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Parabéns ao nosso município!!! Hoje (21.11.13) Boa Viagem completa 149 anos de emancipação política. Com a colaboração do meu amigo e historiador Eliel Júnior saiba um pouco mais sobre nossa história. História do Município Share the post História do Município A FORMAÇÃO COLONIAL: Durante muitos anos acreditou-se que o Alferes Antônio Domingues Álvares e a sua esposa, Agostinha Sanches de Carvalho, foram os primeiros habitantes a chegarem às terras que constituíram a primitiva área do território boa-viagense. Ao fazermos esta simples observação não temos qualquer propósito de contestar que foram eles os fundadores dessa cidade. Antes de nos aprofundarmos nesse assunto julgamos oportuno lembrar que a cidade de Boa Viagem, localizada no Sertão Central do Estado do Ceará, se originou de uma fazenda e que, antes deles, outras pessoas se estabeleceram por aqui tentando explorar as riquezas que essas terras poderiam produzir. Para entendermos a origem histórica desse Município precisamos compreender a forma como se deu a sua colonização, daí então chegaremos à conclusão, observados os elementos, de que a decisão do deslocamento do casal em fuga para esta região não foi obra do acaso, mais sim algo previamente premeditado. No início da colonização das terras brasileiras o Governo de Portugal fez de tudo para não onerar o tesouro real com novas dívidas, a corte portuguesa desejava fazer riqueza para o seu país com a sua nova colônia sem ter a obrigação de investir nenhuma de suas “patacas”, estudava a possibilidade de ter grandes lucros com um baixo investimento. “Povoar a sua nova conquista era fundamental para Portugal manter os seus domínios americanos e resistir às incursões estrangeiras. Mas, para povoar, era preciso apresentar uma alternativa de enriquecimento e de poder que não onerasse a Coroa”. (CAMPOS & GARCIA MIRANDA, 2005: p. 205) As terras brasileiras foram fatiadas e criteriosamente divididas entre aqueles que tinham prestígio e recursos disponíveis para explorar ao máximo às terras recém “descobertas”, visto que, nessa época, o comércio com o Oriente parecia ser bem mais lucrativo e a Coroa portuguesa temia perder a sua nova conquista para as outras nações europeias. A Capitania do Ceará foi criada em 1535 e era a menor entre as demais, possuía apenas 600 quilômetros de extensão ao longo do litoral e tinha como marco de limite o Rio da Cruz, em Camocim, ao Rio Jaguaribe, que se estende praticamente por toda a lateral da chapada do Apodi. O primeiro donatário da Capitania do Ceará foi Antônio Cardoso de Barros, um fidalgo português que pouco se empenhou em promover o seu povoamento, tendo em vista que tinha outras ocupações e não investiu em algo que, a curto prazo, lhe desse o retorno financeiro desejado. Esse fato fez com que o litoral cearense ficasse a mercê dos corsários franceses, que rotineiramente negociavam com os selvagens no intuito de ganhar-lhes a confiança e ter-lhes como aliados em um possível incursão militar. A Capitania ficou em completo abandono até o ano de 1603, quando Pero Coelho de Sousa conseguiu autorização real para reconquistar e desenvolver o território cearense e recebeu por conta disso o título de capitão-mor. O primeiro objetivo desse novo explorador era impedir o comércio indígena com os invasores franceses e, logo em seguida, após ganhar-lhes a confiança, construir um núcleo de povoamento as margens do Rio Ceará usufruindo do potencial do Rio Jaguaribe a fim de partir para a colonização de seus afluentes. Dentro de pouco tempo parte desse plano conseguiu obter êxito, uma pequena vila foi erguida com o nome de Fortim de São Tiago da Nova Lisboa, mas infelizmente, em 1605, uma terrível seca se abateu sobre essa Capitania e fez com que os seus habitantes, desesperados, se refugiassem no Forte dos Reis Magos, localizado na Capitania do Rio Grande do Norte. Frustrada essa tentativa uma nova investida foi feita por volta de 1607, desta vez comandada pelos jesuítas Padre Francisco Pinto e Padre Luiz Figueira, que no dia 11 de janeiro celebraram o primeiro ofício cristão em nossas terras. Nessa tentativa, desta vez pela serra da Ibiapaba, os silvícolas da tribo Tocarijus trucidaram o Pe. Pinto esmagando-lhe a cabeça e por muito pouco o Pe. Luiz Figueira e os outros colonos conseguiram escapar do mesmo destino. “Os índios nunca se conformaram com a tomada de suas terras, caças, pescas, frutos e raízes. Hostilizaram sempre. Os colonos viviam a morrer de fome por terras. E quando estas passaram do domínio público a propriedade privada, foi um Deus-nos-acuda a busca desenfreada por sesmarias”. (FERNANDES VIEIRA, 1977: p. 29) Por fim a colonização do Ceará só obteve êxito a partir de 1611, quando Martim Soares Moreno, um dos colonos da frustrada tentativa feita por Pero Coelho de Sousa, anos antes, conseguiu conquistar a simpatia do Cacique Jacaúna e fazer dele um importante aliado contra os holandeses. Graças a esse aliado os portugueses conseguiram expulsar os invasores e conquistaram uma importante defesa para o nosso litoral, o Forte de Schoonenborch, uma importante posição de defesa que havia sido construído com os destroços do abandonado Forte de São Sebastião. Depois desses episódios percebeu-se que as terras cearenses não eram próprias para o cultivo da cana-de-açúcar, mas possuíam forte potencial para a extração das drogas do Sertão e para a criação de gado às margens dos grandes rios. “Nenhum povo tinha tanta facilidade para se adaptar em regiões tropicais do que o português. O clima mais árido ou mais frio não o amolecia. A terra mais adusta não enlanguescia e se por ali não existiam louras angélicas com quem se deitar, as negra e as mulatas serviam. A cultura de seu povo mandava que ele se adaptasse naturalmente às condições sociais do lugar, onde quer que se encontrasse. Não tivesse preconceito de raça! A miscigenação imediata com as mulheres de cor, vigorosas mestiças, dóceis indiazinhas e rebolentas negrinhas, era uma questão de força e necessidade. Até dizia com os interesses políticos e econômicos de seu Estado. Considerasse seu igual todo aquele que não fosse herege, que não descresse de Deus e não dirigisse em orações aos santos. Facilmente poderia ele conhecer um marrano ou um doente religioso: o padre estava sempre ao seu lado para saber da ortodoxia católica de alguma pessoa”. (FERNANDES VIEIRA, 1977: p. 27) Até o século XVII a criação de gado bovino no Brasil desenvolveu-se nas regiões canavieiras, próximas do litoral, para atender às necessidades dos engenhos. Além de fornecer a carne e o couro o gado era utilizado como meio de transporte e força de tração para moer a cana. Aos poucos esses canaviais foram ocupando maiores extensões de terras, obrigando aos criadores de gado a penetrar o Sertão com os seus rebanhos e criando novos laços de relacionamento social. Avançando pelo Sertão os criadores atingiram o Rio São Francisco e não tardou muito até chegarem ao Rio Jaguaribe e aos seus afluentes, onde constituíram fazendas e pequenos núcleos de povoamento em terras que posteriormente lhes eram cedidas em cartas de sesmarias. “Metade da história do Ceará é contada através dele. Não se pode falar do Ceará sem se se tocar no Rio Jaguaribe. Ele é longo, desce com toda a beleza na época invernosa para o mar devorador e insaciável. Durante o verão fica estorricado, transformando-se em um imenso lençol de areia. O homem que eternamente luta com ele na disputa dos terrenos de aluvião, e por causa da cheias perde a sua lavoura, pode então plantar uma vazante”. (FERNANDES VIEIRA, 1977: p. 12) As concessões destas sesmarias eram requeridas pelos que se diziam dispostos a obterem terras para a criação bovina, ou mesmo para aumentar a quantidade de pasto das propriedades rurais já estabelecidas. Alegavam os requerentes que o desenvolvimento econômico da região e a consequente renda de sua majestade só se tornaria expressiva com o aumento do rebanho. As doações, ou datas, como geralmente eram conhecidas, correspondiam normalmente a duas léguas de comprimento por meia légua de largura e uma das condições para que as terras fossem datadas era a exigência da existência de água potável. O sesmeiro, ao receber essa concessão, possuía a carência de dois anos para por em prática várias obrigações, entre esses deveres podemos listar o compromisso de pagar os dízimos a Deus, “dos frutos que nela houvesse”, catequizar os índios e se dispor à guerra quando solicitado pelo rei. As distribuições dessas sesmarias iniciaram um intenso movimento de colonização em nossas terras e entre esses colonos, por volta de 1702, estava o casal Gil de Miranda Carneiro e Bárbara Maria de Barros, que mais tarde, em 1710, receberam a sesmaria de posse de onde hoje está a cidade de Boa Viagem. “Em vista das palavras de outro requerimento de Gil de Miranda e Antônio Mendes Lobato, em que pedem a 25 de fevereiro de 1702, umas terras no Rio Salgado, assim concebido, que eles descobriram com outros companheiros umas terras no distrito do Icó”. (BEZERRA, 1918: p. 86) De rio em rio o gado bovino, mansamente, sem existir cercas que lhe impedissem a livre escolha do pasto, veio trazendo o homem branco para o Sertão do Ceará e dentro de pouco tempo, em 1710, às terras de Boa Viagem foram requisitadas em concessão. “Concedida no Brasil uma sesmaria, o concessionário ou o sesmeiro era obrigado a demarcá-la judicialmente dentro de dois anos, e pedir depois a confirmação régia, sob pena de perder a mercê; o que se estabeleceu por lei de 1703 e 1753; mas essa disposição era geralmente desprezada. Obtida a sesmaria poucos sesmeiros a demarcavam e buscavam confirmação pelo dispêndio e dificuldade que encontravam: mas, não obstante, metiam-se de posse das terras e o futuro trazia grandes contendas e dissensões pela falta de medição e pela coincidência de outras concessões. Os pleitos eram renhidos e nos sertões eram origem de assassinatos e desordens”. (ARARIPE, 2002: p. 133) No texto lavrado da sesmaria concedida a Antônio Domingues Álvares, datado em 26 de junho de 1743, nos deixam pistas claras a respeito dos primeiros moradores de nossa região e da história da conquista dessas terras. Através desse valioso documento deduzimos que Gil de Miranda Carneiro e a sua esposa, Barbara Maria de Barros, nunca residiram nas terras que hoje formam o nosso Município. Acreditamos que a sua propriedade nas proximidades da Vila do Icó era bem mais lucrativa e promissora do que essas terras localizadas no Sertão Central, que eram bem mais distantes dos centros urbanos da época e bem mais suscetíveis a grandes períodos de estiagens. Diante disso, impossibilitado de explorar essa nova conquista, quem sabe por conta da idade ou da longa distância, essas terras foram doadas, talvez como presente de casamento, um dote, a uma de suas filhas e, posteriormente, negociadas com Antônio Domingues Álvares. A carta de solicitação de sesmaria de Antônio Domingues Álvares é bem clara quando nos diz que Phelipe Rodrigues e Barbosa de Barros, genro de Gil de Miranda Carneiro, durante alguns anos morou com a sua esposa onde hoje está Boa Viagem, mas não nos revela os motivos que o fizeram vender essa propriedade, nem o seu valor, nem a quantidade de semoventes e nem as benfeitorias realizadas durantes os anos de sua residência por aqui. “… Senhor Capitão mayor e governador, diz Antônio Domingues Álvares que elle está possuhindo e dominando três légoas de terra de Cumprido e huma de Largo meya pera cada Banda, em hum Riacho chamado de Crateús do poente para o nascente, e vem fazer Barra em outro a que chamão de fundo Cruz, e dahy correm ambos juntos a desagoar no Rio Quixeramobim, as quais terras forão concedidas no anno de mil setecentos e doze…. Gil de Miranda Carneiro e sua esposa Bárbara Maria de Barros passaram a três léguas de terras a uma de suas filhas e a seu genro Phelipe Rodrigues e Barbosa de Barros, dos quais os ouve o suppte por compra, e os sobreditos as posssuhirão e tiverão sempre povoada com gados, e o suppllicante desde quando os comprou…”. (NASCIMENTO, 2002: p. 51-52) Hipoteticamente acreditamos que no Arraial de Nossa Senhora do Ó, posteriormente chamada de Vila do Icó, todos tinham conhecimento das terras de Gil de Miranda Carneiro no Sertão Central de nossa Capitania. Certos dessa hipótese podemos deduzir também que Antônio Domingues Álvares, quando esteve nessa vila, entre 1725 a 1730, de alguma forma tomou conhecimento da existência dessas terras e, possivelmente, tenha até tido algum contato com algum dos membros da família de Gil de Miranda Carneiro. Acreditamos ainda que ele passou muitos dias perambulando pela Vila do Icó, quem sabe até sendo hospede de Gil de Miranda, espreitando uma simples oportunidade de falar com a sua amada Agostinha. Confiamos ainda que Antônio Domingues Álvares sabia da existência destas terras ou, quem sabe, Agostinha tinha amizade com a esposa de Phelipe Rodrigues, a filha de Gil de Miranda Carneiro, e que esses lhe dariam refúgio por algum tempo em sua propriedade após a planejada fuga. Todas essas suposições nunca nos serão respondidas, mas o benefício da dúvida sempre estará do nosso lado e reforçará ainda mais os muitos mistérios que envolvem esse simples casal. Ainda nessa época, como sabemos, o Sertão era famoso por ser um ótimo local para quem quisesse se esconder da lei, era uma excelente opção de refúgio para criminosos que fugiam do alcance da justiça. “Da Serra dos Cocos, dos Cariris Novos, da Chapada do Araripe, da Serra da Joaninha, da Serra Grande, das Várzeas do Icó, chegavam constantemente toda sorte de criminosos. Eram delinquentes primários que praticavam alguma vingança, eram cabras procurados pela milícia, eram recomendados de algum parente, jagunços de coronéis amigos, mas fora da graças dos políticos da Província ou da Corte, a quem o poderoso fazendeiro protegia seguramente contra toda e qualquer perseguição, pessoal ou legal”. (FERNANDES VIEIRA, 1977: p. 94) A famosa carta de sesmaria nos revela ainda que, depois de estabelecido, anos mais tarde, provavelmente depois de ter feito as pazes com o seu sogro, Antônio Domingues escreveu ao capitão-mor de nossa Capitania, João de Teyve Barreto e Menezes, no intuito de legalizar a situação de suas terras frente ao Governo Lusitano e alegou que a primeira carta de sesmaria, a que foi entregue a Gil de Miranda Carneiro, já não existia mais. “… e o suplicante desde quando os comprou, pagando todos Dízimos a Deus e porque a dita data se perdeo, e buscando o suplicante nos Livros dos Registros a não acha, e pera melhor conservação de seu dereyto pede a vossa Senhoria lha Conceda por nova data em nome de sua Magestade que Deus goarde as ditas tres legoas de terra…”. (NASCIMENTO, 2002: p. 52) Essa carta nos informa ainda de sua prosperidade e o curso de como adquiriu essa gleba, porém não informa se a sua aquisição foi imediata ou se morou durante algum tempo com a família de Phelipe Rodrigues. Outro tema que nos inquieta e nos desperta o interesse é o fato de que ele tenha se referido a inexistência dessa primeira carta de sesmaria, entretanto descobrimos que essa concessão foi autorizada no dia 7 de novembro de 1710 e não em 1712, como equivocadamente ele alegou. Vale a pena deixar claro também que, embora solicitando ao governo e depois passando a possuir essas duas cartas de sesmaria esse casal habitava na localidade denominada de Espírito Santo, hoje dentro dos limites do Município de Monsenhor Tabosa. Nessa época, sem a existências de cercas de arame farpado, o pecuarista precisava de grandes extensões territoriais para o seu gado e essa astuciosa forma de ampliar os seus limites geográficos tinha por objetivo fornecer uma maior quantidade de pastos ao seu rebanho. Com o passar dos anos e a divisão em heranças essas terras, como também a dos outros sesmeiros que estavam dentro dos limites do Município de Boa Viagem, foram sendo divididas entre os parentes, agregados e os forasteiros que foram se estabelecendo na região. A FORMAÇÃO ROMÂNTICA: Como falamos anteriormente a partir da metade do século XVI a máquina estatal portuguesa foi se tornando cada vez mais dependente dos negócios atlânticos, a crise do comércio com o Oriental pôde aos poucos ser compensada pelo florescimento das atividades açucareiras na América e pelo tráfico de escravos negros oriundos da África. O eixo geográfico e econômico do império foi se deslocando, gradativamente, para o Oceano Atlântico e possibilitou altíssimos lucros para à Coroa lusa. Nessa época a metrópole portuguesa vivia uma situação de contrastes sociais em suas ruas, ao mesmo tempo em que a aristocracia se fortalecia com os negócios de ultramar e grandes comerciantes associados ao Estado enriqueciam a maior parte da população empobrecia. Nesse contexto de crise social a vastidão e a fertilidade das terras americanas se constituíam em um forte atrativo para a vinda de europeus empobrecidos para o continente americano. O Velho Mundo já não era mais capaz de dar o sustento a todos os seus filhos e alguns deles, portugueses, espanhóis, ingleses, franceses e etc, eram forçados a ir buscar subsistência longe de suas pátrias, principalmente aqueles que tinham sangue judeu em suas veias. “Mais atingidos pela crise inflacionária, aos pobres do reino português restava um último motivo de orgulho, oriundo da hegemonia da mentalidade aristocrática: a identidade cristã. Seus olhares rancorosos se voltaram para as comunidades que viviam nos bairros judaicos, as judiarias, e para os cristãos novos, vistos sempre com desconfiança. Ataques a essas comunidades e denúncias de seus membros ao Tribunal do Santo Ofício eram práticas correntes da população empobrecida e de mercadores cristãos-velhos, estes motivados por interesses e rivalidades mercantis. Por ironia, tantos judeus e cristãos-novos quanto os cristãos-velhos tinham na América uma alternativa para as dificuldades verificadas na Metrópole. Por sua extensão e possibilidades de enriquecimento, a América tornou-se um lugar de refúgio para a comunidade judaica portuguesa”. (CAMPOS & GARCIA MIRANDA, 2005: p. 211) No início do século XVIII uma família de judeus-portugueses emigrou de sua terra natal com destino à colônia portuguesa na América do Sul na intenção de obter melhores condições de vida e o principal, construir fortuna. “Na primeira metade do século XVIII o português Manuel da Rocha Franco, casado com Maria Sanches de Carvalho, seu cunhado Domingos Sanches de Carvalho e as sete filhas do casal: Antônia Franco de Carvalho, Senhorinha de Carvalho, Anacleta Sanches de Carvalho, Eugênia Gonçalves de Carvalho, Agostinha Sanches de Carvalho, Lina de Carvalho e Bernardina Sanches de Carvalho emigraram de Portugal com destino ao Brasil”. (NASCIMENTO, 2002: p. 49) Quando essa família chegou ao Brasil logo fixou residência na Vila de Olinda, localizada no litoral da Capitania de Pernambuco, onde, não sabemos por qual o motivo, visto que, nessa época, a mineração na região das Minas Gerais parecia ser bem mais lucrativa, Manuel da Rocha Franco decidiu começar a exploração de uma mina de cal. “Viviam em Pernambuco muitas famílias de cristãos-novos, expulsos de Portugal e Espanha, vindos de Amsterdã. Algumas levas, por autodefesa, abraçaram o Cristianismo, mas nunca dispensaram suas práticas judaicas, embora ocultamente. Outras haviam fugido para evitar as perseguições do Santo Ofício”. (FERNANDES VIEIRA, 1977: p. 30) O negócio com a mina de cal, ao que nos parece, não ia tão bem, o ramo da pecuária parecia ser bem mais lucrativo do que o de construção. Sobre esse assunto Nascimento (2002: 49), em sua obra Memórias de Minha Terra, nos informa que os sogros de Manuel da Rocha Franco eram “Agostinho de Carvalho e Ana Gonçalves de Carvalho, os quais, em Pernambuco, constituíram a grande família dos Carvalhos” e estes eram prósperos pecuaristas da região, bem como senhores de escravos. “Originários da Ilha de Itamaracá, Rocha e Franco, do bisavô Manuel da Rocha Franco, que tinha um irmão Capitão-mor na Ribeira do Acaraú, eram famílias que existiam em França desde tempos remotos. Arnaldo da Rocha foi companheiro de D. Galdim Pires, mestre da Ordem do Templo. Teve esta família armas em Portugal… Sanches, da bisavô, Maria Sanches de Carvalho, vinha de D. Diniz, rei de Portugal, que teve dois filhos: D. Afonso e Fernão. Carvalho foi uma família que teve, além do brasão de armas, solar e muitas terras em Coimbra”. (FERNANDES VIEIRA, 1977: p. 62) Embora acreditemos que a causa da migração da família de Manuel da Rocha Franco para o Brasil seja o mesmo da maioria dos outros portugueses, fazer fortuna, para alguns o real motivo está ligado ao romance de uma de suas filhas, Agostinha Sanches de Carvalho, com o Alferes Antônio Domingues Álvares, um jovem de sangue judeu-português. “Os chamados cristãos-novos ou judeus convertidos ao catolicismo foram, a rigor, o principal alvo da ação inquisitorial portuguesa por mais de duzentos anos e os mais estigmatizados, ao menos do ponto de vista jurídico, pela obsessão da “pureza de sangue” que grassava em Portugal”. (SOUZA, 1997: p. 239) Apesar do jovem alferes ter sangue marrano não acreditamos que o verdadeiro motivo esteja ligado simplesmente a sua ascendência judia, pois a família da esposa de Manoel da Rocha Franco, como afirma Nascimento (2002: 49), “a grande família dos Carvalhos, a que pertenciam muitos judeu-portugueses”, tinha em suas veias o sangue do povo de Israel. “A partir do século XV a situação dos judeus tornou-se particularmente difícil na península ibérica. Em 1492, ano da primeira viagem de Colombo, foi anunciada a obrigatoriedade da conversão dos judeus ao Cristianismo na Espanha. As perseguições levaram milhares de judeus a fugirem para outras regiões europeias, principalmente para Portugal e França. Pouco tempo depois, a onda de segregação e violências, também se estendeu para terra lusitana, que também culminou na imposição da fé cristã às comunidades judaicas, em 1495. Criavam-se na península ibérica duas novas características sociais: o cristão-velho, que havia gerações professava a religião cristã, e o cristão-novo, judeu recentemente convertido ou que tinha algum parente judeu entre seus avós e bisavós. Entre os cristãos-novos, duas diferenciações: o converso, sempre suspeito de judaísmo, e o marrano, que mantinha a sua fé original mas praticava exteriormente a religião cristã apenas para sobreviver”. (CAMPOS & GARCIA MIRANDA, 2005: p. 176) Supomos que o romance não era permitido pelos pais de Agostinha pelo fato de Antônio Domingues Álvares ser um jovem que não possuía recursos financeiros suficientes para dar-lhe uma vida digna. Contudo, se a nossa opinião não estiver correta, se o verdadeiro motivo estiver ligado ao preconceito racial, ambicionava a todo o custo esconder o seu parentesco com o povo judeu, em outras palavras, tinha vergonha da descendência de sua esposa. Por essa razão procurava a todo o custo “purificar” o sangue de sua família através do casamento de suas filhas. Ele desejava realizar o enlace matrimonial de sua prole com homens que as projetassem socialmente, se porventura permitisse tal união estaria selando o seu futuro, Agostinha seria uma excluída social pelo fato de ter optado em relacionar-se com um descendente de judeu. Pouco tempo depois, informado do paradeiro da família Rocha Franco, chegou ao porto do Recife uma embarcação de bandeira lusa que trazia a bordo, entre os seus passageiros, Antônio Domingues Álvares, que, meses antes, havia dado baixa de seu posto de alferes no exército português, e que, decidido pela paixão, viera ao encontro de sua amada na longínqua colônia portuguesa na América do Sul. “Alferes é um posto ou uma graduação militar existente nas forças armadas de alguns países. Normalmente corresponde a um posto das categorias de oficial subalterno ou de cadete oficial. Originalmente o alferes era o encarregado do transporte da bandeira ou estandarte de um exército, unidade militar, ordem de cavalaria ou outra instituição militar, civil ou religiosa. Posteriormente transformou-se em um posto militar, ao qual já não estava necessariamente inerente o exercício da função de porta-bandeira. No entanto, em diversas forças armadas, continua a manter-se a tradição dos alferes mais novos de cada unidade serem designados para a função de porta-bandeiras”. (S.N.T) Constantemente informado com as notícias que vinham das docas e decidido a mudar de ramo o velho patriarca decidiu embrenhar-se no Sertão na intenção de cumprir o propósito que o trouxe ao Brasil, prosperar financeiramente. “O Sr. Manuel da Rocha Franco tratou de liquidar seus negócios em Olinda e partiu para o Ceará, fugindo pela segunda vez do judeu, que pretendia fazer parte de sua família, deparando com uma bela chapada, onde surgia uma vila, denominada de Icó”. (NASCIMENTO, 2002: p. 49) A família de Manoel da Rocha Franco, saindo de Olinda, fixou residência próximo ao Rio Salgado, nas proximidades do Arraial Novo dos Icós, posteriormente Vila do Icó, localizado na Capitania do Ceará, voltando os seus esforços para o plantio de cereais e a criação de gado. Depois de estabelecidos começaram a prosperar financeiramente e as suas filhas casaram-se com pessoas influentes da região. Para o cauteloso patriarca tudo indicava que Antônio Domingues Álvares esquecera a bela Agostinha. A enorme distância entre Olinda e o Icó fazia com que se acreditasse que nunca mais se ouviria falar daquele mancebo, por isso, estava tranquilo na esperança de não mais sofrer o assédio do insistente rapaz. Algum tempo depois, atento a qualquer informação que o levassem ao destino de sua amada e desiludido pela esperança de ter as bençãos de seu sogro, Antônio Domingues descobriu o roteiro daqueles que tanto procurava e decidiu que dessa vez não iria mais falar com o patriarca e sim iria propor uma fuga a sua querida Agostinha. Certificado da veracidade das informações recebidas Antônio Domingues passou alguns dias escondido em algum lugar nas proximidades da fazenda de seu futuro sogro espreitando uma oportunidade de falar com a sua amada. “Certo dia, Agostinha ordenou à sua negrinha de companhia que fosse ao mato apanhar alguns espinhos de mandacaru, objetivando facilitar o trabalho manual de coser rendas em sua almofada”. (NASCIMENTO, 2002: p. 49) A tão esperada oportunidade surgiu quando esse se encontrou com uma escrava que estava a colher espinhos de mandacaru no meio do mato, hábito comum naquela época. Insistentemente pediu à mucama, que talvez o conhecesse, que entregasse um bilhete para sua ama e que à noite esperava a resposta daquela missiva no mesmo local. Movida pelo amor e pela longa saudade Agostinha foi ao encontro do seu amado, acompanhada de sua escrava, pronta para a cautelosa fuga. “Sem perda de tempo, montaram num fogoso cavalo. A história não nos revela se havia outro animal, o que podemos presumir é que Agostinha viajou na garupa e sua mucama na lua da sela fugindo rumo ao imprevisível”. (NASCIMENTO, 2002: p. 50) O jovem casal dirigiu-se para a Vila da Mocha, posteriormente denominada de Oeiras, principal povoado da Capitania do Piauí, na intenção de se casarem, pois sabiam que ali havia alguns padres jesuítas que estavam realizando as Santas Missões. Mas, o intento, não ocorreu como esperavam, por falta dos documentos apropriados tiveram de adiar o casamento para outra oportunidade. Diante dessa nova dificuldade tomaram outros rumos, até que chegaram aos Sertões do Quixeramobim, localizado na Capitania do Ceará. Pouco sabemos se a decisão de vir por essas bandas foi proposital ou obra do acaso, sabemos apenas que ao se aproximarem do local onde hoje está à Fazenda Domingos da Costa, atual sede do distrito, temerosos de serem encontrados pelos jagunços a mando do pai de Agostinha, pressentiram que estavam sendo seguidos por pessoas armadas. Para dificultar ainda mais a desesperada fuga o cavalo que os conduzia morreu pela fadiga da longa e cansativa viagem próximo a uma lagoa, às margens do Riacho Cratiú. Em desespero e temendo serem alcançados pelos supostos jagunços, Agostinha prometeu que se escapassem mandariam construir, naquele local, uma capela em homenagem a Nossa Senhora da Boa Viagem. É bem complexo imaginarmos esse momento, tendo em vista que os dois tinham sangue judeu, povo que, historicamente, possui uma forte aversão à idolatria. Infelizmente não sabemos muito, ou quase nada, sobre a vida religiosa do casal, tudo o que se fala sobre isso, hoje, é montado em conjecturas e suposições que muitas vezes aumentam a intensidade desse clamor. Se foi algo de dentro do coração ou apenas um forte gesto de piedade por conta do desespero, não sabemos; o que sabemos e que eles cumpriram a promessa. Era muito comum, naquela época, valer-se de um santo publicamente, possuir um padroeiro ou, na melhor das hipóteses, construir uma capela, era uma forma de fugir da incriminação social que os podia levar para a folgueira do Santo Ofício. Isso servia até de prova para afirmar a catolicidade da pessoa frente às outras, no intuito de sair das vistas do tribunal eclesiástico, principalmente para um cristão-novo e os seus descendentes. Conta-se que um dos jagunços, ao chegar às proximidades onde hoje está à Fazenda Domingos da Costa, sofreu de contrações espasmódicas dos músculos, se contorcendo em dores por conta do tétano. Esse motivo os fez regressar urgentemente para a Vila do Icó, deixando o casal fugitivo viver em paz até uma nova oportunidade de serem encontrados. Depois de algum tempo, tranquilizado pelo fim da perseguição, Antônio Domingues Álvares resolveu ir a sede da Capitania de Pernambuco no intuito de conseguir a documentação necessária para a realização de seu tão sonhado enlace matrimonial. Durante o período de sua ausência, não sabemos por quanto tempo e nem o local exato de seu esconderijo, Antônio Domingues deixou a sua amada e a pequena mucama escondidas. Algumas fontes nos relatam que elas ficaram em uma casinha de taipa, próxima à casa de um fazendeiro de sua confiança, provavelmente Phelipe Rodrigues e Barbosa de Barros, genro de Gil de Miranda Carneiro, nas proximidades do Riacho Cratiú e da mesma lagoa onde falecera o seu possante cavalo algum tempo antes. Mais tarde a referida lagoa recebeu a alcunha de Lagoa do Cavalo Morto, em terras que eram pertencentes a Vila de Santo Antônio de Quixeramobim. Esse período de breve afastamento marcou muito o início da vida conjugal do jovem casal pelo fato de ter ocorrido a morte, de uma forma terrível, de uma grande aliada. “Certa noite, Agostinha ouvindo uma pancada na porta, ordenou que sua acompanhante fosse examinar o que ocorria. Infelizmente era uma onça, que devorou a mucama. Ao regressar, Domingues encontrou Agostinha chorosa e abatida, com o triste acontecimento, que também muito o abalou”. (NASCIMENTO, 2002: p. 51) Contemporâneos dessa história nos dão conta que, finda tristeza pelo trágico incidente, os noivos finalmente conseguiram se casar e algum tempo depois conseguiu celebrar as pazes e encerrar a rixa existentes dentro da família. Algum tempo depois, segundo relatos do Prof. Manoel Ximenes de Aragão, o casal prosperou financeiramente com a pecuária e por volta de 1772 doaram terras e gado para a construção da Capela de Nossa Senhora da Boa Viagem, que posteriormente foi elevada à condição de paróquia. Ainda sobre esses fantásticos e românticos acontecimentos ficamos surpresos com a escassa historiografia local produzida durante todos esses anos sobre esse misterioso casal. Sobre os seus descendentes alguns relatos afirmam que eles geraram apenas três filhos, algo bastante incomum para essa época, Maria do Ó de Carvalho, Isabel Carvalho e Luciano Domingos Carvalho. Outro mistério que cerca esse casal envolve a sua morte, não sabemos com precisão onde estão sepultados, acreditamos que estejam em algum local próximo à Igreja Matriz de Nossa Senhora da Boa Viagem, onde existia um cemitério. “Dizia a octogenária, triste e chorosa, talvez relembrando os seus falecidos sepultados ao lado da capelinha: Senhora Raimunda, esta morte, esta morte!” (NASCIMENTO, 2002: p. 54) Sobre a sua residência, como falamos anteriormente, algumas fontes nos afirmam que o casal não residia na Vila de Cavalo Morto, primeiro topônimo de Boa Viagem, e sim em um local na Zona Rural denominado de Espírito Santo, hoje dentro dos limites geográficos do Município de Monsenhor Tabosa, que antigamente pertencia ao Município de Boa Viagem. A FORMAÇÃO SOCIAL E ECONÔMICA: Como fica fácil de perceber, semelhantemente a Roma, capital italiana, Boa Viagem possui uma história romântica cheia de mistérios, mas o Município não se tornou o que é por conta de sua lírica história de formação. Ninguém moraria nela se ela não oferecesse as condições básicas necessárias para a subsistência de seus habitantes. Na realidade, ao contrário do que muitos pensam, quando esse casal por aqui chegou essa terra já era habitada, já existiam pessoas que de alguma forma exploravam os recursos naturais dessa região. “Não sabemos, com precisão, o dia, mês e ano em que Antônio Domingues e Agostinha chegaram a esta terra que, aliás, já era habitada por algumas pessoas. Em 1712, para ratificar o que estamos dizendo, o casal Gil de Miranda Carneiro e sua mulher Bárbara Maria de Barros recebeu uma concessão de três léguas de terra, no Riacho Cratiú (primeiro nome de Boa Viagem). Essa concessão foi repassada, em 26 de junho de 1743, pelo Capitão-mor João de Teyve Barreto e Menezes, Governador do Ciará Grande, a Antônio Domingues, nosso segundo donatário, aqui chegando antes de 1743, considerado o fundador desta terra, em vista a construção da capela, por volta de 1772. A partir dessa data foi mudado o nome, de Riacho do Cavalo Morto para Boa Viagem, em virtude da boa e feliz viagem empreendida pelos nossos fugitivos”. (NASCIMENTO, 2002: p. 54) Nessa época, como em qualquer comunidade interiorana, a construção de uma capela era de grande importância para a sua população. Essa edificação religiosa, muitas vezes tosca, servia como ponto de referência para àqueles que não conheciam a região e de orgulho para os moradores das proximidades que rotineiramente a frequentavam. O templo se constituía em um ponto de encontro das pessoas que muitas vezes demoravam a se ver, local onde se ficava a par das novidades dos grandes centros, das fofocas da localidade e dos flertes entre os jovens. O deslocamento mensal de um pároco ou outros religiosos para essa comunidade se constituía em uma novidade impar e era celebrada por todos como símbolo de status e prestígio da comunidade frente ao bispo da diocese. Aos poucos, no passar dos anos, foram sendo construídas pequenas casas no entorno da pequena capela e o pequeno núcleo urbano foi sendo formado. Vista aérea do “Marco Zero do Município.Logo as casas soltas formaram pequenas ruas e estas se tornaram em uma pequena vila, com um pequeno e sortido comércio que conseguia atrair os poucos sertanejos que moravam em suas proximidades. Para essa pequena vila veio residir, depois de muito tempo, boticários, mesinheiras, parteiras, ferreiros, professores, advogados e uma série de profissionais liberais que são necessários ao progresso de uma inexpressiva localidade do interior cearense. A cidade de Boa Viagem começou assim, aos poucos deixou de ser uma pequenina fazenda e se tornou em uma imponente cidade, desde o início a sua economia girou em torno da agricultura e da pecuária, foi um grande curral desbravado por muitos vaqueiros e tangerinos, serviu durante muitos anos como um criatório de gado ao céu aberto para produzir as famosas charqueadas. Como sabemos, ainda nessa época, a coroa portuguesa não permitia a criação de gado no litoral nordestino, pois essa prejudicava o plantio da cana-de-açúcar, até então o principal produto da balança comercial da colônia. Nesse intuito, buscando aumentar a área de plantio, desde cedo se percebeu que o litoral cearense não servia para o desenvolvimento desse precioso produto. Diante desses problemas uma das saídas encontradas pelos criadores de gado foi trazer os rebanhos para a Colônia do Ceará. As boiadas cearenses eram engordadas soltas pelo Sertão e depois tangidas com destino ao porto da Vila do Aracati, no litoral da colônia, onde eram abatidas, salgadas e depois embarcadas no intuito de alimentar os habitantes dos vastos canaviais do litoral brasileiro. “O Aracati teve início com o funcionamento das oficinas ou charqueadas do Ceará, que foram responsáveis por possibilitar a competitividade da pecuária no Estado, tendo em vista os privilégios da Zona da Mata pernambucana com a cultura canavieira. Aracati transformou-se então em produtor de carne seca e no principal porto de exportação deste produto para as regiões canavieiras, além de continuar a ser um ponto de apoio militar. A possibilidade de abate e conservação da carne, através do charque, foi a principal responsável pela ocupação e desenvolvimento das terras do Ceará. Por volta de 1740 já existiam oficinas em Aracati, inicialmente no pequeno Arraial de São José dos Barcos do Porto dos Barcos do Jaguaribe, depois elevada à categoria de Vila com o nome de Santa Cruz do Aracati, hoje cidade do Aracati. O comércio de carne e couro atraía abastados senhores de locais diversos. Aracati manteve-se por longo tempo como a localidade de maior influência de formação econômica, social e política do povo cearense”. (S.N.T) Devido a sua história econômica não fica difícil de entender que esse modo de criação de gado, e de exploração das terras cearenses, influenciou as relações político-sociais da sua gente. Um outro produto que serviu para trazer progresso ao Ceará, e em especial à nossa região foi o algodão, ele foi o grande responsável por fixar, por muito tempo, o sertanejo à terra. A cotonicultura se constituiu em um importante fator para o enriquecimento e o desenvolvimento do Ceará, especialmente para Boa Viagem. Nesse tempo, devido à grande capacidade de fornecimento e à boa qualidade de sua terra para produção dessa fibra nossa região recebeu certa projeção nacional, inclusive, ainda nessa época, essa região chegou à terceira colocação mundial como a maior produtora de algodão. Esse bom desempenho agrícola foi finalmente reconhecido pela Assembleia Legislativa da província cearense quando no dia 21 de novembro de 1864 a Vila de Boa Viagem, antiga Cavalo Morto, recebeu a sua emancipação política do Município do Quixeramobim, até então a principal vila da Província do Ceará nessa região. “Seria, contudo, na década de 1860 que haveria um incremento na procura do algodão cearense pelo mercado exterior, em conseqüência da desorganização da produção dos Estados Unidos, principal fornecedor dessa fibra para a Europa, envolvidos na Guerra da Secessão”. (FARIAS, 1997: p. 105) Com o passar dos anos e a crescente retomada desse mercado pelos norte-americanos a produção algodoeira boa-viagense sofreu uma séria retração por conta das várias estiagens e da praga do bicudo, especialmente no final do século XX. “O bicudo-do-algodoeiro é um besouro da família dos curculionídeos, originário da América Central, de coloração cinzenta ou castanha e mandíbulas afiadas, utilizadas para perfurar o botão floral e a maçã dos algodoeiros. É tido como uma importante praga agrícola nos Estados Unidos da América, e a espécie foi introduzida no Brasil em 1983, causando prejuízos nas plantações de algodão do Nordeste”. (S.N.T) Atualmente, além do plantio para subsistência de arroz, milho, feijão, mandioca e batata o agricultor de nosso Município aposta as suas esperanças no plantio da mamona e nos incentivos governamentais para fabricação do bio-combustível. A nossa economia depende também da exploração da dolomita, da produção em grande escala de tinta em pó solúvel, de um variado comércio varejista, e registramos ainda o nascimento de um pequeno pólo de fabricação de calçados. A FORMAÇÃO POLÍTICA: Essa porção de terras localizada no Sertão Central do Estado do Ceará, como observamos anteriormente, já possuía alguns moradores no final do século XVIII, colonos vindos de outras regiões do Brasil fixaram residência nessas paragens tendo em vista que isso era do interesse da coroa portuguesa, que proibiu a criação de gado no litoral por conta do cultivo da cana-de-açúcar e incentivou a sua penetração para o interior do continente. Nessa época, de 1621 a 1774, por conta das dificuldades de comunicação e gerenciamento, o Brasil estava dividido em duas regiões administrativas independentes: o Estado do Maranhão, com capital em São Luís, até 1737, quando foi transferida para Belém, passando a chamar-se de Estado do Grão-Pará e Maranhão; e o Estado do Brasil, com capital em Salvador, até 1763, quando foi transferida para o Rio de Janeiro. No livro XIV de Sesmarias, página 131, registra-se que em 1712, Gil de Miranda Carneiro e a sua esposa, Bárbara Maria de Barros, receberam a concessão de três léguas de terras, que na época era conhecida como Riacho Cratiú, das mãos do Capitão-mor João de Teyve Barreto e Menezes, Governador do “Ciará Grande”. “João de Teyve Barreto e Menezes, nomeado capitão-mor por patente régia de 9 de outubro de 1742, foi empossado no governo a 2 de fevereiro do ano seguinte”. (ARARIPE, 2002: p. 192) Infelizmente ainda não possuímos um conhecimento detalhado dessa época, o que sabemos é que, tempos depois, estas terras foram entregues à filha do casal e ao seu genro, Phelipe Rodrigues. Supomos que a irregularidade do clima e a mudança de eixo econômico tenha-os desanimado e possivelmente os afastado de sua conquista. Nesta mesma época, na segunda metade do século XVIII, por essas terras, chegou o casal Antônio Domingues Álvares e a sua esposa Agostinha Sanches de Carvalho que receberam, mais tarde, no dia 26 de junho de 1743, o termo de posse da referida terra. A gigantesca propriedade inicialmente tornou-se próspera graças a criação de gado e muitos anos depois o plantio de algodão, espécie introduzida, durante muito tempo foi o principal produto de plantio da região. “Em fins do século XVIII e início do XIX, o algodão se efetivava como poderosa atividade econômica, aliada á pecuária, e compunha parte do fisco metropolitano”. (VIEIRA JUNIOR, 2004: p. 36) Algum tempo depois, nas proximidades de uma pequena capela, local que acreditamos tenha sido a sede de uma fazenda, se transformou aos poucos em uma pequena vila e posteriormente, pela lei provincial nº 1025, de 18 de novembro de 1862, em um bem sucedido distrito pertencente ao Município de Quixeramobim. Em 1863 a Vila de Boa Viagem já possui 80 casas, e, graças ao bom desempenho de sua produção agrícola a vila ganhou um significativo aumento em sua população, 1279 pessoas, o que resultou em sua emancipação política do Quixeramobim, antiga Vila de Campo Maior, através da lei nº 1128, de 21 de novembro de 1864. Com o recebimento dessa autonomia política somente no dia 7 de janeiro de 1869 foi instalada a nossa Câmara Municipal de Vereadores e o primeiro desafio enfrentado por esses representantes do povo foi a demarcação dos limites geográficos daquilo que veio a ser o Município de Boa Viagem. Com relação a essa demarcação de terras temos de afirmar que não foi algo fácil de se fazer, tendo em vista que o Município de Quixeramobim não queria perder significativos recursos em seu erário. Nessa época, bem diferente de hoje, os municípios brasileiros sobreviviam somente daquilo que conseguiam arrecadar em impostos dentro de suas fronteiras. Esses impostos, muitas vezes anualmente, eram postos em leilão para quem os arrematassem por uma maior quantia, ou seja, o Município, para ter logo uma grande soma de dinheiro em mãos, não arrecadava os impostos e sim terceirizava o direito de arrecadação. Sobre o número de habitantes dessa época o que sabemos de relevante é que, de acordo com o censo demográfico de 1872, nossa população era de aproximadamente 9.000 habitantes e, por conta das secas e da migração, em 1900, nossa população diminuiu para aproximadamente 6700 habitantes. No período imperial não havia prefeito eleito, o presidente da câmara exercia essa função e os vereadores, homens de maior projeção econômica na comunidade, eram escolhidos pela camada dos proprietários rurais, que se autodenominavam de “homens bons”. No final do século XIX, com a extinção do governo monárquico de D. Pedro II pelo Marechal Manuel Deodoro da Fonseca, acontecido no dia 15 de novembro de 1889, foi proclamada a República através de um decreto. Por esse decreto determinou-se o fim do Império, do Conselho de Estado e da vitaliciedade do Senado, a Câmara dos Deputados foi dissolvida e a família imperial foi banida do Brasil por se temer uma reviravolta política. Nesse tempo todas as Províncias brasileiras, doravante denominadas de Estados, aderiram pacificamente ao novo regime de governo. Com essa nova forma de governo os grupos republicanos locais foram autorizados a assumir as rédeas do poder executivo e desencadearam um efeito cascata sobre os Municípios. Aos poucos foram sendo nomeados interventores pelo Governo Federal e estes receberam poder para dissolveram as assembleias provinciais e as câmaras municipais indicando conselhos de intendência. Em nosso Município o Conselho de Intendência, e depois a Câmara, funcionou durante muitos anos entre as ruas Agronomando Rangel e Antônio Domingues Álvares e, posteriormente, em uma das salas do sobrado que por muitos anos abrigou a Prefeitura de Boa Viagem na Rua José Rangel de Araújo, nº 144, Centro. No dia 12 de julho de 1892 o Estado do Ceará adotou a sua primeira constituição e nela ficou estabelecido que as administrações municipais teriam dois órgãos: a Câmara de Vereadores e a Intendência. Dizia ainda que as funções de intendente e de vereador eram exercidas voluntariamente, não havia gratificação, fato somente modificado através da lei nº 464, de 12 de setembro de 1898. Inicialmente os vereadores eram eleitos quadrienalmente, por sufrágio direto e aberto dos eleitores de paróquia, já o intendente era escolhido por maioria de votos entre os vereadores com um mandato de dois anos, sendo permitida a recondução. No dia 26 de setembro de 1895, através da lei estadual nº 264, a escolha do intendente passou a ser feita por nomeação do Governador, que na época era chamado de Presidente do Estado, posteriormente essa lei foi revogada pela lei nº 764, de 12 de agosto de 1904. Outro fato que merece ser mencionado é que o período iniciado em 1889, denominado de República Velha, ou Primeira República, estendeu-se até 1930, com a ascensão de Getúlio Dornelles Vargas ao poder. No plano federal a fase inicial do governo republicano ficou sob o controle dos militares, por isso é chamada de República da Espada e os membros do governo provisório, escolhidos desde o dia 11 de novembro de 1889, pertenciam a diversas correntes de opinião. Essa heterogeneidade política dos ministros seria a causa das futuras divergências que comprometeriam o sucesso inicial da nova administração. No mês seguinte à proclamação da República foram convocadas eleições para a escolha de uma nova constituinte, marcadas para o dia 15 de setembro de 1890, elas desencadearam uma luta entre as diversas correntes políticas pela hegemonia dentro do novo governo. Essas disputas culminaram com a renúncia do Marechal Deodoro da Fonseca no dia 23 de novembro de 1891, em seu lugar assumiu o vice-presidente, o Marechal Floriano Vieira Peixoto, que prontamente depôs e substituiu todos os Presidentes dos Estados e estes as lideranças municipais. Depois de muitas agitações políticas somente em 1926 foi eleito o primeiro prefeito de nosso Município, Luís Ximenes de Aragão. No segundo pleito o povo decidiu escolher Manoel Araújo Marinho, herdeiro político da família araújo, que administrou o Município por pouco tempo, pois no dia 28 de outubro de 1930, por conta da revolução, o Dr. Manuel do Nascimento Fernandes Távora, governador provisório do Estado, nomeou Teodoro Amaro de Oliveira como interventor do Município até o dia 20 de maio de 1931, quando esse foi extinto, voltando a pertencer ao Município de Quixeramobim. “O Interventor Federal do Estado do Ceará, Manoel do Nascimento Fernandes Távora, considerando que a atual organização municipal deve ser modificada por não atender ao interesse público; Considerando que, para a constituição de qualquer Município, se torna necessária uma população nunca menor de quinze mil habitantes, uma renda anual não inferior a trinta contos de reis e outros fatores de valor; Considerando que muitos dos atuais Municípios não preenchem esses requisitos, sendo meras expressões territoriais, sem vida própria. Considerando que, dest’art, para proporcionar aos Municípios uma existência normal, se impõe a supressão de alguns deles, decreta: Art. 1º – O território do Estado divide-se, administrativamente; em 51 Municípios e estes em distritos. Art. 4º – Ficam extintos os seguintes Municípios:…. Campos Sales, Conceição do Cariry, Santa Cruz, Várzea Alegre…. Boa Viagem que passará respectivamente a fazer parte do Município de Quixeramobim…”. (MOTA, 1989: p. 38-39) Perdendo a sua autonomia política Boa Viagem voltou à condição de distrito de Quixeramobim e o nosso Município, que não possuía forças políticas significativas frente aos interesses dos Municípios vizinhos, só re-obteve a sua autonomia política definitiva no dia 28 de dezembro de 1936 graças ao empenho e aos esforços de Francisco Rangel de Araújo, o agronomando Rangel, filho de nosso primeiro interventor, José Rangel de Araujo, e sobrinho de Manoel Araújo Marinho. “Em Boa Viagem não havia coronéis, porque o centro das decisões políticas ficava em Quixeramobim. A Revolução de 1930 extinguiu essas forças políticas, tomando-lhes as armas, desarticulando-as e reduzindo de modo acentuado o seu poder”. (CARVALHO FILHO, 2008: p. 39) Após a re-conquista dessa autonomia, durante alguns anos, a nossa população voltou a sofrer com os problemas produzidos pelas prolongadas estiagens e isso causou uma forte migração tendo em vista que o governo pouco fazia para modificar esse quadro. Nos primeiros anos da década de 1940 o censo demográfico revelou que a nossa sede possuía apenas 719 habitantes e retomando a sua autonomia política conheceu o governo de vários interventores: Jose Rangel de Araújo, Cap. Raimundo Ferreira do Nascimento, Antenor Gomes de Barros Leal, Walter Batista de Santana, Dr. Lourival Soares e Silva, Enedina de Carvalho, Aluísio Ximenes de Aragão, Ten. José Silvino da Silva e por fim Joaquim Vieira Lima, quando houve a abertura política. Nesse período de nomeação de interventores registrou-se também um dos principais crimes de motivação política de nossa história, o assassinato de José Inácio de Carvalho, até hoje sem elucidação. Ainda no plano político, já no início da década de 1950, esse cenário continuava sendo totalmente norteado pela vontade da família araújo, que assistiu a retomada do Poder Executivo pelo Prefeito Manoel Araújo Marinho. Após o termino de sua administração, por sua indicação e apoio, foi eleito o seu ex-cunhado, Aluísio Ximenes de Aragão, irmão do Prefeito Luís Ximenes de Aragão. Nessa gestão os embates políticos culminaram com o assassinato do vereador Antônio de Queiroz Marinho, filho do Prefeito Manoel Araújo Marinho, e da entrega de parte de nosso território geográfico para formação do Município de Monsenhor Tabosa. Após esses episódios a família araújo voltou ao comando do Poder Executivo com a indicação do nome de Delfino de Alencar Araújo e logo depois com o Dr. Gervásio de Queiroz Marinho, filho do Prefeito Manoel Araújo Marinho, que depois de várias tentativas conseguiu também a façanha de ser eleito como deputado estadual. Nessa mesma década várias famílias oriundas do Estado da Paraíba, algumas motivados por intolerância religiosa, passaram a se estabelecer e a prosperar nas terras cearenses. Daí por diante, já na década de 1960, o cenário político começou a passar por gradativa mudança com o gradativo deslocamento de membros da família araújo para à capital e o preenchimento dessas lacunas deixadas pelos descendentes dos paraibanos. Nesse tempo, segundo o Dicionário Geográfico e Histórico do Ceará, a população do Município de Boa Viagem estava assim distribuída: “O censo de 1960 apurou para o Município de Boa Viagem a população de 31.804 habitantes com a seguinte distribuição: o distrito de Boa Viagem possuía 15.819 habitantes, sendo que 2.274 moravam na sede e 13.545 moravam nos 2.663 domicílios espalhados em seu território. Em Domingos da Costa havia 4.173 habitantes, sendo que 194 residiam na sede do distrito e 3.979 residiam nos 667 domicílios espalhados pelo seu território. No Ibuaçu havia 7.587 habitantes, sendo que 109 moravam na sede do distrito e 7.847 residiam nos 1.196 domicílios espalhados pela área de seu território e em Jacampari havia 4.225 habitantes, sendo que 201 residiam na sede do distrito e 4.024 residiam nos 693 domicílios espalhados pela área de seu território”. (BRAGA, 1967: p. 99) O maior ícone dessa época foi o Deputado José Vieira Filho, o Mazinho, que conseguiu a façanha de administrar o nosso Município por diversas vezes como também eleger muitos daqueles a quem apoiara, dentre eles destacamos: Benjamim Alves da Silva,Osmar de Oliveira Fontes e o seu irmão, Dr. Francisco Vieira Carneiro. Nas últimas décadas, de 1980 a 2004, o seu maior adversário político foi o grupo encabeçado pelo Dr. Francisco Segismundo Rodrigues dos Santos Neto, que durante mais de vinte anos exerceu forte liderança no Município e projetou o nome do Dr. Fernando Antônio Vieira Assef, como o seu virtual herdeiro político. Nesse novo século o Município de Boa Viagem tem assistido um quadro político bastante desgastado. A decadência moral de alguns de nossos representantes tem forjado candidaturas e governos ganhos através de liminares forjadas nas brechas da incapacidade de nossa justiça. Alguns de nossos representantes estão fichados pela lei complementar nº 135, de 4 de junho de 2010, e as principais lideranças políticas estão divididas, se comportando como cabos eleitoreiros nanicos e sem expressão significativa. Carecemos de um líder que seja filho da terra e que agregue carisma, qualidades morais e intelectuais e que consiga a façanha de projetar o Município no cenário político estadual. Nas últimas eleições para a escolha do Governo Estadual testemunhamos que em cada esquina havia um comitê eleitoral e que o eleitorado do Município de Boa Viagem consegue a proeza de contribuir com a eleição de vários deputados, estaduais e federais, mas ao mesmo tempo está sozinho, sem um representante diretamente ligado a terra e que de fato conheça os verdadeiros problemas de sua gente.
Posted on: Thu, 21 Nov 2013 19:30:31 +0000

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