Não conheço Paulo de Tarso pessoalmente, a não ser pelas suas - TopicsExpress



          

Não conheço Paulo de Tarso pessoalmente, a não ser pelas suas reportagens e sua historia de vida através do jornal. Admiro a sua coragem, por tudo que passou, más tem mesmo o meu respeito é por não trair companheiros de lutas quando junto com outros no poder também lutou para denunciar ações ao qual ele não queria e não compatrtilhou, tanto que hoje não mais é PT. Como a um amigo que enterrei a alguns meses. Reportagem- Por Paulo de Tarso Venceslau- O sequestro do século (19) Reprodução da revista Veja nº 66, de 10 de dezembro de 1969. Dado como morto e castrado Torturado na mesma sala onde “Jonas” havia sido barbaramente assassinado, cujas paredes ainda exibiam resíduos de sua massa encefálica, ninguém acreditava que Paulo de Tarso ainda pudesse estar vivo e isso só mudou depois que a revista Veja publicou reportagem com depoimento de um jornalista que tratou de suas feridas na Operação Bandeirantes. Desde minha chegada à Operação Bandeirantes até a ordem do oficial do Exército para que eu fosse levado à sala de tortura passaram-se poucos minutos, quiçás segundos. O suficiente, porém, para me sentir como um animal no zoológico. Era a curiosidade do momento. Na sala de tortura não teve papo. Minha roupa foi tirada e a sessão começou pela cadeira do dragão: um instrumento de tortura utilizado pela polícia política do Brasil e também pelo DOI-CODI na época do regime militar para se obter informações de pessoas sus- peitas de participarem de ações subversivas contra o governo. Era um tipo de cadeira elétrica, com assento, apoio de braços e espaldar de metal onde o preso tinha os pulsos e as canelas presos por cintas de couro. Simultaneamente, fios eram conectados nas orelhas, língua, em nos órgãos genitais. A energia provinha de um dínamo movido por uma manivela manipulada pelo torturador. Quanto mais rápida fosse rodada a manivela, maior é a descarga elétrica. A água jogada sobre o corpo completamente nu fazia com que a força do choque fosse elevada ao extremo. Fui pendurado no pau-de-arara onde continuava a receber descargas elétricas acompanhadas de espancamento. Foram três dias de torturas ininterruptas, entre a cadeira do dragão e o pau- de-arara. Nos intervalos de revezamento de equipe de tortura, eu era confinado em uma solitária sem luz e água. No início, os torturadores não sabiam quem eu era. Até o momento em que a porta se abriu.Eu estava estendido no chão, nu e sujo. O oficial manda entrar Manoel Cyrillo, o “Benê”, companheiro de sequestro do embaixador norte-americano Charles Burcke Elbrick. ___Quem é esse filho da puta?, berra o oficial.____ É o “Geraldo”, responde “Benê”, que não conhecia minha identidade legal. Senti o mundo ruir. Até então eu vinha segurando uma historinha em que meu codinome – nome de guerra – era “Machado”, sem qualquer antecedente. O “Geraldo” estava mais sujo que pau de galinheiro: como participante de ações, inclusive o próprio sequestro, até como membro da coordenação regional da ALN – Ação Libertadora Nacional, comandada pelo ex-deputado baiano Carlos Marighella, o homem mais procurado pela ditadura militar. Os torturadores ficaram eufóricos. E cada vez mais ameaçadores. Se eu não falasse, teria o mesmo fim de “Jonas”. E para provar que não estavam mentindo, exibiam pedaços de sua massa encefálica ainda grudados nas paredes da sala de tortura. Inventei estórias e pontos – locais em que deveria me encontrar com companheiros em horários pré determinados. Eu queria ser visto na rua. Era uma forma de avisar que eu me encontrava preso. No terceiro dia entrei em estado de coma. Fui levado ao Hospital Militar do Cambuci para ser medicado. No sétimo dia, pus em prática um plano: confessar onde morava e escondia uma sacola da Brinks cheia de dinheiro e outra com armas de vários calibres. Pedi para falar com o major do Exército Waldir Coelho, comandante da Operação Bandeirante. Contei-lhe que me sentia derrotado e queria confessar meu endereço, o que anteriormente eu estava decidido a não fazer. Fui convincente o suficiente porque, em poucos minutos, eu seguia para a rua Sergipe, onde eu morava em casarão antigo que funcionava como pensão. Cinco ou seis viaturas cheias de policiais federais e militares à paisana faziam parte dessa caravana. Ninguém sabia desse meu endereço. (Waldir Coelho seria promovido a coronel e assumiria o comando do 2º Batalhão de Engenharia e Comando, em Pindamonhangaba, e, em 1970, protagonizou uma cena hilária com a verdadeira Velhinha de Taubaté, dona Jurema, minha mãe. Ambos já faleceram.) Quando descobriram as sacolas com dinheiro e armas fizeram uma festa. Parecia um grupo de piratas comemorando o butim de guerra. As armas e o dinheiro nunca mais apareceram. Não há qualquer registro deles no processo que respondi. Mais constrangedor, porém, era suportar o assédio dos policiais que ficaram com a parte menor. Eles quase me imploravam para que eu fornecesse um novo endereço como aquele para eles se locupletarem. No mesmo dia, fui colocado em uma cela onde se encontravam presos dois jornalistas que não tinham qualquer vínculo com a guerrilha: Fernando Pessoa Ferreira, era editor da revista 4 Rodas e Talvani Guedes um dos seus repórteres. A revista Veja nº 66, de 10 de dezembro de 1969, publicou (mantenho a grafia original): “O estudante Paulo de Tarso Wenceslau, preso em São Sebastião e levado para São Paulo, foi dado diversas como morto pelos jornais. Dizia também que estava sem dentes, sem unha, que teria sido castrado. Um jornalista (solto depois, com atestado provando sua inocência) esteve com Paulo de Tarso na mesma cela, na sede da Operação Bandeirantes, e contou como o viu: “As mãos semi-paralisadas devido aos longos períodos de pau-de-arara, os pés machucados e a língua cortada na parte superior, do lado esquerdo; estava em carne viva e ele não podia mastigar. Ficou sem comer pelo menos três dias. Os carcereiros encarregados da comida separavam o caldo do feijão e Paulo fazia força para engolir. Isto uma vez por dia, às 19 horas, quando é servida a única refeição. Paulo só parou de apanhar quando confessou onde estava seu ‘aparelho’.” A reportagem fazia parte de uma edição de Veja cuja capa tinha uma única chamada – TORTURAS – sobre a ilustração de uma sala de tortura medieval aqui reproduzida. Minha estratégia tinha dado certo. A tortura praticamente acabou – eu voltaria a ser torturado no DEOPS pela equipe do delegado Sérgio Paranhos Fleury – e lentamente fui recuperando meus movimentos. Dias depois apareceu um coronel do Exército, fardado. Ele queria saber quem era Paulo de Tarso. Ainda sem poder andar, apresentei-me. Perguntou-me se eu estava bem. Mostrei-lhe minhas sequelas e ouvi um único comentário: “O importante é que você está vivo”. Virou-se a partiu. Nunca soube o nome desse oficial. Anos depois, descobri que essa visita era fruto de uma pressão política capitaneada por Cláudio Abramo, jornalista de renome que havia reformulado o Estadão e a Folha onde se encontrava e1969. Cláudio, falecido em 1987, era casado com Radah e pai de Claudio Weber, da ONG Transparência Brasil, Bárbara e Berenice. Nossa amizade foi construída desde 1967 e eu o considerava meu pai adotivo. Cláudio pressionou Otávio Frias, da Folha, que pressionou o então poderoso ministro Delfim Netto, meu ex-professor, e essa corrente chegou até a visita do coronel. Meus pais foram imediatamente avisados. Um alívio para quem queria apenas enterrar o filho dado como morto. (na semana que vem, a última parte dessa série).
Posted on: Mon, 16 Sep 2013 01:46:24 +0000

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