Cinema, ética, dominação e liberdade. É uma rica experiência - TopicsExpress



          

Cinema, ética, dominação e liberdade. É uma rica experiência buscar os pressupostos éticos dos filmes. As pessoas se identificam com os filmes que se ligam, de alguma forma, às suas vidas ou suas crenças. Mesmo que seja um filme de ficção científica, um drama ou um épico, as ideias contidas nos filmes se referem ao nosso cotidiano e nos ajudam a refletir. A sutileza e profundidade das mensagens dependem da habilidade do diretor. Quanto mais sutil a mensagem, mais forte ela é, pois se torna universal, se descolando do contexto do filme e se ligando à nossa individualidade e às nossas questões particulares. Na cena final do filme O Último Samurai, quando o personagem de Tom Cruise (Nathan Algren) leva a espada do samurai morto para o imperador japonês, o jovem imperador pergunta: “me conte como ele morreu”, ao que Nathan responde: “Eu prefiro falar como ele viveu”. Esta é uma mensagem ética, uma vez que dá mais atenção aos valores do mestre samurai, seu estilo de vida, honra e defesa de suas ideias até a morte. Nathan, um soldado americano cheio de culpas, traumas e lembranças amargas da guerra civil americana, encontrou entre os samurais uma vida que valeria a pena ser vivida, pautada pelo senso de comunidade, disciplina, amor e companheirismo. Ora, é esse fundamentalmente o dilema ético: como devemos viver e que vida vale a pena ser vivida? Nathan tomou sua decisão. Forrest Gump jamais deu importância às suas enormes conquistas, que aconteciam enquanto ele se preocupava com seus companheiros e familiares, valorizados e amados acima de tudo. Apesar de sua idiotice, algumas coisas eram-lhe muito claras, e para a mulher que era o amor de sua vida ele disse: “Eu posso ser idiota, mas tenho certeza de que te amo”. Em memória de Buba, seu companheiro morto no Vietnã, Forrest comprou um barco de pesca e trabalhou com seu antigo capitão Dan Taylor, que Forrest salvou arriscando a própria vida durante a guerra. Com o sucesso e o dinheiro que ganhou em sua empreitada, sustentou a família de Buba. Em retribuição à Forrest, Dan Taylor administra a fortuna dos dois. Forrest não apenas salvou a vida de Taylor, mas lhe deu um motivo para viver. Forrest tem uma vida rica em experiências, foi atleta, soldado, empresário, celebridade, pai, marido, amigo e filho amoroso, tudo de forma intensa e verdadeira. Ele era idiota e burro, mas sua sabedoria e posição ética perante a vida suplantavam todas as suas deficiências, encantando a todos que se relacionavam com ele. De certa forma, Forrest é maior que a própria vida, pois suas deficiências não o impediram de viver uma vida plena e agir corretamente com todos. O super-homem pode ser interpretado de várias formas. É um personagem com muitas possibilidades de interpretação a partir de vários paradigmas, desde o cristão até o existencialista. Dentro do paradigma cristão, ele é o filho único de um homem sábio, que o mandou para a Terra por acreditar na benevolência humana, mas também por saber das fraquezas físicas e éticas dos homens. Com o objetivo de contribuir para a elevação dos homens, Jor-el (pai do super-homem) envia seu filho Kal-El, que é o nome kriptoniano de Clark Kent. Clark, por sua vez, é criado por seu pai terráqueo (ou terreno, no jargão espiritual), que é benevolente e o ensina a lidar com os homens e esconder seus poderes até que ele encontre sua identidade. Clark precisa descobrir quem é de verdade, qual sua origem e identidade. Para isso ele tem de passar por um período de solidão, reflexão e estudo (representado na história do super-homem pela Fortaleza da Solidão, sua casa). Lá ele recebe a sabedoria de seu verdadeiro pai, que lhe amplia os poderes e o conhecimento de si mesmo. Somente após esse período, Clark Kent se torna o super-homem e, por fim, consegue voar. O voo inicial do super- homem é simbólico, pois representa a plenitude do conhecimento de si mesmo após um período de solidão onde se buscou o autoconhecimento. A ética contida na história do super- homem é tanto perfeccionista (aquela segundo a qual o homem deve buscar se aperfeiçoar) como consequencialista (que mede as conseqüências de suas ações para os outros, dado o enorme poder do super-homem). Dentro do paradigma existencialista, Clark Kent é alguém que se percebe diferente dos outros, um estrangeiro jogado em um mundo estranho contra sua vontade. É preciso enfrentar a realidade que lhe foi imposta e que cobra atitude e posicionamento em relação ao outro. Clark, como todos nós, não teve liberdade para escolher estar no mundo, mas tem liberdade para decidir o que fazer no mundo. Com freqüência aqueles que se sentem sozinhos e rejeitados, diferentes do que é esperado pela sociedade, se identificam com Clark Kent. Clark tem um poder incrível e suas atitudes podem afetar grandemente os outros. Por outro lado, ele desenvolve uma profunda consciência de seus poderes e das conseqüências de usá-los de forma indiscriminada. Assim, o super-homem desenvolve um amor pela humanidade e pelo mundo que o acolheu e decide viver com os outros de forma responsável. Clark não se mostra verdadeiramente, se disfarça de jornalista atrapalhado, de certa forma reduz sua grandeza para se adequar, por respeito e amor, a uma sociedade absurda. Os filmes trazem mensagens éticas, que representam o comportamento que uma sociedade espera de seus integrantes. Podemos aceitar ou não a mensagem, refletir sobre ela e ver como se aplica à nossa vida ou simplesmente identificar uma imposição de paradigma. No entanto, apesar do forte apelo dos filmes, a decisão sobre como devemos viver é sempre nossa. Como dito mais acima, não escolhemos estar no mundo, mas temos de escolher o que fazer no mundo apesar da influencia cultural. Isso é magistralmente representado em uma cena do filme Matrix em que Neo é forçado pelo arquiteto da Matrix a decidir entre duas portas. O arquiteto, assim como as ideologias e culturas, nos apresentam visões de mundo e nos forçam a escolher. De um lado a salvação da cidade de Zion, do outro a salvação de sua companheira Trinity. Mas nem mesmo o arquiteto pode decidir por nós; pode apenas nos influenciar. A decisão ética é um momento de liberdade essencial onde estamos completamente sós. O próprio arquiteto não poderia forçar Neo a decidir, pois a decisão seria somente de Neo, e por mais que os filmes, sociedades, religiões ou governos tentem nos influenciar, somos nós que decidimos, todos os dias, a vida que iremos viver e arcamos com as responsabilidades de nossa decisão. Temos a liberdade de escolha, e escolher não escolher já é uma escolha que traz suas conseqüências. Como diria Sartre, o homem está condenado à liberdade, mesmo que preso e influenciado pela cultura e sociedade. Alfredo Carneiro Link para o texto no site Netmundi - Pensamentos:
Posted on: Fri, 09 Aug 2013 16:52:11 +0000

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