Bem, desde cedo fui o tipo de idiota que trocou a escola por - TopicsExpress



          

Bem, desde cedo fui o tipo de idiota que trocou a escola por qualquer trabalho inútil e mal pago, pra fazer as pessoas calarem a boca em ficarem me chamando de vagabundo e muitas vezes, simplesmente larguei a escola porque estava de saco cheio e não tinha ninguém pra me cobrar. Fui um macaquinho míope e medíocre que não tinha ambição ou visão de porra nenhuma e isso copiava bem as pessoas que estavam ao meu redor. Pra dizer a grande verdade, nunca gostei de estudar nem de ir à escola desde a quarta série, quando mudando de casa em casa acabei mudando de escola pra escola, me obrigando a mudar de amigos e a me adaptar a toda aquela coisa de novo. Tem certos micro-universos em uma escola que parecem ser mais importantes pra um aluno desorientado, como se socializar e se adaptar, do que simplesmente estudar. Isso cria uma hierarquia de prioridades. Mas eu não vou falar disso. Posso também falar de aprendizado e justamente do aprendizado que tenho na faculdade. Quando entrei nela, depois de finalmente ter concluído o ensino médio fazendo uma prova idiota de 5 horas, depois fazendo o vestibular com outra prova idiota de 5 horas, senti um baque, como se tivesse vivido em uma era medieval e então entrado em um túnel do tempo saindo numa fábrica de automóveis, ou seja, senti como se tivesse paralisado em algum iceberg durante a era glacial e tivesse saído do meu longo e demorado sono criogênico, vendo um mundo cheio de coisas que não compreendia. Não entendia lhufas do que os professores falavam. Me sentia perdido, frustrado, inútil, incapaz e percebi o quão estúpido e precário havia sido o meu aprendizado na escola. Sabe, se sentir incapaz pode ter consequências bem graves na perspectiva de vida de uma pessoa. E culpa caía nos meus ombros, como se fosse tudo um castigo que estava pagando por ter sido tão negligente com a escola. Faziam tantos anos que eu estava parado que não lembrava nem dos nomes das escolas que estudei (e foram muitas...). Mas mais uma vez, não é disso que vou falar. Não vou mentir, cresci vendo matéria de exatas como uma desgraça que conseguia me dar dor de cabeça e enfurecer meu Id em poucos segundos. Aquela merda simplesmente não fazia sentido e muito dela, ainda não faz. Ambiguamente eu gostava de ciência e sentia fascínio por ela. Quantas noites passei olhando pros cadernos lotados de números, quando dores começavam a brotar no pescoço, na cabeça, nas costas, nos ombros. Frustrante. Eu não entendia e por mais que tentasse entender, não conseguia. Passava aulas completamente em branco, como se tivesse visto um monólogo em chinês de duas horas, tendo a vaga noção do que o cara estava falando. Vídeo aulas, livros, textos...e eu me sentia perdido. Mas antes de tudo, antes de tudo mesmo, quero falar dos meus professores. Eu engoli, goela abaixo mesmo, o que um dos meus professores (o cara que eu mais pagava pau) falou em uma certa aula de matemática: "Ser um entusiasta da ciência não significa que será um bom cientista!". Sério, eu acreditei nessa grande e estúpida idiotice que ele falou e cheguei até a recitar como um mantra, pra alguns dos meus amigos, toda vez que a gente comentava sobre as nossas não tão brilhantes performances acadêmicas. Sabe, o que esse professor no fundo quis dizer é que gostar de ciência não significa nada. Mas é muito, mas muuuito pelo contrário: NÃO GOSTAR DE CIÊNCIA, de MATEMÁTICA é que é o XIS (um enorme XIS, o maior de todos os XIS da porra da matemática) da questão. E durante toda a nossa merda de vida, nos fizeram ODIAR matemática, REPUDIAR EXATAS. A única e verdadeira intenção desse professor foi massacrar o único trunfo que me fazia levantar às 5 da manhã, entrar em um ônibus lotado pra ir pra faculdade e depois dormir 3 horas por noite por causa dos estudos: PORQUE EU AMO CIÊNCIA! E isso queria dizer então que eu não seria um bom cientista, que todo esse apego que eu tenho ao que eu persigo não significava nada? E era justamente a maneira rebuscada que ele falava e escrevia, o jeito com que ele apresentava uma noção tão ridiculamente simples mas tão bem enfeitada que se tornava absolutamente complexa e confusa, como uma punhetagem na cara dos alunos, esporrando a verborragia matemática nos nossos rostos, que o pobre mortal aqui, um escroto de supletivo, ficava pasmo com o conhecimento da criatura, mas entendendo menos do que deveria. Se o objetivo dele era acabar com meu entusiasmo, ele QUASE conseguiu. Quase conseguiu me fazer acreditar que na verdade eu não sou bom em matemática, não sou bom em física, que não entendo as coisas da ciência, que só sou um bosta que reproduz coisas interessantes que leio em revistas de entretenimento científico e fica babando com ciência de verdade. QUASE me fez acreditar que eu nunca seria bom naquilo que eu mais gostava e que mesmo completamente apaixonado por todos os ramos da ciência, eu continuava um bosta sem perspectiva porque não sou bom em exatas. Mas FODA-SE. A grande verdade: O cara está completamente errado e foi um péssimo professor, justamente porque eu não entendi a merda da matéria dele, mesmo relendo, mesmo perguntando, porque a lógica daquela porcaria estava escondida por trás de regras, mais regras, decorebas, rebuscações, prolixidades, pomposidades acadêmicas e uma caganeira homérica de abstrações. Não deixe NINGUÉM te dizer esse tipo de porcaria, de que você não presta pra exatas, essa mitologia, essa crença, essa superstição. Estamos todos na mesmo caralho de barco, em um país de bosta com a pior educação matemática do mundo e tem gente QUE FAZ MILAGRE, QUE TIRA ÁGUA DE PEDRA, CONSEGUINDO PASSAR EM CÁLCULO, em química, em física, em qualquer caralho de exatas, mesmo que teve essa educação ridícula de professores mal preparados nas escolas públicas E particulares. E sem contar em algumas pérolas que ouvi de outros professores, incluindo dos próprios alunos, incluindo eu mesmo: "Olha, quando a pessoa não tem jeito pra exatas, não há nada que faça ela entender!" "É melhor você mudar de curso mesmo, já deu pra perceber que isso não é pra você. Olha o tanto de semestre que você já repetiu" "Matemática é um DOM. Tem gente que nasce com o dom. Tem gente que não. Inclusive, se você não tem o dom pra entender ciência, provavelmente terá um dom em algo diferente! Por isso que, se você não é bom, é melhor partir pra outra coisa" "Isso é muuuito fácil. Se você não entende isso, acho que o problema é com você!" E quantas e quantas vomitadas eu ouvi nessa minha fase embrionária na faculdade. MENTIRAS. SÃO TODAS MENTIRAS. Toda essa maneira com que vemos a física, a matemática, a química etç como disciplinas gélidas, rígidas, misteriosamente confusas, sistematicamente regradas com coisas sem explicação, mundaréus complexos, cheias de leis confusas mas que precisavam ser decoradas e seguidas à risca, foram todos ESTUPROS que cometeram contra nós durante todos esses anos. VIOLENTARAM aquela criança curiosa que existia dentro de nós, aquele pequeno cientista querendo conhecer o mundo e entender as coisas, nos traumatizando com um inferno de decorebas, de regras sem sentido, de metodologias ilógicas e desconexas com o mundo, durante anos e anos e anos, até que a nossa natureza curiosa desistiu e como se estivesse lobotomizada, se cansou, se irritou, se reclusou, se contraiu. TODOS podem aprender exatas. Todos são capazes de serem cientistas exímios. Todos somos capazes de carregar a matemática como uma segunda língua e a física como amiga.Todos podemos entender mesmo as coisas mais complexas. Pra quem já tá violentado, tudo o que resta pra nós, com essas feridas abertas de um sistema educacional escroto e falho, é tentar se reerguer e se empenhar em se reconstruir como um ser humano curioso. Eu AINDA estou tentando encontrar meu caminho, uma forma de remediar isso, ainda estou tentando me recuperar de uma vida toda dentro de um buraco, completamente cego e atado. A única coisa que posso dizer a meus amigos de exatas é NÃO DESISTA DESSE CARALHO. "Não pensa que a cabeça aguenta se você parar!" E desejo de coração que essa realidade brasileira mude um dia e quem leu até aqui: pode ter a porra da certeza de que eu vou participar disso. Eu vou ajudar a mudar isso! Eu admito, tenho culpa de ser burro, mas a escola teve toda e a completa culpa em assassinar a minha intenção em deixar de ser um. E NUNCA SE SINTA ORGULHOSO DE DECORAR COISAS DE EXATAS. Isso não é motivo de orgulho. Se sinta orgulhoso de entendê-las, no mínimo. Eu não sou mão de obra. Eu sou um ser humano, governo cretino, desgraçado, demagógico, imbecil, burro. E POR QUE O FILHO DA PUTA DO PEDRINHO COMPRARIA 232 MAÇÃS? HEIN? "Michel, fica quieto e faça o exercício..." - foi o que o meu professor disse. PS: Não, a ideia desse "longo" livro no Facebook não saiu de uma palestra do Prandiano. Saiu de um courseware que faço pela Standford University sobre a decadência do aprendizado de exatas, que me ligou com diversos artigos de educadores e ex alunos de exatas, contando suas experiências. São bilhões de pessoas com o mesmo problema. Nos EUA, só 1 em cada 10 alunos conseguem terminar um curso de exatas e 70% ficam retidos nas disciplinas desse tipo. Isso por que lá é primeiro mundo.
Posted on: Sat, 31 Aug 2013 17:22:46 +0000

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