CARTA ENVIADA A JK, JANEIRO 1964, A VÉSPERA DA DITADURA. INÉDITA - TopicsExpress



          

CARTA ENVIADA A JK, JANEIRO 1964, A VÉSPERA DA DITADURA. INÉDITA ! Rio de Janeiro, 6 de janeiro de 1964. Meu caro amigo Senador Juscelino Kubitschek, Há muito estou para conversar com o meu velho e eminente amigo sobre a sua posição na cena política brasileira. Podia fazê-lo pessoalmente, mas nos assuntos graves, a palavra escrita, além de concisa, é também mais precisa. Prefiro, pois dirigir-lhe esta carta, como ponto de partida para futuras conversações, se isso for do seu agrado. Sei que estou escrevendo a um grande brasileiro, cujos processos e objetivos políticos estão a serviço de um incontestável espírito público, de que sempre darei testemunho, pois tive a honra de colaborar intimamente com o Presidente Juscelino em horas difíceis sem outra compensação que a sólida confiança que me distinguiu. Por isso atreve-me a pedir-lhe que se detenha nestas reflexões, inspirada na perfeita amizade que lhe voto e nas grandes apreensões que experimento em relação á sorte de sua candidatura. Tudo o que me foi dado ouvir do senhor João Goulart, somado ao conhecimento que tenho da situação geral do país, leva-me a firma convicção de que não me passa pela cabeça de interromper o processo de sucessão. Entretanto a crise econômico- financeira , em clima altamente inflacionário , deverá agravar-se, pondo em grave risco a normalidade constitucional. A fim de controlar com energia o fenômeno inflacionário, teria o Governo de adotar providências sérias para a preservação da legalidade, tarefa difícil uma vez que não dispõe de um eficiente dispositivo político para resguardar a forma institucional, a qual só poderia fundar-se no completo acordo entre forças pessedistas e trabalhistas. Uma política anti - inflacionária teria de basear-se , de um lado, numa política salarial assentada no reforçamento da liderança presidencial nos sindicatos e, de outros, num entendimento leal com os nossos grandes credores como os Estados Unidos, sem prejuízo do que se convencionou chamar a uma “política externa independente”. Esta não deve comprometer a nossa posição no quadro panamericano, no que desabilitaríamos com que nossas relações com Washington, quer com as nossas relações com as nações irmão da América Latina. Parece que o Presidente Goulart está disposto a usar sua influência para manter sua liderança nos pontos da área sindical em que se acha ameaçada. È evidente que não o poderá fazer sem algum desgaste, ao menos inicial, em seu prestigio nessa área, preço que ainda não se sabe se estará disposto a pagar sem a compensação de um firme suporte político para um governo centrista. O refazimento de uma atmosfera de confiança nas relações com os Estados Unidos, por outra parte, só será possível se o Senhor João Goulart se dispuser e renunciar de vez ao apoio reticente, mas expressivo nas atuais circunstâncias, nas áreas mais extremadas do nacionalismo esquerdista. Ambas as hipóteses são plausíveis, o Presidente da República tem condições excepcionais para firmar-se numa posição autônoma e prestigiosa em face das forças sindicais, componente vital na atual conjuntura brasileira. E pode, igualmente, conversar essa posição em face da política externa, uma vez que o governo de Washington começa a sentir que a nossa opinião pública exige do Governo brasileiro que tenha uma postura autônoma, (embora não hostil aos Estados Unidos) relativamente aos problemas internacionais. Por outro lado, a notável carta do Presidente Lyndon Johnson revelou-nos, no que tange ás reformas da estrutura política social do Brasil, se deve contar não somente com a perfeita compreensão, mas sim com a expectativa simpática de Washington. Assim, a devoradora crise gerada Washington. Assim, a devoradora crise gerada pelo aceleramento da inflação poderia ser enfrentada com êxito pelo Presidente João Goulart as dificuldades reais, para isso procedessem apenas da área sindical ou da área internacional. Entretanto, os principais obstáculos as ações decisivas contra a crise avassalante – que poderá engolir a sucessão e, com ela, o regime – vêm da resistência tenaz, no PSD, á mais importante das reformas que já era reclamada por José Bonifácio em 1821com do nosso desenvolvimento a reforma agrária. Um grupo aguerrido de pessedistas usa hoje a bandeira do partido para cobrir uma posição suicida, de extrema direita, infensa em qualquer mudança no status-quo da propriedade territorial. O Senhor João Goulart, sentindo a esquivança do PSD ante o plano reformista com o qual se acha fundamente comprometido, será tentado a recompor seu esquema político fora do binômio PSB-PTB. Nessas circunstâncias, atitude do Presidente em face da reforma agrária tende a radicalizar-se, pois ele percebe que não pode contar com a maioria parlamentar para essa reforma e passa a buscar apoio nas massas, através de uma ampla campanha de opinião publica. Tal campanha poderá gerar um clima de hostilidade no Congresso, de vez que se evidencia, de modo escandaloso, o Divórcio entre o Congresso e a Nação, como sucedeu nos episódios que desaguaram no plebiscito. Nessa altura dos acontecimentos, parece-me que o meu eminente amigo Juscelino Kubitschek não poderá escapar a uma definição corajosa, como aquela que sabiamente adotou como o ultimato que apresentou ao Presidente Café Filho em 1955. Lembre-se que seus verdadeiros amigos de hoje não são aqueles que almoçam com Lacerda e aparecem nas fotografias ao seu lado. Estes, e outros que não querem as reformas, ficaram com Lacerda no pleito cristianizando o candidato pessedista usa hoje as bandeiras que não puder disputar ao governador Carioca a bandeira da extrema direita. A eleição de 65- se não for tragada pelas crises que nos ameaçam – vai ser travada, substancialmente no plano social ou ideológico. Será uma eleição histórica, um tournant no destino do Brasil. Não vai permitir o jogo das pequenas habilidades clássicas da política, mas definições duras e claras. Forças conservadoras como a Igreja, já o perceberam e se esforçam para intervir no processo ganhando a confiança das massas rurais para um programa de reforma agrária que as desvie da solução comunista , sem frustrar as esperanças dos camponeses. Mas essa eleição poderá deixar de se realizar ou redundar num desastre exatamente pela falta de um dialogo viril e nítido de uma candidatura progressista com a candidatura da reação ou anti-reforma. Esta última candidatura será constituída por Juscelino desde que ele saiba colocar-se perante o país como o campeão da reforma, o candidato das forças de centro-esquerda. O primeiro passo, o grande, o decisivo, será JK assumir o comando das negociações entre o Presidente João Goulart e as áreas pessedistas sensíveis ao ideal das reformas, para a adoção de uma plataforma comum autenticamente reformista e as áreas pessedistas sensíveis ao ideal das reformas comum autenticamente reformista, base da nova aliança. A burocracia partidária dificilmente poderá realizar essa tarefa se a estrutura agrária começa a fender-se, é claro que a estrutura de partidos políticos de base agrária como o PSD não pode permanecer intacta. Urgiria talvez um conceito de pessedista de ”base partidária” vai evidenciar a ruptura dos quadros tradicionais do eleitorado rural. Com uma plataforma anti-reformista, ou mesmo não reformista, face ao status-quo do campo, o PSD será um partido perempto, em irreversível declínio. Não esqueçamos que no fim desse ano haverá somente em Minas 300 candidatos camponeses. Admitamos, porém, que por milagre os elementos mais resistentes á reforma agrária vençam o pleito. Quem é o candidato natural dessas forças? Carlos Lacerda. E quando isto se verificar, toda essa vaga social que arqueia o dorso, nos campos e nas cidades, poderá ser represada pelo conselho dos prudentes? O provável é q o eleito não vá governar ou vá converter-se a ditador. Que adiantaria levar falsamente coeso até a convenção o PSD imponente, mas em boa parte se dispôs a cristianizar o seu candidato oficial para salvar o latifúndio? Melhor erguer no seio do partido a bandeira da reforma e convocar os que estejam com ela, pois já perceberam que as bases rurais são dos reformistas? Para concluir, repitamos a pergunta que está em todos os lábios: Haverá sucessão? Haverá, sem dúvida, mas somente se tivermos um Governo pelo apoio do PSD reformista, que permita ao Presidente Goulart tomar as medidas necessárias a suavizar, quando menos os efeitos terríveis da inflação. Haverá, mas somente se um homem da envergadura de Juscelino Kubitschek aceitar seu papel histórico aceitar o líder da anti-reforma. A fórmula é esta: Jango + JK = Legalidade. De sorte que meu caro eminente amigo, agora como em 55 o destino do Brasil e do regime está em suas mãos. Perdoe esta explosão de sinceridade do amigo certo, que nunca lhe faltou, _________________________ DANTON JOBIM
Posted on: Wed, 13 Nov 2013 23:35:52 +0000

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