Portefólio de Maria De Lurdes Nogueira O SENTIDO DA DIMENSÃO - TopicsExpress



          

Portefólio de Maria De Lurdes Nogueira O SENTIDO DA DIMENSÃO EXISTENCIAL DA ANGÚSTIA (ANGST) VS. A SUA DIMENSÃO MERAMENTE PSICOLÓGICA De: Lurdes Nogueira Aluna: 8068 E-mail:[email protected] Introdução Partindo do campo semântico a palavra angústia tem muitos sentidos, que numa primeira análise podem parecer muito diferentes entre si. a angústia entendida como temor (Furcht), da angústia como “ ansiedade” ou “patologia” e a angústia como disposição privilegiada. Em Heidegger a angústia deve ser abordada à luz da fenomenologia existencial. Assim, em Heidegger, a angústia surge, como um conceito predominantemente “existencial” e “existenciário”. A angústia é um fenómeno originário e fundamental, para compreendermos o sentido do Ser e do temor e que se distingue do medo, ou seja, da sua dimensão meramente psicológica ou patológica. I- A “ansiedade” ou “a”Angústia” como patologia de acordo com A. Fernandes da Fonseca. A “ansiedade” que em linguagem científica consideramos sinónimo de “angústia” constitui uma manifestação da nossa actividade emocional ou afectiva em que predominam os sentimentos de colorido desagradável: o mal- estar, a apreensão, a preocupação e a expectativa, a intranquilidade e o desamparo (Fundamentos da propedêutica psiquiátrica). A ansiedade corresponde para certos autores, a uma “reacção de alerta”, de temor vago e indefinido. A “angústia” corresponde mais a um sentimento de constrição, de estrangulamento e de cansaço. A ansiedade como fenómeno psicológico representa um dos mecanismos de adaptação do organismo às circunstâncias do “stress” e da tensão, revelando-se útil para a aprendizagem do ser humano e para a maturação adequada da sua personalidade (Eibsfelt, 1971). Essa sensação desagradável, que corresponde quase sempre, a um sinal de alarme, experimentado pelo ser humano, perante a existência real ou imaginária de um perigo; representa a resposta natural e de tipo universal existente em todas as culturas e que se manifesta, em idênticas circunstâncias, em quase todos os indivíduos. A psicanálise considera a reacção ansiosa como a exteriorização de impulsos ou fenómenos inconscientes com uma forte carga libidinosa. Mas para além desse tipo de atitude psicológica normal, há muitos indivíduos em quem, por virtude da sua baixa capacidade de adaptação (mecanismos de esgotamento), por aumento de frequência e da intensidade dos estímulos (mecanismos reactivos) ou pela influência de factores disposicionais (mecanismos constitucionais), a manifestação do tipo ansioso toma características demasiado intensas. Tais características são susceptíveis de se repercutir no organismo desses indivíduos, de forma mais ou menos paroxítica, em transtornos viscero-motores ou do tipo psicossomático que adquirem um dimensão neurótica. A ansiedade surge, nesses casos, como uma expressão de “ medo patológico” (sem objecto) e representa um autêntico sinal de alarme ou de defesa, susceptível de distinguir-se da sensação de medo psicológico pela falta de uma motivação adequada. O medo, que pode expressar-se sob formas reais, imaginárias e simbólicas (fobias) tem representado, um dos grandes traumas da nossa civilização contemporânea, já que “ um elevado número de objectos, de acontecimentos, de condições e de situações actuais são potencialmente assustadores”, não só do ponto de vista da segurança individual (dificuldades económicas, desemprego) como também do ponto de vista da segurança colectiva (ameaças de guerra, terrorismo etc.). Outros indivíduos há, em quem o estado emocional de ansiedade se organiza e cristaliza numa espécie de estrutura ou maneira de ser permanente, dando lugar à formação e organização de personalidades psicopáticas do tipo ansioso, onde predominam entre as primeiras os medos, as fobias, as dismnésias, os fenómenos de despersonalização e as alterações de comportamento. Entre as segundas, são frequentes as manifestações dispneicas, as extrasístoles, a taquicardia, os tremores, a sudação, os vómitos, as náuseas, a polaquiúria, e as manifestações psicomotoras. Consoante a combinação e o predomínio desses diversos sintomas ansiosos (primários ou secundários), a distinção entre uma ansiedade do tipo primário e uma ansiedade do tipo secundário provém dos conceitos psicanalíticos. Freud distinguia a reacção ansiosa traumática (situação condicionada pela incapacidade do Eu em dar resposta) da ansiedade - alarme (dispositivo psicológico posto em marcha pelo eu), assim poderemos ter síndromos de angústia, de apreensão, de stress, de tensão, de agitação, de fobia e de pânico. Tais estados, impregnados por sentimentos de medo e de incapacidade, mostram-se susceptíveis de arrastar o indivíduo para situações de insegurança e de exaustão ou até para estados mais graves do tipo agressivo - confusional e de desorientação da consciência. No aspecto sócio-cultural, deve assinalar-se justamente a elevada incidência que vêm adquirindo, por toda a parte, certas manifestações do tipo ansioso – agressivo. II - Quanto ao temor ( Furcht) Do ponto de vista ontológico, segundo Heidegger, o que atemoriza está sempre relacionado com um ente intramundano, que vêm ao encontro do mundo, seja esse ente, manual, simplesmente dado ou uma co-presença (Mitdasein), o que se teme é uma ameaça. O ameaçar possui o carácter do aproximar-se que vem ao encontro numa região, trazendo consigo o dano. Esse dano pode ser dominado, podendo chegar a realizar-se ou não. Neste existencial é necessária a espacialidade “ o que atemoriza tem que se aproximar materialmente do espaço” III - Para compreendermos a análise do conceito de angústia (Angst) em Heidegger, temos em primeiro lugar, que compreender o conceito de quotidianeidade. A vida humana lançada na quotidianeidade apresenta-se como uma forma inautêntica de existência, marcada por três características: a facticidade (Faktizitat), a existencialidade (Existentialitat) e a decadência (Verfallen). O Quotidiano como facticidade apresenta-nos e manifesta-nos o homem, quer como força, quer como fraqueza ou fragilidade, como ser – no -mundo (in – der Welt –sein), como lançado, nessa situação, numa relação activa, sem que tenha sido escolha sua. A decadência é um modo fundamental do ser da quotidianeidade, mas que não deve ser entendida negativamente. A existencialidade é um aspecto da quotidianeidade que permite manifestar o ser humano como “ sendo uma antecipação das suas possibilidades, permitindo a objectivação e a concretização daquilo “que ainda não é” e que” poderá vir a ser” (por-vir). Permite a concretização ou a frustração/negação desse projecto. Detectar, compreender e agarrar esse projecto, ou simplesmente não detectar, não agarrar, não compreender e deixar passar o momento. Assim, para compreendermos o conceito de angústia (Angst), temos que compreender o conceito de decadência ( Verfallen). O ser humano surge como um ser decaído, que se perde no impessoal, que foge de si mesmo, que se desvia do seu poder-ser mais próprio, e que se lança para fora de si mesmo nos mais variados modos de ocupação intramundanos, pois as suas preocupações quanto à quotidianeidade da existência inautêntica, desviam-no do projecto essencial ou fundamental: realizar-se, a si próprio. “A decadência dissimula e recalca a autenticidade do ser-si-mesmo”. A “fuga” assume dois sentidos diferentes quanto ao temor e à decadência. Quanto ao temor, ela denota o desviar-se daquilo que provoca o temor. Na decadência, “fuga” significa, “fuga de si mesmo”, pelo facto, do estar - aí decair no impessoal e no “mundo das ocupações”. Aquilo com que a angústia se angústia, não é do mesmo género, daquilo que o temor teme. O temor teme o ente intramundano, que advindo de uma determinada região de entes se torna cada vez mais próximo e ameaçador, a angústia não tem que ver com o ente intramundano. Na verdade ”o com quê” da angústia é indeterminado (unbestimmt). O carácter indeterminado da angústia coloca o simplesmente dado (vorhanden), e o à mão (zuhanden) numa posição irrelevante. O “quê” da angústia (Wovor) não se encontra em lugar nenhum. O que ameaça não tem determinação, não está em lugar algum, não tem um modo de aproximação, ou seja, o que ameaça está sempre presente e ao mesmo tempo não está em lugar nenhum. Do “Nada” a angústia se tornou “angústia com o próprio ser – no - mundo”. O “ Nada” e o “em parte alguma” não significam a ausência do mundo, apenas revelam que o “ ente intramundano” tem pouca importância e que somente o mundo se impõe na sua mundaneidade. Angústia é a possibilidade originária, da abertura directa do mundo Mas a angústia, se mostra o ser intramundano, como decaído no “mundo, de modo impessoal, também por outra parte, oferece a possibilidade de retirar o - estar –aí do seu modo impróprio de ser, inautêntico, abrindo para ele a possibilidade do seu poder - ser no mundo finito. “ No estar aí a angústia revela o ser puro para o poder - ser,” mais próprio”, ou seja, o ser livre para a liberdade de assumir e escolher-se a si próprio”, ou seja, realizar o seu projecto, o seu modo de ser. Isto implica deliberação, escolha, decisão e responsabilidade pelas decisões e o assumir as consequências quer da escolha, quer da não escolha. IV - Em Heidegger a angústia tem um duplo sentido e parece aparentemente envolver uma contradição que é a contradição da própria condição humana: Heidegger faz da angústia “o tempo de ânimo” peculiar mediante o qual se revela o “Nada” e se descobre a existência como um “estar-se sustendo-se” nela. A angústia tem assim um carácter revelador e messiânico, porque permite a visão daquilo que havia angustiado a existência: o “Nada” na sua existência pura revela-se. Por outra parte, para se poder entender o conceito de “Angst” heideggeriano é necessário compreender que quando Heidegger fala de “angústia frente ao “Nada” essa angústia tem objecto, porque Heidegger hipostasia o “Nada” transformando-o num ser. A angústia não é segundo ele um mero estado psicológico, nem um “angustiar-se por” algo determinado (com objecto), como no caso do medo. Na angústia reveladora há uma indeterminação absoluta que a distingue completamente do medo. O “Nada”, objecto hipostasiado da “Angst” heideggeriana remete o indivíduo para uma ameaça indeterminada. O “Nada” heideggeriano jamais pode ser conhecido, condenando sempre o homem ao facto, de poder sempre ser tocado pela experiência da angústia. No entanto a angústia não é uma aniquilação do ente, e sim uma despertês do ente para o seu verdadeiro ser. A Angústia funciona como um motor que dispara para revelar o ser autêntico, mediante a liberdade como potencialidade. Ela conduz o homem a negar o mundo exterior e a escolher-se a si mesmo. A angústia é segundo isto, a condição mesma de uma existência temporal e finita, não é só a agudização de uma mera inquietude, quando não se acha “ distraído” entre as coisas. A angústia é algo que se “ manifesta ao ser – aí ( ao homem), ao seu ser –livre -para, permitindo revelar a autenticidade do seu ser como possibilidade que é agora e que foi desde sempre. A experiência do “Nada” faz com que o homem se sinta essencialmente um ser para a morte. Angústia é um acontecimento absolutamente paralisante e que provoca uma suspensão da existência, como se a vida ficasse presa naquele instante. Na angústia é experimentada a relevância do tempo da finitude da existência humana. O tempo urge. Angústia é experimentada como uma liberdade para um “encontrar-se com a morte”, um “ estar preparado para” e um contínuo “ estar em relação “ com a “sua própria morte”. Na angústia tudo o que ocupava o homem perde sentido. Todas as coisas, todos as entidades se afastam, afundando-se em “nada e em nenhum lugar”, e o homem completamente só, enfrenta o vazio, a nenhuma “coisidade (das Nichts), toda a rotina cai por terra. E é só aí quando o ataque ao seu núcleo vital se dá, que então encontra a potencialidade de ser de modo autêntico e perante este facto, apresentam-se duas opções: a fuga, o fechamento sobre si próprio na existência inautêntica, que não é menos existência por isso, ou a tentativa de transcender os seus próprios limites, transcendendo-se a si próprio, para dar sentido ao seu ser, através da compreensão do projecto criativo. Para Heidegger a angústia “calma” ou a angústia “sóbria” (nuchtern) e a confrontação implicada na morte, abrem o homem para o ser, porque ao descer ao abismo, à sua profundidade, o homem encontra, a angústia, mas também a esperança, um estado de expectação para que se caminha, não simplesmente as coisas entre as quais se move a existência nos seus momentos de “distracção” e sim uma plenitude que pode colmatar o suposto vazio ou a crise da sua vida. V – O Binómio Angústia - Esperança Podemos dizer que a angústia e a esperança constituem um binómio e que se alimentam uma da outra: Sem a angústia, a existência correria com efeito, o perigo de perder-se no quotidiano, de enquilosar-se no satisfatório, sem a esperança, ao contrário, a existência poderia desmoronar-se, vítima do seu próprio e interminável afundamento. Poderia conceber-se a vida como um contínuo trânsito de uma a outra sem jamais deter-se em nenhuma. Esperança e angústia parecem igualmente necessárias para que a existência humana mantenha o seu modo de ser essencialmente contraditório. Heidegger afirma o homem como um ente com as potencialidades para ser alegremente activo “ conhecer a alegria ( die wissende heiterkeit) é uma porta para o eterno”. O ser é associado com a “luz” e com a “alegria”. Pensar e compreender o ser é “chegar a casa”, é fazer com que o homem chegue ao verdadeiro lar. VI - A determinação temporal fundamental e mais importante do Tempo : o Futuro Embora passado, presente e futuro sejam inter-dependentes e se impliquem, Heidegger privilegia o futuro. Porque é do futuro e por retroacção, que se dá o embate com a morte, com a possibilidade do fim, com a possibilidade de poder não - ser que leva o homem a sua auto - consciencialização. A morte é na sua condição máxima uma “situação-limite” que possibilita o olhar crítico sobre a sua existência. Esta consciencialização do projecto da sua vida permite-lhe apropriar-se da sua existência, tornando-a, efectivamente sua e autêntica, e não mais uma vida presa à exterioridade da cultura, ao factual, onde não problematiza, onde vive de modo atemático e não-reflexivo, vivendo uma vida marcada pela superficialidade, pela busca do novo, pelo novo, uma vida marcada pela curiosidade, pela tagarelice, vivendo em nome de regras e de valores impostos por terceiros que conduzem à mais completa despersonalização, e que o fazem mergulhar no mais completo anonimato “ mais um entre tantos”, como diz o poeta “ ser do rebanho e cantar…” (Das Man) ser impessoal, viver a vidinha banal dos dias. “ come-se, bebe-se, vive-se, como todos comem, bebem e vivem”. VII - O homem com um “Ser-para-a-morte” Apesar de o homem não poder viver a experiência real da sua própria morte, toda a pessoa autêntica tematiza e problematiza sobre a sua própria finitude. Enquanto entes existentes e reais, a morte é a nossa única possibilidade mais real e permanente. Diante dessa possibilidade não última, mas primeiríssima, todas as outras possibilidades se transformam em impossíveis. A morte é assim a impossibilidade de viabilização de todo o projecto, e com isso, do nada que acompanha toda a existência. A consciência que nos remete para o sentido da morte e que nos revela a nulidade de todo o projecto, que nos revela a imprevisibilidade e a possibilidade da sua não realização, abre dessa forma a porta para uma existência autêntica que é a de que somos um Ser- para a morte. A existência é a especificidade do modo de ser do Ser- o- aí. A morte remete-nos para a angústia essencial. O ser humano nasce sozinho e morre sozinho, ainda que nascimento e morte possam ser assistidos por outros. Mas “ Ninguém pode assumir o morrer do outro”. É sempre a Minha morte, é sempre a Mim que me acontece. O assumir a morte não é um acto intelectual mas sim um sentimento muito específico que é a angústia. Diante do “Nada” a angústia é o sentimento mais real, a experiência mais autêntica. O sentido da dimensão existencial da angústia consiste em olhar de frente para a própria possibilidade de” Não – Ser” e lidar com isso, com coragem. O medo é sempre de alguma coisa (tem objecto). Freud usou a palavra “Angst” para angústia (sem objecto) e “Schreck” para “ pavor, terror, horror e espanto (também como objecto). O medo é sempre de “alguma coisa”. Mas a morte não representa “alguma coisa” e sim o “Nada”. A morte representa o medo do aniquilamento face ao “Nada”. A existência inautêntica transforma a angústia em medo, de algo ainda distante, que não virá já, num acontecimento longínquo. A morte, neste caso, é só mais um acontecimento que virá num tempo incerto. O medo é assim a morte da angústia. Ao ser substituída e banalizada pelo medo, a angústia, aparece na vida autêntica como uma fraqueza, que o homem seguro e firme não deve conhecer. Dessa forma, na vida inautêntica, a existência trás a marca da indiferença e da tranquilidade, da vida não problematizada, do “ não vale a pena pensar nisso, quando chegar logo se vê”. VIII - A existência é possibilidade e projecto, abertura a vir - a –ser, e assim sendo, o tempo importante é o futuro. No entanto passado, presente e futuro encontram-se interligados. O cuidar do presente implica o passado e o cuidar das possibilidades do futuro. O tratamento dado às diferentes determinações do tempo permitem viver uma vida autêntica ou inautêntica. O passado é sempre retorno, o presente é ocupação e preocupação e o futuro é um pretender Ser. Exemplos de tempo inautêntico são a excessiva preocupação com o êxito, o sucesso e a imanência. O tempo autêntico não permite ao homem ficar preso à tradição, nem ser envolvido nas possibilidades do momento. O tempo autêntico pede decisão, definição e auto – destinação. A existência consiste no projectar-se, no lançar-se para o futuro. Podemos afirmar que a essência, ou a natureza do Ser- o –aí consiste em ser existência aberta às possibilidades. O homem compreende uma coisa, quando sabe o que pode fazer dela, do mesmo modo, compreende-se a si próprio quando sabe o que pode fazer consigo mesmo, isto é, quando percebe as suas possibilidades. O humano é a possibilidade de constituir uma abertura ao de ser e de se realizar diferenciadamente. Cada ser humano é enquanto existente e existência, originalidade e unicidade. É a compreensão e a decisão que caminham para a posse de si, para a autenticidade, ou para a inautenticidade. Esta escolha livre, implica uma decisão e uma assunção de responsabilidades. Não decidir, também é escolher. Há que assumir todas as responsabilidades. Esta atitude de abertura constitui a realidade humana. A existência permite assim a realização da essência, ou a fusão com a essência.
Posted on: Thu, 03 Oct 2013 20:52:49 +0000

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