O CANSAÇO DOS MITOS RJ: a cidade maravilhosa Não é fácil questionar um mito. Muitas vezes ele é confundido com “mentira”, porém se refere a mais que isso. Abarca o poder do símbolo e, portanto, encontra-se além das vicissitudes do tempo e do espaço. Freud se utilizou do mito grego de Édipo para fundamentar uma tese que faria a cabeça de muita gente, desde o século passado. Por ironia e paradoxo, a ciência não escapa ao peso religioso do mito. Há certa ousadia em se questionar Freud. Também é ousada a tese que questiona o título de “cidade maravilhosa” para o Rio. Sim, existem belezas mil no município, porém isto é sempre afirmado como se o Criador, um demiurgo bairrista, tivesse concentrado todas num lugar somente; como se fora dos limites da cidade o território, a geologia, o clima, a paisagem estancassem num grande corte abrupto. Não será preciso discorrer muito sobre a construção cultural do mito, para se afirmar que há interesses, sobretudo, financeiros orbitando a mitologia desta cidade. O histórico da colonização portuguesa também ajuda a explicá-lo. É claro que não faria sentido começar a colonização pelas regiões interioranas: o litoral foi o primeiro contato e facilitava o escoamento dos produtos, via-oceano, até às metrópoles europeias. O mar tem sua beleza ímpar, que é cantada em estrofes poéticas desde a Antiguidade. Mas, é certo que há belezas magníficas, por exemplo, no município serrano de Macuco, próximo a Friburgo, estado do Rio. Ainda mais, se pensamos que ali o meio ambiente está mais casto, preservado, que o Rio de Janeiro. Tudo bem, a garota de Ipanema é mais conhecida do que a garota de Macuco, mas e daí? A beleza também é uma construção cultural. As mulheres pintadas por Leonardo da Vinci eram gordinhas. Repare nas bochechas da Mona Lisa. Enquanto hoje as manequins de passarela precisam mostrar os ossos, e vence aquela com a fratura mais exposta. Agora, imagine: existem cinco mil e seiscentos municípios no país. Somente no RJ, são noventa e dois. O estado de Minas Gerais, sem praias, mas generoso em rios, cachoeiras e serras, possui pra lá de oitocentos! O mito da cidade maravilhosa é reconhecido pelos estrangeiros, que fazem a chancela internacional classificando-a como a cidade mais bela do planeta. E mesmo os turistas de fora, que conhecem mais a Amazônia e outros recantos nativos do que nós, moradores da terrinha, não têm tempo suficiente para conhecerem tudo e tecerem uma comparação. Seria necessário se fazer um passeio por todas as cidades, a fim de se produzir uma comparação minimamente justa. Mas, não há tempo suficiente para isso. Ainda mais que os municípios parecem se reproduzir como coelhos, nessa onda de emancipações que atravessa o território. Maurício Pássaro acolunadoservidor
Posted on: Sat, 23 Nov 2013 20:54:49 +0000
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