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Fonte: soloproibido.br/conto-de-terror/a-casa-abandonada/#more-749 A CASA ABANDONADA Me falta coragem para deitar na cama e fechar os olhos. Estou com medo de dormir, estou aflito. É um incomodo que domina minha alma, é o resultado de um pesadelo surreal. Assustado e a procura de um remédio para esse tormento, encontrei em folhas vazias, de um caderno antigo, um espaço para distribuir minha angústia. Escrevo agora para deixar a dor ir embora, para deixar de ser prisioneiro de minhas memórias. Não sei se vai funcionar, mas essa é a única saída. Sim, parece um ato exagerado e quase que sem sentido, mas em breve você irá entender. Você, esse que pode ser qualquer um, pode até mesmo ser outro eu. Antes, gostaria de me apresentar, deixar aqui registrado alguns fatos importantes, para que você entenda o quão sincero serei. Me chamo Lúcio e sou escritor. Pelo menos é isso que dizem. Gosto de contar estórias, inventar mundos e possibilidades, mas nunca fui o tipo de cara que transcreve sonhos ou pesadelos. Minhas ideias sempre partem do lado consciente de minha cabeça, ou de simples situações que me chamam atenção. Não estranhe o ritmo mal construído em certos momentos ou a pontuação desconexa. Pois isso aqui não é um trabalho de ficção, mas poderá ser, amanhã, se eu vir a acordar. Bom, já fazem três meses que me mudei para Ponta Grossa, mudei porque queria viver em outro lugar, não estava mais aguentando ficar na capital. Trânsito demais, barulho demais, pessoas demais. Agora moro em um bairro simples, no subúrbio da cidade e leciono na Universidade Estadual do Paraná. Nesses aspecto, as coisas andam bem. Na verdade, se não fosse pelos acontecimentos da última noite, tudo estaria perfeito. Acontecimentos estranhos onde os culpados por eles são a minha curiosidade e a casa abandonada. Vou lhe contar o que houve ontem, acreditar ou não no meu relato não é uma necessidade, quero que apenas sinta tudo o que narrarei. Tudo começou ontem a noite… Eu estava sentado no sofá, um sofá velho, de cor amarela e que tinha o cheiro de nunca ter sido lavado, mofo, sabe? Em minha frente uma pequena estante marrom, com nada mais que uma TV. O televisor estava ligado, mas em um daqueles canais fora do ar e eu olhava para os rabiscos cinzas, lembrando de quando era criança. Época em que eu comparava aquela falta de sinal com milhares de formiguinhas correndo de um lado para o outro, hoje essa ideia soa tão ridícula, mas por algum motivo, essa é uma memória permanente. Meus pensamentos se perderam quando ouvi um barulho. Assustado levantei e procurei pela origem do som. Se meus ouvidos estavam certos o barulho vinha do segundo andar. Foi ai que entendi onde eu realmente estava. Aquela era a casa que ficava do outro lado da rua, a casa abandonada. Lugar que eu observava durante os últimos dois meses. Fazia isso a procura de inspiração. Pois sempre achei que o lugar era um bom espaço para um conto de terror. Narrativa a qual nunca me aventurei. Sem saber como havia entrado ali, afinal minha mente estava vazia. Fui tomado por um calafrio, e os comentários feitos pelos vizinhos, passaram a preencher o branco de minha mente. Comentários que diziam que aquela casa era mal-assombrada, que a família anterior os Siqueiras, haviam passado por uma tragédia naquele local. “Foi tudo obra do capeta”. Ouvi uma velha que morava ali na rua dizer. A casa era um pequeno sobrado, parecia ter o estilo da construção dos anos 90, poucos detalhes, tinta descascada, madeira podre em alguns lugares, duas janelas grandes em baixo e três janelas pequenas em cima. O telhado é daqueles que lembram um chapéu. As vezes quando eu não tinha o que fazer, ia até a minha janela e ficava pensando sobre o que existia lá dentro da casa abandonada. Será que ela era mesmo abandonada? O que havia acontecido com a família que ali morou? E aquela vontade que só es escritores sentem de ficcionar o real, batia em meu peito. Mas faltava a ideia, a situação. Eram tantas dúvidas! As vezes odeio ser tão curioso. Tentei várias vezes conseguir respostas com os vizinhos, mas nunca funcionava. A Senhora Izabel que morava ao meu lado uma vez disse que eu deveria deixar o mal dormindo e não me meter com a casa, acho que essa foi uma das respostas que eu mais gostei, isso para vocês verem o nível de minha curiosidade. “O mal está dormindo.”, e aquela frase ficou, martelando em minha cabeça. No momento que me vi parado, na sala da casa velha. Aceitei a mirabolante ideia de que poderia responder todas as minhas perguntas, explorar a casa e ter um insight para a escrita de meu primeiro conto de terror. Mas havia outra voz em minha cabeça. Uma que estava com medo. Era o lado da razão, que tentava aos poucos tapar o buraco presente em minhas memórias e colocar uma explicação lógica para o fato de eu estar ali. Tentei então organizar as coisas e construir uma verdade, afinal não é isso que as pessoas fazem quando estão perdidas ou em situações sobrenaturais? E assim, aceitei a ideia de que havia entrado ali movido pelo meu desejo de conhecer a estranha casa e que acabei vendo a TV, depois tentei liga-lá e a mesma funcionou, ai misteriosamente peguei no sono e só despertei com o barulho. Como podem ver, resolvi aceitar tudo da maneira mais fácil. E só agora, um dia depois, me lembrei que na casa abandonada não havia energia, estava ai um furo na minha “verdade”. Depois de pensar resolvi conferir o que era o barulho, mas antes andei pelo primeiro andar para conhecer aquela velha residencia. Em baixo ficava a sala que era onde acabei começando minha aventura, depois havia uma cozinha, onde só tinha um fogão, um armário e alguns ratos. Ainda no primeiro andar encontrei um banheiro que estava simplesmente podre. Com certeza ladrões e drogados já haviam vivido ali por um tempo e usado aquele banheiro como se fossem os verdadeiros donos. Conferi todas as peças e então tomei a atitude de subir as escadas, ao encontro das batidas. O som lembrava pancadas em uma parede. A cada passo que dava na escada, eu escutava a madeira ranger. Pode até parecer engraçado mas enquanto subia, imaginava aquela escada cantando para mim. Meus passos davam a impressão de criar uma sinfonia. Quando cheguei no segundo andar encarei um velho corredor e nele vi três portas. Era da última que o som vinha. Comecei a avançar e o medo mesclado com a curiosidade fez com que eu conferisse o que havia nas outras portas também. Ainda bem que olhei, pois acho que se não tivesse feito, eu não estaria preparado para ver o que tinha atrás da última. A primeira porta era de um quarto de casal. Eu conseguia ver uma grande cama velha em um canto. Mas o que realmente me surpreendeu, foi a visão que tive quando olhei para o outro lado do quarto. Vi um casal. Os dois pendiam no ar, enforcados. Eles sorriam para mim. Seus corpos balançavam como se estivessem dançando, dançando ao ritmo das batidas que vinham da última porta, ao som da mesma sinfonia produzida pelo ranger da escada. Sobressaltado dei um pulo para trás, esfreguei meus olhos e quando olhei de novo não havia mais nada lá, a não ser duas cordas podres penduradas. Sai dali e decidi que o melhor era ir embora, mas então ouvi um choro, um choro de criança. E agora, o que devo fazer? Olhei para o corredor, só faltavam duas portas. Se eu já tinha chegado até ali, iria até o final. E o orgulho nos levando para o fundo do poço. Caminhei na direção da segunda porta. Está estava entre aberta, empurrei e então vi uma das cenas mais horríveis de minha vida, o quarto estava vazio, mas fedia muito e suas paredes era feitas de restos humanos. Retalhos de corpos colados por todos os cantos. Uma decoração demoníaca. Vi pernas, braços, tripas e órgãos. Era simplesmente nojento. Parecia que centenas de pessoas haviam morrido apenas para ir completando aquela parede, que por sinal não estava totalmente completa! Haviam partes, onde se podia ver a tinta branca e manchas de sangue. Mas as coisas não param por ai. Pois ao caminhar para o interior do recinto, vi que não se tratava de apenas manchas de sangue e sim, palavras. Nesses espaços ausentes de carne, uma palavra se repetia: “Lúcio” Aquilo só podia ser brincadeira, seriam aqueles lugares preenchidos por mim? Eu não conseguia aceitar o que meus olhos viam! Era medonho demais. Insano. Saí do quarto e comecei a descer as escadas. As batidas ainda continuavam e então ouvi uma voz. - Lúcio… me ajude. A voz vinha do último quarto. Como sabiam meu nome? Nada fazia sentido. Parei no início das escadas e ouvi a voz chamar-me mais três vezes. Tomado por uma força que não respondia ao meu lado racional, eu subi novamente as escadas. Ouvi a música do demônio outra vez e assim, fui verificar o que havia no último quarto. O corredor parecia mais escuro, assim como o cheiro de carne podre. Caminhei devagar até chegar ao meu destino. A porta ao contrário das anteriores, se encontrava trancada. Coloquei a mão na maçaneta e senti um calafrio. Girei e empurrei, mas a mesma não saiu do lugar. Os pedidos por socorro aumentaram. Era uma criança e ela precisava de mim. - Lúcio me ajuda! Por favor, socorro! Com uma força fora do normal arrombei a porta e então descobri o que era o barulho e quem me chamava. Era uma garotinha, estava sentada no chão, com as pernas cruzadas. Batia em uma sequencia maluca, sua cabeça contra a parede e enquanto fazia isso, continuava pedindo por ajuda. - Lúcio me ajude… me ajude… Faça isso parar. Cheguei perto, quase não aguentava respirar. - Estou aqui. Ela parou, parou com a testa encostada na parede. Vi um sangue negro escorrendo pela madeira. - Foi bom ter vindo, estou te esperando a meses. A voz da garota havia se transformado e eu só tinha ouvido uma voz daquelas em filmes de terror. -Eu te esperei… Então ela olhou para mim, sua testa estava partida, um buraco imenso que expelia sangue. Os olhos da pequena eram negros, sua boca estava toda partida. A pele branca carregada de veias verdes. Tinha o rosto magro, até parecia uma caveira. Eu gelei, não sei como não morri do coração, imaginem a horrível situação em que me encontrava! - E agora você é meu! Completou a menina. E começou a se levantar. Tomei minha primeira atitude normal desde que havia entrado ali. Corri, sai do quarto, desci as escadas e fui em direção a saída. Mas a maldita porta estava trancada. Olhei para trás e vi a garota descendo as escadas. Sabem aquela cena do exorcista, onde a Regan desce as escadas de corpo contorcido, foi isso que eu vi, decerto esse deve ser um dos modos do demônio assustar os homens, se é, funciona, pois eu estava aterrorizado. Enquanto descia as escadas a menina gritava, dizia que estava vindo me buscar, que nós estaríamos juntos para sempre em um macabro conto de terror. Pensei rápido, corri até a janela, que também estava trancada e então senti o pequeno demônio pegando em meu calcanhar. Olhei para baixo e o bicho estava ali, ao meu lado. Quebrei a janela com um murro e pulei para fora, enquanto o monstro gritava de raiva. Corria para minha casa, mas ainda pude ouvir uma última promessa. - Você vai voltar aqui Lúcio e será meu, só meu, para todo o sempre! Antes de sair do terreno eu tropecei, fui de cara no chão de terra batida e na hora apaguei. Antes de perder a consciência pedi a Deus que o monstro não pulasse a janela e me levasse novamente para dentro da casa. Acordei em minha cama, olhei no relógio e eram 9 horas da manha. O colchão estava encharcado de suor e aquele havia sido provavelmente meu mais verdadeiro pesadelo. Eu sentia dores no corpo e ao olhar para minhas mãos, notei alguns cortes. Lembrei do soco que havia dado no vidro e fiz uma relação surreal. Levantei e fui para o trabalho normalmente, nem olhei para a casa abandonada. Na aula eu agi de maneira diferente, acho que os alunos notaram isso. Voltei, já eram mais de 19:00 horas, novamente passei pela casa sem olhar. Estava com medo. Jantei, vi TV, tentei esquecer das coisas e depois de um tempo deixando os pensamentos estranhos de lado vim para meu quarto. Agora estou sentado de frente para a janela, com um bando de folhas já rabiscadas na mão. A ideia do conto finalmente surgiu, mas trouxe consigo muito medo. Agora pouco olhei para a janela da casa abandonada e vi, que o vidro da janela onde em meu sonho escapei, está realmente quebrado. Como pode uma coisas dessas? Nas janelas do segundo andar, tenho a impressão de que alguém me encara. Não consigo distinguir se é verdade ou apenas uma impressão. Mas o pesadelo só faz com que a realidade seja mais bruta. Não sei se acabei ficando meio louco ou se tudo não passa apenas de um pesadelo. Só sei que agora a estória já foi escrita e meu medo, compartilhado. Vou me deitar e se não acontecer nada, pelo menos amanhã terei pronto, meu primeiro conto de terror. Boa noite.
Posted on: Wed, 14 Aug 2013 23:14:39 +0000

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