Há tempos que venho querendo escrever sobre essa greve dos - TopicsExpress



          

Há tempos que venho querendo escrever sobre essa greve dos professores e sobre sua repercussão. Não o tenho feito porque, apesar de apoiar o movimento - e nem se trata de apoiar, trata-se de saber que é o mínimo que uma sociedade exige para ser digna - tenho algumas críticas quanto à greve, à forma como vem sendo feito e, além disso, a própria crise é um sintoma, uma consequência que, ainda que venha a ser resolvida - não será por motivos óbvios - voltaria em pouco tempo a se repetir, pois o problema é de base, é estrutural, e não estamos agindo sobre esse ponto. Também porque tenho receio de textos mais profundos em facebook sem "autoridade", ou seja, um mesmo texto escrito por mim ou, imaginemos, supostamente por um Jô Soares, será lido ou avaliado por esse motivo. Logo, como não sou o Jô Soares, deixei de dar muitas opiniões, pelo menos por escrito, e num dos espaços de maior intolerância que conheço: é, aqui mesmo, o facebook. Mas isso são outros quinhentos. Queria dizer, apenas, o que vejo nessa foto, aliás, fantástica: parabéns ao fotógrafo. Vejo uma dura realidade que quebra qualquer lente cor-de-rosa dos óculos da felicidade pateta que andam por aí. Vejo uma professora, já uma senhora, provavelmente cansada de tudo o que presenciou na vida: desmandos, abusos, roubalheiras, destruição sistemática da educação no Brasil; e ela chora. Chora segurando uma bandeira do Brasil manchada, creio, de sangue. E o que é mais icônico na História do Nosso país que a nossa bandeira manchada de sangue? Um sangue que diariamente insistimos em não ver, que fingimos não estar lá. Em meio à "crise" da educação - coloco entre aspas porque claramente não é uma crise, a educação está agonizando como um todo: infraestrutura, metodologia, espaço físico, legalmente... - ainda vejo gente jogando lixo na rua, ainda vejo cidadãos bebendo acintosamente dentro de seus carros, durante o dia, vejo nossa mentalidade se voltar para o cotidiano do espetáculo, seja ele de que tipo for, enfim, vejo que a educação não está não apenas nos planos do Estado, mas no inconsciente coletivo do brasileiro. Dizer que há exceções é desnecessário, sempre há, mas fica dito. E essa professora, que chora pelo sangue derramando há mais de quinhentos anos e que tinge de morte a nossa bandeira (morte cultural, política, social, humana...), tem ao lado dela um policial que ri com os colegas. Imagino do que ria esse policial... Me parece ser o riso da ignorância, o riso do tolo que não sabe o que acontece à sua volta. Mas, muito mais do que um sorriso de ignorância, é um sorriso que mostra como nossa sociedade está dividida, como as classes, as profissões, os segmentos não estão mais ligados, como nos feudalizamos a ponto de não nos importarmos mais com nada que não seja da nossa alçada. E a educação não é mais de nossa alçada, ou pelo menos de alçadas que não sejam a dos professores. Lutar por salários e por condições melhores de trabalho, apesar de obviamente justo e necessário pela greve não me parece mais funcional. Talvez funcional seja se servisse de pontapé para uma união total de todos em prol não só dos salários e das condições, mas das transformações de base que levam a essas revindicações. Nós sabemos que nem todos os professores nem todas as escolas estão paradas. Pelo que li, parece que são muito poucos os que não aderiram ou que não puderam aderir, mas, enquanto não houver a união,enquanto o Brasil não topar com 100% de mãos dadas e cidadania pelo que há de mais básico, mais estrutural, outros profissionais e pessoas de bem continuarão chorando sob o sangue derramada no pavilhão verde e amarelo. E, agora, vermelho... Não, não é um texto pessimista, é um texto que mostra o que há, o que está nas ruas, o nosso presente, a nossa realidade. Por que vestir-se de esperança não é tão bom nem tão eficaz quanto se imagina ou se quer fazer acreditar. Se a nossa bandeira e a nossa história tiverem que ser manchadas de sangue, que não seja um sangue em vão, que seja um sangue que valeu a pena ser derramado porque lavou a sujeira e a podridão de nossas instituições, e batizou uma nova sociedade. Caso contrário, o sorriso apatetado e patético que emoldura o choro da educação vertido por uma professora brasileira, continuará emoldurando e minando todos os nossos passos, passos previstos, passos absorvidos e passos ridicularizados por que sabe que é necessário muito mais para que tudo mude.
Posted on: Sat, 05 Oct 2013 16:46:32 +0000

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