Dois mundos e mil ouvidos surdos - Iuri Muller (Companheiro do Sul - TopicsExpress



          

Dois mundos e mil ouvidos surdos - Iuri Muller (Companheiro do Sul 21) “As informações do Cimi mostram que mais de 500 indígenas foram mortos na última década, e que a frequência das demarcações diminuiu nos governos de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff. Desde 2006, ainda em relação aos dados apresentados, pelo menos cinquenta indígenas são assassinados por ano no país”. (brasildefato.br/node/13234) Há meses, representantes de povos indígenas do Rio Grande do Sul mandam um aviso para o mundo surdo: é preciso, urgentemente, realizar a demarcação das terras de guaranis, charruas e caingangues, é preciso, urgentemente, oferecer mínimas condições de vida para as famílias que acampam na beira das rodovias e em territórios insalubres. Avisaram tanto que algumas vezes ganharam reuniões. Foram recebidos pelo gabinete da presidência da República, pelo governador do estado, por deputados e secretários. As autoridades talvez tenham compreendido a cobrança, mas jamais a urgência – e menos ainda a violência que está envolvida. Existe o mundo em que as reuniões servem para marcar outras reuniões, em que as decisões se prolongam até o cansaço decidir pelo esquecimento, o mundo da pressa fingida e da preocupação orquestrada. E existe o mundo da necessidade, plano demasiado real para se dobrar às convenções desta política que se esfarela com o tempo. Os indígenas habitam o segundo mundo; os homens que podem decidir sobre o futuro destes povos frequentam, pelo menos agora, o primeiro. Em algum momento, o esforço vai precisar deixar a cadeira estofada, a gravata e o protocolo de lado. Porque o segundo mundo – que, dizem, que originou o primeiro – pode ser paciente, mas não é inerte. A questão é que os povos indígenas decidiram – com razões antigas e justificativas modernas – que a demarcação das terras sairá do papel. Que a miséria terá fim, que a dignidade precisará ser recuperada para que haja possibilidade de futuro para (que cruel ironia) os povos originários. Sairá com as indenizações do governo do estado, as autorizações do Incra e o carimbo do Ministério da Justiça, mas também sem isso. Em algum momento, a tentativa será à força, com as próprias mãos. Não é que as ameaças de sangue a se derramar sejam confortáveis para os povos que perderam milhares de homens e mulheres em disputas desproporcionais e tantas vezes covardes – elas só voltam a acontecer porque é preciso gritar insuportavelmente alto para acordar os ouvidos surdos. O Rio Grande do Sul poderá resolver o impasse sobre as terras sem que isso aconteça, no entanto. Depende do governo federal, é certo. Mas alguém precisará apressar a garantia dos repasses, a realocação de agricultores para outras praças e quem sabe tocar em algum canto do latifúndio – esta autônoma região gaúcha, com ordem e leis próprias – nesta história. Mais de quinhentos indígenas foram assassinados no país na última década, mostra a reportagem do início deste texto, ao passo em que as demarcações diminuíram. A questão indígena é provavelmente um dos mais desesperadores problemas do Brasil atual. E o drama maior é que pouca gente parece notar. callesoriano.sul21.br/2013/10/04/dois-mundos-e-mil-ouvidos-surdos/
Posted on: Fri, 04 Oct 2013 05:07:58 +0000

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