Reflexão Sobre o Recenseamento Manual ou Biométrico A - TopicsExpress



          

Reflexão Sobre o Recenseamento Manual ou Biométrico A conflitualidade no nosso país tornou-se endémica. Os últimos anos têm sido pródigos em acontecimentos nefastos para a boa saúde da nossa jovem nação. Desde os primórdios da introdução do sistema democrático multipartidário na Guiné-Bissau - regime democrático para cuja conquista e efectivação eu lutei e dei os melhores anos da minha juventude, de 1975 a 1991 - o recenseamento eleitoral tem vindo a constituir fonte de viciação prévia das eleições e , consequentemente fonte de descredibilização dos resultados eleitorais e de não legitimação dos vencedores. Sendo o candidato de todos os guineenses, de todos os partidos, que se revêm no Projecto Político anunciado e iniciado por Amílcar Cabral, e sendo eu o porta-estandarte da bandeira do perdão e da reconciliação, eu não pretendo agora apontar o dedo acusador a ninguém. Apenas quero ajudar a prevenir para que mais uma vez as próximas eleições não constituam mais um momento de gigantescas fraudes, de descrédito da democracia e de dúvidas, resultando na consequente ilegitimidade do poder que delas vier a emergir. A questão da legitimidade ou da ilegitimidade é fulcral para a criação e condições de estabilidade. Quando existem dúvidas sobre a legitimidade de um poder resultante de eleições duvidosas, não tardam a surgir várias formas de contestação a esse mesmo poder, incluindo a contestação por meios violentos tendentes a derrubar e substituir esse mesmo poder. A essência de uma vivência sem conflitos reside na capacidade de os prevenir. Um processo de recenseamento bem organizado e pouco permeável à fraude ajudará a assegurar a legitimidade e a autoridade do poder que resultar das eleições, prevenindo, certamente, ou erradicando possíveis conflitos pós eleitorais. Considero, desta forma necessária a ajuda da comunidade internacional para que a Guiné-Bissau possa organizar eleições acima de qualquer suspeita, pois essa é um pré-condição para estabilidade futura. Desde 1994, todos os actos eleitorais realizados na Guiné-Bissau foram custeados com o dinheiro da Comunidade Internacional e não do Estado guineense. É demasiado óbvio que nós necessitamos da ajuda da comunidade internacional para custear o recenseamento seja ele manual, manual com fotografia ou biométrico, sendo certo que a comunidade internacional sabe que a introdução do censo biométrico iria assegurar a credibilidade do processo, contribuindo enormemente para a criação de um clima de paz social e, acima de tudo, para umas eleições finalmente livres e justas. Desde há muito tempo eu defendo que para garantir a legitimidade e a autoridade do poder político devemos ter eleições “blindadas” contra a fraude, e isso traduz-se no recenseamento biométrico e na votação com urna electrónica. Quanto a este último aspecto, a cedência de urnas electrónicas, não parecem existir problemas, sendo somente uma questão de vontade política dos guineenses, pois há um país amigo que se manifesta disposto a ceder “urnas electrónicas com autonomia energética” desde que a Guiné-Bissau as solicite. Porém, para tal, é necessário que o parlamento reveja a Lei eleitoral. Quanto ao recenseamento biométrico, já “a porca torce o rabo”. Na verdade, o que acontece hoje é que existem entidades que têm um esquema de fraude muito bem montado e dão instruções a militantes ativos e a imigrantes para se recensearem em várias mesas, oito, dez, quinze mesas diferentes. E em cada mesa recebem um cartão de eleitor para poderem votar tantas vezes quantos os cartões que possuem, dez, doze, quinze vezes. Depois de votarem, eles diluem a tinta “indelével” e vão votar para outra “freguesia”. Ora, diz-se que o recenseamento manual melhorado consiste em colocar uma foto no cartão de eleitor. Ora bem, o que custa ao perpetrador da fraude ter dez fotos nos dez cartões que ele possui nos bolsos, em vez de ter apenas uma foto num cartão ? Fica, pois, evidente que o recenseamento manual melhorado não virá resolver o problema da fraude no recenseamento. O que se impõe que os responsáveis guineenses decidam é se vamos fazer o recenseamento biométrico (no qual a impressão digital e os dados biométricos ficam registados num banco de dados nacional, não permitindo que o “dono” de uma impressão digital possa votar mais de uma vez) ou se vamos fazer o recenseamento manual, ficando todos nós conscientes de que, mais uma vez, teremos eleições fraudulentas. (Já este texto estava concluído e a aguardar publicação, quando a diretoria de campanha foi informada da decisão tomada hoje no sentido da opção pelo chamado “recenseamento manual melhorado”). Os nossos irmãos que em Bissau representam a União Africana e as Nações Unidas estão munidos da mais genuína e empenhada boa vontade. Porém eles não decidem sobre os engajamentos financeiros e nisto, estamos nas mãos de quem nos doa / oferece o dinheiro para a organização das eleições, que são os decisores da comunidade internacional, isto é, os doadores. E estes consideram que os custos apresentados para o recenseamento biométrico são muito elevados, pelo que os guineenses deverão optar pelo que se decidiu chamar “recenseamento manual melhorado”. É evidente que, apesar do reconhecido empenho de alguns representantes da comunidade internacional, em Bissau, a comunidade internacional dá pouca ou nenhuma importância à Guiné-Bissau. Repito, quem olhe pra o Darfur, para a RDC e para outros países em post-conflito, apercebe-se de que a comunidade internacional dá apenas um pequena importância residual à Guiné-Bissau, independentemente da vontade pessoal que possam ter os seu representantes locais. E, infelizmente, as decisões não são tomadas pelos representantes que se encontram no terreno, mas sim por quem se encontra em Nova Iorque, em Bruxelas, etc. A Comunidade Internacional, particularmente em momentos de crise, pensa com as mãos na carteira, agarrando o dinheiro para este não fugir. E depois distribui o dinheiro parcimoniosamente ou não, em função dos interesses conjugados dos Estados. Por isso na RDC, país rico em minérios e em interesses, a Comunidade Internacional investiu rios de dinheiro para assegurar a realização de eleições . Se bem me lembro, foram cerca de 500 milhões de dólares. Ao invés, na Guiné-Bissau, os Estados que constituem a Comunidade Internacional nunca se empenharão a gastar recursos proporcionalmente semelhantes, enquanto o ouro, o petróleo, o zircão, os fosfatos, a bauxite, o cobre, o amianto e outros recursos da nossa terra não estiverem à mão de apanhar e levar. Nós, guineenses, temos de ter consciência disso, assumir o nosso falhanço que nos conduziu a esta dependência e lutar para restaurarmos o nosso orgulho nacional. Só os nossos verdadeiros irmãos, como foi visível esta semana com Timor – Leste, virão ao nosso encontro para nos auxiliar. De resto, estamos entregues à nossa sorte e viveremos das migalhas que caírem ao chão e que os outros pisarem. Por isso é que temos a obrigação de escutar Cabral e de nos reencontrarmos como povo e como nação unida, para traçarmos o nosso destino e escrevermos o nosso futuro com letras de ouro, com suor e com orgulho. Também se tem levantado o argumento do tempo que levaria a concluir o recenseamento biométrico (dizem que cerca de seis meses), o que levaria a que as eleições fossem realizadas apenas no primeiro trimestre de 2014. Porém, esse é um argumento que não colhe face às inúmeras experiências já realizadas em África. Tudo depende do volume de recursos financeiros que a comunidade internacional queira engajar. Com poucos kits de recenseamento o esforço poderá durar seis meses, mas com o triplo desses kits o recenseamento durará dois meses e com seis vezes mais kits o recenseamento biométrico durará apenas um mês, tal como o recenseamento manual. Na Guiné-Bissau há que recensear menos de 800.000 eleitores. Na RDC foram necessários seis meses para recensear 25 milhões de eleitores. Se a comunidade internacional aceitar doar PROPORCIONALMENTE à Guiné-Bissau os mesmos meios que cedeu à RDC, em 2005, para o recenseamento de 25 milhões de eleitores, nós, Guiné-Bissau necessitaríamos apenas de seis (6) dias para concluir o recenseamento de 800.000 eleitores. Fica, assim, claro que o problema para a comunidade internacional é o dinheiro que ela acha que a Guiné-Bissau não merece e não o tempo para se fazer o recenseamento. Para demonstrar que não é válido o argumento da falta de electricidade para fazer o recenseando biométrico eu refiro que os kits de recenseamento biométrico que foram utilizados no Togo e na RDC possuem baterias com autonomia energética até 18 horas. Quer isto dizer que as baterias dos kits podem ser carregadas durante a noite, com geradores instalados nas sedes de sector administrativo. Contra o argumento dos seis meses necessários para se fazer o recenseamento biométrico eu apresento os exemplos do Togo e da República Democrática do Congo. No Togo, foi possível fazer o recenseamento biométrico de três (3) milhões de eleitores em apenas quatro semanas. Para tal foram usados 2.500 kits móveis dotados de uma fonte de fornecimento de energia elétrica com duração de até 18 horas, consumíveis (cartões de eleitores em branco, tinta, CDs, etc.) e todos os demais dispositivos necessários para o recenseamento eleitoral: computador, câmara fotográfica, leitor de impressão digital e impressora. Um eloquente exemplo do interesse da comunidade internacional foi a RDC, onde foram recenseados 25 milhões de pessoas em 180 dias, representando uma média de 138.888 eleitores por dia. A esse ritmo, em seis dias podem ser registadas 833.328 eleitores, o que poderá ser mais do que o potencial universo eleitoral da Guiné-Bissau. Assim vistas as coisas, fica clara a vontade da comunidade internacional em ajudar a Guiné-Bissau a securizar e garantir a fiabilidade do seu sistema eleitoral. E então o que nos resta fazer? Neste momento de busca de patamares de entendimento comum, eu não irei destoar do consenso nacional que for encontrado relativamente ao modelo de recenseamento, acatando-o. Mas, se o que sempre me distinguiu na política guineense foi o meu compromisso com a verdade, eu não posso deixar de sublinhar que é possível securizar o processo eleitoral, fazendo o recenseamento biométrico no prazo de quatro semanas e a custos sustentáveis. É meu modesto entendimento que, apesar da nossa pobreza, nós, guineenses, devemos ser suficientemente competentes e argutos para podermos falar com a comunidade internacional em pé de igualdade, defendendo os legítimos interesses do nosso país. E, hoje por hoje, um dos nossos interesses fundamentais é que as eleições sejam tão perfeitas quanto a tecnologia permite, para que do resultado dessas eleições nós possamos fazer o cimento para construirmos os alicerces da estabilidade, condição indispensável para erigirmos o progresso e o bem-estar das nossas gentes. Das referências ao Togo e à RDC fica claro que é possível fazer o recenseamento biométrico em menos de um mês e que a falta de energia eléctrica pode ser superada usando kits de recenseamento que possuem autonomia energética (baterias). A questão de facto resume-se à indisponibilidade da comunidade internacional para fornecer à Guiné-Bissau os recursos financeiros necessários. Assim, se a comunidade internacional não nos concede os meios para fazermos o recenseamento biométrico, nós teremos de aceitar fazer o recenseamento manual, mesmo conscientes dos cancros que ele fará alastrar no nosso processo político e social. Então, meus irmãos, porque devemos ser nós a assumir o ónus da organização de umas eleições que quando correrem mal darão lugar à percepção internacional de que as falhas resultam da incompetência e da insanidade dos atores guineenses? Porque não decidimos delegar na comunidade internacional a responsabilidade de organizar as eleições presidências e legislativas que se avizinham? A política constituiu uma forma de satisfação das necessidades humanas através da soberania popular dos destinos colectivos concebidos através da representação exercida pelos homens bons que, através do voto, dedicam o seu tempo à coisa pública e à satisfação das necessidades colectivas. A essência das eleições é que elas devem servir para traduzir a escolha da maioria. Com o modelo actual de recenseamento não está assegurada a possibilidade da vontade da maioria se traduzir nos resultados eleitorais. Antes pelo contrário. Eu acredito que a essência do processo democrático não pode ser desvirtuada pela insistência num método (recenseamento manual) que não é credível para ninguém e já foi sucessivamente posto em causa por todos. Eu proponho que se opte por um método que não cause nenhuma contestação ao resultado eleitoral. Para o efeito, no futuro, eu defendo que o recenseamento biométrico seja obrigatório, para que não se ponho de maneira nenhuma em causa os resultados eleitorais e para que se iniba o desenvolvimento de possíveis fraudes. Duas notas finais relativas ao exercício do direito de voto na diáspora e à participação dos guineenses no exterior nas eleições presidenciais. Quanto à primeira questão quero salientar que não se pode deixar de fazer o recenseamento dos guineenses que vivem na diáspora para que possam participar nas eleições legislativas. É uma questão de respeito pelos nossos concidadãos que trabalham arduamente no estrangeiro para evitarem que a fome chegue ao nosso país. Por outro lado, é tempo de se introduzirem as alterações que se impõem na Lei Eleitoral, para que os guineenses residentes no exterior possam votar nas eleições presidências. A decisão de excluir os emigrantes do exercício do direito de voto nas eleições presidências foi tomada pela maioria num determinado contexto histórico, que hoje já não tem como ser sustentada e mantida. No actual momento politico não podemos por nenhum artifício proibir quem quer que seja e onde quer que esteja de contribuir activamente para definir os destinos do país. É fundamental rever a lei eleitoral para que os Guineenses que se encontram a viver no exterior, a diáspora da nossa terra que tem substituído a ajuda internacional num momento em que o nosso país está isolado, possa votar nas eleições presidenciais. A todos o meu muto obrigado pela atenção dispensada a este assunto que é crucial para a definição do Futuro da Nação Guineense. NOTAS: Togo: 3 milhões de eleitores inscritos, com 2.500 kits de inscrição em quatro semanas O sucesso deste projeto de registro em larga escala foi em grande parte devido às aplicações “user-friendly “ desenvolvidas pela Zetes, que eram facilmente acessíveis ao pessoal não especializado. O software escalável pode ser adaptada às necessidades específicas de gestão do Togo para o registo da população. A Zetes utiliza as tecnologias biométricas mais avançadas, garantindo a qualidade dos componentes, a confiabilidade dos algoritmos e, mais importante, a credibilidade do processo eleitoral. Congo RDC: Em 2005, a Zetes ganhou uma licitação do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), para a criação de 10 mil kits para a identificação e registo biométrico dos eleitores na República Democrática do Congo (RDC). O projeto inscrevia-se no âmbito do apoio ao processo eleitoral na RDC e exigia que todos os 10 mil kits de recenseamento biométrico fossem entregues no prazo de 8 semanas a partir da encomenda. Encomenda grande, necessidades complexas, prazos de entrega apertados: A Zetes foi capaz de cumprir os rígidos prazos de entrega,, mobilizando mais de 20 fornecedores e subcontratados para transportar os kits da Bélgica para a República Democrática do Congo. Os kits móveis desenvolvidos pela Zetes foram alojados em caixas de metal à prova de choque. Elas continham uma fonte de fornecimento de energia elétrica com duração de até 18 horas, consumíveis (cartões em branco dos eleitores, tinta, CDs, etc) e todos os dispositivos necessários pela equipe para completar o recenseamento eleitoral: computador, câmara, leitor de impressão digital e impressora. Os kits foram construídos para funcionar sob as circunstâncias mais difíceis em ambientes rurais e urbanos. Zetes desenvolveu também a solução de registo da população para a RDC, uma aplicação informática segura para a captura e registo de dados, fotografias e impressões digitais dos eleitores e também a produção e emissão imediata dos cartões de identificação dos eleitores. 25.000 Agentes de Recenseamento Formandos e 25 Milhões de Eleitores Recenseados: No terreno, a nível local, a Zetes montou uma equipa de 100 gestores de projecto para treinar 25.000 agentes de recenseamento e técnicos congoleses , habilitando-os a dar assistência técnica local durante a fase de recenseamento dos eleitores. A inscrição foi concluída entre junho e dezembro de 2005. Mais de 25 milhões de eleitores foram registrados com a ajuda da solução construída pela Zetes, superando as expectativas iniciais da Organização das Nações Unidas. A experiência adquirida com este contrato amplo e complexo, combinado com o profundo conhecimento que a Zetes possui do setor, coloca a empresa como um sólido integrador de sistemas para a identificação automática de pessoas, habilitando-a a lidar com projetos de todas as dimensões.
Posted on: Sun, 04 Aug 2013 13:19:43 +0000

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