Algumas lições das manifestações pelo país: resgatar a - TopicsExpress



          

Algumas lições das manifestações pelo país: resgatar a independência de classe do proletariado para que amanhã seja maior Rogério Miranda Gomes 1 “Foram-se os tempos da luta de classes!”, bradavam até alguns dias os ideólogos da pós-modernidade e os burocratas e oportunistas da “esquerda responsável”. Essa “esquerda do possível” - que advoga o diálogo e o pacto social para humanizar o capital, as “saídas institucionais”, “dentro da ordem”, para as múltiplas manifestações da exploração produzidas pela sociedade capitalista!”-, essa “esquerda” durante as últimas décadas “remeteu” os enfrentamentos de classes para os museus como expressões de uma época superada pela história. Porém, se há algo que os explorados aprenderam é que a história não pode ser “domesticada” pelas vontades de alguns. Seu desenvolvimento está enraizado em solo muito profundo, o das relações sociais de produção da vida humana. Nesse solo não há paz, não há pacto, não há harmonia. Ele se caracteriza pelo conflito, pela violência, pela luta. É esse solo que está tremendo sob nossos pés agora, pedindo passagem, irrompendo pelas fendas que encontrou disponíveis. Só quem acredita em chão inabalável pode estar surpreso. A magnitude e duração dos tremores não podem ser previstas de antemão. Mas, sabemos que não serão movimentos isolados. Mais cedo ou mais tarde serão seguidos por outros, cada vez mais violentos, enquanto se mantiver preservada a contradição que os alimenta: as relações de exploração capitalistas. Por trás do povo, classes: são segmentos do proletariado que se levantaram, mas sob direção pequeno-burguesa Predominam análises na mídia burguesa e mesmo entre organizações de esquerda de que seria a “classe média” que estaria nas ruas. Essa leitura, ainda que desavisadamente, oculta o verdadeiro caráter de classe das manifestações. Oculta que são predominantemente assalariados que estão nas ruas como manifestação, ainda que não consciente, da contradição entre capital e trabalho. A realidade das ruas levou a pique em algumas horas a falácia da satisfação dos trabalhadores brasileiros com os resultados das políticas de pacto social entre burguesia e a social-democracia petista nos últimos dez anos. Nesse pacto, a contrapartida à geração de empregos e ampliação do consumo (principalmente através do crédito) tem sido a intensificação do trabalho, o aumento de jornadas, o endividamento e a piora geral das condições de vida nos centros urbanos (transporte deficitário, serviços públicos precários, violência), mesmo para os segmentos mais qualificados dos trabalhadores, e seus filhos. Para os segmentos mais pauperizados do proletariado a contrapartida às políticas assistencialistas como o bolsa-família tem sido a repressão com a higienização social dos centros urbanos com objetivo de expandir os lucros da indústria da construção civil, para a qual os megaeventos, ainda que importantes, são apenas o instrumento mais recente. 1 Professor da Universidade Federal do Paraná. Militante da Luta Socialista – LS e da Alternativa Sindical Socialista – ASS. Curitiba, 04 de julho de 2013 Porém, a constituição predominantemente proletária das massas nas ruas não se traduz automaticamente em formas de atuação e programa compatíveis com os interesses imediatos e históricos dessa classe. O desarmamento da classe trabalhadora realizado nas últimas décadas pela social-democracia, através de seus principais instrumentos – PT, CUT, UNE -, com a cooptação e conformação das lutas aos limites da ordem burguesa foi determinante para o retrocesso na independência do proletariado brasileiro em relação às outras classes e ao Estado. Como não está organizado de forma independente, o proletariado pode ser dirigido pelas palavras de ordem e pelos métodos de outras classes. A pequena burguesia é a classe materialmente “mais próxima” do proletariado, aquela que, pelas condições de vida semelhantes em alguns aspectos, pode sofrer várias de suas dores e que mais facilmente com ele se confunde. A atuação social-democrata baseada no pacto social, ao encobrir a contradição de classes na sociedade, forja um cenário em que o programa pequeno burguês de uma sociedade sem luta de classes, uma sociedade “para todos” ganha influência sobre o proletariado. Como sua existência material está em permanente risco, ameaçada pelo desenvolvimento monopolista e pela luta entre as duas classes antagônicas, a pequena burguesia tradicionalmente volta suas atenções ao Estado. Nele ela identifica s eus problemas e soluções. Reivindica um Estado “acima” das classes em luta na sociedade, “apolítico”, não corrupto, técnico, eficiente, que a proteja. O programa pequeno burguês de combate à corrupção e reformas políticas é expressão da ocultação, para os assalariados que estão nas ruas, da contradição capital-trabalho. Em lugar dela a pequena burguesia proclama o “conflito” entre “povo” e “políticos”, o que se expressa nas bandeiras do apartidarismo e do nacionalismo. Tomar partido na luta de classes é tudo o que a pequena burguesia tenta evitar. Ela também é a única classe para a qual faz sentido a bandeira decrépita da nação. O desenvolvimento do capitalismo monopolista destroçou, onde existiu, qualquer possível resquício de nacionalismo no programa burguês. Esse mesmo processo também desenvolveu o proletariado como classe mundial em oposição à sua inimiga internacionalizada. Já a pequena burguesia possui suas raízes na pequena produção que não extrapola os solos nacionais, na pequena produção dependente do apoio governamental, das políticas de auxílio e créditos para pequenos empresários e agricultores, que a protegem de devora pelo capital monopolista. O que alguns classificam, portanto, como uma despolitização do movimento que toma as ruas é de fato a predominância da política de uma classe específica: a pequena burguesia. A negação do ciclo social-democrata: um aparente retorno a formas pretéritas de (des)organização proletária A derrota das tentativas de transição socialista e as tragédias levadas a cabo pelos sucessivos governos social-democratas na Europa e em outros países do mundo nas últimas décadas encerram um ciclo da luta de classes. O cenário é de terra arrasada, de derrota e decepção para o proletariado. A negação desse ciclo, para uma parte significativa da nova geração do proletariado, no primeiro momento, condena tudo que com ele se identifique: projetos, programas, métodos e formas organizativas, bandeiras... A perda completa de referência em projetos societários se expressa na constituição de “novos movimentos sociais”, “novas” formas de luta, caracterizadas pela “horizontalidade”, pela “ausência de direções”, por críticas às organizações tradicionais como partidos e sindicatos, pela pulverização das lutas em pautas variadas e difusas. São tempos dos movimentos anti-globalização, dos Indignados, do Occupy. O Brasil não poderia escapar incólume a esse processo. A decepção com o ciclo social-democrata e seus instrumentos – PT, CUT, UNE – leva o proletariado brasileiro a um retrocesso significativo da consciência de classe. Esse levante de massas explicita com ares de dramaticidade esse cenário, no qual o rechaço às bandeiras de partidos políticos é apenas uma expressão. Constitui-se, de fato, um movimento que, juntamente com a negação do cretinismo e do oportunismo político social-democrata, propaga também a negação de grande parte do aprendizado histórico da classe trabalhadora em sua história de luta contra o capital e o Estado. São negados aspectos como: a importância da atuação independente em relação a outras classes; a necessidade de centralização de pautas e direção unitárias da luta para dar eficiência ao seu “exército” nos enfrentamentos; a definição do adversário central em cada embate, entre outros aspectos. Irônico, mas compreensível. No momento em que as relações capitalistas encontram-se em seu estágio mais desenvolvido, o proletariado parece retroceder a graus político-organizativos próximos do momento histórico em que começava a dar seus primeiros passos no terreno da luta de classes. Quando predominavam formas de luta ainda embrionariamente independentes sob a bandeira do “povo”, da “república social”, nas quais a violência ainda se apresentava predominantemente de forma desorganizada, como reações espontâneas de revolta, com formas de luta pouco centralizadas, “horizontais”, ou com caráter anarquista. A gravidade desse retrocesso expressa o tamanho da derrota. É preciso ter claro, contudo, que esse retrocesso no grau de consciência do proletariado é apenas um aparente retorno a formas pretéritas do ser social da classe. Isso porque as rupturas produzidas ao longo no desenvolvimento político do proletariado, como a desse último ciclo de lutas, por mais profundas que sejam, não conseguem “abolir” a cultura classista acumulada. Esse acúmulo está difundido em formas mais sistematizadas – na teoria e nas organizações marxistas - e em formas menos sistematizadas, como no aprendizado adquirido de forma heterogênea pelos trabalhadores através de cada greve, cada mobilização, cada enfrentamento contra os capitalistas e seu Estado ao longo das décadas. Esse acúmulo está por aí, ainda disperso, escondido, em parte rechaçado, abatido por gases lacrimogêneos... à espera de ser recolocado no centro dos acontecimentos como elemento guia das ações da classe. A burguesia, nesse momento, não tem motivos para apostar em aventuras Os governos do PT nos últimos dez anos têm garantido altas taxas de acumulação para o capital, seja financiando empresas, principalmente via BNDES, seja através das privatizações e da sustentação do rentismo, com o pagamento pontual da dívida pública. Além disso, o governo petista tem colaborado com a burguesia em um aspecto central: a cooptação dos principais instrumentos de luta dos trabalhadores, contribuindo para a retirada progressiva de direitos de nossas classe. A burguesia possui dois blocos políticos – PT e PSDB/DEM - para garantir as condições para efetivação de suas taxas de acumulação. Como em vários países do mundo baseados no bipartidarismo burguês, a alternância na gestão do Estado entre esses dois blocos define-se meramente por aspectos circunstanciais. À medida que um se desgasta, a burguesia opta pelo outro, sendo que o anterior pode, mais à frente, ser novamente aproveitado. Ela tem permitido que seus dois blocos de representação “disputem”, a gestão do estado em termos “amigáveis”, ou seja, que não coloquem em risco as relações capitalistas. O extravasamento da insatisfação de grande parte do proletariado brasileiro com as condições de vida catalisado pelo movimento contra a tarifa cobra soluções pela burguesia. Seus movimentos denotam a opção preferencial por saídas “tranqüilas”. Para as pautas econômicas, algumas migalhas como a redução das tarifas e a canalização de recursos ínfimos do pré-sal para a educação. Nada que interfira na acumulação capitalista ou sequer no redirecionamento do orçamento público. Para as pautas políticas, tenta-se “acalmar” o movimento com medidas “serenas”, e pouco custosas, como o arquivamento da PEC 37 e o aceno a algumas reformas políticas cosméticas. Além dessas, outras alternativas de médio prazo passam a ser aventadas, como o retorno de Lula ou a utilização de um Joaquim Barbosa como “salvador” do país. Pensamos não possuir base material, nesse momento, a tese do orquestramento de um golpe da burguesia contra Dilma, como querem fazer crer os petistas/cutistas. Embora, não vacile em recorrer à repressão quando necessário, a burguesia é uma classe que não possui entre suas características o culto à aventura. Ela só recorre a “movimentos bruscos”, como os golpes militares, em situações em que seu domínio é ameaçado pelo proletariado, ou quando possíveis conflitos entre suas diferentes frações tornam-se tão profundos que exigem soluções “mais firmes”. Nenhum dos dois cenários parece se apresentar. A hipótese de ascensão do fascismo, por sua vez, que não deve ser confundido com ditaduras militares, tampouco parece se sustentar, visto que também carece de sua base material, qual seja: o protagonismo adquirido pela pequena burguesia em meio a um cenário de crise social e desgaste do proletariado e da burguesia em função do encarniçamento da luta de classes. Nessas situações, a burguesia incapaz de governar, nas palavras de Marx, abre mão de sua existência política para preservar sua existência social, delegando o poder a algum aventureiro autoritário e “apartidário”, “acima das classes”, que a pequena burguesia apresenta como salvador para a nação. É muito possível, e até provável, que, em caso de manutenção do movimento de contestação, forje-se um “salvador”, um “caçador de corruptos”, mas a burguesia sempre optará em primeiro lugar por transportá-lo através do caminho pavimentado e tranqüilo do respeito à “ordem institucional”. É preciso, portanto, diferenciar a existência de alguns grupos fascistas dentro das manifestações – e os riscos de sua influência sobre setores mais desorganizados do proletariado - da estratégia política adotada pelas diferentes classes para lidar com a conjuntura. Os grupos fascistas existem e sempre existirão enquanto se mantiver o capitalismo, e sua influência deve ser permanentemente combatida pelos revolucionários. A elevação do fascismo ao aparelho de Estado, contudo, depende de condições especiais da luta de classes, condições estas que, a nosso ver, nesse momento não existem. Avançar as lutas e contribuir para a consciência de classe do proletariado Como é evidente, qualquer perspectiva de “dirigir” o atual movimento por parte dos comunistas das várias organizações brasileiras carece de bases materiais. Isso porque uma herança inquestionável do ciclo social-democrata é a restrição extrema no seio do proletariado da influência do comunismo – o projeto de derrubada revolucionária do capitalismo e construção de uma sociedade igualitária, sem classes e sem exploração. Por isso, vimos defendendo que a tarefa principal dos comunistas na presente fase da luta de classes é o enraizamento entre o proletariado, reforçando suas lutas práticas, colaborando para sua organização independente e para a formação de sua vanguarda através da apropriação do marxismo. Somente ao cumprir essa tarefa essencial, a liberação de amplos segmentos dos trabalhadores da influência social-democrata e pequeno-burguesa, os comunistas poderão exercer influência decisiva sobre os futuros levantes de massas como o que atualmente ocorre no país. Pensamos que nossa atuação no atual cenário de manifestações de massas deve se pautar pelo objetivo de contribuir, com a limitada força que possuímos, para que o segmento do proletariado que está em luta avance em seu grau de consciência de classe. Nosso papel é estar entre as massas reforçando suas pautas mais classistas e colaborando para que levem a luta cada vez mais à frente. Nesse caminhar, problemas práticos colocarão a necessidade de recorrer ao aprendizado histórico da classe e, com o tempo, as novas gerações em luta aprenderão a diferenciar os reformistas e oportunistas dos revolucionários. A luta contra a hegemonia pequeno-burguesa não se dá, nesse contexto, através da “imposição de bandeiras” ou com a inserção de pautas “externas” mais “avançadas”. Onde temos maior possibilidade de influência, devemos contribuir para a centralização do programa, ainda bastante difuso, posto pelo próprio movimento. O programa, por sua vez, é que pode centralizar a classe trabalhadora. Há dois grupos de pautas que disputam a hegemonia do “programa” do movimento. A pauta da melhoria dos serviços públicos - transporte, principalmente, mas também saúde e educação; e a pauta do combate à corrupção. A pequena burguesia tenta dirigir o movimento para o combate à corrupção e reformas políticas, onde não se explicita o confronto com o capital - o empresariado e o rentismo. Pensamos que nossa atuação deve ser a oposta. Devemos defender: - Transporte público, gratuito e estatal, onerando os capitalistas e combatendo as saídas dos governos que visam garantir os lucros dos empresários, através da desoneração fiscal; - Ampliação dos investimentos em educação e saúde públicas, retirando dinheiro dos megaeventos, do pagamento da dívida, dos empréstimos do BNDES aos capitalistas etc. Nossa atuação deve ser voltada para explicitar a relação entre as pautas do movimento e o caráter explorador e gerador de injustiças do capitalismo. É necessário demonstrar com serenidade e persistência que as lutas parciais, como por direitos sociais e serviços públicos de qualidade, são fundamentais, mas devem ser vinculadas a uma estratégia de enfrentamento contra o próprio capital, rumo à construção do socialismo. Caso contrário, as pautas econômicas, parciais, podem ser absorvidas pela ordem, colaborando, inclusive, para a manutenção do capitalismo. A maioria que está nas ruas pertence à classe trabalhadora, ainda que não identificados com a luta histórica de sua classe. Nosso papel é militar pacientemente ao seu lado pela conquista de suas demandas contribuindo para seu avanço de consciência. Devemos ter em mente também que setores organizados do proletariado ainda não saíram às ruas. Quando o fizerem, se o fizerem nesse levante, a luta provavelmente se dará em outro patamar. Onde temos influência, devemos contribuir para isso.
Posted on: Sun, 07 Jul 2013 17:08:26 +0000

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