Hipoteca não Impede Usucapião Extraordinário - TJSC. Processo: - TopicsExpress



          

Hipoteca não Impede Usucapião Extraordinário - TJSC. Processo: 2008.031551-0 (Acórdão) Relator: Denise de Souza Luiz Francoski Origem: Criciúma Orgão Julgador: Primeira Câmara de Direito Civil Julgado em: 27/08/2013 Juiz Prolator: Giancarlo Bremer Nones Classe: Apelação Cível Apelação Cível n. 2008.031551-0, de Criciúma Relatora: Desa. Subst. Denise de Souza Luiz Francoski APELAÇÃO CÍVEL. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA EM AÇÃO DE USUCAPIÃO ORDINÁRIO. INSURGÊNCIA INTERPOSTA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. CONTRATO PARTICULAR DE COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA DE UM TERRENO INTEGRANTE DE LOTEAMENTO SOBRE O QUAL PESA HIPOTECA ANTERIOR, DEVIDAMENTE AVERBADA NA RESPECTIVA MATRÍCULA IMOBILIÁRIA. GRAVAME QUE, AO MESMO TEMPO EM QUE NÃO IMPEDE A CONFIGURAÇÃO DA PRESCRIÇÃO AQUISITIVA, IMPÕE A ANUÊNCIA DO CREDOR HIPOTECÁRIO À NEGOCIAÇÃO LEVADA A EFEITO, ACERCA DO QUE NÃO EXISTE DEMONSTRAÇÃO NA ESPÉCIE. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DO JUSTO TÍTULO E DA BOA-FÉ EXIGIDOS PELO ART. 551 DO CC/1916. CONJUNTO PROBATÓRIO QUE, APESAR DISTO, EVIDENCIA ESTAREM REUNIDOS OS PRESSUPOSTOS DA USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA ESPECIAL, PREVISTA NO ART. 1.238, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CC/2002, ANTE A CONJUNTA APLICAÇÃO DESTE DISPOSITIVO COM A REGRA DE TRANSIÇÃO ESPECÍFICA CONTIDA NO ART. 2.029 DO MESMO CÓDICE, DO QUE EXTRAI-SE A IMPRESCINDIBILIDADE DE OCUPAÇÃO PELO PRAZO DE 12 ANOS. ELEMENTOS DE CONVICÇÃO QUE, NESTE SENTIDO, COMPROVAM O EXERCÍCIO DA POSSE MANSA, PACÍFICA, ININTERRUPTA, E COM ANIMUS DOMINI, POR TEMPO SUPERIOR AO NECESSÁRIO PARA A OBTENÇÃO DA DECLARAÇÃO DO DOMÍNIO EM FAVOR DOS AUTORES APELADOS, QUE NOS TERRENOS ESTABELECERAM A SUA MORADIA. MANUTENÇÃO DA DECISÃO DE ACOLHIMENTO DO PLEITO EXORDIAL, TODAVIA, POR FUNDAMENTO DIVERSO. PRECEDENTES DESTA CORTE. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2008.031551-0, da comarca de Criciúma (1ª Vara da Fazenda), em que é apelante Representante do Ministério Público, e apelados Celírio Pereira Portal e Maria das Dores Casagrande Portal: A Primeira Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Custas legais. O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Carlos Prudêncio, com voto, e dele participou a Exma. Desa. Denise Volpato. Florianópolis, 27 de agosto de 2013. Denise de Souza Luiz Francoski Relatora RELATÓRIO Trata-se de Apelação Cível interposta por Representante do Ministério Público contra sentença que julgou procedente o pedido da ação de usucapião ajuizada por Celírio Pereira Portal e Maria das Dores Casagrande Portal. 1.1 Da Inicial Celírio Pereira Portal e Maria das Dores Casagrande Portal ajuizaram ação de usucapião. Aduziram que são legítimos possuidores, com animus domini do Lote 9 da Quadra F do Loteamento Vila Beatriz, parte integrante de uma área de terras maior, matriculada sob o nº3.813 do Cartório de Registro de Imóveis de Criciúma. Relataram que fazem jus à aquisição de propriedade de seu lote através de usucapião ordinário por que possuem justo título que comprova a posse por prazo superior a 10 (dez) anos, conforme artigo 551 do Código Civil de 1916. Enfatizou que os Apelados adquiriram o lote em 10/05/1982, há mais de vinte anos, de forma que as condições de sua posse fazem jus à aquisição de propriedade através de usucapião extraordinário. Informou que o imóvel original possui o gravame hipoteca junto em favor do Banco do Estado de Santa Catarina (BESC). Juntou os documentos de fls. 06/14. 1.2 Do comando inicial Na decisão de fls. 22, o juiz de 1º grau deferiu o pedido de justiça gratuita e determinou a citação das partes contrárias. 1.3 Da contestação do credor hipotecário O credor hipotecário apresentou contestação (fls.50/65) em que arguiu em preliminar a inépcia da inicial, a conexão com outras ações de usucapião relativas a lotes oriundos do desmembramento do mesmo imóvel, a carência de ação em virtude de inadequação da via eleita e sua ilegimitidade para figurar no pólo passivo da ação. No mérito, sustentou que "O título aquisitivo colacionado aos autos está ferido de morte porque não contempla a anuência do credor hipotecário à transação de compra e venda dos direito de posse do imóvel. Não existindo justo título, a posse passa a ser injusta, o que afasta qualquer possibilidade de aquisição da propriedade pela prescrição aquisitiva (...)" (verbis, fls.59) Argumentou que o bem encontra-se sob constrição judicial por que foi oferecido à penhora pela devedora Alfa Embalagens Ltada nos autos de execução por quantia certa nº020.83.000016-0. Alegou que o loteamento foi registrado sem a sua anuência. Acrescentou que a parte autora não operou de boa fé pois "não trouxe aos autos comprovação cabal de que ignorava os vícios e obstáculos que impediam a aquisição do imóvel." (verbis, fls.60) Ao final, requereu a denunciação a lide do Município de Criciúma e do Cartório de Registro de Imóveis de Criciúma. 1.4 Do encadernamento processual A proprietária, os confrontantes do imóvel, os réus incertos e terceiros interessados forma devidamente citados e deixaram fluir o prazo in albis (28/29 e 31v). Devidamente notificadas, as fazendas Municipal, Estadual e Federal não manifestaram interesse no feito (fls.24/26 e 32/36). O Ministério Público pugnou pela improcedência do pedido ante a inexistência de boa-fé e justo título (fls.82/86). O Magistrado de 1º grau afastou as preliminares arguidas de inépcia da inicial e ilegitimidade passiva, bem como os pedidos de conexão e denunciação a lide (fls.87/88). Foi realizada audiência de instrução e julgamento em que foram colhidos os depoimentos pessoais doas Apelados e de três testemunhas e apresentadas alegações finais orais pela procuradora dos Apelados (fls.98). O Ministério Público ofereceu alegações finais às fls.112/118. 1.5 Da Sentença Ao prestar a tutela jurisdicional (fls. 136/137) o Juízo julgou procedente o pedido deduzido na inicial pois entendeu que estão presentes no caso em questão os requisitos para declarar o domínio dos Apelados sobre olote nº9, quadra F do loteamento Vila Beatriz. Alegou que o fato de o imóvel encontrar-se penhorado é irrelevante para o deslinde da demanda pois o devedor não é o titular do domínio constante na matrícula do registro imobiliário. Argumentou que a existência de hipoteca não afasta a disponibilidade do devedor sobre o bem, nem condiciona eventual alienação ao prévio consentimento do credor hipotecário pois mesmo com a transferência permanece a hipoteca incidindo sobre o imóvel. Sustentou que a falta de anuência do credor hipotecário quanto ao registro do loteamento não produz efeito sobre a pretensão dos Apelados que tem por fundamento a aquisição de propriedade em função do exercício prolongado da posse sobre a área de lote. Acrescentou que não restaram comprovados os requisitos para a usucapião extraordinária pois essa exige a posse ininterrupta por vinte anos e depreende-se dos autos que os Apelados lá residem há dezenove anos. Afirmou que restaram comprovados os requisitos para a usucapião ordinária quais sejam posse ininterrupta, sem oposição, com justo título e boa-fé por dez anos entre presentes. Ressaltou que apesar de não ter sido firmado pelo proprietário indicado na matrícula do imóvel, o contrato particular de compra e venda atende à exigência do artigo 551 do Código Civil. Destacou que presume-se que os Apelados ao entabularem o negócio agiram com a convicção de que estavam adquirindo o bem do proprietário. Salientou que por que a posse ad usucapionem somente teve início dezenove anos após a instituição das hipotecas, verifica-se que o imóvel deve permanecer vinculado à garantia real. 1.6 Da Apelação Cível Irresignado, o Ministério Público interpôs recurso de Apelação Cível (fls. 146/151) em que postulou a reforma da sentença para que a ação seja julgada improcedente. Sustentou que não houve o cumprimento dos requisitos para a concessão da usucapião ordinária. Alegou que não há possibilidade da caracterização do justo título por que o contrato de compra e venda é mera simulação. Argumentou que não há boa-fé pois os Apelados pactuaram contrato simulado e adquiriram o terreno com plena convicção da impossibilidade de transferência de domínio em razão da restrição hipotecária. Acrescentou que ao homem médio não é crível a aquisição de imóvel urbano sem a verificação da possível transcrição imobiliária e que através disso os Apelados tomaram conhecimento da existência da garantia hipotecária. Defendeu que a prova testemunhal é imprestável pois ostentam a condição de informantes e por que não se pronunciaram sobre a impossibilidade de transferência de propriedade no respectivo registro imobiliário. 1.7 Das Contrarrazões Foram apresentadas contrarrazões pelos Apelados às fls. 155/163. Este é o relatório. VOTO 2.1 Da Admissibilidade Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso. 2.2 Do Objeto recursal Em análise aos autos, observa-se que, inconformado com a decisão proferida em primeiro grau, a parte Apelante objetiva, em síntese, a cassação do decisório com a improcedência dos pedidos da inicial. 2.3 Do mérito O art. 551 do Código Civil de 1916 exige para a configuração do usucapião ordinário o cumprimento dos requisitos dez anos de posse contínua e incontestada, justo título e boa-fé, como segue: Adquire também o domínio do imóvel aquele que, por dez anos entre presentes, ou quinze entre ausentes, o possuir como seu, contínua e incontestadamente, com justo título e boa-fé. Parágrafo único. Reputam-se presentes os moradores do mesmo município e ausentes os que habitem município diverso. Consta da inicial, em síntese, que em 1982 os Apelados teriam adquirido o Lote de nº9, da Quadra F, do loteamento Vila Beatriz, integrantes de uma área maior de terras, matriculada sob o nº 3.813 no 1º Ofício do Registro de Imóveis de Criciúma, sendo que, desde então, estariam a exercer a posse dos referidos terrenos, tendo neles fixado sua moradia. Anexaram ainda contrato de Compromisso de Compra e Venda em que figura como vendedor a empresa Imobiliária e Dedetizadora Cobrasul Ltda (fls.09). Aludida pretensão foi julgada procedente pelo togado singular, que, diante do contrato de Compromisso de Compra e Venda (fls. 09), entendeu caracterizado o exercício da posse com justo título e boa-fé por mais de 15 (quinze) anos, tempo tido como suficiente, por se tratar de usucapião entre presentes. O Apelante sustentou em síntese que não houve o cumprimento dos requisitos para a concessão da usucapião ordinária em síntese porque: a) o contrato de compra e venda é mera simulação e não constitui justo título; b) que os Apelados adquiriram o terreno com plena convicção da impossibilidade de transferência de domínio em razão da restrição hipotecária e dessa forma não agiram com boa-fé e que c) a prova testemunhal é imprestável pois ostentam a condição de informantes. Após examinar as provas juntadas aos autos, entendo que a declaração do domínio em favor de Celírio Pereira Portal e Maria das Dores Casagrande Portal é de ser mantida, mas por fundamento diverso. Importante destacar que o fato de existir hipoteca sobre a área do loteamento Vila Beatriz, integrado pelo terreno objeto da usucapião, não impede a sua alienação (art. 1.475 do Código Civil de 2002), embora preservado o direito de sequela do credor. Por conseguinte, mostra-se de rigor seja conferido o mesmo tratamento no que diz respeito à possibilidade de se reconhecer a configuração da prescrição aquisitiva. Porém a existência da restrição hipotecária impede o reconhecimento da ocupação com as características necessárias à configuração da usucapião ordinária. Isso porque o contrato de Compromisso de Compra e Venda (fls. 09) assinado pelos Apelados Celírio Pereira Portal e Maria das Dores Casagrande Porta não tem o condão de caracterizar a posse de boa-fé com animus domini, face a necessidade de anuência do credor hipotecário, o Banco do Estado de Santa Catarina S/A (BESC S/A). Em relação à necessidade de anuência do credor hipotecário para alienação de bem gravado com hipoteca cedular tem-se o seguinte julgado do TJSC: APELAÇÃO CÍVEL. SUSCITAÇÃO DE DÚVIDA. ALIENAÇÃO DE IMÓVEL GRAVADO COM HIPOTECA CEDULAR (CÉDULA DE CRÉDITO INDUSTRIAL). NECESSIDADE DE ANUÊNCIA DO CREDOR HIPOTECÁRIO. EXEGESE DO ART. 51 DO DECRETO-LEI N. 413/69. DECISUM MANTIDO. APELO DESPROVIDO. Estando o imóvel objeto da escritura pública de compra e venda gravado com hipoteca cedular (cédula de crédito industrial), faz-se necessária a aquiescência prévia e por escrito do credor para a sua alienação, a teor do disposto no art. 51 do Decreto-Lei n. 413/69. (TJSC, Apelação Cível n. 2011.045917-3, de Balneário Camboriú, rel. Des. João Henrique Blasi, j. 30-10-2012).(sem grifo no original) E o Egrégio Tribunal de Justiça já afirmou que se a alienação não teve a anuência do credor hipotecário faltam a boa-fé e o justo título necessários para a concessão da usucapião ordinária : AÇÃO DE USUCAPIÃO ORDINÁRIO. LOTEAMENTO VILA BEATRIZ. AQUISIÇÃO DE LOTE POR CONTRATO PARTICULAR DE COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA. IMÓVEL ADQUIRIDO SEM ANUÊNCIA DO CREDOR HIPOTECÁRIO. GRAVAMES AVERBADOS NA MATRÍCULA DO IMÓVEL. AUSÊNCIA DE JUSTO TÍTULO E BOA-FÉ. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. A aquisição da propriedade pela usucapião ordinária exige a comprovação do exercício de posse mansa, pacífica, com animus domini, ininterruptamente por 10 (dez) anos, entre presentes, ou 15 (quinze) anos, entre ausentes, de imóvel que detém justo título e boa-fé, nos termos do artigo 551 do Código Civil de 1916. A existência de ônus real gravando imóvel alienado sem a anuência do credor hipotecário obsta o preenchimento dos requisitos referentes ao justo título e à boa-fé exigidos à usucapião ordinária quando configurada posse precária exercida pelos adquirentes sobre o imóvel (AC nº 2010.042492-6, de Criciúma, rel.: Des. Jaime Luiz Vicari, j. 10/05/2012, grifei). No mesmo sentido: APELAÇÃO CÍVEL. COISAS E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE USUCAPIÃO ORDINÁRIO. PROCEDÊNCIA NA ORIGEM. - LOTEAMENTO VILA BEATRIZ. ÁREA GRAVADA POR HIPOTECA. AVERBAÇÃO NO REGISTRO DE IMÓVEIS. LOTE USUCAPIENDO. AQUISIÇÃO POR INSTRUMENTO PARTICULAR. ANUÊNCIA DO CREDOR HIPOTECÁRIO AUSENTE. BOA-FÉ AFASTADA. REQUISITOS DO ART. 551 DO CC/16. NÃO PREENCHIMENTO. PRECEDENTES DESTA CASA. - ÔNUS SUCUMBENCIAIS. INVERSÃO. - SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PROVIDO. Por força do art. 551 do Código Civil de 1916, a declaração de propriedade por meio de usucapião ordinária é possível quando a posse do imóvel é exercida de forma contínua e incontestada, por dez anos (entre presentes) ou 15 anos (entre ausentes), com justo título e boa-fé. Se, todavia, aquele que adquiriu o lote estava ciente do gravame (hipoteca) que pendia sobre a área maior - devidamente averbado no Registro de Imóveis -, o que tornava, estreme de dúvidas, indispensável a anuência do credor hipotecário, não pode agora arguir a sua boa-fé para fins de usucapião. Precedentes deste Tribunal. Com a reforma da sentença, impõe-se a inversão dos ônus sucumbenciais (Apelação Cível nº 2010.024310-6, de Criciúma, rel.: Des. Henry Petry Junior, j. 20/10/2011). Assim, por que os pressupostos justo título e boa-fé não estão presentes não é possível declarar configurada a usucapião ordinária. No entanto, as provas mostram que é possível reconhecer a prescrição aquisitiva com base no art. 1.238, parágrafo único, do Código Civil vigente, que assim estabelece: Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis. Parágrafo único. O prazo estabelecido neste artigo reduzir-se-á a dez anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo. (grifei) E a regra de transição específica contida no art. 2.029 do Código Civil de 2002, fixa que "até dois anos após a entrada em vigor deste Código, os prazos estabelecidos no parágrafo único do art. 1.238 e no parágrafo único do art. 1.242 serão acrescidos de dois anos, qualquer que seja o tempo transcorrido na vigência do anterior, Lei no 3.071, de 1o de janeiro de 1916", sendo exigidos, pois, 12 (doze) anos de posse. As provas mostram que os Apelados ocuparam o Lote de nº9, da Quadra F, do loteamento Vila Beatriz, aproximadamente no ano de 1987. Assim, quando do ajuizamento da ação, em 01/12/2004, já havia transcorrido mais de 17 (dezessete) anos de ocupação pelos Apelados, dos quais aproximadamente 2 (dois) deles sob a vigência da lei civil atual completados em 10/01/2005, conforme exige o referido art. 2.029 do Código Civil de 2002. Sobre a matéria, tem-se o seguinte julgado do Superior Tribunal de Justiça: DIREITOS REAIS. USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIO. POSSE PARCIALMENTE EXERCIDA NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL DE 1916. APLICAÇÃO IMEDIATA DO ART. 1.238, § ÚNICO, DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. INTELIGÊNCIA DA REGRA DE TRANSIÇÃO ESPECÍFICA CONFERIDA PELO ART. 2.029. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO EM PARTE E, NA EXTENSÃO, PROVIDO. 1. Ao usucapião extraordinário qualificado pela "posse-trabalho", previsto no art. 1.238, § único, do Código Civil de 2002, a regra de transição aplicável não é a insculpida no art. 2.028 (regra geral), mas sim a do art. 2.029, que prevê forma específica de transição dos prazos do usucapião dessa natureza. 2. O art. 1.238, § único, do CC/02, tem aplicação imediata às posses ad usucapionem já iniciadas, "qualquer que seja o tempo transcorrido" na vigência do Código anterior, devendo apenas ser respeitada a fórmula de transição, segundo a qual serão acrescidos dois anos ao novo prazo, nos dois anos após a entrada em vigor do Código de 2002. 3. A citação realizada em ação possessória, extinta sem resolução de mérito, não tem o condão de interromper o prazo da prescrição aquisitiva. Precedentes. 4. É plenamente possível o reconhecimento do usucapião quando o prazo exigido por lei se exauriu no curso do processo, por força do art. 462 do CPC, que privilegia o estado atual em que se encontram as coisas, evitando-se provimento judicial de procedência quando já pereceu o direito do autor ou de improcedência quando o direito pleiteado na inicial, delineado pela causa petendi narrada, é reforçado por fatos supervenientes. 5. Recurso especial parcialmente conhecido e, na extensão, provido (Resp nº 1088082/RJ, rel.: Ministro Luis Felipe Salomão, j. 02/03/2010, DJe de 15/03/2010, grifo meu). Não há tampouco dúvida de que a posse dos terrenos foi exercida com animus domini por Celírio Pereira Portal e Maria das Dores Casagrande Portal, que neles fixaram sua moradia, lá permanecendo, ao que se tem, sem interrupção, nem oposição, fatos que não foram impugnados pelo Apelante e que foram confirmados pela prova oral produzida na audiência de instrução e julgamento. Nesse sentido foram as informações prestadas por Antônio Carlos Mezzari, conforme o Termo de Depoimento de fl. 101: "(...) que o depoente afirma que mora no loteamento Vila Beatriz há aproximadamente 14 anos; (...) que os autores Celírio Pereira Portal e Maria das Dores Casagrande Portal (...) já moravam no imóvel em questão quando o depoente foi morar no loteamento; (...)" O que foi confirmado pelas informações prestadas por Albino Magagnim, segundo o Termo de Depoimento de fl. 103: "(...) que o depoente afirma que é o primeiro morador do loteamento e que lá está há 26 anos; (...) que conhece os autores Celírio Pereira Portal e Maria das Dores Casagrande Portal e acredita que os mesmos estão morando no loteamento Vila Beatriz há aproximadamente 19 anos; (...)" Assim em relação ao tempo de ocupação do imóvel, os depoentes afirmaram que os Apelados residem no local há mais de 15 (quinze) anos (fls. 101 e 103), razão pela qual fazem jus à referida modalidade de usucapião. Frise-se que o argumento do Ministério Público de que a prova testemunhal é imprestável pois os depoentes ostentam a condição de informantes é destituído de embasamento uma vez que não há indícios de prática de conluio com os Apelados. Ademais o artigo 405 do Código de Processo Civil prevê que é prerrogativa do magistrado dar credibilidade às informações prestadas por informantes: Art. 405. Podem depor como testemunhas todas as pessoas, exceto as incapazes, impedidas ou suspeitas. (...) § 4o Sendo estritamente necessário, o juiz ouvirá testemunhas impedidas ou suspeitas; mas os seus depoimentos serão prestados independentemente de compromisso (art. 415) e o juiz Ihes atribuirá o valor que possam merecer. Ademais, os depoimentos corroboram as demais provas constantes nos autos. Diante do exposto, deve-se manter a procedência do pedido inicial, com a declaração da aquisição da propriedade originária em favor de Celírio Pereira Portal e Maria das Dores Casagrande Portal, mas por estar configurada a usucapião extraordinária especial do art. 1.238, parágrafo único, c/c. o art. 2.029, ambos do Código Civil de 2002.. Ao decidir outras ações de usucapião de moradores do mesmo loteamento Vila Beatriz, o Egrégio Tribunal de Justiça de Santa Catarina já entendeu pela aplicabilidade do usucapião extraordinário: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE USUCAPIÃO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DO CREDOR HIPOTECÁRIO. PRELIMINARES DE INÉPCIA DA INICIAL, CARÊNCIA DE AÇÃO E ILEGITIMIDADE PASSIVA. DOCUMENTOS DESTINADOS À INDIVIDUALIZAÇÃO DO BEM JUNTADOS EM MOMENTO OPORTUNO, SEM QUE HOUVESSE QUALQUER PREJUÍZO À DEFESA. MEDIDA INTENTADA ADEQUADA À CONVOLAÇÃO DA POSSE DURADOURA OBEDECIDOS CRITÉRIOS LEGAIS. IMPOSSIBILIDADE DE SE RECONHECER ILEGITIMIDADE DE PARTE QUE ACORREU AO PROCESSO VOLUNTARIAMENTE PARA DEFENDER SEUS INTERESSES. PROEMIAIS AFASTADAS. HIPOTECA SOBRE IMÓVEL MAIOR NO QUAL SE IMPLANTOU LOTEAMENTO. DIREITO REAL SOBRE IMÓVEL ALHEIO QUE NÃO O RETIRA DO MERCADO. POSSIBILIDADE DE ALIENAÇÃO. IRRELEVÂNCIA DE EXISTÊNCIA DE JUSTO TÍTULO E BOA-FÉ. USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA. POSSE PARCIALMENTE EXERCIDA NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL DE 1916. APLICAÇÃO IMEDIATA DO ART. 1.238, § ÚNICO, DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. INTELIGÊNCIA DA REGRA DE TRANSIÇÃO ESPECÍFICA CONFERIDA PELO ART. 2.029. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO (AC nº 2010.074492-1, de Criciúma, rel.: Des. Ronei Danielli, j. 21/06/2012, grifei). No mesmo sentido: APELAÇÕES CÍVEIS. COISAS E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE USUCAPIÃO. PROCEDÊNCIA NA ORIGEM. PRELIMINARES. I - LEVANTAMENTO PLANIMÉTRICO NÃO JUNTADO À INICIAL. DOCUMENTO ACOSTADO POSTERIORMENTE. INÉPCIA AFASTADA. II - CARÊNCIA DE AÇÃO. INOCORRÊNCIA. ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA. INVIABILIDADE E INEXIGIBILIDADE. USUCAPIÃO POSSÍVEL E ADEQUADA. LEGITIMIDADE PASSIVA. CREDOR HIPOTECÁRIO. INTERESSE DIRETO. III - PREFACIAIS AFASTADAS. I - Não há falar em inépcia da inicial em razão da não juntada do levantamento planimétrico à exordial, tanto porque não se enquadra com perfeição às hipóteses do art. 295, parágrafo único, do Código de Processo Civil, quanto porque o documento foi juntado posteriormente aos autos, do que teve ciência o apelante. II - Adequada a "ação de usucapião", pois inviável a adjudicação compulsória na espécie e autônomo o direito à declaração da propriedade por usucapião; é legitimado passivo o credor hipotecário, a fim de fazer preservar seu direito real de garantia, sendo destituída de sustentação a alegação de carência de ação. MÉRITO. I - LOTEAMENTO VILA BEATRIZ. USUCAPIÃO ORDINÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. AQUISIÇÃO DOS LOTES USUCAPIENDOS. HIPOTECA ANTERIOR AVERBADA. BOA-FÉ AFASTADA. FIXAÇÃO DE MORADIA SOBRE UM DOS LOTES ADQUIRIDOS (LOTE 11). POSSE HÁ MAIS DE 10 ANOS. PRESSUPOSTOS DO USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIO COM PRAZO REDUZIDO PREENCHIDOS. EXEGESE DOS ARTS. 1.238, PARÁGRAFO ÚNICO E 2.029 DO CC/2002. II - OITIVA COMO INFORMANTES. DEPOIMENTOS CONCATENADOS. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO FÁTICA ESPECÍFICA. NOTÓRIA OCUPAÇÃO DO LOTEAMENTO. PROVA BASTANTE DA POSSE. PRINCÍPIO DO LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO. III - ÔNUS SUCUMBENCIAIS. REDISTRIBUIÇÃO. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA RECONHECIDA. IV - SENTENÇA REFORMADA. RECURSOS PROVIDOS PARCIALMENTE. I - Não obstante ausente a boa-fé necessária ao reconhecimento do usucapião ordinário, porquanto existente averbação de hipoteca sobre o imóvel anteriormente à aquisição dos lotes usucapiendos, impõe-se a declaração do domínio sobre um dos lotes (lote n. 11) quando demonstrado que os autores o ocupam há mais de 10 (dez) anos e sobre ele edificaram sua moradia habitual, preenchendo os requisitos do novo usucapião extraordinário com prazo reduzido, em consonância com os arts. 1.238, parágrafo único, e 2.029, ambos do Código Civil de 2002. II - O simples fato de que os vizinhos foram ouvidos na qualidade de informantes não impede o reconhecimento da prova do fato constitutivo do direito da parte autora - na espécie, a posse por mais de dez anos e o estabelecimento da moradia habitual - quando os seus depoimentos são concatenados, não há impugnação fática específica da defesa e a ocupação do loteamento é fato público e notório, sobremaneira porque vige em nosso ordenamento o princípio do livre convencimento motivado. III - Com a reforma da sentença, a fim de julgar parcialmente procedentes o pleito, tão somente para reconhecer a usucapião de um dos lotes, impõe-se a sucumbência recíproca com equivalência de derrotas (AC nº 2008.061461-4, de Criciúma, rel.: Des. Henry Petry Junior, j. 27/09/2012, grifo meu). E ainda atestando a possibilidade de reconhecer em juízo a prescrição aquisitiva em modalidade diversa daquela inicialmente requerida pelos demandantes, tem-se o seguinte julgado: DIREITOS DAS COISAS. USUCAPIÃO. LOTE URBANO. IMÓVEL GRAVADO COM HIPOTECA JUNTO AO BESC. AUTORES QUE COMPROVAM ESTAR RESIDINDO NO IMÓVEL EM TEMPO SUFICIENTE À AQUISIÇÃO DO DOMÍNIO PELA VIA AQUISITIVA EXTRAORDINÁRIA, CUJO LAPSO PREVISTO NO CC/2002, APLICÁVEL À ESPÉCIE, É DE 15 (QUINZE) ANOS (ARTS. 1.207, 1.238, CAPUT, E 2.028 DO CC/2002, E ART. 333, INC. I, DO CPC). SENTENÇA MANTIDA, AINDA QUE POR OUTRO FUNDAMENTO. RECURSO DO CREDOR HIPOTECÁRIO IMPROVIDO. Alcançados, pelos autores, sobre o imóvel usucapiendo, mais de 15 (quinze) anos de posse mansa, pacífica, ininterrupta e sem oposição - até porque construíram sobre ele a casa onde a família reside - deve ser-lhes reconhecida a prescrição aquisitiva, eis que evidenciados os pressupostos concessivos da usucapião extraordinária (AC nº 2010.075628-7, de Criciúma, rel.: Des. Eládio Torret Rocha, j. 29/09/2011). Assim, é de se manter a sentença, ainda que por fundamento diverso. Dessa forma, conheço e nego provimento ao recurso. 3.1 Do Dispositivo Ante o exposto, conclui-se por conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Custas legais. Esse é o voto. Gabinete Des. Denise de Souza Luiz Francoski
Posted on: Mon, 30 Sep 2013 13:44:33 +0000

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