CÁRCERE, ESTIGMA E REINCIDÊNCIA: O MITO DA - TopicsExpress



          

CÁRCERE, ESTIGMA E REINCIDÊNCIA: O MITO DA RESSOCIALIZAÇÃO jus.br/revista/texto/24285 O abuso do cárcere é determinante para a reincidência, sendo a prisionização um dos seus efeitos mais nefastos, pois “destreina” o apenado ao convívio em liberdade, agravando sua exclusão. Utiliza-se o conceito de rotulação (Labeling Theory, de Howard Becker), para averiguar como a prisão age sobre a visão que a sociedade tem do internado e a percepção que este tem de si mesmo. A presente monografia propõe-se a relacionar a estigmatização do criminoso com o insucesso do objetivo ressocializador da pena privativa de liberdade, haja vista a diversidade de efeitos negativos da prisionização que dificultam o retorno do indivíduo à sociedade, impelindo-o a assumir a carreira delitiva. Para tanto, utilizou-se o conceito de rotulação oferecido pela Labeling Theory de Howard Becker, a fim de averiguar de que forma a prisão age sobre a visão que a sociedade tem do internado e a percepção que este tem de si mesmo. O objetivo maior deste trabalho é promover o debate multidisciplinar em torno da pena de prisão, utilizando conceitos da Sociologia e da Psicologia para enriquecer e atualizar as Ciências Jurídicas no estudo da criminalidade, de modo a dar subsídios à apresentação de propostas alternativas de execução penal e à prevenção da reincidência. A pesquisa foi conduzida a partir do método categórico-dedutivo, utilizando-se a abordagem fenomenológica, e valeu-se do método exploratório, tendo sido a coleta de dados feita por meio de pesquisa bibliográfica em Direito, Sociologia e Psicologia e na legislação nacional. Os dados coletados foram interpretados qualitativamente, relacionando-se o caráter estigmatizante da prisão com a reincidência e o fracasso da prevenção especial, a partir de sua análise subjetiva. Ao fim, concluiu-se que o abuso do cárcere enquanto pena privativa de liberdade é fator determinante para os altos índices de reincidência no País, sendo a prisionização um dos seus efeitos mais nefastos, porquanto “destreina” o apenado ao convívio em liberdade, agravando sua exclusão. A história da humanidade é caracterizada, desde que passou a compor-se de grupos cada vez mais numerosos e perenes de homens em busca de segurança e de melhores condições de vida para o desenvolvimento da espécie, pela defesa da coesão e manutenção da integridade da comunidade. Os atos propensos a pôr em risco sua existência são punidos desde então, de diferentes formas ao longo do tempo. Em princípio, a punição consistia em pura vingança ao mal praticado; era brutal e imediata, pois partia do próprio ofendido de forma privada, já que não existia uma estrutura punitiva organizada e complexa com tal atribuição. Posteriormente, à medida que a noção de Estado se desenvolveu paralelamente à evolução do próprio homem, o controle social foi sendo paulatinamente atribuído ao Poder Público - abstração responsável pelo bem-estar comum e pela defesa dos interesses sociais -, e as penas passaram a ter a função não só de retribuir o crime, mas de promover a “cura” do delinquente, para que este pudesse voltar a viver em sociedade sem violar o pacto social. A partir do Iluminismo, com a retomada do antropocentrismo e a valorização do homem como indivíduo, surgiu a necessidade de se racionalizar e humanizar as penas infligidas aos delinquentes, a fim de que sua dignidade fosse preservada e de modo a dar-lhe a oportunidade de recuperar sua cidadania, voltando ao saudável convívio social. A pena de morte, as penas corporais e as infamantes – castigos comuns à época - passaram a ser duramente criticadas por eminentes pensadores da época, e a reforma do sistema punitivo tornou-se premente. Nesse contexto, em fins do século XVI, o modelo prisional foi proposto como forma alternativa de punição, a partir da criação das primeiras workhouses na Inglaterra. Nelas, buscava-se a correção do delinquente por intermédio do trabalho penoso e da instrução religiosa, modelo que vigeu durante muito tempo. Posteriormente, outros modelos foram desenvolvidos, mas sempre fundamentados basicamente na privação da liberdade, no trabalho e na religião. No entanto, com o passar do tempo, as elevadas taxas de reincidência revelaram que a prisão não cumpre exatamente a função que dela se esperava; ao contrário, mostrou-se uma verdadeira “escola de criminosos”, porquanto favorece o surgimento de subculturas carcerárias de indivíduos que compartilham entre si experiências e conhecimentos sobre como cometer delitos sem ser capturado; dessa integração surgem facções criminosas e delinquentes profissionais, que adotam a carreira delitiva como meio de sobrevivência. Para explicar a falência da pena de prisão, utilizamos a Labeling Theory - ou Teoria da Rotulação ou da Reação Social -, inaugurada pela publicação do livro Outsiders, do cientista social norte-americano Howard Becker no início dos anos 1960, o qual representou uma verdadeira revolução no conhecimento a respeito do que se entendia por “delinquência”. A transgressão passou a ser vista como desvio social, de modo que este seria resultante de um processo de rotulação que envolveria, além do comportamento dos indivíduos definidos como desviantes, aqueles que formulam as regras sociais e suas sanções, bem como os designados para fazê-las cumprir. Assim, a criminalidade passou a ser entendida como a reação social ao desvio, a partir de regras formuladas por uma parcela reduzida da sociedade que refletem seus próprios valores e interesses. Com a recepção da Labeling Theory nas Ciências Criminais, surgiu uma nova corrente criminológica – a Criminologia Crítica -, segundo a qual a falência da pena de prisão e a incapacidade do sistema punitivo de promover a ressocialização dos delinquentes acabaram por retirar do Direito Penal vigente a legitimidade a ele atribuída de detentor do poder punitivo; admite, então, que o sistema penal é apenas um instrumento para a manutenção da estrutura vertical da sociedade, marginalizando as classes mais baixas, a fim de que as relações de poder se mantenham sempre em favor das classes de maior poder econômico, que são as responsáveis, afinal, por fazer as regras e definir a quem estas serão aplicadas. É sob tais fundamentos que desenvolvemos nossa análise, procurando relacionar a estigmatização do criminoso no contexto prisional com o insucesso do objetivo ressocializador da pena, haja vista a diversidade de efeitos negativos, tanto de ordem sociológica quanto psicológica, relacionados ao cárcere, que levam o indivíduo a assumir a carreira delitiva. Dessa forma, o objetivo maior deste trabalho é promover o debate multidisciplinar em torno da pena de prisão, utilizando conceitos da Sociologia e da Psicologia para enriquecer e atualizar as Ciências Jurídicas no estudo da criminalidade, a fim de que sejam estudadas novas propostas viáveis para a execução penal e que cumpram o fim ressocializador da pena. A pesquisa foi conduzida a partir do método categórico-dedutivo, utilizando-se a abordagem fenomenológica, e valeu-se do método exploratório, tendo sido a coleta de dados feita essencialmente por meio de levantamento bibliográfico nas searas do Direito Penal, da Execução Penal, da Criminologia, da Sociologia e da Psicologia, mormente em livros científicos das referidas disciplinas e na legislação nacional. Os dados coletados foram interpretados qualitativamente, relacionando-se o caráter estigmatizante da prisão com a reincidência, em especial as carreiras delitivas, a partir de sua análise subjetiva. A partir disso, após a comparação dos resultados obtidos na pesquisa bibliográfica com as hipóteses levantadas em nosso projeto monográfico, concluiu-se que o cárcere, ao invés de promover a função de reintegrar o egresso à sociedade, age como verdadeiro fator criminógeno sobre o reeducando, compelindo-o a assumir a identidade de “criminoso” e a reincidir na delinquência. O trabalho foi desenvolvido em quatro partes: na primeira delas expomos as principais correntes relativas aos fins da pena, a partir de suas origens históricas; na segunda, traçamos as linhas gerais da história e evolução da pena de prisão; na terceira, abordamos a Labeling Theory e o problema da estigmatização; e, por fim, na quarta parte, demonstramos a incompatibilidade hoje existente entre a pena de prisão e o objetivo ressocializador pretendido pelo nosso Código Penal, em virtude de sua própria natureza excludente e desumanizadora. Com fundamento em tudo o que foi exposto, concluímos que a prisão nos moldes atuais representa uma instituição total tão opressora e infecta que, ao invés de proporcionar aos internados meios de adequar seu comportamento ao convívio social em liberdade, os dessocializa e estigmatiza profundamente, pois lhes retira a individualidade e modifica o conceito que têm de si próprios, compelindo-os a aceitar e assumir a identidade de “criminosos”. Essa mudança na psique dos delinquentes, associada ao convívio forçado com outros desviantes, favorece o surgimento de subculturas carcerárias e compele os egressos à carreira delitiva. Dessa forma, há uma evidente incongruência entre a realidade que a prisão nos apresenta e seu suposto fim ressocializador, pois atua mais como fator criminógeno que como solução para o problema da criminalidade. De acordo com notícia publicada na página eletrônica do Supremo Tribunal Federal (2009), o índice de reincidência entre os egressos do sistema prisional chegava a 70% no ano de 2009, um dos mais altos do mundo, ao passo que uma pesquisa promovida pelo Grupo Candango de Criminologia, da Universidade de Brasília (UnB), apontou que esse índice cai para menos da metade entre os apenados com penas alternativas (ESTUDO..., 2010), já que estas permitem que o reeducando mantenha contato com a sociedade, de modo a facilitar sua reintegração após o cumprimento da pena. A prisão atua de modo diametralmente inverso, pois isola os apenados do convívio social saudável, submetendo-os a indignidades tais que reduzem drasticamente a possibilidade de ressocialização. No entanto, muito embora a prisão encerre em si graves defeitos de difícil resolução, gerando descrédito nas penas privativas de liberdade entre boa parte dos estudiosos da questão penitenciária, acreditamos ser inviável sua supressão no atual estágio em que se encontra nossa sociedade. A abolição da prisão requereria a modificação de todo o atual aparato punitivo do Estado, por intermédio de novas políticas públicas de prevenção e combate à criminalidade, o que exige tempo, recursos e interesse político. No entanto, acreditamos ser imprescindível a sua reforma, a fim de que o fim preventivo-especial seja novamente uma meta a ser alcançada pelo nosso sistema penal. Para tanto, é necessário que o Direto acompanhe os avanços obtidos nas Ciências Sociais em geral e, mais especificamente, incorpore as contribuições oferecidas pela Sociologia e pela Psicologia, para que, por meio do estudo interdisciplinar da criminalidade e das formas de controle social, possa chegar a propostas inovadoras e eficazes de resposta penal, respeitando a dignidade do reeducando e proporcionando-lhe meios de ser reintegrado à sociedade.
Posted on: Mon, 22 Jul 2013 19:09:40 +0000

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