O reconhecimento do Mundo. Por Oswaldo Porchat Mas voltemos - TopicsExpress



          

O reconhecimento do Mundo. Por Oswaldo Porchat Mas voltemos à filosofia que reconhece o Mundo. Algum filósofo virá dizer-nos que a consulta da filosofia ao saber da visão comum deixa as coisas como estão e nos deixa, a nós, no grau zero da filosofia. Responder-lhe-ei que a filosofia do reconhecimento deixa confessadamente as coisas como estão, pois as reconhece como coisas dotadas de plena realidade e objetividade. Não alimenta a pretensão de delas fazer tabula rasa, pois entende que não pode com elas. Mas por outro lado, ao reconhecer as coisas e processos do Mundo, a filosofia se confere um ponto privilegiado de partida. Esse ponto de partida não é um vácuo de saber, mas uma plenitude de manifestação e presença. Em verdade, não se trata de um ponto, mas de uma base sólida de partida. A promoção filosófica da visão comum é, precisamente, a sua transmudação em base para uma visão filosófica do Mundo. Reconhecendo o Mundo, a filosofia se dá a si mesma essa base extraordinariamente rica sobre a qual se erguerá o edifício filosófico. Fundamento forte, alicerce sólido plantado em terra firme. O Mundo reconhecido é o fundamento que a filosofia exibe e descreve, para sobre ele construir-se, não o tendo construído. Tomando-o como necessário Objeto, a filosofia vê nele, anteriormente, o seu Sujeito suporte e raiz, fonte e alimento. 0 mundo reconhecido é o pressuposto explicitado do discurso filosófico, o referencial imediato que o norteará e lhe dará sentido. Dando. às palavras de Wittgenstein um sentido por certo diferente daquele que o filósofo lhes atribuía, direi também que em filosofia, conhecemos, no ponto de partida, todos os fatos que precisamos conhecer.Tudo isso leva-me justificadamente a dizer que não existe o grau zero da filosofia. Mas não ë verdade que toda a filosofia está ainda por fazer? Sim, num certo sentido. Mas a filosofia se pode agora fazer, porque ela dispõe de um fundamento firme. Não tem que procurar por certezas e evidências primeiras, porque as tem em seu ponto de partida. Não perseguirá no ar o que tem como chão: o solo não se inventa, mas sobre ele se caminha. Não sairá à busca de critérios para legitimar o seu discurso, na medida em que este imediatamente se legitima, enquanto expressão do reconhecimento do Mundo. Pois vimos acima como, ao assumir teoricamente a visão comum do mundo, a filosofia assume ipso facto sua expressão no discurso comum como fundamentalmente adequada, assume ipso facto a significatividade imediata e transparente deste discurso que ela faz seu. Não mais forjando o extravagante projeto de procurar alhures o chão que já pisa, a filosofia partirá da visão assumida do Mundo para explicitá-la sempre mais, articulá-la sempre melhor, constantemente aperfeiçoá-la e nesse sentido enriquecê-la, tornando-a mais sistemática, auto-consciente e crítica. Explicitação, articulação, aperfeiçoamento, sistematização e crítica que a preservarão, no entanto, de qualquer desqualificação, clara ou dissimulada. A partir daí, a filosofia procurará definir suas tarefas e fixar seus programas, formular seus problemas e propor suas soluções. 0 mundo reconhecido, que não é um problema, será o referencial permanente para a formulação de problemas e a proposição de soluções. Alfa e ômega da filosofia, origem e fim não questionáveis dos questionamentos filosóficos. E a filosofia remeterá constantemente ao Mundo para orientar, aperfeiçoar ou mesmo corrigir suas formulações. 0 caminhar da filosofia tem agora parâmetros bem fixos que o balizam. Dentro deles, poderão abordar-se os problemas históricos e clássicos da filosofia, seja para orientar sua solução, seja para desmascarar eventualmente sua falsa problematicidade. Mas se caminhará sempre por terra conhecida. 0 reconhecimento do Mundo terá sido apenas o ponto de partida. Mas ele é o único ponto de partida possível para uma sã filosofia. E se procurará construir, assim, o discurso crítico da filosofia. A razão filosófica encontrará sua força e grandeza nessa submissão ao Mundo que ela reconhece como anterior e transcendente a ela, maior e mais poderoso que ela. Relativa ao Mundo, a filosofia sabe que o Mundo não lhe é relativo. Ela se constituirá num ato de humildade, como rendição da razão ao Mundo. Porque a racionalidade da razão se manifesta no reconhecimento de seu lugar próprio, não no culto narcísico de sua divindade imaginária. E, com isso, se opera um verdadeiro redimensionamento da racionalidade filosófica.
Posted on: Tue, 22 Oct 2013 00:55:38 +0000

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