O artigo é do ex-ponta-esquerda do Fluminense, José Roberto - TopicsExpress



          

O artigo é do ex-ponta-esquerda do Fluminense, José Roberto Lopes Padilha, o Zé Roberto, com quem tenho amizade desde 1973 quando residimos no mesmo prédio no Leblon: Um elástico para a vida Depois de passarmos por todas as equipes de base do Fluminense FC, campeões juvenis e de juniores, treinados por João Baptista Pinheiro, revelados por Zagalo e preparados por Carlos Alberto Parreira, finalmente havia chegado a nossa hora. Todos éramos pratas da casa e o clube se preparava para a temporada de 1975 com uma excursão, em fevereiro, pelo eixo Rio-São Paulo. Eu, Edinho, Cléber, Herivelton, Marco Aurélio, Abel Braga, Nielsen Elias e Carlos Alberto Pintinho enfrentamos o Guarani, a Ponte Preta, o XV de Piracicaba e estávamos na ponta dos cascos para estrear no estadual carioca. No ônibus da volta, em meio a euforia por uma série de bons resultados, lemos no Jornal dos Sports que o Presidente Horta, que ficara no Rio e não nos vira atuar, resolvera montar um supertime. No meu caso, como ponta-esquerda, deu vontade de ficar naquela parada de Itatiaia: contratou os três melhores do país, Rivelino, do Corinthians, Paulo César Cajú, do Olympique de Marselha e Mário Sérgio, do Vitória. E trouxe o Zé Mário para tomar o lugar do Pintinho. Irritados e inexperientes, voltamos pro banco, que já era conhecido como poltrona, e começamos, em toda a Taça Guanabara, a ironizar todos aqueles que roubaram a nossa oportunidade. Rivelino, então, pela idade, já tricampeão do mundo, não podia errar um só passe. Como ele não errava, implicávamos com o fato de não correr mais para marcar ninguém. Ai veio o jogo contra o Vasco. Me lembro como se fosse hoje: nós, os jovens corneteiros, sentados no banco do lado direito das tribunas e ele, com a bola dominada, diante do cabeça-de-área vascaíno, o Alcir. Rivelino parou e o Alcir o encarou, naquele tempo dava para parar a bola e ensaiar uma obra de arte. De tão surreal a cena, por segundos nos calamos também. E o Maracanã emudeceu junto. Num gesto inusitado, conduziu a bola pela parte externa do seu tornozelo em direção à esquerda, e num movimento rápido, com a ponta dos pés, trouxe a bola de volta. Esta, caprichosamente, encontrou um espaço entre as pernas do Alcir. Ainda estupefatos, estádio, corneteiros, Alcir e toda a defesa do Vasco, Rivelino aproveitou o movimento da bola, arrancou para dentro da área, deixou para trás o quarto-zagueiro René, de passagem, e entrou na cara do gol. Pelo lado direito, já ao lado da pequena área, só encontrou o goleiro Andrade fechando 95% do seu lado esquerdo e se preparando para saltar para o lado óbvio, o direito, totalmente escancarado. E Rivelino bateu com sua canhota nos 5% restantes do seu contrapé. A bola, como um pincel de Renoir, entrou entre seu pé e a trave, e ele saiu para comemorar um dos mais belos gols que o nosso futebol já produziu. Olhamos, os ex-corneteiros, um para o outro, completamente sem graça e tomamos, naquele momento mágico, ao vivo, um lição para o resto das nossas vidas. Porque ele, Roberto Rivelino, o Reizinho do Parque, que se tornou o Príncipe das Laranjeiras, assumiu o leme das nossas carreiras. Não teve mais excursão de ônibus para Campinas, entramos no Jumbo da Air France e fomos jogar o Torneio de Paris. Deixamos o Hotel das Paineiras, onde concentrávamos, e fomos inaugurar o 5 estrelas Hotel Nacional, em São Conrado. A vitrine da Rua da Alfândega para a boutique do Barrashopping. Fomos campeões da Taça GB, carioca e nossa equipe entrou para a história como A Máquina Tricolor, a original, que foi bi em 1976, ainda com Rivelino, Doval, Edinho e Dirceu. Após os treinos, nos juntávamos num cantinho do gramado e posicionávamos os cones para treinar o elástico, e à noite era a vez de colocar uma cadeira no corredor para tentar, entre suas canelas finas de madeira, já apelidadas de Alcir, repetir aquele gesto mágico. Nos sobrava vontade, mas faltou coragem, pelo menos no meu caso, para executá-lo nas partidas. Quando deixamos o Fluminense, anos depois, cada um buscando seu destino, aprendemos a respeitar aquele cidadão experiente, que desembarca no seu trabalho, é contratado por sua redação e que não vem mais tomar o seu lugar. Porque ninguém toma o lugar de ninguém. Como Rivelino, os mais sábios, experientes e competentes que assumem nossa repartição, não devem ser subestimados ou questionados pelos aspirantes ao cargo que se julgam a bola da vez. Precisam ser fontes de consultas, sugados seus conhecimentos para que quando a oportunidade surgir estejamos preparados para assumir o nosso espaço, construir uma carreira com dignidade e competência. Aquele elástico, desferido numa sábado à noitinha, há exatos trinta e oito anos, levou o ciúme acumulado e trouxe o orgulho estampado, carregou magoas, inveja, ressentimentos e trouxe de volta uma magia e respeito que passamos a ter por nossos mestres, nossos ídolos para o resto das nossas vidas. E Rivelino foi para minha geração, ao lado de Gérson e de Zico, um gênio e será para sempre o nosso grande ídolo.
Posted on: Sun, 11 Aug 2013 03:56:50 +0000

Trending Topics



Recently Viewed Topics




© 2015