"Hegel estava certo ao apontar repetidas vezes que, quando - TopicsExpress



          

"Hegel estava certo ao apontar repetidas vezes que, quando falamos, estamos sempre no universal - o que significa que, com sua entrada na linguagem , o sujeito perde suas raízes no mundo vivido concreto. Em termos mais patéticos, posso dizer posso dizer que, no momento em que começo a falar , deixo de ser o eu sensualmente concreto, pois sou apanhado em um mecanismo impessoal que sempre me faz dizer algo diferente do que eu queria dizer - ou, como costumava dizer Lacan eu não estou falando , estou sendo falado pela linguagem . Essa é uma das maneiras de entendermos o que Lacan chamou de " castração simbólica": o preço que o sujeito paga por sua " transubstanciação" do ser agente de uma vitalidade animal direta para ser um sujeito falante cuja identidade é mantida à parte da validade direta das paixões. Uma leitura nietzschiana discerne com facilidade nessa reversão do Terror em moral autônoma uma estratégia desesperada de transformar a derrota em triunfo: em vez de lutar heroicamente por nossos interesses vitais , declaramos antecipadamente a rendição total e abandonamos todo conteúdo. Lebrun, nesse ponto, sabe muito bem como é injustificada a critica geral a Hegel, segundo a qual a reversão dialética da negatividade total em uma nova positividade mais elevada, da catástrofe em triunfo, funciona como um tipo de DEUS EX MACHINA, tolhendo a possibilidade de que a catástrofe possa ser o resultado final do processo - o conhecido argumento baseado no senso comum: " E se não houver nenhuma reversão da negatividade em uma nova ordem positiva ? ". Esse argumento não leva em conta o principal ,ou seja, que é exatamente isso que acontece na revisão hegeliana: não há uma reversão real da derrota em trinfo, mas apenas uma alteração puramente formal,uma mudança de perspectiva, que tenta se apresentar como triunfo.O ponto defendido por Nietzsche é que esse triunfo é falso , um truque barato de mágica, um prêmio de consolação pela perda de tudo o que faz a vida valer a pena: a verdadeira perda da vitalidade é suplementada por um espectro sem vida. Na leitura nietzschiana de Lebrun, Hegel, portanto , aparece como uma espécie de filósofo cristão ateu : assim como a cristandade , ele localiza a " verdade" de toda realidade terrena finita em sua (auto)aniquilação - a realidade atinge sua verdade somente na autodestruição e por meio dela ; diferentemente da cristandade, Hegel sabe que não há Outro Mundo no qual seremos seremos recompensados por nossas perdas na terra: a transcendência é absolutamente imanente, o que há " ALÉM" DA REALIDADE FINITA NÃO É NADA MAIS QUE O PROCESSO IMANENTE DE SUA AUTOSSUPERAÇÃO . O nome que Hegel dá a essa imanência absoluta da transcendência é "negativamente absoluta", como deixa exemplarmente claro na dialética entre Senhor e Escravo: a segura identidade particular / finita do Escravo é abalada quando, experimentar o medo da morte durante o confronto com o Senhor , ele sente o sopro da força infinita da negatividade; através dessa experiência, o Escravo é forçado a aceitar a falta de valor de Si mesmo: [...] Essa consciência sentiu a angústia, não por isto ou aquilo, não por este ou aquele instante, mas sim através de sua essência toda, sentiu o medo da morte , do senhor absoluto .Ai se dissolveu interiormente; em si mesma tremeu em sua totalidade; e tudo que havia de fixo, nela vacilou. Entretanto , esse movimento universal puro, o fluidificar-se absoluto de todo o substituir , é a essência simples da consciência-de-si, a negatividade absoluta, o puro ser- para- si, que assim é nessa consciência.* * G. W. F. Hegel, Fenomenologia do espírito (trad. Paulo Meneses, 2 , ed., Petrópolis, Vozes, 1992), parte I, £194,p. 132.[...] Então o que o Escravo ganha em troca por renunciar a toda a riqueza de seu Si particular ? NADA - ao superar o Si terreno, o Escravo não atinge um nível mais elevado de Si espiritual : tudo o que tem de fazer é mudar sua posição e reconhecer no (que lhe parece) poder opressivo de destruição que ameaça obliterar sua identidade particular a negatividade absoluta que forma o núcleo de seu próprio Si. Em suma, o sujeito tem de se identificar plenamente com a força que ameaça exterminá-lo: o que temeu ao temer a morte foi o poder negativo de de seu próprio Si. Desse modo, não há reversão da negatividade em grandeza positiva - a única " grandeza" aqui é essa negatividade em si. Ou , com respeito ao sofrimento , a ideia de Hegel não é que o sofrimento causado pelo trabalho alienante da renúncia seja um momento intermediário que deve ser pacientemente suportado enquanto esperamos alcançar nossa recompensa no final do túnel - não há prêmio ou lucro no fim de nossa paciente submissão, o sofrimento e a renúncia são sua própria recompensa : tudo o que temos de fazer é mudar nossa posição subjetiva , renunciar ao apego desesperado ao Si finito, com seus desejos "patológicos", purificar nosso Si rumo a sua universalidade. Também é dessa maneira que Hegel explica a superação da tirania na história dos Estados: " Diz-se que a tirania é subvertida pelo povo por ser indigna vergonhosa etc. Na verdade, ela desaparece simplesmente por ser supérflua* " *Idem, Jenaer REALPHILOSOPHIE( Hamburgo, Felix Maeiner, 1969),p.247-8. Ela se torna supérflua quando as pessoas não precisam mais da força externa do do tirano para renunciar a seus interesses particulares, quando se tornam " cidadãos universais", identificando diretamente o núcleo de seu ser com essa universalidade. Em suma, as pessoas não precisam mais do senhor externo quando são educadas a cumprir elas mesmas a tarefa da disciplina e da subordinação. O avesso do " niilismo" do Hegel ( todas as formas finitas/determinadas de vida atingem sua " verdade" na autossuperação) é seu oposto aparente: dando continuidade à tradição metafisica platônica, ele não está pronto para atribuir plenos poderes à negatividade , isto é , sua dialética, em ultima análise, é um esforço para "normalizar"o excesso da negatividade.Já para o ultimo Platão, o problema era relativizar ou contextualizar o não - ser como um momento subordinado do ser( o não-ser é sempre uma falta particular/determinada do ser, medida pela plenitude que ele não efetiva; não há não -ser enquanto tal, há sempre somente, por exemplo : o "verde" participa do não-ser por não ser "vermelho" ou qualquer outra cor). Nessa mesma linha a "negatividade" hegeliana serve para " proscrever a ideia de uma diferença absoluta" ou " não-ser" * : * Gérard Lebrun, O AVESSO DA DIALÉTICA, cit., p. 198 a negatividade é limitada à obliteração de todas as determinações finitas/imediatas. O processo da negatividade, portanto,não é apenas um processo negativo da autodestruição do finito: ele chega a seu TÉLOS quando as determinações finitas/imediatas são mediadas/mantidas/elevadas, postas em sua "verdade" como determinações ideais conceituais. O que resta depois que a negatividade faz seu trabalho é a parúsia da estrutura conceitual ideal . O que falta aqui , do ponto de vista nietzschiano, é o não afirmativo: o não do jubiloso e heroico confronto com o adversário, o não da luta que visa a autoafirmação, não a autossuprassunção. "
Posted on: Sat, 24 Aug 2013 01:53:04 +0000

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