Não foque no foco. Existe uma avaliação quase geral de que os movimentos de hoje perdem força devido à ausência de foco, de liderança, de uma pauta específica de reivindicações, de uma ideologia clara. Penso que nada poderia estar mais errado. Vamos avaliar a questão por dois lados: um deles o lado estrutural, ligado à lógica do movimento, àquilo que o impulsiona; o outro o lado pragmático, referente aos resultados. Sob o ponto de vista estrutural, leio esse movimento não como uma manifestação reivindicatória, que venha exigir algo dos governos. Não me parece ser isso. O que ocorre aqui é que, durante 500 anos, o povo brasileiro NUNCA falou, mantendo um pacto de silêncio inquebrável. Sempre havia um partido político, uma empresa da Grande Mídia, um grupo de interesse no comando das poucas manifestaçoes de fato na História do Brasil e o povo era tratado como gado nesses movimentos, assim como o era no cotidiano. Não havia realmente expressão popular, tanto por falta de consciência (devido à condição da Educação em nosso País, que nunca foi boa), quanto por falta de mecanismo de agregação popular (leia-se Facebook). Hoje, o que acontece aqui é uma catarse. Todos falam e cada um fala de suas necessidades, de sua indignação, de sua esperança ou da falta dela. Todos falam ao mesmo tempo e, com toda a sinceridade, não se importam se alguém está ouvindo. Tudo o que importa é falar, quebrar o silêncio, com o povo mostrando ao povo que maifestações como essa podem existir, não são um pecado, não são uma baderna, são parte do processo democrático. A voz do povo hoje é a voz do caos, um caos ideológico que popula nosso povo, um caos de necessidades que o clichê explica muito bem: mistura desafios do século XIX a desafios do século XXI. Não existe foco porque não precisa existir: o importante é falar, detonar um processo que vai desembocar na aceleração da maturidade da Democracia brasileira. Esse é o ponto central. Os movimentos desses dias são uma manifestação do processo de maturação, fruto da crescente indignação do povo brasileiro com a elite política que ele mesmo mantém no poder. Essa é uma indignação reflexiva e, por isso, não pede nada a ninguém, não diz nada coerentemente. É o povo conversando sozinho, mas falando, o que é inédito em nossa história. Sob o ponto de vista pragmático, o que estamos vendo em termos de consequencias imediatas? TODOS estão com medo. Dilma faz discursos pró-manifestações e se reúne com marketeiros, a juventude do PSDB de SP coloca o péna boca e divulga nota de repúdio, lendo o movimento como uma "manobra para desestabilizar o governo Alkmin " (PS: se 30.000 pessoas saem às ruas apenas para desestabilizar um governados de estado, o mínimo que se deveria esperar dele é uma renúncia...), blogueiros de direita colocam a cauda entre as pernas e pedem desculpas por tratar os manifestantes como "baderneiros". Por que tudo isso? Porque não existe uma liderança que possa ser co-optada. Não existe uma figura a quem se possa fazer promessas e mandar para casa. Não existe uma pauta de negociações para atender... e, por isso, os governos estão em pânico! Fazer a coisa certa agora é fazer história em torno do próprio nome; fazer a coisa errada agora é cometer suicídio político... mas qual é a "coisa certa"? Qual é a "coisa errada"? A classe política brasileira está em uma sinuca de bico inteiramente vinda do povo, algo que não acontece há 500 anos nesse país. O que vejo hoje é um movimento que já venceu, por mais que haja escalada de vandalismo, o efeito já foi consolidado: a classe política já percebeu que está diante de uma nova realidade e que o povo brasileiro (ou uma parte extremamente barulhenta dele) está disposto agora a falar como nunca falou antes... e as consequencias disso são imprevisíveis. Por favor, parem de pedir foco. Foco aqui só adria a nossos políticos algo em que se apoiar. Por favor, parem de pedir liderança. Liderança significa cabeças a cortar ou moldar. Isso é algo que nossos políticos estão desesperados por encontrar. Por favor, parem de pedir uma pauta clara de exigências... isso só coloca nossos governantes de volta ao solo seguro daquilo que eles já experienciam há cinco séculos. Hoje, apresentamos o novo e, a partir do novo, muita mudança pode ocorrer.
Posted on: Wed, 19 Jun 2013 03:36:50 +0000
Trending Topics
Recently Viewed Topics
© 2015