Uma das ideias mais fortes criadas pela fase de desenvolvimento - TopicsExpress



          

Uma das ideias mais fortes criadas pela fase de desenvolvimento capitalista nas últimas três décadas foi a ideia do «fim do trabalho» ou, pior, a ideia de que as classes sociais tinham desaparecido e seríamos hoje todos indivíduos, pequenos empresários, empresários em nome individual, empreendedores. Verifica-se que a realidade é, porém, outra. Nunca em Portugal houve tanta população activa e tanta gente que vive do trabalho. A população no sector industrial mantém-se aliás praticamente estável nas últimas quatro décadas. Mas quem vive do trabalho é hoje diferente do operário de fato-macaco azul. Há, por exemplo, uma «fábrica» de centenas de milhares de pessoas a trabalhar sozinhas em casa num regime de trabalho à peça (recibo verde) do século XIX: jornalistas, arquitectos, investigadores, costureiras, editores, revisores, gestores, designers, informáticos, um sem fim de profissões. A produtividade aumentou, porque a formação e a educação aumentaram também (temos 1,3 milhão de licenciados e 30 000 doutorados) e porque se introduziu tecnologia maciçamente – isso faz as pessoas mais heterogéneas mas não faz que deixem de ter em comum o facto de viverem do trabalho, serem trabalhadores. Ninguém pode afirmar, por este critério, que um médico, um professor, um montador de automóveis, uma cabeleireira, um trabalhador de call center e um investigador não têm em comum o facto de viverem do trabalho e não de renda, juro ou lucro. Do ponto de vista das classes sociais – de que muitos apregoaram o fim, omitindo que o que se passou foi uma complexificação dessas classes mas não o seu desaparecimento – a sociedade divide-se efectivamente, com alguns híbridos pelo meio, entre quem vive do trabalho e quem vive de juro, lucro ou renda. (...) Com as políticas executadas desde 2008 vivemos aquele que é historicamente o maior processo de proletarização de Portugal. Maior do que aquele que se verifica no século XIX com a privatização da propriedade, maior do que aquele que se dá nos anos 60 do século XX com a mecanização agrícola, que expulsou para as cidades e para fora do país milhares de camponeses e assalariados agrícolas. Cada vez mais pessoas têm a sua força de trabalho (mental e física) para vender e só têm isso para garantir a sua sobrevivência, nada mais. Perdeu-se a ligação da maioria à terra (que dava, ainda que pouca, alguma independência); muitos escritórios de advogados, médicos, dentistas deixaram de ser trabalhadores independentes para passarem a estar dependentes de uma empresa ou de um conglomerado. Nasceram como cogumelos cadeias de supermercados, cabeleireiros, oficinas de automóveis e restaurantes que arrasaram a chamada empresa familiar.
Posted on: Wed, 09 Oct 2013 08:07:41 +0000

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