O menino com a cara esculpida no asfalto era um menino. Andava com - TopicsExpress



          

O menino com a cara esculpida no asfalto era um menino. Andava com os pés pretos, “que nem carvão!”, dizia a mãe; “da poeira e da fuligem”, dizia a verdade. Andava com a pequena caixa. A caixa dos sonhos. E dela imaginara tantos futuros. (Ó mas tantos, que nem se pode imaginar!) Mas, para o menino, esses futuros sempre pareciam muito distantes. Mais distantes que aquele grande relógio, que ilumina as noites no centro da cidade. Um círculo e alguns traços, era isso que o menino via. Mas ele sabia que lá dentro, o relógio não andava sozinho. Tinha gente lá. Tinha gente que fazia o traço se mexer. E o menino gostava de se imaginar essa gente que faz o traço mexer, que faz o tempo andar, que faz girar o gigante. Mas estava tudo dentro da caixa do menino. Não era uma caixa de Pandora, do tipo que o mantinha preso aos desagradáveis apelos dos sentimentos cruéis. Nem era a lâmpada de Aladdin, que o prometia a transformação mágica em três estágios. A caixa tinha o que a caixa devia ter. Uma escova, um paninho, e um pouco de graxa. E quando o sol ia embora, e o relógio brilhava de novo, o menino ia dormir. Feliz por deixar pretos os pés dos outros, pensando que agora, eram um pouco mais iguais às solas dos seus. E dizia boa noite ao círculo e aos traços do gigante relógio. Distantes, mas sempre visíveis.
Posted on: Thu, 07 Nov 2013 02:27:28 +0000

Trending Topics



Recently Viewed Topics




© 2015