Quem tiver a paciência de ler até o fim, ganha uma bandeira vermelha para ir à próxima manifestação: Vejo muitas pessoas na oposição à esquerda se perguntarem: “ué, como pode haver perigo de golpe, se o PT está absolutamente comprometido com a velha política e com a burguesia? Ora, como pode haver perigo de golpe das elites, se o PT ESTÁ COM AS ELITES?” Acho que vale a pena discutirmos essa questão. Em primeiro lugar, é necessário reconhecer que a pergunta faz sim todo sentido. O governo PT foi e está sendo absolutamente medíocre para um governo que se propunha a ser de esquerda. Aliás, essa mediocridade me parece ter sido anunciada antes de o PT chegar ao poder, na famosa – ou famigerada - “Carta ao Povo Brasileiro”, escrita para acalmar a burguesia. E assim foi. A burguesia esteve calma nesses 10 anos. O PT não fez absolutamente NENHUMA das reformas importantes da pauta da esquerda. Não fez reforma agrária (aliás, o PSDB em 8 anos de poder fez mais assentamentos que o PT em 10) (link 1), não estatizou nada (pelo contrário, leiloa o nosso petróleo), não democratizou os meios de comunicação e nem fez reforma política. Aliou-se ao que havia de pior no Congresso. Tranquilizou, desse modo, a burguesia. Eike Batista está calmo, feliz e satisfeito. E isso perdura já 10 anos. Não tem desculpa para isso. É por isso que eu faço parte da oposição de esquerda. No entanto, não se deve por isso crer que o PT seja, agora, a legenda preferida das elites. Não é. Basta ler a Veja e notar o ódio com que ela se refere ao PT. Basta comparar a repercussão do mensalão de 1997 (links 2 e 3), do qual nem se ouve mais falar, à do mensalão de 2005. Esse ódio do PT não é gratuito. Esse ódio é originado no fato de que a renda dos mais pobres cresceu nesses 10 anos muito mais que a dos mais ricos. A desigualdade social diminui em ritmo muito acelerado (link 4). O desemprego nunca foi tão baixo. A burguesia não gosta de se ver menos privilegiada. Não gosta de enriquecer em ritmo menor. Também não gosta de ver pobre viajando de avião. Nem de perder a empregada doméstica. O PT não desafiou as elites, mas fez o melhor que podia sem desafiá-la. Isso não é pouco. As conquistas não foram pequenas. Mas, por outro lado, foram muito aquém do sonho da esquerda, justamente por não terem tocado em nenhuma estrutura do sistema. Portanto, o fato de o PT não ter desafiado as elites não significa que governou apenas pensando nelas e apenas para elas; não significa que as elites não pudessem estar mais satisfeitas. Poderiam sim. Mas ainda fica a questão: “Tudo bem, as elites poderiam estar mais satisfeitas. Mas estão elas insatisfeitas a ponto de quererem causar instabilidade para derrubar o PT?” Aqui me parece importante tratar de uma novidade, que talvez seja uma das chaves para entendermos esse crescimento dos protestos, com essa intensa infiltração da direita e desse senso comum anti-petralha construído pela grande imprensa. E essa novidade é a intenção do PT de fazer uma reforma política. O governo PT foi, até o momento, medíocre, por não ter feito nenhuma reforma estrutural. Mas parece ter a intenção de fazer uma agora, que é a reforma política. E talvez, para a burguesia, agora seja a hora de derrubar o PT, justamente por isso. Mas por que a reforma política é tão ameaçadora à burguesia? A reforma política do PT tem algumas propostas, mas a mais importante é a adoção do financiamento exclusivamente público de campanha. Hoje, qualquer pessoa está proibida de ser presidente da República, a não ser que uma empreiteira o queira. Isso mesmo. Porque é absolutamente impossível alguém chegar ao poder no Brasil sem dinheiro das maiores corporações do país. São elas as financiadoras das campanhas políticas. Isso significa que o mecanismo de financiamento atual torna o poder público refém do poder privado. Significa que é a burguesia quem governa. Diz-se muito que “todos os políticos são safados e corruptos”, mas será que isso se dá por uma culpa individual de cada político? Por que é que apenas “bandidos” chegam ao poder? Será que a culpa acaba na classe política? Evidente que não. Existem estruturas de cooptação da classe política por grandes interesses privados. E o PT ameaça mexer na mais fundamental dessas estruturas, que é o mecanismo de financiamento. O financiamento público, defendido pelo PT, é uma bandeira de toda a esquerda, e ameaça emancipar o poder público, isto é, libertá-lo dos laços com o poder privado. Não mais os políticos precisarão do dinheiro da burguesia para se elegerem. Portanto, não mais serão reféns dela. Essa ameaça petista pode justificar uma intenção de desestabilização seguida de golpe da burguesia. Não falo em golpe militar. Essa possibilidade foi enterrada pela própria grande imprensa, que, após a redemocratização, condena a persistentemente a ditadura e se faz de paladina da liberdade e da democracia, numa estratégia cínica para se eximir da culpa sobre o golpe de 64. O golpe que eu me refiro pode ser, simplesmente, a desestabilização intencional e planejada seguida de um impeachment. Qualquer pessoa que assuma no lugar da Dilma será mais à direita e, portanto, melhor para a burguesia. Então eu pergunto: por que essa teoria não seria verossímil, particularmente agora que o PT ameaça fazer uma reforma verdadeira? O PT esteve muito bem e estável no poder enquanto foi medíocre e não mexeu nas estruturas, embora também não fosse querido da grande imprensa burguesa. Bastou falar em reforma política que, em questão de meses, mergulhamos num quadro de instabilidade. Para a burguesia, talvez seja a hora de derrubar o PT, e não mais apenas através da manipulação da opinião pública. Não digo que tenho total convicção dessa teoria, mas vejo nela uma explicação plausível para o que estamos testemunhando. Agora o PT precisa se reunir com toda a esquerda e definir os pormenores da reforma política de comum acordo com os partidos mais radicais. Tem que explicar direitinho como o dinheiro público vai ser fatiado entre os partidos. Não adianta querer fatiar apenas de acordo com o número de votos, porque isso só beneficia os mesmos políticos que chegaram ao poder através do mecanismo anterior. Não adianta querer fatiá-lo de acordo com critérios que pareçam legislação em causa própria. Há uma nova oportunidade de uma radicalização séria e honesta, de uma ruptura com as velhas alianças sujas e de uma nova aliança com a esquerda. Existem quadros importantes do PT que defendem essa postura (links 5 e 6). Vamos torcer para que eles se façam ouvir. E vamos torcer para que ainda seja possível ao PT desfazer os laços que equivocadamente construiu e que hoje são tão fortes. Felizmente, parece estar se formando um consenso na esquerda de que ela não pode sair das ruas, sob o pretexto do golpe da direita. Não podemos deixar que o medo de nos tornarmos massa de manobra da direita nos tire das ruas. Pelo contrário, temos que nos unir para conquistarmos as ruas. E temos que conquistar toda a população que veste verde e amarelo e canta o hino, mas que não é fascista, apenas despolitizada. Essa população é esmagadora maioria e pode ser conquistada sim. Por último, deixo meus votos para que o PT saiba ouvir as críticas que merece (sem acusar toda e qualquer oposição de ser a “direita”) e que a oposição de esquerda saiba fazer as críticas certas, sem vestir a carapuça caricata do antipetismo. brasildefato.br/node/11534 cartamaior.br/templates/analiseMostrar.cfm?coluna_id=5735 www1.folha.uol.br/fol/pol/po14051.htm estadao.br/noticias/economia,renda-dos-10-mais-pobres-cresce-em-ritmo-chines,246181,0.htm https://facebook/breno.altman/posts/10200785681937254 articulacaodeesquerda-go.blogspot.br/2013/06/a-direita-tambem-disputa-ruas-e-urnas.html Sobre a reforma política: g1.globo/sao-paulo/noticia/2013/04/pt-anuncia-campanha-por-15-milhao-de-assinaturas-pela-reforma-politica.html cartacapital.br/politica/pt-coletara-assinaturas-para-projeto-de-reforma-politica/#.UWiYU7qdjqo.blogger meionorte/saviabarreto/oab-garante-apoio-a-reforma-politica-defendida-pelo-pt-254134.html
Posted on: Mon, 24 Jun 2013 00:43:36 +0000
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