O teatro reserva esse espaço fundamental de espelho às - TopicsExpress



          

O teatro reserva esse espaço fundamental de espelho às deformidades; ele, o teatro, é o próprio lugar de instaurar deformidades fazendo entortar tempo e espaço, desmoronando sobre o ator um continente de torções e fraturas, tudo com a intenção de celebrar a derrota desse falso otimismo progressista, ditadura reinante na existência das ruas de nossos dias. O teatro abre suas portas para decretar impossibilidades, atar nós insolúveis, promover terremotos e enterrar as individualidades. O ator de teatro é esse mártir da extinção proclamada, não porque sofre para poder ser lembrado, mas porque primeiro some para depois poder aparecer, e existir. O ator de teatro é uma presença desmaterializada, um fantasma portador de órgãos, um condenado a morrer de tanto suspirar de aflição, a cada sopro de vida esvaindo. A função do ator de teatro é mascarar-se, e é só quando derrete as suas feições faciais que pode revelar o que é preciso ser revelado: a decadência da humanidade, o inequívoco estado de doença que sempre esteve atado às nossas frágeis estruturas. Repare: os grandes do teatro sempre falaram e falam daquilo que realmente interessa, e que só o teatro pode dar conta de abarcar: a terrível tarefa de reconhecer a aventura furada que é a vida. Mas nisso há celebração, nunca uma bruma pesada de cores negras. O cinza das coisas é a própria realidade que dá conta de pintar. O teatro, ao abrir as portas para desentocar os absurdos irrevelados, invertendo a ordem natural das coisas para descobrir o que não se vê no piscar dos olhos, é sempre festa, lugar de potência celebrativa. É a vida, na sua constância cotidiana, que nos envenena sem que saibamos. O veneno do teatro é simbólico, e é por ele, através do seu envenenamento poético, que temos alguma chance de nos salvar.
Posted on: Wed, 11 Sep 2013 02:09:30 +0000

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