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Compartilho com vocês, artigo meu publicado no site da Carta Maior sobre as manifestações. Abs, cartamaior.br/templates/analiseMostrar.cfm?coluna_id=6152 O poder das multidões Até bem pouco tempo, se falava do desinteresse dos jovens pela política e da apatia do povo brasileiro sobre questões a ela relacionadas. O que fez com que as pessoas se levantassem neste exato momento? Que questões estão envolvidas no descontentamento geral? Adelina França Enviar !Imprimir ! Em 1895, Gustave Le Bon, médico, sociólogo, psicólogo e visionário, afirmou o seguinte sobre as sociedades do futuro: “Em que idéias fundamentais se vão basear as sociedades que sucederão a nossa? Por enquanto, não o podemos saber. Mas podemos prever que terão que contar com um novo poder – último poder soberano da idade moderna: o poder das multidões. [...] No momento em que as nossas antigas crenças vacilam e desaparecem, em que os velhos pilares das sociedades desabam, a ação das multidões é a única força que não está ameaçada e cujo prestígio vai sempre aumentando. A época em que estamos a entrar será, na verdade, a era das multidões. (Psicologia das Multidões, 2008) Le Bon iniciou uma linha de pensamento que seria mais tarde desenvolvida por Freud e depois por Jung, nos conceitos de consciência individual e consciência coletiva, respectivamente. Assistimos no momento a uma reação social, não só da juventude, mas da sociedade brasileira a questões ainda pouco claras. Aumento na tarifa dos ônibus, obras da Copa do Mundo, somados a outros fatores de fundo e estruturais envolvendo áreas de responsabilidade do Estado, têm levado milhares às ruas no país todo e nas colônias de brasileiros no exterior. Até bem pouco tempo, se falava do desinteresse dos jovens pela política e da apatia do povo brasileiro sobre questões a ela relacionadas. O que fez com que as pessoas se levantassem neste exato momento? Que questões estão envolvidas no descontentamento geral? Vários analistas se arriscam a levantar hipóteses de causas, desde os fatores conjunturais aos estruturais. O Instituto Datafolha aponta, em pesquisa, a falta de confiança dos paulistanos nas instituições governamentais e instrumentos democráticos. De dez anos para cá, o prestígio da Presidência e do Ministério caiu de 51% para 19%. Em relação ao Congresso Nacional, o índice dos que consideram que a casa legislativa não tem prestígio subiu de 17% para 42% (FOLHA, 19.06.2013, p. C8). Outros apontam para a falência do modelo de inclusão social através do consumo, levado a cabo principalmente pelas gestões Lula. Ao mesmo tempo, uma característica dos movimentos jovens em todo o mundo e nas manifestações que temos presenciado também é a horizontalidade e recusa à liderança. No caso de São Paulo, na segunda-feira (17), as imagens das multidões mostradas pelas emissoras de TV se assemelhavam a um imenso monstro acéfalo, que não sabia se subia ou descia as grandes vias metropolitanas. Aos poucos as pessoas foram se espalhando pela cidade e a marcha viu sua força inicial ser diluída em três ou quatro passeatas. Os próprios jovens durante as manifestações reclamavam da falta de direção do movimento e do tempo que haviam “perdido” sem saber que rumo tomar. O que está sinalizado – para além do óbvio – na recusa de uma liderança ao movimento? Reação contrária à política partidária, denúncia da “corrupção política” e do desinteresse do Estado pelas questões sociais: saúde, educação, transporte, são alguns dos sinais de descontentamento identificados. Todos os manifestantes, munidos de seus celulares falavam, fotografavam e trocavam orientações e impressões, trazendo uma unidade e coesão do processo forjada em um dos símbolos do individualismo: a telefonia celular. Pensando novamente em uma consciência política coletiva, temos algumas etapas ou fatores apontados pelo cientista político e professor de Psicologia Social na PUC-SP e Unicamp, Salvador Sandoval, no seu modelo de consciência política (1986). O inimigo comum é evidente: o Estado; o desejo de agir coletivamente era também evidenciado pela magnitude da ação. Existe uma identidade coletiva presente – somos todos brasileiros descontentes, porém movidos por um sentimento generalizado de impotência política nos moldes tradicionais. Os interesses são coletivos – por se expressarem coletivamente – mas qual seria o desejo subjacente? O fortalecimento do SUS, ou seguro saúde privado para todos? Transporte coletivo eficiente ou uma cidade que permita o trânsito dos milhares de carros novos? A polêmica “nova classe média” (ou a classe trabalhadora ascendente, como diria Marilena Chauí) quer o que? Ser classe média e ter todos os produtos individuais disponíveis para o consumo, também individual? E onde é que está o coletivo? Onde é que estão os interesses societários? Divisão, compartilhamento dos espaços públicos, dos bens e recursos públicos, das políticas públicas para o interesse público e não privado. Os contrastes são evidentes, mas ainda não conscientes. E não representam a bandeira de todos. A revolução à la Caetano, “luxo para todos”, só combina com música. Captamos mensagens de todo o mundo, e sensações e sentimentos vão sendo armazenados na memória coletiva e processados por meio de um descontentamento difuso. Existe um desejo de uma nova ordem, mas ainda não se traduziu em proposições. O que está posto é apenas um não. Assim não! O comentário mais honesto que li foi de Antonio Prata: “... ninguém está entendendo nada” (FOLHA, 19.06.2013). Imersos que estamos no contexto, porém no caminho e na possibilidade de uma consciência que espero, seja coletiva. Mas, enquanto nossas crenças e valores forem guiados por anseios privados e individuais - apesar das mobilizações coletivas - nada será revolucionado, como diria Le Bon. Adelina França é doutoranda em Psicologia Social, membro do Núcleo de Psicologia Política da PUC-SP, colaboradora da Universidade de Orebro, Suécia e pesquisadora sobre a temática Participação e Consciência Política da Juventude. Atua profissionalmente como consultora das Nações Unidas.
Posted on: Thu, 20 Jun 2013 19:57:48 +0000

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