Se há tanta gente indignada sem cenário de crise, truques - TopicsExpress



          

Se há tanta gente indignada sem cenário de crise, truques políticos não desanuviam a insatisfação A razão difusa da insegurança dos jovens talvez seja a percepção de que o processo de criação de riqueza nacional vai mal, negando o ufanismo da propaganda oficial 30/6/2013 - 01:29 - Antonio Machado A taxa de juros operada pelo Banco Central e a tropa de choque da polícia revelam situações anormais quando se tornam personagens da cena nacional. Noves fora os seus excessos, no entanto, ambas são sequelas de problemas não resolvidos. Não é o juro o problema. Nem a inflação contra a qual o BC aciona o juro como antídoto, mas o que a provoca, desestabilizando a economia e corroendo os salários. Tais considerações são úteis para se compreender o plebiscito que a presidente Dilma Rousseff propõe ao Congresso, fazendo da reforma política sua resposta contra a onda de protestos. A analogia com a febre, sintoma de algo errado e não a doença em si, também tem tudo a ver com este momento de incertezas, com as ruas em chamas - e não raro literalmente -, e a economia andando ao ritmo do para-anda. Juros nas alturas e estudantes protestando contra 20 centavos de aumento da passagem de ônibus são símbolos e instrumentos de ação. Isso é o que há a analisar e refletir e não as motivações factuais do grupo que foi às ruas pedir tarifa zero de transportes e acabou, em parte inflamadas pela brutalidade da polícia, atraindo multidões e um rol de reivindicações que muitos, especialmente os governantes acomodados, supunham só perturbar uma minoria ou até desconheciam. Se os protestos começaram pela esquerda, guiados pelo pequeno, mas barulhento, Movimento Passe Livre (MSL), em São Paulo, e foram fisgados pela “direita” mobilizada pelo Facebook, segundo o governo e o PT, isso só importa ao embate entre elas. Mas não são respostas às críticas ao mau funcionamento da saúde, à insegurança pública, à sensação de impunidade da corrupção, à baixa qualidade e alto custo dos transportes – as questões básicas que movimentam os protestos. Ou tais juízos estampados nos cartazes empunhados pelo pessoal nas ruas são verdadeiros ou não são. Esse é o fato relevante - a febre, por assim dizer, cabendo clinicar as suas causas. A tal direita, a rigor tão legítima quanto a esquerda enquanto escolhas políticas da sociedade, inseriu as mazelas dos serviços públicos nos protestos - aliás, a bordo do ônibus do MPL -, certamente porque há razões nas queixas. Ou não levaria tanta gente às ruas em todo o país. Não só de direita, de esquerda também, além da maioria apartidária. Panela de pressão social E por que só agora acontecem os protestos, vários violentos, como indagam os exegetas sociais? Primeiro, porque a campanha eleitoral pela reeleição de Dilma foi antecipada. Os governos costumam ficar mais “sensíveis” a reivindicações nestes tempos. E, segundo, porque os serviços públicos funcionam como panelas de pressão social. Surpreender-se com a violência, atribuindo-a só à ação de vândalos infiltrados nos grupos sociais, revela ignorância sobre o cotidiano da maioria da sociedade. A agressão a funcionários de hospitais do SUS, queima de ônibus, depredação de trens, tudo isso é recorrente, com causas muito objetivas: trens sujos, lotados, que quebram com frequência; falta de vaga nas UTI; polícia que chega batendo. Isso vem de anos, enraizando a percepção de omissão dos governantes. Desequilíbrio federativo Se a reforma política, começando pelo plebiscito que a presidente propõe ao Congresso, é o meio de atender tais reclamos, e, segundo ela expressou, “ouvir as vozes das ruas e transformá-las em energia institucional”, não se sabe. Sabe-se é que o financiamento público de campanhas eleitorais (demanda do PT) e o voto distrital (tese da oposição) não resolvem coisa alguma sem a reforma administrativa do Estado, profissionalização, investimentos e competência da máquina. Também não é um problema federal, a rigor, já que educação, saúde e segurança são servidas pelos governos regionais - os estados e os municípios. As responsabilidades entre os três níveis da Federação estão desequilibradas desde a Constituição de 1988, com os recursos concentrados na União e os serviços nas cidades. É um quadro que só se deteriora, já que o Congresso tem ampliado direitos da cidadania sem prever o financiamento do seu custeio ou jogando a despesa para o Tesouro Nacional, apesar dos déficits orçamentários da União. Ufanismo e os contrastes Ainda assim, as distorções federativas, acumuladas ao autismo dos governantes, não explicam tudo o que os jovens reclamam nas ruas, descontadas as propostas ideológicas, sabidamente inviáveis, como a tarifa zero nos transportes. A pista do que ocorre está no enésimo ciclo de alta da Selic para ajustar a demanda à produção doméstica insuficiente, compensada com importações. Está ai, talvez, a razão difusa da insegurança dos jovens: a percepção de que o processo de criação de riqueza nacional vai mal, negando o ufanismo ostentado até há poucas semanas. O luxo da Copa, confrontado à carência dos serviços públicos, foi como a gota que transborda a água do copo. O embargo institucional A presidente e os políticos estão certos ao dizer que os problemas atuais são políticos. Menos claro é o que os provoca. Anos a fio de inflação elevada, juros altos e viés estrutural de déficit fiscal e externo significam que a produção estagnou e a demanda deslanchou. O sentimento é que se bateu no teto pela terceira vez. A primeira levou à exaustão do modelo do PSDB, focado na solvência nacional. O que ficou relegado foi destaque nos dois governos Lula: o resgate da miséria absoluta. Agora é a vez do que ficou para trás nos 16 anos de PSDB e PT: a infraestrutura e o parque industrial. O dilema de Dilma é como ativar a expansão da riqueza nacional em sintonia com a solvência fiscal e as políticas de bem-estar. Há um embargo institucional. A reforma política pode removê-lo. Não há é clareza da intenção, nem da compreensão de que o maior obstáculo é o perfil paquidérmico do Estado brasileiro.
Posted on: Mon, 01 Jul 2013 13:20:04 +0000

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