morreste-me. não aos 11 de junho que a tua lápide informa, só - TopicsExpress



          

morreste-me. não aos 11 de junho que a tua lápide informa, só me morreste na manhã seguinte. nesse 11 de junho falaste comigo, estiveste comigo, não me morreste. morreste-me quando a luz ainda era fria, naquele breve minuto mais longo de sempre em que me ligaram a dizer que o meu irmão tinha tido um acidente. morreste-me aí, logo, claro como a água, ainda antes de te saber morto. morreste-me muito nessa manhã, a cada pessoa a quem contei, nos pais em choque, na espera desesperante por notícias. morreste-me várias vezes nessa semana, no vaivém entre pai e mãe em luto suspenso e o assegurar que duas casas não caíssem ao chão. esse papel era o teu, mas alguém teve de o fazer. morreste-me em todas as notícias do teu acidente que pesquisei, em todas as notícias de todas as pessoas que morreram em acidentes nos tempos seguintes. morreste-me quando te fomos buscar, uma semana depois de teres morrido, e parei numa estação de serviço à espera de uma carrinha funerária. morreste-me no aeroporto quando chegaste a nós dentro de uma caixa. morreste-me aí e morres-me sempre um bocadinho em cada viagem de carro pela noite, em cada notícia de uma morte jovem, em cada perda próxima. morreste-me, mas não morreste em mim. podia dizer que levaste um bocadinho de mim contigo, mas não levaste. não perdi nada que fosse, verdadeiramente, meu. morreste-me, mas deixaste-me tudo o que eras em tudo o que eu faço. por isso eu acho que não estás debaixo de terra nem num cemitério ou sob uma lápide. estás em todo o lado. se tenho irmãos? tenho, um. morreu há 3 anos. e o sol não deixou de brilhar, nem a relva deixou de ser verde.
Posted on: Tue, 11 Jun 2013 22:55:51 +0000

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