Entrevista O Popular com o Grande Mestre, Professor João Alberto - TopicsExpress



          

Entrevista O Popular com o Grande Mestre, Professor João Alberto - UFG Crescimento das manifestações 23 de junho de 2013 (domingo) Ian Caetano ­– As manifestações no decorrer do tempo em que elas aconteceram aqui em Goiânia, nos últimos dois meses, tinham uma pauta muito específica, que são as condições do transporte coletivo na cidade. Tem a ver com a questão do preço e também com a qualidade e outras demandas mais específicas do transporte. A gente viu que isso gerou uma efervescência nacional e, com a popularização das manifestações, aconteceu uma acepção de novas demandas. No caso de Goiânia elas não partem propriamente das mesmas pessoas que reivindicavam acerca do transporte coletivo. Mas, de uma forma mais orgânica, elas acabam povoando a manifestação também. Não é que elas apareceram agora, mas agora é que a grande massa percebeu que pode ir à rua. Eles trazem uma série de indignações, tanto contra o Legislativo tanto por conta da corrupção e por questões públicas mesmo. Transporte, saúde e educação. Ian ­– Creio que tinha força, tanto é que o aumento foi barrado. O próprio prefeito diz que atendeu o clamor popular quando barrou a tarifa. Então, a gente entendeu que sim, que as manifestações anteriores tinham força. Não tinham o mesmo número de pessoas, claro, mas entendemos que a clareza de objetivos é fundamental para conseguirmos essa vitória parcial, barrar o aumento. João Alberto – É importante ressaltar que o movimento passe livre aqui em Goiânia está inserido a um contexto de manifestações nacionais em que o Movimento Passe Livre (MPL) também está presente. Há uma tendência nacional de se colocar em pauta a questão dos transportes, que é de fundamental importância para o funcionamento daquilo que, na última década, tem representado para o Brasil, que é um Brasil de todos, mais vigoroso economicamente. Ora, quem pega ônibus, essas carrocerias perniciosas, sem horários, controlados por esses empresários invisíveis não vê isso. Esse país do PSDB, de Lula e Dilma, tem de dar acesso a (um transporte de qualidade) para essa população, tem de colocar essa população para andar. O movimento tem um conteúdo centrado. Politicamente, é uma inovação para as lutas políticas populares. Esse é o grande sucesso que eles têm. Aquilo que é problemático de fato e não difuso, como os gastos com a Copa, é apontado pelo movimento. É uma causa popular e isso tem de ser preservado. Tomara que o movimento continue e a sociedade apresente outras configurações institucionais e tomara que isso passe para a educação, para a saúde. Ou seja, de tal modo que a política se faça dentro de uma nova institucionalização e não mais na política convencional. Essa adesão demonstrada na manifestação de ontem (quinta) foi tardia, evidentemente. Cinco manifestações aconteceram anteriormente, que foram pautadas centralmente na questão do transporte em Goiânia e que sofreram repressão violenta, com cavalaria, com tropa de choque, de uma forma que raramente se vê em outras capitais ditas civilizadas. Essas situações não podem se repetir. E isso choca. Essas repressões violentas de um poder público que não consegue entender as demandas reais da sociedade precisam ser reequacionadas. Não é só o PSDB, a extrema direita que temos, mas também o PT, a esquerda capitalista. A população percebe que a configuração institucional desses partidos é a mesma. Eles negociam entre si. Então, a política tem de se modificar. O diálogo político não pode mais acontecer na carnavalização das eleições e depois funcionalizar o Estado de acordo com suas próprias demandas e daqueles que os financiam para lá estarem. Essa radicalidade que o movimento apresentou é contundente, tem de ser preservada, precisa ser defendida. Ela têm êxito, tem penetração popular. Os gestores do PT e do PSDB tiveram de recuar. Que raio de país é esse que se diz sem crise mas a população, que está entrando na classe C não tem acesso à locomoção para levar seus filhos à universidade, pois os ônibus não funcionam. Funciona melhor o capitalismo quando a cidade deixa as pessoas andar. Tem de ter tarifa zero, ela jamais poderia ser cobrada. Essa é uma pauta que eu espero que o movimento não interrompa, não deixe de lado. É o centro. O passe livre é funcional para o capitalismo. E esse capitalismo organicamente funcional, dentro desses novos princípios colocados pela economia internacional no qual o Brasil está inserido com sucesso, tem de pautar uma nova agenda para a política institucional. Pedro Mundim – Eu tenho impressão que as manifestações anteriores, com pauta muito específicas, afetavam um grupo bastante específico. A partir do momento em que a manifestação começou a surgir e a reação foi um pouco mais dura, de não abrir mão dos preços das tarifas e obviamente colocar a polícia para reprimir, isso acabou gerando uma sensibilização. As pessoas perceberam que a demanda é justa e a repressão não se justifica. Então, chegou um momento de não apenas juntar essas pessoas em prol de demandas que são justas. Por mais que eu não ande de ônibus, eu conheço gente que anda, eu contrato pessoas para trabalhar na minha casa que andam, eu minimamente me solidarizo com isso. Gerou uma percepção de que era o momento ideal, surgiu uma brecha e as pessoas perceberam que elas de fato podem ir para a rua. Isso gerou um efeito colateral entre aspas em que as pessoas foram se solidarizando, perceberam que poderiam levantar outras questões, não só do transporte público, mas colocando um pouco de pressão no centro de poder político. Essa onda de solidariedade levou ao crescimento do movimento. Tem um fato interessante: essa gerações de jovens é formada, provavelmente, por filhos de gerações de jovens que estavam na rua em 1992 (pedindo o impeachment do ex-presidente Fernando Collor). A turma do Ian é uma geração de pessoas que foram para as ruas querendo derrubar um presidente. Os filhos do Ian formarão uma geração muito mais politizada, do ponto de vista democrático, isso é extremamente interessante. 1.346306 Violência e vandalismo 23 de junho de 2013 (domingo) Ian Caetano – Quando falamos de vandalismo, de ações que fogem do padrão ordeiro das manifestações, precisamos lembrar daquela manifestação do dia 28, que foi a quarta manifestação, no terminal da Praça da Bíblia, que teve um embate policial e que culminou na depredação de alguns ônibus. Analisar aquela violência isoladamente de fato pode gerar uma interpretação de que houve vandalismo. Mas se analisarmos a trajetória do movimento, percebemos que aquilo foi mais uma necessidade popular de expressão, já que todas as vias pacíficas de diálogo tinham se esgotado. Digo isso porque na manifestação do dia 8, a primeira que fizemos, entregamos um documento formal ao presidente da CMTC, que foi até a praça do Bandeirante, onde estávamos, e esse documento nunca chegou à CMTC. Fizemos uma audiência pública nos termos legais no dia 22 e ela não teve comparecimento. O Ministério Público não compareceu, foi um representante alheio da CMTC. Não tiveram interesses nas demandas. Tentamos também na manifestação do dia 21, que foi quando eles estavam discutindo o preço da tarifa e não fomos ouvidos. Inclusive agiram de forma truculenta. Então, percebemos que houve uma tentativa de diálogo pacífico, mas não fomos ouvidos em nenhum momento. Você pode perceber que a manifestação estava ordeira e pacífica até o embate policial. Nossa ideia no dia 28 era realizar uma assembleia popular com os estudantes, trabalhadores e usuários do terminal da Praça da Bíblia. A polícia fechou o terminal e ficou fazendo cordão de isolamento. Evidentemente que os ânimos se exaltaram e houve o confronto. Em um ato de último fôlego, quase desesperado de se fazer ouvir, essa população acabou trazendo atos mais radicais, mas que não entendemos como vandalismo. Vandalismo é tentar impedir uma assembleia popular, é não aceitar as reivindicações populares. Isso em nosso entendimento é muito mais grave. João Alberto – O radicalismo é de perspectiva. A sociedade civil se junta com os estudantes e eles têm uma pauta através da qual o Estado tem de dialogar. É um movimento legítimo com uma caracterização social imensa e o Estado vira as costas, não faz o diálogo, é truculento, espanca, põe na cadeia. Isso é que é violência, vandalismo. Nessas últimas semanas o vandalismo é do Estado contra a sociedade civil. É o vandalismo da CMTC contra seus usuários. Nesse momento deve haver milhares de pessoas dentro dos ônibus, tolhidos lá dentro. Isso sim é que é vandalismo, é criminosos, é assintoso para um país do PT, do PSDB, que se diz cada vez mais democrático e justo economicamente para todos. A população de baixa renda mantém-se tratada como horda por essas instituições. O radicalismo destas instituições é que é criminoso. O radicalismo do movimento é o radicalismo de perspectiva e o radicalismo de perspectiva aponta o problema. Se esse problema não for resolvido, a sociedade não consegue estabelecer um diálogo mais fraterno. Dessas práticas radicais na perspectiva é que nasce a solidariedade na classe média, que também se vê acintosa. É roubalheira para todo lado, esses nossos políticos não nos representam. Uma empregada doméstica falta ao trabalho porque não consegue se organizar bem porque organizar o seu tempo por falta de transporte. Se o filho pega dengue ela precisa enfrentar aquelas filas do SUS. Ian Caetano – Temos uma tradição recente de que a violência não resolve. Percebemos que há sim um certo receio. As pessoas querem ir para as ruas, mas não querem qualquer tipo de violência. Mas elas se esquecem, nesse sentido, que a depredação, muito antes de prática, é um ato político. É um ato, que antes de ter sentido prático, é um ato simbólico para além do que foi feito ali. É interessante perceber que as grandes mudanças que ocorreram na história não se deram por manifestações de cunho muito pacífico, não se deram por passeatas tranquilas pela rua. Percebemos que as mudanças mais significativas da história se deram com ações que não vou chamar de extremas, mas que colocaram em cheque a situação vigente. Como você vai jogar com um governo que já tem todo um aparato para tornar pétrea a sua estrutura, que tem a polícia, a detenção da violência legítima. Nós temos a mídia, que pode ou não ser favorável às demandas populares e não é algo nosso e a própria opinião pública. Ninguém gosta de correr, de apanhar da polícia, de levar balas de borracha, ser atropelado por cavalos. Em países como a Grécia ou Turquia os atos muitas vezes são extremados e a população não entende necessariamente como maléficos, entende como uma necessidade para se fazer ouvida perante a um poder público que não tem representado as demandas que elas levam. Pedro Mundim – Uma coisa que eu me pergunto é quem são essas pessoas que estão, de fato, quebrando o pau. Especificamente, foi bom você ter explicado porque na quarta manifestação teve briga. Mas, olhando de fora, eu não acho que você pode relacionar e colocar na mesma dimensão o motivo pelo qual vocês brigaram lá na praça da Bíblia e o motivo pelo qual ontem (quinta) tinha um monte de gente lá no Rio e Porto Alegre, Brasília e aqui, com menor intensidade, entrando em confronto com a polícia. São duas dimensões diferentes. São coisas diferentes. Internamente, no movimento, como estão sendo vistos esses eventos recentes? Ian Caetano – São de fato situações distintas. A priori, no dia 24 era a maioria da manifestação que estava indignada e participou desses atos. Ontem, era uma minoria da manifestação. Mas não porque ontem era uma minoria em relação à demanda, mas porque, de fato, ontem aconteceu uma explosão de pessoas. É uma situação que não tinha acontecido antes, quando o teto era de 800, 900 pessoas. As pessoas que estavam ali se inseriram em um contexto muito diferente. O que acontece, e a Assembleia é um ponto simbólico, é que de fato há um sentimento de indignação com relação às instituições que estão postas. Por isso, você pode ter percebido o apartidarismo das manifestações. As pessoas não estão entendendo legitimidade mais no modo como está posto o jogo político. Para além do problema do transporte, as pessoas querem mudanças políticas, que a representatividade seja revista. O grupo tem a seguinte postura, então qualquer postura de quem está indignado tem nosso apoio. Não organizamos, muitas vezes não concordamos, mas apoiamos por uma questão de unidade do movimento. Essa questão de condenar determinados manifestantes só solapa o movimento. Não podemos gerar divergências internas enquanto lutamos por uma causa à qual todos são simpáticos. 1.346307 Futuro dos movimentos 23 de junho de 2013 (domingo) Pedro Mundim – Cada vez mais os políticos vão ter uma incerteza a partir das atitudes deles. Cada vez mais eles estarão constrangidos perante a opinião pública a agir de maneira mais coerente e menos particularista, pensando mais no bem público. O nível de exigência das pessoas com as administrações e com o comportamento dos políticos e das organizações partidárias aumentou. Eu acho que esse será o grande legado, além dessa conquista que já foi conseguida de forma palpável. Não necessariamente você vai precisar sair à rua para protestar por determinado tema, principalmente porque os custos para determinados tipos de atitude, para quem quer legislar em causa própria, agora são muito maiores. Eles não vão nem tomar certas atitudes. João Alberto – Sou cético em relação à pluralidade de demandas constituída como movimento social nas ruas. Acredito que a luta pela redução da tarifa, pela tarifa zero, deve continuar. Ela está organizada, tem um eixo, tem um foco. Ontem vi coisas espantosas, um cartaz dizendo “não é pelo ‘busão’, é pela nação”. Me desculpe o manifestante que por ventura escreveu isso de boa fé ou má fé, mas é a destruição do próprio sentido das manifestações. Ontem (na quinta) certamente tinha gente no protesto que nunca tinha passado pelo Centro à pé. De carro sim, mas à pé não. O que ficará e está de fato organizado, é o que os meninos estão fazendo. As adesões tendem a enfraquecer (o movimento) se essa adesão se manter na pluralidade difusa, que não organiza nada. Agora, pensando na perspectiva daqui para a frente, quem fica no comando do movimento é quem está no movimento. Essa luta da população goianiense haverá de continuar. Se os governantes de fato não souberem dialogar com a sociedade de maneira mais gentil, republicana e não com rosas purulentas. A polícia vem, bate nos manifestantes e abre feridas. Quando a ferida começa a ganhar pus, eles vêm trazer essas rosas de pus. São rosas purulentas.
Posted on: Mon, 24 Jun 2013 01:22:29 +0000

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