Madrugada alta e eu fico aqui pensando o quanto três dias podem - TopicsExpress



          

Madrugada alta e eu fico aqui pensando o quanto três dias podem ter uma carga tão forte na tua vida. Um dia quero viajar por aí com um mochilão pra passar pelo menos um mês em cada cidade que eu visitar, pra absorver o máximo que puder. Percebi que não me contento mais em ser turista, e cada vez que volto pra casa, a vontade de sair de novo e aprender mais é maior. Ficar na Annie (ou Nonya) em Chicago foi uma das melhores escolhas que eu podia ter feito na minha vida. Abrir mão da comodidade e querer viver os subúrbios de uma cidade desconhecida. Aliás, é uma pena que a carga de preconceito ainda seja tão grande quando se trata dos negros aqui - ler notícias sobre Englewood e ouvir o que as pessoas têm a dizer do bairro é quase pensar que vais sair morta de lá. Fiquei bem assustada, no começo. Mas ter escolhido a Annie me proporcionou a experiência de bater um papo sobre as frustrações de ser freelancer e sobre jornalismo independente com uma jornalista norte-americana e um cara do México; e um papo sobre o caso dos médicos cubanos com um médico do Paquistão, que tá revalidando os documentos dele pra atuar aqui nos Estados Unidos. Me permitiu conversar com porto-riquenhos, conhecer um vietnamita que mora na França e tá estudando aqui, e conhecer franceses. Foi a maior misturada cultural da minha vida num tempo tão curto. Um dos residentes da casa me contou que os policiais disseram, certa vez, que a Annie envergonhava Chicago ao levar os turistas pra região, o que me deixou até enojada. Ela mostra o lado da cidade que os brancos querem esconder, por isso incomoda tanto. Lógico que existe violência, mas como ela avisa muito antes de confirmar a reserva, Chicago tá infestada de gangues. Tomei as precauções que eu tomaria em Belém em relação aos meus pertences, xinguei e fiz cara feia pra quem me cantava como eu faria em Belém, ignorei quem gritava comigo do nada e sorri pra quem me sorria. Não posso negar que, por vezes, me senti incomodada com alguns olhares de "que porra essa branquela tá fazendo aqui". Acho que o último dia foi o mais engraçado, porque mostrou o tanto de preconceito que ainda carrego. O senso comum (?) indica que quando és abordada por mais de um adolescente/cara andando de bicicleta em Belém, é porque vais ser assaltada. Pois bem, aconteceu isso comigo em Englewood e o que diabos eu ia fazer? Esconder minhas coisas onde? Correr? Pra onde? A única coisa que consegui fazer foi virar e sorrir pros três adolescentes que, de repente, começaram a me seguir. E aí a gente engatou uma conversa super gostosa e eu acabei virando "namorada" do mais velho (eram três irmãos, de sete), que, ironicamente, quer ser um policial da cidade - a polícia de Chicago é considerada a mais corrupta do país. Talvez ele não escape dessa sina. Talvez seja até difícil pra ele enxergar um destino diferente, no meio de uma realidade tão estúpida e preconceituosa e crescendo em um bairro tão negligenciado.
Posted on: Tue, 06 Aug 2013 07:32:31 +0000

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