O GLOBO - 07-10-2013 O Estado da Arte Hermes Frederico Soares - TopicsExpress



          

O GLOBO - 07-10-2013 O Estado da Arte Hermes Frederico Soares Costa Produtor traça a história do teatro musical no país e considera que o gênero não é hegemônico diante da variedade de produções contemporâneas Nos últimos tempos, temos ouvido falar de uma suposta hegemonia do musical dentro do teatro brasileiro contemporâneo. Há no nosso DNA cultural uma atração pelo teatro musical? Chiquinha Gonzaga, Arthur Azevedo, Luiz Peixoto e Gastão Tojeiro já encantavam as plateias brasileiras antes mesmo do “Show boat”, a primeira grande produção da Broadway. O Teatro de Revista, com suas inesquecíveis vedetes, é sinônimo de nossa cultura. Com o Teatro Brasileiro de Comédia, o Arena e o Oficina, o gênero se arrefeceu, mas marcou presença em alguns momentos, seguindo o modelo Broadway, com “Alô, Dolly!”, “My fair lady”. Além do sucesso de “O mambembe”, de Arthur Azevedo. Durante a ditadura militar, musicais como “Gota d’água”, “Ópera do malandro” e “Roda viva”, de Chico Buarque, “A vida escrachada”, de Bráulio Pedroso, “Hair”, “O homem de La Mancha” e “Pippin” tornaram-se memoráveis, assim como “Calabar”, de Chico Buarque, censurado. No final dos anos 1970, “Macunaíma”, encenado por Antunes Filho, e “Trate-me leão”, pelo Asdrúbal Trouxe o Trombone, mudaram paradigmas e influenciaram novas gerações de atores e diretores. Passamos rapidamente pelo inteligente Teatro Besteirol e chegamos à “era dos encenadores”, nos anos 1980, concomitantemente à introdução das leis de incentivo. Fala-se, mas não se prova, que nessa longa era, apesar do valor artístico, o público foi-se afastando mais do teatro. Várias brincadeiras surgiram: “Vá ao teatro, mas não me chame” ou “O teatro está chato”, escreveram algumas personalidades. Nesse período, Luiz Antônio Martinez Corrêa e Marília Pêra faziam sucesso com musicais. Nos anos 1990, Sérgio Britto encenou musicais no Teatro Delfim, e Antônio de Bonis, com “Dolores”, sobre a vida de Dolores Duran, fez um sucesso surpreendente e lançou a fase de musicais biográficos, mostrando a sede do público pelo gênero. “Somos irmãs” atingiu um ápice de requinte artístico e de alcance de espectadores. Claudio Botelho, como intérprete em “Na bagunça do teu coração”, dirigido por Paulo Afonso de Lima, marcou seu nome. E, por meio da parceria com Charles Möeller, começou a fixar um novo momento do teatro musical (“Cole Porter”, “Company”, “Sweet Charity”). Mas é com “A noviça rebelde”, em 2008, feito pela dupla, que o musical tornou-se mais um divisor de águas do teatro brasileiro, ao inaugurar o Teatro Oi Casa Grande, com estrutura para sediar um musical de grande porte e atrair um imenso público. A partir daí, o gênero se desenvolveu com altos patrocínios, produzindo impecáveis produções e ampliando o mercado de trabalho para múltiplas categorias profissionais. Um pouco antes, em São Paulo, espetáculos reproduzidos da Broadway já atraíam caravanas de várias cidades. O desenvolvimento dos musicais possibilitou criações mais livres, mesmo em versões de peças importadas. Miguel Falabella, Möeller e Botelho, Jorge Takla e De Bonis, pioneiros encenadores, são grandes responsáveis por esse desenvolvimento. E como resistir ao talento de uma das maiores atrizes do mundo, Marília Pêra? E ao trabalho de Claudia Raia? Profissionais envolvidos garantem que a produção no gênero é definitiva, e em breve, com “Rock in Rio”, estrearemos na Broadway, mostrando nossa competência. Há quem afirme que já temos uma indústria de produção de musicais, que firma a excelência de atores como Claudia Netto e Soraya Ravenle; João Fonseca e Thadeu Aguiar ampliam seus talentos de diretores, e uma quantidade enorme de jovens veem nessa solidificação dos musicais a possibilidade de concretizarem sonhos. Na Casa das Artes de Laranjeiras (CAL), testemunhei surpreso a quantidade de jovens que buscam aprimorar o dom do canto e da dança que já possuem, junto com a interpretação; a surpresa se estendeu com o conhecimento que eles têm acerca do gênero. A CAL teve que abrir espaço para atender tamanha solicitação, criando cursos específicos, além de abrir sua faculdade com alunos interessados em tudo o que diz respeito às artes cênicas. A indústria do musical, porém, é dependente de patrocínios. Sem eles, não há como isso tudo acontecer. A bilheteria não cobre os custos. E a decantada hegemonia mostra um paradoxo. Neste momento, autores brasileiros também ganham reconhecimento e público como há quase três décadas não acontecia, como Pedro Brício, Jô Bilac, Rodrigo Nogueira, Júlia Spadaccini, Daniela Pereira de Carvalho, Renata Mizrahi, Carla Faour e Walter Daguerre. Newton Moreno e Bosco Brasil desenvolveram ainda mais suas dramaturgias. E diretores se firmam fora dos musicais, como Guilherme Leme, Bruce Gomlewsky, Inez Viana, Cristiane Jatahy, Felipe Vidal e Roberto Alvim. Nesta época supostamente hegemônica dos musicais, nossas eternas damas (Bibi, Fernanda, Nathalia, Nicette, Eva Wilma, Laura, Rosamaria, Beatriz e Irene) continuam esbanjando talento no teatro. Antunes, Zé Celso, Aderbal e Amir prosseguem criativos. Marieta Severo criou o Teatro Poeira com Andréa Beltrão. Nanini, com semelhante inquietude, abriu o Galpão Gamboa. Renata Sorrah continua em plena entrega no teatro. Wilker, Fagundes, Edwin e Caruso estão em constantes mergulhos teatrais. Regina Duarte lança-se a novos desafios. Armazém, Tapa, Cia. dos Atores, Galpão, Os Fofos, Os Satyros, Felipe Hirsch, Jeferson Miranda, Moacir Chaves, Gabriel Vilela, Moacyr Góes, Ulysses Cruz, Celina Sodré, Ivan Sugahara e Gilberto Gawronski continuam a pleno vapor. E os editais de patrocínio ampliaram seus espectros de subvenção. Nesta mesma fase, o stand-up lota teatros. Sem falar da longevidade de Clarice Niskier, com “Alma imoral”, Beth Goulart, com “Simplesmente eu, Clarice Lispector”, Júlio Adrião com “A descoberta das Américas”, e Gustavo Rodrigues com “Billdog”. É, portanto, impossível falar em hegemonia ou que o teatro musical minou outros gêneros. Vejo o momento muito rico e miscigenado artisticamente. E torço para que o público, maior ou menor de cada gênero de espetáculo, seja estimulado a migrar por toda essa riqueza de oferta artística e crie “uma indústria do prazer em ir ao teatro”.
Posted on: Wed, 09 Oct 2013 00:13:36 +0000

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