Eu estava na Travessa do Leblon "a procurar o poeta Eugênio de - TopicsExpress



          

Eu estava na Travessa do Leblon "a procurar o poeta Eugênio de Andrade", em estante de autores portugueses; não o encontrei, e vi, amontoados a um canto, vários " Não te deixarei morrer...." Lembrei-me, de imediato, do volume que se encontrava na minha estante há algum tempo. A leitura do pequeno livro de Miguel de Souza Tavares, uma simples coletânea de textos esparsos, é gratificante. Em comum têm apenas o DNA do autor. São temas diversificados onde encontramos, aventura, lições de vida, poesia em prosa, o amor à natureza da terra natal e as saudades doloridas da mulher que se foi, lembrando o "Sem ti" de Eugênio, em deliciosa entonação portuguesa de Portugal. No último texto é abordada a perspectiva como a principal invenção do milênio com todas as suas consequências filosóficas. Acredito que este pequeno trecho dê uma boa idéia do todo. A noção de profundidade, em perspectiva de várias janelas abertas, é maravilhosa. Apenas um pedacinho: "Nada é mais natural do que a naturalidade com que as coisas acontecem e se sucedem: tudo nasce, cresce e morre, naturalmente. Enquanto eu estou a envelhecer, há crianças que estão a crescer e, quando eu estiver a morrer, haverá crianças que estão para nascer. E isto é assim com tudo: homens, árvores, universo. Nada é mais antinatural do que a ideia de eternidade, nada é mais absurdo e retrógrado do que as profecias do fim do mundo ou as promessas da vida eterna. Os meus filhos terão outros filhos, as árvores que plantei deixarão cair sementes na terra de onde nascerão outras árvores e a tudo se aplicará a lei de Lavoisier. É isto a perspectiva - a ideia de sobreposição, de continuidade, de harmonia. A história destes dois mil anos é uma sucessão contínua de janelas que se vão abrindo sobre horizontes cada vez mais além: Colombo chegou à América, Gama à índia, Cabral ao Brasil, Scott ao Pólo Norte, Armstrong à Lua. Mas nada disso teria acontecido se o Renascimento não tivesse derrotado o obscurantismo religioso e a crença de que é a fé e não a descoberta que move o mundo. A condenação de Galileu é o último marco simbólico na tentativa de impor à vontade de conhecimento dos homens o terror de Deus. A partir daí, abre-se o horizonte e o homem descobre, contra o mundo fechado que lhe propunham, a fascinante visão da profundidade. Se é então de datas que precisamos para assinalar pontos de viragem decisivos, esqueçamos dois mil, e guardemos antes e por exemplo esse ano de mil quatrocentos e quarenta e três, em que Brunelleschi pintou o Baptistério de Florença e com isso inaugurou o que chamamos a perspectiva - o infinito e o relativo, simultaneamente." Miguel de Souza Tavares Não te deixarei morrer, David Crockett Estação 2000: Perspectiva
Posted on: Sat, 03 Aug 2013 16:16:06 +0000

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