Se você {tu}, colega médico brasileiro (e a parte da elite que - TopicsExpress



          

Se você {tu}, colega médico brasileiro (e a parte da elite que você representa) tem o direito de passar meses insultando os médicos cubanos e agredi-los em sua chegada, é por que deve considerá-los uma subespécie. Você fala {habla} dos vícios políticos deles: são dóceis e adaptados às restrições a suas liberdades individuais. Não consegue concebê-los como pessoas dotadas de cultura e senso crítico, apesar das restrições do regime. Aliás, o que você estranha é que a falta de liberdade incida em médicos, porque não o choca que milhões de brasileiros não possam viajar, ou que migrem ou emigrem sem suas familias – aqui, por razões econômicas. Há também os vícios econômicos: são médicos pobres, sem sofisticação material e que aceitam qualquer fração de salário de brasileiro. Você tem razão sobre sua pobreza, mas erra ao duvidar {dudar} de vida inteligente abaixo de certo limiar de consumo e ao censurar suas ambições materiais. Você ignora que, para cubanos, trabalhar no exterior é uma chance muito almejada, por representar uma multiplicação da renda. Não só para médicos, mas também artistas, professores universitários, promotores de eventos, analistas de sistemas... Não ter total controle sobre sua situação migratória e trabalhista não é nenhum demérito. Ter autonomia e poder de escolha sendo brasileiro médico é fácil. É totalmente legítimo agarrar as oportunidades que aparecem pela frente, e é a atual situação de alguém que define o que se considera oportunidade. Assim fazem {hacen} todos os brasileiros que vêm para São Paulo ou que vão batalhar no exterior; assim fizeram nossos avós {abuelos} imigrantes europeus que legaram a nós médicos a nossa brancura. Ah, tem isso {y eso} também. Isso você não perdoa: eles não conseguiram preservar a classe médica do elemento negro. E pior, falam espanhol. Marcador maior da incompetência “latina”, incapaz de veicular pensamento inteligente. Para você, caro colega, os cubanos são uma raça desprezível como os médicos “cucarachas” que inundam São Paulo, capital hispânica brasileira e reduto de hispanofobia. Fico triste por todas as limitações políticas e econômicas dos médicos e outros cubanos. Assim como fico triste pelas dos brasileiros. Tenho mil críticas ao Programa Mais Médicos - essa solução efêmera que vai durar o suficiente para ter seu efeito eleitoral e oculta a negação às soluções definitivas para a saúde, como a carreira de profissionais e a fixação de 10% das receitas federais para o sistema público de saúde. Os médicos devem continuar denunciando o caráter eleitoral do programa, as falhas do SUS e lutando por essas pautas, em conjunto com outros profissionais de saúde (o que parece impossível de acontecer). Os colegas cubanos, no entanto, não têm nada a ver com isso. A eles dou as boas-vindas. Fico feliz por eles; por poderem viajar, conhecer outra cultura a fundo, aprender outra língua e aumentar sua renda e da família. Tudo isso exercendo sua profissão de forma digna. Os moradores dos municípios que vão recebê-los também não têm nada a ver com isso. Fico feliz por eles também; é importante para eles uma solução imediata. Já defendi mais o Revalida; sei que muitos países exigentes conferem ao trabalho médico temporário, como o voluntário em ONGs, um status especial que não exige revalidação, ou seja, não é algo inédito. Mas podíamos fazer diferente, respeitando um procedimento justo de segurança. De qualquer forma, tratando da situação concreta, se não posso falar sobre a qualidade individual do médico cubano, sei bem que, em geral, eles têm muito mais formação e experiência na fundamental atenção básica do que eu e 99% dos colegas. Você, colega médico brasileiro que insulta cubano, provavelmente não faz parte de nenhuma minoria ou grupo cuja opressão é socialmente aceita. Ou, se faz, deve sofrer muito, por ainda não ter se emancipado e atingido a crítica necessária para perceber como é desprezível e medíocre o sentimento de superioridade que autoriza uma agressão. Mas nem tudo está perdido. Aprenda outras línguas além do inglês. Faça bom uso da sua liberdade de ir e vir e viaje bastante, indo além dos países comuns, dos estados comuns, ou dos bairros comuns. Ouça os diferentes pontos-de-vista e respeite-os. Aprenda e sinta, com empatia e crítica. Assim, é capaz de você nem ficar chateado {encabronarse} se alguém lhe virar a cara {te da las espaldas} no Upper West Side.
Posted on: Thu, 29 Aug 2013 00:25:04 +0000

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