É preciso estar atento e forte (por Marcelo Neder Cerqueira) Na - TopicsExpress



          

É preciso estar atento e forte (por Marcelo Neder Cerqueira) Na política, vale o efeito. Importa menos para onde mira o arqueiro, e mais onde cai a flecha. Neste sentido, as pertinentes ponderações dos líderes do Movimento pelo Passe Livre (MPL), alertando a manipulação estratégica realizada pela grande mídia – com destaque para a Rede Globo – e reivindicando as causas libertárias originais do movimento, fazem pouca diferença. A manobra de manipulação política contra o governo federal e a presidente Dilma já vem “pintando a cara” das manifestações desde a semana passada. E a tinta vai ser mais “branca” e “verde-amarela” quanto mais a classe-média sentir-se tocada pela revolta e insatisfação com “os políticos corruptos”, de forma genérica e indefinida. Ao contrário do que gostaria de acreditar, as manifestações não tem uma direção definida e estão sendo disputadas por diferentes grupos. O MPL, que puxou as primeiras mobilizações, tem uma direção definida; os partidos de esquerda, como PSOL e PSTU tem uma direção definida, inclusive de olho nas eleições; alguns representantes de movimentos sociais, agremiações estudantis, sindicatos de trabalhadores, estudantes e profissionais liberais e mesmo alguns militantes do PT, sem bandeira, claro, mas identificados na luta comum por direitos sociais também se posicionam de forma mais ou menos definida – e foi interessante observar na passeata de segunda feira, no Rio de Janeiro, certa união entre estes grupos distintos. Mas seria muita inocência acreditar que havia apenas estes interesses disputando o rumo das manifestações. No caso do Rio de Janeiro, especialmente, havia a militância do grupo do Anthony Garotinho que, como sabemos, vem fazendo forte oposição ao Sérgio Cabral e ao Governo Federal. A militância do Garotinho esteve presente na recente greve dos bombeiros, no Rio de Janeiro, e tem bastante influência entre os evangélicos. Portanto, ninguém deve estranhar quando provavelmente um taxista demonstrar certa simpatia pela manifestação, nem quando um bombeiro de ocasião gritar “Cabral ditador”. Neste caso, vale observar ainda, o grupo do Garotinho também assume um discurso crítico à Rede Globo – como sabemos, a emissora vem perdendo audiência entre os evangélicos que “se ligam” na TV Record. Isso se torna especialmente relevante quando estamos a menos de um mês do “megaevento” Jornada da Juventude Católica e da visita do Papa. A denúncia dos gastos excessivos do megaevento que favorece o interesse privado da Igreja Católica, neste caso, não parte apenas do campo socialista, que luta por uma sociedade mais democrática e laicizada. É preciso estar atento à diversidade de grupos políticos que se justapõe em diferentes discursos. Destacam-se ainda os interesses de grupos políticos infiltrados nas manifestações. Por mais que a indignação possa ter tomado um ou outro manifestante, as cenas de depredação e rebeldia exageradas guardam também certo “profissionalismo”, fazendo desconfiar sobre a presença de milícias infiltradas e grupos de extermínio que, apesar da transição democrática, não deixaram de manter suas atividades em todo Brasil. A ação da Polícia Militar de São Paulo na quinta feira passada deve ser compreendida neste diapasão. A quem interessa fazer das manifestações um cenário de guerra e terror desmedido? Que interesse político primeiro tira proveito deste cenário? Seria ingenuidade supor que uma Polícia Militar como a de São Paulo responde tão diretamente às ordens de políticos civis, em especial nestes momentos de tensão política, mesmo em se tratando de um governo tucano, por exemplo. Por mais que o Governo de São Paulo mude o discurso, e que o secretário de segurança proíba o uso da violência policial, existe um ou outro grupo dentro da Polícia Militar afeito a desobediência da hierarquia, que simplesmente não respeita ordens desse tipo. Na saída da Ditadura Militar, o Brasil não fez a transição da “polícia política” para uma “polícia cidadã”. O mesmo pode ser observado em outras instituições políticas. A insatisfação destes velhos setores paramilitares conservadores, afeitos à prática política antidemocrática e repressora, se torna ainda mais evidente quando destacamos o atual (embora limitado) debate promovido pela Comissão Nacional da Verdade. De fato, seria preciso discutir uma verdadeira reformulação das polícias militares, bastião conservador da ideologia da segurança nacional e do desrespeito aos direitos humanos. As cenas de “violência profissional sem farda” serão tão maiores quanto mais indeterminadas forem as grandes manifestações. Todavia, a “grande massa” da classe média que foi para a Avenida Rio Branco não tem uma direção política muito clara. Não foram exatamente no “Ato Unificado pelo Passe Livre”: foram antes no “white monday” dizer… “yes, we can”. Para eles pesa mais o sentimento genérico de insatisfação, esse tipo de lacerdismo latente que volta e meia toma o Rio de Janeiro. São manipuláveis por discursos ambíguos que exaltam uma suposta revolta da sociedade civil contra “os políticos”. São discursos que identificam a política como “sujeira”; discursos higienistas e puristas que dão voz aos sentimentos políticos mais profundos da cultura política burguesa, toda ela impregnada de teologia-política. Nessa cruzada contra a corrupção e contra “os governantes”, estes discursos, travestidos ironicamente na máscara anônima do quadrinho “V”, clamam por vingança contra a “classe política”, eleita democraticamente. Apesar das críticas ao sistema liberal representativo, e com todos os problemas da democracia brasileira, não podemos deixar de lutar por ela. Assim, sob a máscara pintada da rebeldia, a grande massa da classe-média encontra seu equilíbrio histérico para a defesa direta e sem culpa de seu interesse de classe. Os gritos de “Fora Dilma”, embora não tão presentes assim, dão margem para esta reorientação proposital do rumo das manifestações. Assim, não é de se estranhar que entre os gritos contra a corrupção, também os gritos de “sem partido, sem partido” foram entoados. Em alguns momentos, os manifestantes forçaram os partidos presentes a abaixarem suas bandeiras, com aplauso inclusive da grande mídia louvando tal orientação. Como sabido, muitas bandeiras de partidos socialistas foram quebradas e jogadas no fogo também. A grande massa da classe-média que foi às ruas vestiu-se de branco, pintou a cara de verde e amarelo. Não por acaso a expressão repetida por muitos o “gigante acordou” faz justamente alusão ao nacionalismo, tomando a expressão do hino nacional. A pergunta é: que “gigante” seria esse? A grande mídia, em aberta campanha eleitoral, conduz a “pacificação” da manifestação contra o Governo Federal, mas não me surpreenderia se, de uma hora para outra, transformasse radicalmente seu discurso insuflando a violência. De fato, o clima de terror e violência instaurado pelos “vândalos” ou “bandidos saqueadores” é manipulado pela grande mídia neste sentido. Neste caso, é importante compreender como a “pacificação” das manifestações é acompanhada pelo terror midiático, como duas faces da mesma moeda. Neste sentido, não devemos estranhar também se tivermos a impressão que o discurso da mídia ou de muitos de seus intelectuais pulem de um lado para o outro de forma aparentemente contraditória e bipolar. Nesta conjuntura é sempre bom relembrar que os grupos mais reacionários estão disputando as manifestações visando um improvável impeachment da Dilma – lembrando que neste caso assumiria o vice-presidente Michel Temer, do PMDB. A campanha eleitoral já começou. A grande mídia já tem seu candidato: o tucano Aécio Neves. Parece plausível supor também que Eduardo Campos, do PSB, ameace uma candidatura independente para pressionar a base do governo do PT. É notável o canto da sereia mobilizado pelos jornais visando a cooptação do Eduardo Campos, para dividir a base do governo. Por outro lado, a Marina Silva disputa pelo STF para garantir o registro do novo partido Rede. O ministro Gilmar Mendes expediu uma liminar contra o legislativo, endossando as recentes disputas entre o Supremo e o Legislativo. Para a oposição do PSDB e DEM, a candidatura da Marina Silva é vista como estrategicamente fundamental para tirar a popularidade da presidente Dilma. Assim, não devemos achar estranho que todos os discursos estejam confundidos numa voz aparentemente uníssona. Afinal, que político nesta conjuntura se colocará contra as manifestações? Até o comunicador Luciano Huck é a favor das manifestações… Mas todas estas avaliações críticas não tiram da cena o relevante debate político que está sendo realizado em todo do Brasil pela melhoria do transporte público e pela garantização deste direito universal que é a mobilidade e a locomoção democrática pelas cidades – direito que deve ser garantido para todas as classes sociais. A redução das tarifas declarada ontem pelas prefeituras do Rio de Janeiro e São Paulo, bem como de outras cidades pelo Brasil, foi uma vitória do MPL e dos movimentos sociais. Uma vitória limitada sim, mas foi uma vitória do campo democrático que luta para a ampliação do processo de democratização do país. Entretanto, cabe avaliar se a grande massa da classe média, afeita ao discurso indefinido contra a corrupção, estaria disposta a fazer um verdadeiro debate nas ruas em favor de um transporte efetivamente público. Isso significa que não basta que a prefeitura e governo estadual paguem o aumento, com redução de impostos, etc. Seria necessário rediscutir os contratos com as empresas e seus monopólios, visando diminuir a margem de lucro exorbitante dos empresários. Por outro lado, porque não, isso poderia conduzir um debate sobre a estatização do transporte público. Pergunta é: a “classe média cara-pintada”, afeita ao discurso contra “os governantes”, de forma genérica, endossaria esse tipo de discussão? Acredito ser preciso firmar que a principal bandeira unificada das manifestações deve ser o debate sobre o transporte público e a universalização deste direito para todos. Isso implica não apenas a redução dos preços, ou a melhoria da qualidade do serviço prestado, mas uma reflexão profunda sobre a política de transporte encampada em nossas cidades. Firmar esta bandeira é uma alternativa para a integração de diferentes interesses em cena nas manifestações, ao passo que funciona como um antídoto contra a manipulação política. pontuadas.wordpress/
Posted on: Fri, 21 Jun 2013 17:17:42 +0000

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