«Julgo ser mais ou menos público que não sou um especial - TopicsExpress



          

«Julgo ser mais ou menos público que não sou um especial admirador do actual Governo. No entanto, gostava,a este propósito, de deixar clara uma ressalva: não são tanto as medidas concretas que o executivo toma que me incomodam, mas, antes, a sua profunda e consistente desonestidade intelectual. Tomo dois exemplos que me forma sugeridos há uns minutos por José Luís Arnaud na SIC Notícias: 1- Pergunta Aranaud (e, com ele, o Governo): «não temos que diminuir a despesa pública? Não temos que diminuir a despesa pública?» O Governo assume esta interrogação como retórica. Para ele é uma evidência que dispensa demonstração e que assume carácter de verdade apodíctica termos que diminuir a despesa pública. NÃO É VERDADE. Ponto. É um simples preconceito ideológico. Temos, sim, em certa medida, que equilibrar as contas públicas. Mas as contas públicas tanto se equilibram através de uma redução da despesa, como através do aumento da receita (ou um misto das duas coisas). E o aumento da receita não tem fatalmente que ser alcançado com aumento das taxas de impostos. Pode ser alcançado até com diminuição do nível de imposto, se houver crescimento económico. O problema é que - habituados a trabalhar em modelos abstractos, manipuláveis através simples alteração de dados em folhas de Excel - o Governo, a troika e todos os pseudo-liberais dados à engenharia social imaginaram que, sendo complicado pôr a economia a crescer, era mais fácil cortar na despesa. Evidentemente, como ficou demonstrado depois de dois anos de governo de Passos Coelho e como adivinhava qualquer pessoa que tivesse lido duas linhas de História, não era. A despesa é relativamente fácil de cortar, quando se tem o exército atrás e se está disposto a eliminar sem piedade os que se nos opuserem. De outro modo, é complicado. O resultado de ter ignorado e insistir em ignorar estas evidências está à vista: o Governo não consegue cortar na despesa pública, não consegue pôr a economia a crescer e só consegue (quando consegue, pois, na verdade, não tem conseguido) algum equilíbrio das contas públicas através do aumento dos impostos, das respectivas taxas. 2- Continua Arnaud: «Porque temos que honrar os nossos compromissos, ou não temos?» É outro argumento comum, falacioso e desonesto do Governo: «temos que honrar os nossos compromissos!». Honrar, os compromissos é, de facto, um princípio fundamental da vida em sociedade, sem o qual não há paz nem ordem jurídica possíveis. Simplesmente, se há coisas em que este Governo tem sido campeão é em não honrar compromissos. Não honra os compromissos que assumiu com os funcionários que o servem; não honra os compromissos com os reformados que nos governos confiaram e a quem entregaram mensalmente os seus descontos, na esperança de uma reforma descansada; não honra os compromissos com quem lhe fornece bens e serviços e paga invariavelmente fora dos prazos contratuais que estabelece e que impõe aos outros (embora, em abono da verdade, tenha de dizer-se que esta não é uma originalidade do actual Governo). Na verdade, quando está a falar na necessidade de honrar os compromissos, o Governo não está, de facto, a falar em honrar os compromissos. Está a falar em honrar alguns compromissos e desonrar todos os outros. Basicamente, está a falar em honrar os compromissos assumidos com a banca que nos financia. Note-se que a atitude do Governo não é estúpida nem irracional. A escolha de honrar os compromissos com a banca e alta finança em prejuízos de todos os outros tem uma explicação óbvia: o desrespeito pelos outros compromissos todos não tem mais consequências do que umas manifestações e uns protesto na rua; ao invés, o desrespeito pelos compromissos assumidos para com a alta finança teria como imediata consequência o fim do financiamento de que necessitamos para viver. Simplesmente, se assim é (e é), o que está em causa não é - como o Governo, grandiloquente e inchado, gosta de proclamar urbi et orbi - nenhum grande princípio ético nem a defesa de alguma honra e bom nome que se queiram manter intocáveis, mas, bem mais rasteiramente, o simples estado de necessidade e a coação moral a que os nossos credores financeiros nos sujeitam. E, neste contexto, a obrigação primeira - e única - de qualquer governo era unir os portugueses todos em torno do grande desígnio nacional de nos libertarmos desse jugo de coactivo e intolerável a que nos submetem os nossos credores. Em vez disso, parolamente deslumbrado com o último artigo neo-liberal que leu, como se fosse ciência, na última newsletter da Goldman Sachs, o Governo desvanece-se de orgulho por secundar a pressão da alta finança internacional sobre o país e governa contra os portugueses, apontando-lhes a cada passo a sua culpa e condenando-os, sempre muito ufano da sua acção moralizadora e morigeradora, à expiação pela eterna pobreza do pecado de um dia terem sonhado viver e não, apenas, sobreviver. Por isto, sobretudo por isto, pela ilimitada desonestidade intelectual - e não pelas medidas concretas que toma que, por vezes, dificilmente podiam afastar-se muito daquilo que são - contesto e continuarei a contestar o Governo. Até que a pena me doa.» António Conceição
Posted on: Wed, 04 Sep 2013 02:24:56 +0000

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