Acabou (Uma carta cidadã) Quem mora em Copacabana já se - TopicsExpress



          

Acabou (Uma carta cidadã) Quem mora em Copacabana já se acostumou com perguntas do tipo. — Onde fica a Rua Santa Isabel? O morador de um bairro turístico deve ter paciência para lidar com as multidões e com os visitantes, mas o desrespeito ao habitante da cidade foi a tônica desta Jornada Mundial da Juventude, em todas as partes e, mesmo quem não mora em bairros que abrigaram eventos ajudou a liquidar a sua fatura. Sem a devida contrapartida. Quem mora em Copacabana se sentiu em um momento especial do país: uma espécie de estado de sítio, no qual as leis não têm valor. Nem mesmo simbólico. Os eventos do palco principal da JMJ se estenderam por toda a noite e, antes do amanhecer, já havia testes feitos no sistema de som, com direito a mestres de cerimônias animados demais para o horário. Pelas ruas do bairro, carros da polícia, dos bombeiros, da defesa civil e motos pareciam competir em uma disputa acéfala: - Qual sirene soa mais alto? No comércio, os preços fugiam do padrão: foram remarcados as pressas, como na época d e inflação galopante. Tudo com o objetivo de elevar o faturamento da maneira mais primitiva. Melhores serviços? Estamos esperando desde o PAN de 2007. Pelas ruas, voluntários e autoridades queriam nos ensinar como transitar pela cidade que é nossa todos os dias. Na esquecida Zona Oeste, o orgulho de receber um evento importante como a JMJ estava ferido pelo descaso do poder público. Mais desrespeito com toda uma comunidade que se preparou com fervor para uma festa de gala e dela se viu barrada sem compensações. Do norte, a Tijuca, onde fica o Hospital São Francisco, ao sul, da Praia de Copacabana, vimos uma cidade unida pela negligência. A democratização do descaso acabou com as zonas de exclusão. Mas, em vez de erradicá-la, tornou o caos onipresente. Eu queria poder falar aqui da educação dos peregrinos e de seu comportamento exemplar, ou dos posicionamentos surpreendentemente progressistas e fraternos do Papa Francisco. Acontece que todos eles já voltaram para casa ou estão em vias disto, onde encontrarão realidades distintas. Depois de as visitas irem embora, a casa fica para a gente. Eis a oportunidade final de torná-la agradável para quem mora nela. Que sempre possamos oferecer conforto às visitas, mas jamais em detrimento do aconchego de nosso lar. Isto vale para todos. Mas, principalmente da classe mais pobre, que precisa de uma cidade minimamente organizada para poder trabalhar e prover o seu sustento. O respeito pela cidadão é a bênção das bênçãos sempre adiada e esquecida, em nome de uma cordialidade que destoa da opressão do cotidiano. Aliás, as autoridades têm muito a aprender com a população mais pobre. Poderiam descobrir que a busca pelo dinheiro não deve atravessar o respeito, e que o esforço é fundamental para o sucesso de qualquer empreitada. Que o dinheiro é importante, mas que não é bem-vindo a qualquer custo, que essências e vocações demoram a ser construídas, mas que jamais devem servir como escada para as ambições de terceiros. Mais do que um negócio, administrar uma cidade significa harmonizar interesses divergentes em prol de um bem estar comum. Para isto, é preciso entender que os mais singelos patrimônios imateriais são tão importantes quanto a inauguração de qualquer obra farônica. Que os grandes eventos revertam a nossa tendência eterna de olhar para fora na busca de referenciais. O Rio tem muita gente talentosa e competente, um povo esforçado e trabalhador, capaz de finalmente se apossar da cidade. Os eventos devem nos fazer olhar para dentro da cidade e curar as mazelas de suas artérias pulsantes. A JMJ foi apenas mais um estopim de uma população que encara os problemas com irreverência e bom humor, aspectos que diminuem o peso da existência, mas que nem sempre contribuem para as mudanças que tanto precisamos. O Basta começa com F, de fiscalização. Estejamos vigilantes, porque a virada precisa começar.
Posted on: Tue, 30 Jul 2013 00:26:22 +0000

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