Achêêêi!!! Autoria e copyright by Rogerlando Cavalcante Numa - TopicsExpress



          

Achêêêi!!! Autoria e copyright by Rogerlando Cavalcante Numa calçada no centro de Independência as ondas do calçadão da orla de Copacabana no Rio de Janeiro me tragaram. Tomado por essas ondas, vibrei – deu vontade de correr e gritar: ACHEI! Heureca, pois, ali, num lampejo, se abriu a solução para o que há muito me propunha e, até então, não havia encontrado o meio mais convincente para desdobrar minha ideia de que Independência – como qualquer outro lugar deste país – reflete o Brasil. E, assim, poder discorrer, sem reducionismo bairrista, sobre diversos assuntos – desde os mais recentes, como as manifestações até o aumento da violência, passando por política, literatura, religião, artes e tudo que à medida que se mova, defina e redefina, inteire e reitere, mantenha e altere a nação e as noções de Brasil – e de Independência. E discorrer de modo a borrar, fundir, confundir as fronteiras entre conto, ensaio, poesia, gêneros literários enfim – e as da memória e as das e de histórias. Pois: como uma sombra que se levanta e anda um homem de terno e gravata amarrotados, vinha rumo aonde eu parara – ali na livraria de D. Hozanira –, quando o vi, de imediato vislumbrei nele um achado. Ligue a câmara do celular e o esperei se aproximar. Quando pisou a calçada da livraria disparei o flash. Um único disparo e o capturei todo apoiado no peito do pé esquerdo e perda direta suspenda como se o seu próximo passo o levasse não a pisar novamente o chão, mas a dele, se levantando, voar. Aí se deu o voo em que a calçada da Livraria de D. Horaniza e o Calçadão de Copacabana, por um inebriante bilionésimo de segundo, pairou no meu vislumbre e abaixo dos pés daquele homem desconhecido, a sombra andante de chapéu. Sombra que seguiu e se desmanchou ao pino do sol do meio dia. Sua face, porém, me ficou em linhas e traços a mais que configurarem um rosto – e alguma identidade –, um enigma a ser decifrado e, ao ser decifrado, tornar-se novamente, nas incessantes ondas do mundo e do homem, incógnita. Ainda, antes de comprar a prancheta e voltar para casa, revi extasiado o flash, a abertura através da qual posso agora capturar o Brasil, Independência e o mundo. E nestas ondas como metáforas perscrutarei o ethos do brasileiro, não a busca de uma explicação última, mas a entender o que o atende e, ao pronunciá-lo, para saber por quais nomes responde e por quais atende – e a quais é surdo. Os desenhos portugueses e em pedra portuguesa do calçadão de Copacabana e os em azulejo da calçada da Livraria de D. Horaniza sugerem ondas em movimento. Dispostos, porém, longitudinal, o de Copacabana e o da calçada em Independência, latitudinal, apontam para um movimento de localização por coordenadas geográficas – e gráficas. Do encontro destas ondas, nos meus textos, emergirá – espero –, porém, mais que apenas, como já indiquei, mapas e indicação de endereços e mais que convergente e/ou divergentes paralelismos. (Acrescento dois detalhes fundamentais da fotografia: a figura, de boné amarelo, que aparece ao lado e involuntariamente aponta para a calçada e ao fundo, por trás das nuvens, o céu de iluminado azul. E chamo à atenção para tais e significativos pormenores para lembrar que a fotografia não é, por si, uma importante arte, mas a banalização da arte; aliás, sem um discurso indutor, a fotografia não se sustenta como arte - mas essa questão pede um outro ensaio: voltarei, futuramente, ao tema. Antes saliento: note-se que a fotografia que fiz teria pouca relevância sem todo esse meu discurso que faço sobre ela. Note-se ainda: não nomeio as personagens da foto, não nomeio porque, a uma, não sei quem são; a duas, porque elas não me deram tempo de lhes cumprimentar e perguntar-lhes, ao menos, os nomes - mas asseguro, as encontrando novamente, as deterei efetivamente para além desta retenção instantânea e lhes anotarei, aqui também, os nomes). Então, por que saliento este tema aqui? Porque para mim as palavras evocam imagens, e as imagens precisa de palavras para o testamento de sua validade, precisam nem que seja de uma palavra. Se as palavras e as imagens passam – e passam e também perdem sentidos e significados –, então, para restarem como algo, é que são complementares: uma não se dá sem a outra. Não há relevo, não há pronuncia, não há entendimento sem a fusão delas. Sem a fusão delas não há calçadão em Copacabana na calçada da Livraria de D. Horaniza, e nem uma sombra que passem sobre os desenhos das ondas que seus pisos estampam. E mais: a calçada que contorna todo Mercado Público Municipal de Independência,e a de um vizinho de gente minha, também flutuam nas mesmas ondas. Aquele homem que fotografei e me sugeriu tudo isso, ignora tudo isso. De modo que ele, para mim, é ele, digo, uma sugestiva e poderosa imagem; e se ele me ignora, ele não pode ser sem mim. Alteridade, eis de que falo. Por que alteridade? A alteridade permite transporto fronteiras, geografias, idiomas, culturas e apresentar o ser em movimentos entre eu e tu e nós e eles, a se atar e se desatar os nós que somos nós. Nós que resultamos das interações, inter-relações, relações e contradições próprias de qualquer pessoa, em qualquer idade e em quaisquer e de quaisquer sociedades: a independenciense ou a carioca, chinesa ou americana, a ianomâmi, a hindu, a basca e a que tenha por dialeto assovios, e mais todas as que conheçam o calçadão de Copacabana sem pisar sequer a calçada de Independência, e as que pisem a calçada de Independência sem sequer imaginarem a existência de Londres, ande descalço na Amazônia, ou nas montanhas de Tora Bora. A silhueta formada pelo corpo engravatado e a curta sombra derramada sobre a calçada comporta qualquer pessoa. O rosto pode ser substituído por qualquer outro. E preservando a silhueta, ainda que modificada e lembre qualquer outra coisa que não o homem, a paisagem que pisa também comporta qualquer outra – meme à silhueta. Então, ali em sombra e silhueta, vislumbrei naquela figura minha face e todo meu ser, agora como uma imagem desapegada de mim, uma imagem do mundo, um reflexo móvel do outro, que me captura numa sugestão e sucessão de ondas, ondas prestes a tornarem-se asas e levantarem voo no próximo passo que, dado, ecoa e se propaga, indo de Independência para o infinito, e, em luz, vindo do mundo para a silhueta que comporta na leveza da sombra o peso de ser – e o da existência.
Posted on: Tue, 24 Sep 2013 19:22:58 +0000

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