Operações da Polícia Federal e a mudança do estereótipo da - TopicsExpress



          

Operações da Polícia Federal e a mudança do estereótipo da criminalidade Cada sociedade tem o criminoso que quer, já dizia o sociólogo Howard Becker, em meados dos anos 60, revelando ser impossível dissociar o crime das impressões individuais e políticas. No momento em que a temática da corrupção está tão em voga, como as operações da Polícia Federal (PF) podem contribuir para a mudança do estereótipo da criminalidade no Brasil? Certo é que, com o seu trabalho, a PF está mudando a percepção da sociedade brasileira, jogando luz sobre um tipo de criminoso muito mais nocivo do que aquele normalmente perseguido pelo sistema penal. O crime não é um fenômeno neutro. Conforme o filósofo Michel Foucault, é uma construção social. E o processo de objetivação pelo qual se define o que é crime e quem é criminoso nasce nas estratégias e lutas de poder e dominação entre os homens. Os grupos mais influentes elegem os valores a ser protegidos e as condutas a ser criminalizadas, perseguidas e punidas. A partir dessa ótica, as leis penais representam os interesses dos que detêm o poder na sociedade e todo o sistema penal se volta prioritariamente à punição dos tradicionais delitos praticados pelas camadas mais baixas da sociedade, sobretudo os delitos contra o patrimônio. Basta um rápido olhar sobre o perfil da população carcerária e condenada em geral. Possuem maior chance de serem selecionados pelo sistema penal os membros das classes sociais mais baixas. Foucault relata que, no século XVII, a população se levantava em revoltas contra o fisco. O contrabando era saudado pela população e tinha amplo apoio e proteção nos castelos. Era difícil distinguir juridicamente e moralmente o que era a criminalidade. Na segunda metade do século XVIII, com a multiplicação da riqueza e das propriedades, o alvo principal da ilegalidade popular se desloca da linha dos direitos para alcançar os bens. Pilhagem e roubo no lugar do que antes era o contrabando e a luta armada contra os agentes do fisco. Se a burguesia aceitava bem a ilegalidade dos direitos, não admitia quando o ataque recaia sobre seu direito de propriedade. Para as ilegalidades de bens, como o roubo praticado por populares, reservava-se a condenação pelos tribunais ordinários. Para as ilegalidades de direitos, praticados pela burguesia, fraudes, evasões fiscais, operações comerciais irregulares, havia jurisdições especiais com transações e acomodações de penas, multas atenuadas. Essa herança de pensamento perdura até o tempo atual. Para o criminoso comum, a cadeia (cifra negra). Para os criminosos do “colarinho branco” (cifra dourada), de extrato social elevado, os termos de ajustamento de conduta, as multas, que por si só não refreiam esse tipo de criminalidade, pois já estão computadas no risco do negócio criminoso. Quando o sociólogo norte-americano Edwin Sutherland cunhou o termo “crimes do colarinho branco”, em 1940, os criminólogos tiveram que superar o pressuposto de que o crime se concentrava nas classes mais baixas. A criminalidade não poderia mais ser associada apenas à pobreza e às condições sociais inferiores. O juiz federal Paulo Lima apontou numa recente palestra que os criminosos do “colarinho branco” não possuem o tradicional estereótipo da marginalidade e contam com uma identificação cultural entre legisladores e administradores da justiça, em razão de formação semelhante e da convivência no mesmo círculo social. Assim, é preciso vencer o costume de considerar que bandido tem cara de bandido. De outra forma, será bastante difícil prender ou julgar alguém que é “igual” a você. O sociólogo Austin Turk demonstra que tanto a criminalização primária, na elaboração das leis, quanto a secundária, na seleção realizada pela polícia, parquet e Judiciário, sofrem com o processo de identificação cultural com os autores de “crimes do colarinho branco”. Turk destaca o papel preponderante da polícia no processo seletivo do que é crime/criminoso, pois é a partir da investigação policial que ocorre o ingresso dos fatos no sistema penal. Sendo assim, ao atingir empresários, banqueiros e políticos, as operações da PF têm um papel histórico na mudança de paradigma da imagem do crime e do criminoso. Para o cientista político Rogério Arantes, além de resgatar a corrupção das esferas administrativa e civil de volta para a esfera criminal, as operações da Polícia Federal são como a ponta de um iceberg: representam um ponto de inflexão no combate ao crime organizado e à corrupção no Brasil. Elas permitem visualizar a própria natureza e as características principais do crime organizado e da corrupção. Hoje, graças à atuação da Polícia Federal, o Brasil conhece mais esses problemas. Este é o primeiro passo para superar os estereótipos e enfrentar melhor a impunidade ainda reinante nesse tipo de criminalidade econômico-financeira detentora de tantos e injustificáveis privilégios legais e processuais. Fonte: Atualidades do Direito (Marcos Leôncio Sousa Ribeiro)
Posted on: Tue, 05 Nov 2013 15:57:17 +0000

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