo, não haveria outras implicações na reintegração liminar. Mas a elisão da excomunhão tão só pelo vício formal não reintroduziria o acionante nos quadros da associação cuja profissão de fé negou (apostasia – fato incontroverso -, segundo o decreto de excomunhão) e o levou a ser dela excluído. Afora isso, a reinserção judicial do autor entre os fiéis, sem com que haja a sintonia dele com os preceitos da Igreja, não encontra amparo no direito canônico. Segundo o cânone 209, Os fiéis são obrigados a conservar sempre, também no modo próprio de agir, a comunhão com a igreja. §2º Cumpram com grande diligência os deveres a que estão obrigados para com a Igreja universal e para com a Igreja particular à qual pertencem de acordo com as prescrições de direito. Em suma, a efetiva reincorporação do autor aos sacramentos passa ao largo da discussão formal do processo de excomunhão. Para a retomada do elo entre o promovente e a igreja, é necessária a comunhão no entendimento sobre a fé, assim entendida como o pedido de readmissão do acionante, que passa pela remissão prevista nos cânones, ou seja, pela atividade extraprocessual do autor. Ante o exposto, indeferida a liminar, cite-se com observância do artigo 803 do Código de Processo Civil. Intimem-se.
Posted on: Mon, 26 Aug 2013 01:01:03 +0000

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