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Quero inaugurar esse espaço com o brilhante texto do Prof. Dr. Emir Tomazelli- psicanalista. Fêmeas: memória ou desejo? por Emir Tomazelli As palavras ditas para a parede de minha sala, que se edifica diante do cliente enquanto eu o escuto, lá atrás, protegido do impacto frontal do dizer1, dizem que as fêmeas sofrem, que as mulheres perdem, que as mulheres não são vistas. As palavras (que Freud considera reais agências reveladoras dos não ditos) escorrem do divã quando as fêmeas falam, e gotejam no tapete da sala como bile que digere o nada da angústia. Essas falas dizem de um esverdeado que devora a ausência e, em seguida, a expele. Famintas, as falas das fêmeas comem o minúsculo fragmento de brasa por confundirem a fonte de calor perigosa com o calor daquilo que seria alimento. Engolem a brasa e, sem controle, em seguida, expulsam-na. É o calor que queima; falsamente pensado como proteção! Este é o feminino: sombra que só se alimenta do que pode matá-lo. É o falso sonho onde hysteros é apenas útero, corpo puro, totalmente ausente dos fantasmas que o traduzem e o transcrevem. Psicopatologicamente antes de serem mulheres, as fêmeas, desenvolveriam a ‘uteria’ e não a ‘hysteria’, e as mulheres seriam ‘utéricas’ e não ‘hystéricas’. As fêmeas sofrem. Mas são fortes, não fraquejam. Nunca, nem diante do gozo obtido pelo masoquismo feroz que cultivam depois que o desenvolvem. Destruídas, exaustas, mais em pé, sempre prontas para um novo sacrifício, para mais sangue. São boas, são santas, não acreditam que os cães podem mordê-las no rosto, não acreditam que os maridos podem odiá-las e preferirem se masturbar a estar com elas; ou, talvez ainda prefiram estar com machos para serem consolados por suas varas vigorosas. Não acreditam que suas mães ou suas amantes (qual seria a diferença entre estas?) podem matá-las, nem de que suas filhas as odeiam. Não sabem que são loucas, topam qualquer parada. Talvez por isso que a morte poderia ser definida como o feminino da pulsão. Assim não se perderia mais tempo em pensar a pulsão de morte. O feminino é suficiente para dar forma ao que deveria ser da ordem da morte! Não sei se ouço bem ou se invento o que me dizem, mas o que dizem quando me falam - ou quando falam para a parede do meu consultório - é isto que agora eu digo que me dizem quando falam: elas sofrem, elas padecem de amor. Principalmente se falam daqueles que amam e daqueles que desejam, pois que as fazem sofrer. O amor é cego, reveste de sentido o vazio vôo de Ícaro rumo ao sol. Há anos uma cliente me disse: “Mulher não quer amor, quer prova de amor!” Até hoje isto reverbera nas sessões onde as escuto. E, quando falam, se é que falam quando falam, falam de uma dor que deriva da cicatriz destino do que é para elas o ter no corpo esse outro decalcado que é o de ser mulher! Condenada a seus órgãos, suas funções e ao insuportável complemento que evocam esses mesmos órgãos e funções: o órgão receptivo anseia pelo intrusivo. Destino de corpo. Seta que aponta o lugar onde o eu deve estar, quer queira quer não. De alguma forma é o preço que se paga pelo corpo que se tem. De bom grado qualquer homem poderia somente querer que a mulher (toda mulher) estancasse ali onde o corpo oferece uma brecha. Bastaria para nós essa flor que se abre para a procriação e também para a insanidade. Ao homem comum basta o mergulho e o desaparecimento. Complexo é, para a fêmea, possuir Thalassa no corpo e abri-la para ser invadida e “conhecida” pelo intruso obrigatório. Se Jesus é o ‘pene’-trante, o êxtase de Santa Teresa D’Ávila2, as interpretações místicas de Françoise Dolto para os bebês e o transe psicótico de Klein junto de suas crianças, também se inscrevem no feminino. Ou não? É o corpo que impera, é o corpo que “inter-preta”! Ela é selvagem. E, se não anda com os lobos, deveria. __________________________ 1 Há os que me dizem na cara. 2 Vasse, ,DENISE Leitura psicanalítica de Teresa D’Ávila.
Posted on: Tue, 19 Nov 2013 03:59:21 +0000

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