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Ainda é complicado levar adiante uma análise lúcida sobre a série de protestos que tomaram conta das ruas do país nas últimas semanas. Decidi então, limitando-me ao que ocorreu em Belo Horizonte, tecer algumas conclusões provisórias sobre certos aspectos das manifestações de rua por aqui. Se durante a maior parte do protesto, a multidão que ali estava parecia se caracterizar por uma pluralidade imensa de reivindicações, muitas vezes contraditórias entre si, houve, ontem, um ponto de convergência perceptível entre vontades que apontavam, no mais das vezes, em sentidos diferentes. Em um dado momento, na manifestação de ontem (não estava lá, assisti pelo Pos Tv), me pareceu que a reivindicação de parte considerável das pessoas era apenas chegar ao Mineirão. Na segunda e no sábado os manifestantes foram impedidos de alcançar esse intento de forma abusiva, violenta e sem sentido. Ninguém apresentou um bom motivo para as bombas e as balas de borracha e para o cerceamento do direito de manifestação. Não, não se diga que a alegação de que a partir de determinado ponto é o território indevassável da FIFA é um bom motivo. Nem mesmo as pessoas sensatas e pouco dispostas ao quebra-quebra que possuam um espírito minimamente questionador seriam capazes de se contentar com essa justificativa. Ela não só não tem nexo, como é afrontosa à nossa inteligência. Aqui em Belo Horizonte, em grande medida, a demanda é pela cidade, pelo direito de usufruir da cidade. Isso, para mim, ficou claro. A truculência com que a polícia agiu nas últimas manifestações (e com que age, via de regra, nas vilas, favelas, comunidades pobres e ocupações por aqui) provavelmente serviu de combustível para as ações daqueles a quem a imprensa insiste em qualificar de “vândalos infiltrados entre os manifestantes”. Quando a imprensa lança mão desse curioso artifício, não acredito que ela esteja falando dos policiais infiltrados que, segundo alguns relatos, agiram como agentes provocadores em dadas situações. A imprensa fala, nesse caso, de um tipo de manifestante que, por seu modo de agir, não mereceria o nome de manifestante, mas um outro, deletério, indigno, que ajudaria a criar uma dicotomia entre NÓS, pessoas de bem e de bens, cuja forma de manifestação se esgota em um caminhar ordenado por áreas permitidas, e ELES, que quebram coisas, desobedecem a polícia e, que muito embora comecem a fazer isso, geralmente, DEPOIS de um ataque da polícia, acabam, nesse tipo de discurso, por deslegitimar o “movimento” e por justificar a ação nada seletiva e abusiva da polícia militar mineira. Quando ELES agem, NÓS também, se não sairmos correndo daqueles que deveriam nos proteger, respiraremos gás tóxico, levaremos bala de borracha nos olhos, no lombo, na testa, nos membros e, apenas por estarmos lá, corremos o risco de sermos detidos. Se não saímos a tempo, NÓS nos incorporamos magicamente a ELES e seremos, a partir de daí, tão vândalos, baderneiros e arruaceiros quanto qualquer pessoa que joga uma pedra em uma vidraça. Por um tempinho. As coisas, é sempre necessário explicar, são mais fluidas quando estamos falando de uma multidão heterogênea que resolveu se formar para ganhar as ruas. O nós e eles do cotidiano, reproduzido, de certa maneira, no discurso midiático, não serve para descrever a dinâmica de uma manifestação que reúne dezenas de milhares de pessoas. Os “vândalos” das manifestações de BH destoam muito da imagem identificada com a classe média universitária que, em muitas análises, constituem o núcleo duro do fenômeno. São ou parecem ser jovens de periferia, das vilas e favelas, para os quais a violência é uma linguagem cotidiana, ditada, muitas vezes, pela própria ação policial, pela ausência de aparatos de estado, por carências materiais múltiplas, pelo preconceito generalizado. Se este é um momento de catarse para a classe média, porque não seria para eles? Assim, se a sua indignação se contenta com um nariz de palhaço, uma cartolina e com o rosto pintado de verde e amarelo, acostume-se com o fato de que isso não é o suficiente para muita gente. Para aqueles que depositam toda a conta da quebradeira em agentes provocadores da polícia, da direita ou de “grupos radicais”: parem. Para que a provocação surta efeito, é preciso haver um campo fértil e o campo, aqui em BH se mostrou tão fértil, mas tão fértil, que me pergunto se foi mesmo necessária a semeadura por parte de grupos com interesses escusos. Não duvido de infiltração, mas certamente o fenômeno nem se explica e nem se resume a isso. Antes que me acusem de apologia de qualquer coisa: não concordo com violência, não mesmo, mas nesse particular só posso falar por mim. Ninguém me deu procuração para pautar os protestos alheios. Não são vândalos, são manifestantes. Vamos entender. ** Pedro Munhoz (@pedromunhoz5
Posted on: Fri, 28 Jun 2013 23:27:41 +0000

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