As Raízes do Anarquismo: I Por Joana Castro Pereira Taoísmo e - TopicsExpress



          

As Raízes do Anarquismo: I Por Joana Castro Pereira Taoísmo e Budismo O anarquismo é frequentemente encarado como um fenómeno recente, nascido na época contemporânea, de índole predominantemente ocidental. Face a esta ideia generalizada, sustentar que as suas sementes germinavam já nas antigas civilizações do Oriente poderá constituir objeto de surpresa. Na verdade, as filosofias Taoísta e Budista eram já fontes de diversas ideias que, ainda hoje, se encontram presentes no seio do anarquismo. Analisemos então estas duas filosofias e vejamos de que forma elas poderão ser encaradas como as mais embrionárias manifestações de anarquismo. Nascido no século VI a.C., em torno da cultura popular dos primórdios da civilização chinesa, o Taoísmo vê em Tao Te Ching (O Caminho e o Seu Poder) a sua principal obra. Atribuída a Lao Tzu, filósofo nascido entre 600 e 300 a.C., “ [it] celebrates the Tao, or way, of nature and describes how the wise person should follow it.” (Marshall, 2008: 54) Lao Tzu encara a propriedade como uma forma de roubo e considera que a distribuição desigual de recursos é a principal causa da guerra. Criticando a sociedade de classes e a propriedade, o filósofo propõe uma sociedade não hierarquizada e sem governo, na qual os seres humanos viveriam em harmonia com a natureza: “It would be a decentralized society in which goods are produced and shared in common with the help of appropriate technology.” (Marshall, 2008: 58) O desenvolvimento da filosofia taoísta corresponde à conjuntura de uma sociedade feudal, na qual se assistia à codificação da lei, bem como à centralização e burocratização do governo, onde a hierarquização social se tornava uma realidade cada vez mais presente, baseada na ideia de que cada um conhecia o seu lugar e a sua função na sociedade. Desta forma, os taoístas desenvolveram sentimentos de rejeição ao governo, sustentando que todos poderiam viver em harmonia natural e espontânea. O seu pensamento baseia-se na crença de que os seres humanos têm uma predisposição inata para a bondade, pelo que seria possível estabelecer uma ordem voluntária, em harmonia com a natureza.[1] No cerne do pensamento taoísta está o conceito de wu-wei (falta de wei), que, do ponto de vista político, associa wei à imposição da autoridade: assim, wu-wei refere-se à ação natural, a qual conduz à ordem espontânea, em nada relacionada com a autoridade imposta. Na sua conceção de wu-wei, os taoístas condenam toda a atividade contrária à natureza, acreditando que a sua correta aplicação conduzirá à perda da dimensão coerciva do trabalho. [2] De acordo com a sua filosofia, a melhor forma de regular o mundo consiste em deixá-lo seguir o seu próprio rumo, sem qualquer interferência: “(…) just as plants grow best when allowed to follow their natures, so human beings thrive when least interfered with.” (Marshall, 2008: 56) Assim, o melhor legislador será aquele que confia na boa fé humana, permitindo que os indivíduos sigam as suas atividades pacíficas e produtivas.[3] A tendência anarquista dos taoístas é fortalecida pelos escritos do filósofo Chuang Tzu (369-286 a.C.), que rejeita todas as formas de governo e celebra a livre existência do indivíduo autodeterminado: entregues a si mesmos, os seres humanos viverão em harmonia natural e em ordem espontânea, livres de controlo e coerção, aspetos que viciam a natureza humana. [4] Advogando uma sociedade livre, na qual os indivíduos estariam entregues a si mesmos, perseguindo os seus objetivos, os taoístas não esquecem os interesses dos outros, pois “the more a person does for the others, the more he has; the more he gives to others, the greater his abundance.” (Marshall, 2008: 59) Fundada no século V a.C. por Siddhartha Gautama, conhecido como Buddha (“o Iluminado”), o Budismo era, originalmente, uma religião indiana. Em 1200, tinha já desaparecido da Índia e encontrava-se estabelecido no Sri Lanka, no Tibete e na Tailândia. Na China, desenvolveu o seu lado Zen, dotado de um profundo potencial libertário.[5] O Budismo Zen procura o regresso do ser humano ao estado natural de liberdade, estado esse perdido através da ignorância. É necessário que o indivíduo faça as suas próprias escolhas e seja capaz de realizar a sua caminhada sozinho, porque o “awakening cannot be achieved by another’s power.” (Marshall, 2008: 62) O Budismo não conhece qualquer autoridade que não emane da própria consciência do indivíduo, sendo que essa autoridade só serve para si próprio. Segundo os budistas zen, não há justificação para a hierarquia e a dominação e todos nascemos livres e iguais.[6] A propriedade privada é rejeitada e muitos seguidores do Budismo Zen defendem uma economia baseada na dádiva mútua.[7] Para os budistas zen, as nossas vidas e toda a existência são reguladas pelo karma, o que significa que toda a ação tem uma reação. Assim, cada pessoa tem liberdade dentro das limitações do seu autocriado karma e, através do pensamento e das boas ações, é possível moldar o próprio destino.[8]Na caminhada rumo à autossalvação, o indivíduo não deve esquecer os outros, pois “whoever breaks the harmony of life will suffer accordingly and delay his or her own development.” Parece legítimo afirmar que a visão de liberdade social das filosofias taoísta e budista as transforma em grandes fontes de sensibilidade anarquista, uma vez que ambas advogam a rejeição da hierarquia e da dominação, a busca do crescimento na liberdade autodisciplinada, a preocupação com a autonomia pessoal e o bem-estar social. A pobreza voluntária, o pacifismo e o amor pela vida, presentes nas duas filosofias, oferecem-nos uma base moral para a criação de uma sociedade livre.[9]
Posted on: Mon, 24 Jun 2013 15:17:07 +0000

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