Uma realidade agravada em tempo de crise. Uma assunto faldo - TopicsExpress



          

Uma realidade agravada em tempo de crise. Uma assunto faldo levianamente hoje fez-me recordar pessoas que já partiram. É preciso ter respeito e não rotular estas pessoas como doentes mentais até que a própria ciência não é concensual. Respeito pela dor alheia. E atenção muita atenção aos sinais! Deixo aqui um pequeno apontamento de algumas situações que nos poderão alertar e ajudar o próximo. As redes sociais são cada vez mais influentes. Ajudar o próximo esse é o lema. Estudos de autópsia psicológica (feitos com base em entrevistas com amigos, familiares e médicos do suicida) mostram que mais de 90% das pessoas que se mataram no mundo tinham alguma doença mental. Entretanto, doenças psiquiátricas não são condição suficiente para o comportamento suicida, já que outros fatores – emocionais, socioculturais e filosóficos – também entram em jogo. Na verdade, essas doenças provocam uma vulnerabilidade maior ao suicídio. “É comum que a pessoa, quando está com depressão, tenha pensamentos pessimistas, ache que a vida não vale a pena e que talvez fosse melhor morrer”, diz o psiquiatra Humberto Corrêa, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). “Mas a maioria dos deprimidos não tentará se matar. Somente os mais impulsivos e agressivos procuram o suicídio.” Hoje, sabe-se que indivíduos com alteração no metabolismo da serotonina – um dos mensageiros químicos mais importantes do nosso cérebro – apresentam maior risco de suicídio que os demais. Em sua pesquisa sobre a genética do comportamento suicida, Humberto analisou pacientes com depressão e esquizofrenia e constatou que todos aqueles que haviam tentado se matar tinham a chamada função serotoninérgica diminuída. (Ou seja, problemas no conjunto das etapas que envolvem a participação da serotonina: sua síntese, sua ligação com os receptores celulares e seu transporte. Se há falha em alguma etapa, a atuação desse neurotransmissor se reduz.) “Quanto maior a intencionalidade suicida e mais letal o método usado, menor a função cerebral da serotonina”, diz Humberto. O próximo passo é pesquisar que genes ligados ao funcionamento da serotonina – são mais de 20 – poderiam estar mais associados ao comportamento suicida. Diversos grupos internacionais dedicam-se a estudos desse tipo. O psiquiatra Pavel Hrdina, diretor do Laboratório de Neurofarmacologia da Universidade de Ottawa, Canadá, descobriu que pacientes depressivos portadores de uma mutação no gene responsável por codificar um dos receptores da serotonina apresentavam duas vezes mais chances de cometer suicídio que aqueles sem a mutação. “A alteração nesse gene aumenta o risco de ideação suicida e de tentativas de autodestruição em casos de depressão grave”, diz Hrdina. Os cientistas tentam agora entender a relação direta entre a serotonina e o suicídio. “Há uma forte evidência de que a serotonina inibe o comportamento violento, agressivo e impulsivo. Mas o que sabemos sobre a ligação entre esses comportamentos e o suicídio?”, escreve a psiquiatra americana Kay Redfield Jamison, portadora de depressão bipolar, familiarizada com a ideação suicida (ela mesma já tentou se matar) e autora do livro Quando a Noite Cai. “Embora muitos pacientes tenham planos bem formulados para o suicídio, a cronometragem definitiva e a decisão final para a ação costumam ser determinadas por impulso.” Portanto, os fatores biológicos são particularmente importantes para a decisão sobre quando apertar o botão “morrer”. A participação genética no suicídio vem sendo pesquisada desde a década de 1920. Um estudo feito na Dinamarca mostrou que os parentes biológicos de pessoas que foram adotadas quando recém-nascidas e que se suicidaram posteriormente tinham taxas de suicídio significativamente maiores que as observadas entre os parentes adotivos. Entre gêmeos idênticos, de acordo com uma pesquisa americana, a possibilidade de um irmão se matar caso o outro já tenha se suicidado gira em torno de 15%. Para os gêmeos não-idênticos, a taxa cai para 2% ou 3%. Tal componente genético poderia explicar, em parte, os casos de suicídio numa mesma família. Filhos de pais depressivos teriam uma predisposição maior à doença. Por isso, muitos especialistas incluem os parentes de um suicida no grupo de risco. Mas, no caso de padrão familiar para o suicídio, não só a genética pode exercer influência sobre o comportamento, mas também o modelo presente naquele núcleo social. Filhos podem se inspirar na solução que pais suicidas encontraram, por exemplo, de usar a morte como saída para um conflito. "Desculpa, não consegui" O escritor italiano Cesare Pavese (1908-1950), 12 anos antes de se matar com barbitúricos, tinha escrito: “Ninguém nunca deixa de ter um bom motivo para o suicídio”. A angústia existencial do suicida sempre vai fornecer justificativas para a sua morte. Ele sempre poderá enxergar a vida sem sentido ou ver prevalecer em si um sentimento neurótico de desvalia, derrota e de baixa auto-estima. Daí a criação de fantasias em torno da morte. Como se trata de um fenômeno pouco entendido e também considerado tabu (leia a matéria “Morte”, na Super de fevereiro de 2002), o suicídio geralmente é recriado de acordo com as expectativas do indivíduo. O suicida não pensa, por exemplo, que vai se decompor e virar pó. “O suicídio é um ato de linguagem, de comunicação. Como vivemos numa rede de relacionamentos, a nossa morte significa algo para as outras pessoas”, diz a psicóloga Maria Luiza Dias Garcia, coordenadora da Clínica de Psicoterapia Laços, em São Paulo, que analisou mensagens (bilhetes, cartas, gravações) deixadas por suicidas no livro Suicídio – Testemunhos do Adeus. “Constatei, pelos discursos, que o suicida está num quadro de embotamento, como se estivesse afogado nas próprias emoções. Ele não aproveita os vínculos sociais para partilhar seus sentimentos e vê o mundo de uma maneira muito própria.” O suicídio, então, torna-se um meio de expressão, uma fala que não pôde ser dita. Os especialistas costumam diferenciar as tentativas de suicídio do ato em si, uma vez que, de acordo com a intencionalidade e a letalidade, o gesto pode assumir sentidos diferentes. As tentativas de se matar são vistas como um grito por ajuda, sintoma de uma falha tanto no sistema familiar quanto no grupo social. “O indivíduo não consegue pedir socorro de outro modo, então opta por um ato extremo”, diz a psicóloga Denise Gimenez Ramos, da PUC de São Paulo. “Por que ele não foi ouvido? Todos dão conselhos, mas ninguém ouve o que ele tem a dizer. Esse indivíduo, portanto, fica com a impressão de que não existe para o mundo.” Incapazes de comunicar a própria dor, os suicidas recorrem a algumas fantasias para justificar a si mesmos a autodestruição. A busca de uma outra vida é uma das mais comuns. O indivíduo enxerga no suicídio a oportunidade de interromper uma existência infeliz e recomeçar, com uma nova chance para acertar. Matar-se também pode ser um jeito de acelerar o reencontro com pessoas queridas já mortas – o pai, a avó, um amigo, o cônjuge. Outras fantasias comuns acerca do suicídio: gesto de vingança ou rebeldia, castigo e autopenitência. “A idéia da não-existência é tão insuportável que a mente humana inevitavelmente recorre às fantasias para levar adiante o projeto de auto-aniquilamento”, diz Roosevelt Cassorla. Mas o indivíduo nem sempre tem acesso consciente a essas fantasias. Você pode argumentar que muita gente se vê em situações de grande desespero ou solidão existencial e, mesmo assim, não busca o suicídio. O que faz a diferença? Na verdade, não existe uma personalidade suicida – existe, sim, uma vulnerabilidade emocional (que pode ser trabalhada com o apoio de um parente, um psicoterapeuta ou um amigo). “Quem tem uma estrutura de ego frágil pode não suportar uma grande perda ou um momento de crise e, num impulso, acaba cometendo o suicídio”, diz Ingrid Esslinger. O ego se constitui a partir dos primeiros vínculos afetivos, do modo com que o bebê foi cuidado pelas figuras de apego e da educação que a criança recebeu. Um ego fraco não tolera a frustração, não tem capacidade de espera, não suporta lidar com a impotência, com os limites e com os “nãos” que a vida impõe. "O sistema mata!" Mesmo sendo resultado de uma escolha individual, o suicídio também é visto como uma questão social. O pioneiro no estudo desse campo foi o sociólogo francês Émile Durkheim (1858-1917), com o clássico O Suicídio, de 1897. “Existem vários estudos comprovando a influência da cultura, do ambiente e da religião sobre as taxas de suicídio, seja como facilitadores, seja como limitantes”, afirma José Manoel Bertolote. Ele e a equipe do Departamento de Saúde Mental e Toxicomanias da OMS publicaram recentemente um estudo, numa revista científica norueguesa, mostrando que as taxas de suicídio mais baixas encontram-se em países islâmicos, seguidos de países hinduístas, cristãos (mais baixas em católicos que em protestantes) e budistas, nessa ordem. As taxas mais altas vêm de países “ateus”, que compunham o antigo bloco comunista: Lituânia, Letônia, Estônia, Rússia, Cuba e China. A religião aparece, portanto, como um mecanismo de “proteção” contra o comportamento suicida (todas as crenças religiosas condenam, em maior ou menor grau, o suicídio). Combinada a outras influências, a religião pode ser também fator de estímulo para os “suicídios altruístas ou heróicos”, na definição de Durkheim. Cada membro do grupo está disposto a sacrificar a sua vida em prol das crenças. “Os casos mais recentes são os dos homens-bomba entre os palestinos e dos suicidas de 11 de setembro, relacionados a situações políticas muito específicas e à crença religiosa islâmica”, afirma Maria Cecília de Souza Minayo, doutora em Saúde Pública e professora da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), no Rio de Janeiro. Embora as mulheres sejam mais propícias a ter pensamentos suicidas que os homens, as taxas de suicídio masculino são mais elevadas. E os métodos que eles usam são mais definitivos e violentos, como uso de arma de fogo e enforcamento. Em média, ocorrem cerca de três suicídios masculinos para um feminino – com exceção de algumas regiões da Ásia, em especial na China, onde o número de mulheres que se matam supera o de homens e há mais casos no meio rural que nas cidades –, o que também contraria o padrão mundial. “A adolescência e a velhice são os dois momentos mais propícios tanto para a ideação e as tentativas de suicídio quanto para concretização do ato, por razões diferentes”, diz Cecília. Na velhice, os motivos com freqüência se devem à depressão, a sentimentos de rejeição e abandono e à dificuldade de aceitar certas enfermidades dolorosas e incapacitantes, como o câncer. “Na adolescência, os problemas de conflito familiar, de dificuldades de identificação, os sentimentos de perda ou de inferioridade, a baixa auto-estima, em casos específicos de personalidades com tendências depressivas e de isolamento, podem se associar e resultar em tentativas ou em atos de suicídio”, afirma ela. O cansaço existencial e as crises constantes também alimentam o desejo de morrer. "Eu não deveria existir" Para o filósofo e escritor argelino Albert Camus (1913-1960) só há um problema filosófico verdadeiramente sério sobre o qual o homem deve refletir: o suicídio. Segundo ele, a questão fundamental da filosofia é responder se vale a pena ou não viver. “O homem vive num clima de absurdo e pouco pode esperar da história. Esses obstáculos colocam a existência como um problema. Novamente, a pergunta se impõe: viver vale a pena?”, diz o filósofo Franklin Leopoldo e Silva, da USP. “Na perspectiva de Camus, o suicídio está sempre no horizonte do indivíduo porque a pergunta sobre a validade da vida é permanente. Isso não significa que a morte é a única solução. A saída pode ser o enfrentamento lúcido, ainda que um tanto solitário, desse clima de absurdo.” Uma reflexão filosófica mais profunda da contemporaneidade revela que a vida não é mais considerada um valor – pois, diante da moderna sociedade de consumo, perdeu gravemente o caráter sagrado – e, por isso, o suicídio também foi banalizado. Tornou-se alternativa descartável. “Já não representa mais um ato de contestação ou um ato exemplar nem parece resultado de uma dor psíquica insuportável, como foi no passado. O significado do suicídio também se perde nessa tendência ao não-pensamento que assola o mundo contemporâneo”, diz a filósofa Olgária Mattos, também da USP. A sociedade de consumo é falsamente hedonista: promete gratificação imediata e, ao mesmo tempo, frustra as próprias perspectivas que oferece. O suicídio seria também uma conseqüência dessa impulsividade: uma reação às promessas não cumpridas de felicidade e satisfação instantâneas e à decepção que daí decorre. “O suicídio, hoje, vem da dificuldade de entrar em contato consigo mesmo. O autoconhecimento dá trabalho, exige empenho e tolerância à frustração”, diz Olgária. A pergunta fundamental de Camus continua a nos martelar. “O suicídio agride porque nos diz o tempo inteiro da nossa possibilidade de escolha. Porque, se o outro faz isso, eu também posso ter essa escolha. Porque eu terei de me haver com o meu próprio potencial suicida, ou com o meu próprio desejo de morte”, diz Ingrid Esslinger. Levado às últimas conseqüências, o suicídio também pode parecer um ato de afronta a Deus. “Tirar a própria vida dá, ao indivíduo, a sensação de fazer algo que é divino e entrar em contato com o mistério”, afirma Denise Ramos. “O suicida passa da extrema impotência – não posso mudar nada – à extrema potência – acabo com a minha vida quando e como eu quero. Nesse momento, em sua fantasia, se iguala a Deus por provocar também um ato que vai além da natureza humana.” Para o teólogo e filósofo Renold Blank, da Pontifícia Faculdade de Teologia de São Paulo, tal atitude de achar-se o único responsável pela própria vida ultrapassa os limites éticos. “Do ponto de vista ético, a vida de cada ser humano tem sentido não só para si mesmo mas para os outros também”, diz ele. “Por meio da minha vida, dou sentido à vida dos outros e, assim, a minha existência ganha significado. Se acabo com a minha vida, acabo com todas as possibilidades de dar sentido à vida de outras pessoas. Falho em minha responsabilidade com os demais.” As ações de cada indivíduo repercutem no grande sistema de relações sociais e ganham uma dimensão histórica – o que é feito hoje, mesmo em âmbito pessoal, tem sempre uma conseqüência futura. O suicídio funciona, então, como uma brusca ruptura dessa rede. “O suicídio é um ato privado que não representa somente uma violência contra si mesmo mas também contra mais, pelo menos, seis pessoas. Elas são forçadas a conviver com os sentimentos de vingança, vergonha, culpa, sofrimento psicológico, medo de enlouquecer e de também cometer o suicídio”, afirma o suicidologista australiano Diego De Leo, diretor da Associação Internacional para a Prevenção do Suicídio (IASP, na sigla em inglês), organização não-governamental que reúne profissionais e entidades envolvidas no estudo do comportamento suicida. "Sei que voceis me perdoarão" Para enfrentar o problema, a OMS lançou, em 1999, o SUPRE, um programa mundial para a prevenção do suicídio. O objetivo é reduzir as taxas de mortalidade de “violência autodirigida”, acabar com o preconceito em relação ao tema e prestar assistência técnica aos países para a formulação de políticas públicas e programas de prevenção. As diretrizes se baseiam no tratamento adequado das doenças mentais, na criação de campanhas educativas e de estratégias, como reduzir o acesso a instrumentos de autodestruição – armas de fogo e venenos agrícolas, por exemplo. Na mesma época, a OMS criou o SUPRE-MISS, um projeto conduzido em oito países a fim de identificar fatores de risco para o suicídio e métodos eficazes para diminuir as tentativas de tirar a própria vida. A representante brasileira nesse estudo é a Unicamp. No núcleo familiar e comunitário, a melhor prevenção é falar sem temores sobre suicídio e saber identificar os pedidos de socorro das pessoas próximas. “Ninguém precisa dar uma solução para os problemas do outro, deve apenas aprender a ouvir. As pessoas encontram as soluções dentro de si quando conversam e refletem sobre seus conflitos e emoções”, diz Denise. Apostando nessa fórmula, existe o serviço de prevenção ao suicídio do Centro de Valorização da Vida (CVV), uma entidade não-governamental de atendimento humanitário criada há 40 anos e presente em todo o Brasil. O CVV segue os moldes dos Samaritanos, de Londres, uma entidade fundada no início dos anos 1950 para atender pessoas angustiadas que precisavam de apoio psicológico. Todos os voluntários são treinados para ouvir seus interlocutores (por telefone, carta, e-mail ou pessoalmente) sem nenhum tipo de julgamento e respeitar sua decisão, mesmo que seja a de cometer o suicídio. “Respeitamos o sofrimento de quem nos telefona. Ele tem a liberdade de falar sobre o que quiser durante o tempo que for necessário”, conta Adriana, voluntária do Posto da Vila Carrão, em São Paulo, e assessora de comunicação do CVV. “Estamos disponíveis para ouvir o que cada um tem a dizer sobre seus medos, dificuldades e angústias e ajudar a revalorizar a própria vida.” O serviço atende, em média, 1 milhão de ligações por ano. Isso revela a necessidade que as pessoas têm de falar sobre seus conflitos. Quando o assunto é suicídio, abrir-se pode ser terapêutico. A experiência do CVV, dos Samaritanos e de outros programas semelhantes demonstra que o primeiro passo para evitar o suicídio está no resgate do sentido da existência. “O que motiva o suicida é a falsa idéia de que sua vida não tem mais valor nem para si mesmo nem para os outros”, diz Renold Blank. O verdadeiro desafio parece fazer com que as pessoas percebam que sempre existe saída, não importa a situação. Que há como se reinventar e trabalhar em si mesmo aspectos de que gosta menos. Que nossa vida é importante para os outros também. E que sempre há alternativa, mesmo que, a princípio, seja dolorida. Afinal, a única coisa para a qual não há remédio é a morte. Os intertítulos e os bilhetes desta reportagem são de mensagens de pessoas que se suicidaram. "Tive medo de ser o próximo"
Posted on: Mon, 02 Sep 2013 23:06:05 +0000

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