Uma conversa de amigos Faz um ano hoje que meu querido Raphael - TopicsExpress



          

Uma conversa de amigos Faz um ano hoje que meu querido Raphael se foi. Era um domingo e até nisso ele fez uma boa escolha. O trânsito para o céu estava mais ameno. Ontem, pedi para oferecer a missa das 10h na Igreja do Pai Nosso, no Lago Norte, para ele. Nesta manhã, Bruno e o padrinho Hilton levaram flores para Bael. Repito, com alguns ajustes, a conversa que tive com ele quando se completou sete meses de sua partida. “Já perdoei erros quase imperdoáveis. Tentei substituir pessoas insubstituíveis. E esquecer pessoas inesquecíveis... Já pensei que fosse morrer de tanta saudade E tive medo de perder alguém especial. E acabei perdendo! Mas sobrevivi. E ainda vivo. (Charlie Chaplin) Meu querido filho Bael, hoje faz um ano de sua partida. Por isso, abro essa nossa conversa com as palavras de Chaplin que caem tão bem no momento em que vivo. Sabe, garotão, é difícil, muito difícil não lembrar a toda hora de você. Seu jeito de rir, de chegar, de me abraçar, de suas investidas como gourmet na cozinha. Enfim, seu falar alto e sua gargalhada sonora que até nosso vizinho me disse outro dia que sente falta dela. Às vezes, me parece ouvir você chamando Pai, como fazia quando queria me contar algo. Sabe Bael, agora uso as palavras de Jorge Luiz Borges quando viu a vida se indo: “Se eu pudesse novamente viver a minha vida, na próxima trataria de cometer mais erros. Seria menos higiênico. Correria mais riscos, viajaria mais. Andaria mais pela minha rua. Mas, tenho 85 anos e estou morrendo”. Eu lhe abraçaria mais. Teria ficado mais tempo no hospital com você. Teria lhe beijado mais vezes e não deixaria nunca que um abraço abrisse uma distância amarga da despedida. Mas, ao mesmo tempo, meu filho, sua lembrança me dá um ânimo imenso e otimista recorro a Mário Quintana: “A gente deve atravessar a vida como quem está gazeando a aula, e não como quem vai para a escola”. Lembro quantas fraldas suas eu troquei. Quanto banho lhe dei ainda pequeno. E, quantas noites após o trabalho, dediquei momentos passando seu uniforme escolar para chegar limpinho no colégio. Mesmo sem mãe, você não fazia feio entre os coleguinhas! Recordo daquele dia em que você ainda pequeno e seus três irmãos me chegaram para ficar definitivamente comigo. A partir dali, meu filho, jamais nos separamos até o momento de você ser chamado por Deus. E quando recaio na tristeza me consolo de novo com Quintana: “A maior dor do vento é não ser colorido”. Sabe meu querido filho, imagino como deve ser o céu. Vejo você convivendo com tantas belíssimas figuras que também já se foram. Talvez ouvindo Tom ao som de harpas; Nat King Cole interpretando Unforgettable entre nuvens e anjos e, mais recentemente, recepcionando Dominguinhos. O lugar deve ser de um azul suave. As nuvens e as estrelas são de encher os olhos e a alma é lavada por suaves cantos gregorianos que vêm de Deus. Lembrei agora de Vinícius de Moraes, mas acho que ele ainda não chegou aí não. No céu não tem uísque e certamente ele parou em alguma estrela-bar para um happy hour. Mas depois ele vai até aí. Pode esperar que ele chega. Ah, Bael, encontrando Quintana dê um caloroso abraço nele e pergunte se ele lembra do dia em que estive na casa dele em Porto Alegre? Sabe, filho, sobre ele, Érico Veríssimo disse certa vez: “Descobri outro dia que o Quintana na verdade é um anjo disfarçado de homem. Às vezes, quando ele se descuida ao vestir o casaco, suas asas ficam de fora”. Veja essa pérola do Quintana-anjo: “Todos estes que ai estão atravancando o meu caminho eles passarão, eu passarinho”. Ontem à noite, filho, o céu estava repleto de estrelas. De repente, uma delas cruzou o céu em tamanha velocidade, Bael, que só podia estar sendo pilotada por Ayrton Senna. Então, pensei nele e nos momentos sensacionais que eu e você passamos grudados na tv torcendo a cada manobra genial dele... Mas ele também se foi. Diga para ele que deixou saudades e a Fórmula 1 nunca mais será a mesma. Dê, também, um abraço amigo e Carinhoso em Pixinguinha. Hoje, vasculhando minhas coisas, Bael, um desenho seu feito para mim no Dia dos Pais (que está logo abaixo) me levou a você menininho. Veja e lembre seus sete anos quando você me deu de presente um pincel de barba que até hoje está comigo e eu o uso diariamente como se você afagasse meu rosto a cada manhã. Olhando para o rabisco recordei palavras de Garcia Marques: “Aprendi que quando um recém-nascido aperta com sua pequena mão pela primeira vez o dedo de seu pai o tem prisioneiro para sempre”. E eu, Bael, o guardo no fundo do coração porque, como dizia Drummond, “Tenho apenas duas mãos e o sentimento do mundo”. Aqui, meu filho, está tudo indo. A grutinha de pedras que mandei fazer para você com a imagem de Nossa Senhora de Fátima está linda. O pé de Manacá na frente dela está todo florido e despeja um perfume doce em todo o espaço. Na gruta fizemos um canteiro com flores, uma pequeninha fonte que jorra água bem limpinha, uma caixa de som com música suave e, algo sensacional: é visitada todos os dias por belos sabiás-laranjeira e irrequietos cuitelinhos. Uma luz suave, azul, ilumina de longe a imagem que veio de Fátima e tem aos pés aquela fotografia sua tirada da época da formatura. Você está lindo nela, meu filho. Com aqueles cabelos negros e lisos, olhos puxadinhos que levaram muitos a lhe chamar de chinesinho... Pois é meu filho, um ano se completa nesta segunda-feira 21. E faço minha outra vez as palavras de Drummond: “A cada dia que vivo, mais me convenço de que o desperdício da vida está no amor que não damos, nas forças que não usamos, na prudência egoísta que nada arrisca, e que, esquivando-se do sofrimento, perdemos também a felicidade. Acho que nessa linha de raciocínio, Bael, dou seguimento com palavras de Pablo Neruda: “Morre lentamente quem não lê, quem não viaja, quem não ouve música. Morre lentamente quem não vira a mesa quando está infeliz com o seu trabalho, quem não arrisca o certo pelo incerto para ir atrás de um sonho... Desde a sua partida, filho, fui apenas uma vez ao Campo da Esperança com seu irmão e sua sobrinha levar algumas flores para você. Não queria que você me visse chorando de novo. Preferi cultuar sua memória na grutinha aqui em casa. Lá não é sua casa. Sua casa é aqui. Aqui é que você está em alma e pensamento. Aqui estão perpetuadas todas as suas coisas e ainda passeiam pela casa todos os seus sonhos de menino que não foram realizados... Este é o meu tesouro, tudo o que foi seu. Até mesmo os sonhos que, se eu puder, filho, darei seguimento a eles! Mas tínhamos de ir lá, onde lhe vi pela última vez adormecido e sereno. Lá estava tudo bem. Corrigiram seu nome corretamente na placa colocando Raphael com ph; a sua foto está laqueada perpetuando seu olhar suave e um breve sorriso que perscrutam um infinito, filho, que só você vê. É um semblante de harmonia de quem está com Deus... Colocamos flores. Levei um banquinho para conversar por mais tempo com você e notei uma coisa. É que o seu jazigo está entre dois outros. Li as placas. O da sua direita nasceu no mesmo dia que você: 05/12. E o da esquerda faleceu no mesmo dia que você 21/10. Coincidência. Ali, sentado, com a alma na boca, me vieram as palavras de Fernando Pessoa: “Um dia a maioria de nós irá se separar... Sentiremos saudades de todas as conversas jogadas fora, as descobertas que fizemos, dos sonhos que tivemos, dos tantos risos e momentos que compartilhamos” .(Fernando Pessoa) E, agora, filho, me despedindo lembro Antoine De Saint-Exupèry “Cada um que passa em nossa vida passa sozinho, pois cada pessoa é única, e nenhuma substitui outra. Cada um que passa em nossa vida passa sozinho, mas não vai só, nem nos deixa sós. Leva um pouco de nós mesmos e deixa um pouco de si mesmo. Há os que levam muito; mas não há os que não levam nada. Há os que deixam muito; mas não há os que não deixam nada. Esta é a maior responsabilidade de nossa vida e a prova evidente que duas almas não se encontram ao acaso”. Um beijo grande meu filho querido. Deus o levou cedo justamente para poupá-lo de, um dia, você ter a graça triste de ver um filho partir primeiro. Com o amor eterno de seu pai.
Posted on: Mon, 21 Oct 2013 13:32:07 +0000

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